Oficinas Para Quê: Uma proposta ético-estético-política para oficinas terapêuticas.

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Oficinas para que ? Uma proposta ético-estético-política para oficinas
terapêuticas


Cristina Rauter


Referêcia Bibliográfica: RAUTER, C. Oficinas para quê? uma proposta ético-
estético-política para oficinas terapêuticas. In: Amarante, P. (org)
Ensaios: Subjetividade, saúde mental, sociedade. Rio de Janeiro, Fiocruz,
2000, p.267-278.








RESUMO: No contexto da reforma psiquiátrica atual proliferam
experiências ligadas a oficinas terapêuticas, onde o trabalho e a criação
artística estão associados a estratégias ligadas ao que se tem chamado
"reabilitação psicossocial" do doente mental ou do usuário de serviços de
saúde. Consideramos que as perspectivas teórico-políticas que norteiam tais
experiências nem sempre são capazes de escapar à reprodução de velhas
estratégias psiquiátricas de adaptação pura e simples do doente mental.
Nossa proposta, tal como levada a efeito no curso de Especialização
"Teorias e Práticas Psicológicas em Instituições Públicas" do departamento
de Psicologia da Universidade Federal Fluminense (RJ/Brasil), é de
problematizar estas questões no sentido da buscar um direcionamento ético,
estético, político para a prática das oficinas, capaz de catalisar
transformações político-institucionais e subjetivas. Trata-se do relato e
reflexão teórica sobre uma experiência na formação de psicólogos para o
trabalho na rede pública de saúde mental.


A "reabilitação psicossocial" a que se refere a atual reforma
psiquiátrica pode soar como um eco de antigas práticas, já que desde o seu
nascimento, segundo nos mostrou Foucault, a psiquiatria passa por reformas.
A adaptação pura e simples do doente mental "à sociedade" é o horizonte da
maioria destas reformas pelas quais passou a psiquiatria. O termo
reabilitação possui um cunho pragmático, visto como seu maior mérito por
alguns, que a definem como uma prática que se desenvolveu mais depressa que
a teoria, ou até mesmo como uma prática sem teoria[1]. O que nos move
neste trabalho é a necessidade de problematizar algumas afirmações feitas,
no âmbito da reforma psiquiátrica atual. Problematizar, não para proclamar
a solução definitiva, mas no sentido bergsoniano, onde o exercício de
pensar coincide com a capacidade de saber colocar problemas, e não de
apontar soluções definitivas. Pois que sabemos nós, não há soluções
definitivas num terreno imediatamente político como o da psiquiatria. Que
falar de psiquiatria seja falar imediatamente de política
acreditamos já suficientemente demonstrado por Franco Basaglia, Foucault,
entre muitos outros. Mas pensemos no que pode se constituir uma prática sem
teoria. Uma prática levada a efeito por atores sociais de cabeça vazia, que
não pensam, apenas agem ? Considero inicialmente impossível a existência de
uma prática sem teoria - pois se trata sempre de saberes, mais ou menos
complexos, mais ou menos elaborados, mas sempre de saberes,
indissociavelmente articulados a práticas sociais.
Alguns dirão com razão, que até agora levantei apenas questões
teóricas, e se trata principalmente de agir, de inserir socialmente
indivíduos encarcerados, segregados, ociosos - recupera-los enquanto
cidadãos. Como faze-lo ? Através de ações que passam fundamentalmente pela
inserção do paciente psiquiátrico no trabalho e/ou em atividades
artísticas, artesanais, ou em dar-lhe acesso aos meios de comunicação, etc.
Se trata fundamentalmente, então, de criar situações onde os pacientes
possam trabalhar e criar para que possam inserir-se socialmente.
Não apenas para os pacientes psiquiátricos o trabalho e a arte têm esta
função de inserção no mundo da coletividade, de rompimento do isolamento
que caracteriza a vivência subjetiva contemporânea. O trabalho (dependendo
de que trabalho, como veremos a seguir) pode nos tornar (a nós e a nossos
pacientes) agentes ativos no mundo em que vivemos e não penas expectadores
passivos ou submissos ao que ocorre fora de nós. Sim, trabalho e a arte
podem ser grandes vetores de existencialização - como diz Félix Guattari.
Porém, em que condições isto pode ocorrer ? Em que mundo queremos nos
inserir e inserir nossos pacientes ou usuários psiquiátricos? Responder a
esta questão é muito importante, porque - será que queremos nos inserir ou
nos adaptar pura e simplesmente ao mundo em que vivemos hoje ? Do ponto de
vista do fortalecimento e da expansão da vida, que obteremos com este tipo
de adaptação? Será que no mundo capitalista o trabalho segue tendo todas
estas características (de funcionar como vetor de existencialização) ou até
que ponto? Ou se trata de transformar as relações de trabalho para que elas
possam funcionar deste modo?
No que se refere à arte, teremos também que pensar sobre o lugar da
criação no mundo contemporâneo. Teríamos portanto que nos colocar todas
estas questões quando fazemos oficinas onde trabalho e criação artística
estão em jogo.
É necessário retomarmos Marx[2] para pensar as condições do trabalho no
capitalismo - lembremo-nos da noção de trabalho alienado : no trabalho
alienado, creio que as condições pelas quais o trabalho pode se constituir
como vetor de existencialização estão bastante reduzidas ou inexistentes.
(o homem se torna escravo das máquinas e não o contrário.) No capitalismo,
a mecanização da produção trouxe consigo o aumento da exploração, já dizia
Marx, sem chegar a ver os desenvolvimentos atuais da informatização da
produção, um dos fatores responsáveis pelo aumento do desemprego em todo o
mundo. Neste tipo de sociedade, o homem se torna absolutamente escravizado
pelo sentido de ter, escravo das coisas. (aqui, relembramos a noção de
fetichismo da mercadoria).
Lembremo-nos também de que o filósofo Gilles Deleuze utiliza a palavra
construtivismo quando fala de desejo. O desejo é um construtivismo, diz
ele. Trata-se de construção e não de expontaneismo. De fato, quando nos
perguntamos pelo sentido das oficinas terapêuticas, este questionamento diz
respeito ao desejo e suas condições de efetuação na vida, no trabalho, na
criação. Também nos diz Deleuze que embora uma diferença de grau e não de
natureza nos separe dos animais (assim, não haveria oposição entre natureza
e cultura) - enquanto eles têm um mundo, nos homens "o mundo" se apresenta
como uma construção permanente. Nossa capacidade de construir mundos onde
possamos habitar, nós animais humanos, parece estar comprometida
atualmente. É o que enfatiza Guattari em seu As Três Ecologias.3
É neste ponto que traremos um relato sobre a história de um movimento
das artes plásticas, contemporâneo da revolução de 1917 - o Construtivismo.
É uma história que trata justamente das relações entre política, criação
artística e produção da vida material, tema que toca de perto a questão das
oficinas terapêuticas . Alguns dos participantes do movimento
construtivista, nas primeiras décadas do século vinte na Rússia,
pretenderam, talvez ingenuamente, trazer a revolução para o campo das artes
ou participar dela desde aí. E foram sendo progressivamente "expurgados",
eles que chegaram a ocupar cargos significativos no campo cultural, no
começo da revolução.
Que era o construtivismo ? O movimento propunha-se a uma total
reformulação da linguagem plástico-pictórica, rompendo com a relação de
dependência para com as formas do mundo real exterior, para criar "objetos
autônomos"[3]. Construtivismo entendido em relação aos elementos materiais
da pintura, construtivismo como ruptura dos limites entre a escultura e a
pintura, com a construção de objetos e contra-relevos, ou com a própria
tela tornada objeto da pintura. As esculturas moveis de Rodtchenko, o
monumento à Terceira Internacional de Tatlin são também experimentações
sobre o ritmo espaço-temporal. Muitas criações do construtivismo serão
obras arquitetônicas, projetos para prédios públicos do novo governo e
cartazes de propaganda.
No momento político pós revolucionário, as autoridades do governo
pensam a princípio que a arte deve participar do incremento da produção e
do esforço de conscientização do povo em prol da causa socialista. Mas o
lugar conferido à produção artística vai sendo progressivamente esvaziado,
e o artista visto como improdutivo, um inimigo da revolução. Que terá
havido ? Embora engajada na construção do socialismo, a arte não objetiva
russa tinha como principal característica uma redefinição mesma do que era
a arte: a ruptura com a representação da realidade, a ruptura com
conceituações anteriores sobre o que era "o belo", ruptura com todo um
passado que no campo das artes ditava certas normas para a criação
artística, que a ligavam ao campo da representação da realidade. Não
obstante existirem tendências no seio da arte não objetiva russa [4] que
visavam justamente um engajamento na produção e um a compatibilização entre
arte e produção industrial, o movimento como um todo vai sendo expurgado
das instituições culturais oficiais, pois é justamente a arte
representativa que vai ser eleita, mais tarde, como a arte "oficial", no
realismo socialista.
Na tendência do construtivismo denominada "produtivismo", torna-se
evidente uma preocupação com a "maestria" ou a qualidade formal dos objetos
de arte, e com um engajamento pragmático e utilitário no esforço produtivo
leninista. Este movimento, considerado como precursor da Bauhaus, na
Alemanha dos anos 30, procurará de forma semelhante associar técnica e
arte, produção industrial e criação. Acreditará nas possibilidades
inovadoras desta associação e sonhará com uma arte tornada útil, como se lê
numa das obras clássicas do movimento da Bauhaus: "Arrancar o artista
criador de seu distanciamento do mundo e restabelecer sua relação com o
mundo real do trabalho."[5]
Sob este ponto de vista, é elucidativo o discurso proferido por um
líder do partido comunista da União Soviética na época: "O sapateiro
fabrica sapatos. Que faz o artista? Cria. Isto não é claro e é
suspeito."[6] Se de um lado, tendências no seio do próprio movimento
construtivista buscavam uma arte útil, por vezes os dirigentes da
revolução, ainda assim, a viam com desconfiança, já que as formas criadas
pelos artistas não correspondiam ao já visto, redefinindo a própria noção
de utilidade.
É o suprematismo de Kasemir Malevitch (uma outra tendência da arte
Russa no mesmo período) que dá um sentido verdadeiramente contemporâneo,
apesar de sua obra datar das primeiras décadas do século vinte, a este
primado da criação estabelecido pela arte não objetiva russa. Para ele ,
criar era por-se em contacto com o plano também responsável pela criação
dos objetos do mundo da tecnologia, da ciência. Não para criar objetos
úteis, mas para atingir o plano da "energia intuitiva" de onde provêm as
formas mesmas. Este plano recebe também outras denominações: vazio criador,
potência criativa do nada. Não há mais essências a servir de fundamento
para a arte, ou para a vida, nem questões filosóficas ou literárias que a
arte deva simbolizar ou representar. Na perspectiva suprematista, todas as
transcendências perderam a razão de ser, mas ao contrário do que
denunciavam seus críticos, não se trata de pessimismo ou negativismo. O que
se abre para a as artes e para a existência é a perspectiva da criação e
da liberdade. A invenção suprematista da superfície plana pictural afirma
de modo mais acabado o princípio de uma arte completamente autônoma e não
representativa. Uma arte comprometida com um primado da criação sobre todos
os outros aspectos.
Quando se deseja, através da arte ou do trabalho produzir territórios
existenciais (inserir ou reinserir socialmente os "usuários", torna-los
cidadãos ...) creio que está se falando (ou do meu ponto de vista, dever-se-
ia falar) não de adaptação à ordem estabelecida, mas de fazer com que o
trabalho e a arte se reconectem com o primado da criação, ou com o desejo,
tal como na arte não objetiva russa, cuja trajetória traçamos
resumidamente. Pois que o plano da produção desejante é também o plano de
engendramento do "mundo" humano de que falávamos ainda há pouco.
No trabalho com os usuários de psiquiatria (terminologia empregada na
atual reforma psiquiátrica), trata-se de reinventar a vida em seus aspectos
mais quotidianos, pois é do quotidiano, principalmente que se encontram
privados os chamados doentes mentais, como disse Saraceno, numa palestra no
recente I Congresso Estadual de Saúde Mental.[7] Entretanto, vimos como o
estabelecimento deste primado, seja no campo da psiquiatria, seja no campo
da criação artística, se apresenta pleno de obstáculos no mundo em que
vivemos, e isto não apenas para os chamados usuários de psiquiatria. Do
mesmo modo, uma subjetividade voltada unicamente para a utilidade, para a
adaptação é, na maioria das vezes a demanda de instituições, de famílias,
de clientes. Entretanto, trata-se, também neste contexto, de estabelecer o
primado da criação sobre todos os outros aspectos da vida, compatibilizando
ou subordinando os aspectos pragmáticos e utilitários a este princípio
fundamental. Isto se se deseja que, nas oficinas, trabalho e arte possam
funcionar como catalisadores da construção de territórios existenciais, ou
de mundos nos quais os usuários possam reconquistar ou conquistar seu
quotidiano.
Que tipo de relação poderia haver entre loucura e arte ? Sabemos que
nem todo louco é artista, mas sabemos há entre loucura e arte um parentesco
- tantas vezes expresso por figuras como Bispo do Rosário (paciente da
Colônia Juliano Moreira, no Rio de Janeiro.) Podemos dizer que há vida na
loucura, assim como há vida na arte. E a vida é criação contínua de novas
formas, de novos territórios. É a vida que há na loucura, enquanto força
disruptiva, que cria constantemente este parentesco entre loucura e arte.
Muitos loucos, no entanto, têm como destino a psiquiatrização, ou caminhos
sem saída, linhas de abolição e não linhas de fuga. Assim, enquanto a arte
é sempre criação de novos territórios, seria problemático afirmar o mesmo
acerca loucura.
Que dizer do trabalho? Também, em relação ao trabalho, trata-se de
estabelecer outras relações (diferentes daquelas do trabalho alienado)
entre produção desejante e produção da vida material. O objetivo das
oficinas me parece ser o de produzir outras conexões entre estes dois
aspectos, mas não pensemos que se trata de uma tarefa simples. Muitas
questões se colocam toda vez que nos defrontamos com o trabalho de
usuários. Vender ou não vender o produto? É certo que os pacientes
necessitariam de recursos para poderem viver seu quotidiano. Por outro
lado, ouvi o relato de uma experiência em que a maioria dos pacientes de
uma oficina (TOCA - Oficina Terapêutica de Criação Artística, no Rio de
Janeiro) decidiram não faze-lo. Parecem preferir que seus trabalhos
permaneçam na instituição, como que marcando um território construído por
eles. Numa outra experiência cujo relato ouvi, quando o paciente estava "em
crise" não recebia pagamento. Eis um funcionamento que apenas repete o modo
de funcionar capitalista, inclusive com elementos "neoliberais" que: não
trabalha, não ganha. Nenhuma solidariedade, mesmo para com os
impossibilitados de produzir. É o trabalho alienado, individualizado,
impessoal - acreditamos que nestas condições, o trabalho não pode funcionar
como vetor de existencialização, como catalisador para que o paciente
reconstrua seu mundo. Pois acredito que com as oficinas, queremos muito
mais do que gerar algum dinheiro para o usuário. Isto é importante, mas não
é só isso.
No trabalho de supervisão que realizo juntamente com Regina Benevides
no Curso de Especialização Teorias e Práticas Psicológicas em Instituições
Públicas - Clínica Transdisciplinar, Universidade Federal Fluminense,
Departamento de Psicologia, constumamos levar à prática este trabalho de
problematização das oficinas terapêuticas. Neste curso de formação de
profissionais para o trabalho em saúde mental pública, são supervisionadas
práticas de trabalho no campo da psiquiatria - onde frequentemente se
encontram em curso experiências de trabalho com oficinas em ambulatórios,
hospitais-dia, e mesmo em hospitais psiquiátricos fechados. Como bem mostra
em sua dissertação a psicóloga Marcia Raposo Lopes[8], nossa ex-aluna do
curso de especialização e psicóloga do Posto de Atendimento Médico da
Engenhoca, em Niterói, frequentemente os profissionais que atuam em
oficinas não se questionam acerca do porque e para que fazem o que fazem.
Isto contribui para que frequentemente, sob o rótulo "oficina" se faça
velha (e adaptativa) psiquiatria. Desde o seu nascimento, a psiquiatria
procurou fazer do trabalho um instrumento terapêutico. A associação
trabalho e terapia tem pois uma longa história. não sendo de nenhum modo
uma novidade.
Para que esta "problematização" possa ser feita, não nos restringimos
aos saberes comprendidos no campo extrito da psicologia, da psiquiatria ou
da psicanálise. Eis o que denominamos "clínica transdisciplinar"[9] - lidar
com diferentes campos do saber, desarticulando as fronteiras tradicionais e
construindo novos parâmetros teórico-práticos, tal como neste artigo
trouxemos fragmentos de questões ligadas à história da arte, à filosofia,
ou as observações de um samoano sobre o homem branco, que traremos a
seguir.
Num livro muito interessante denominado "O Papalagui"[10] entramos em
contacto com um relato sobre as impressões de um chefe samoano de nome
Tuiavi ao visitar a Europa no início do século. Observando o trabalho do
Papalagui (nome com o qual ele designava o branco europeu) chamou-lhe à
atenção o fato de que cada Papalagui tinha uma profissão da qual tinha
orgulho, mas que para Tuiavi resultava numa grande limitação: a de fazer
uma só coisa por toda a vida. Em sua aldeia, se iam construir uma choupana,
todos eram capazes de fazer todas as tarefas requeridas. A choupana era
construída coletivamente, e ao final todos festejavam com uma festa que
celebrava a tarefa cumprida. Este singelo relato nos leva a pensar que
estamos diante de uma modalidade de relação com o trabalho em que ele
comporta uma inserção no coletivo, tendo a ver com o prazer, com a festa. O
trabalho moderno geralmente exclui estes aspectos, pois mesmo sendo
altamente coletivizado, tal coletivização tem como correlato uma forte
individualização[11], a competição e a ausência de prazer na tarefa. Aliás,
o que talvez melhor caracterize as relações do Papalagui com o trabalho
seja a idéia de que lazer e trabalho estão em campos opostos. O prazer é
identificado com o descanso, com estar parado, desfrutando passivamente de
algo, frequentemente diante de um vídeo de TV .
Porque o trabalho das oficinas se reveste de tantos questionamentos?
Por que é necessário constantemente problematiza-lo? Porque as questões por
ele colocadas não dizem respeito apenas à terapêutica da doença mental, mas
a questões políticas cruciais para toda a sociedade. A questões que dizem
respeito ao desejo enquanto produtor de real, produtor de mundos concretos
onde possamos habitar. Normalmente quando profissionais do campo "psi"
falam da desejo, referem-se fantasias, interioridades, íntimidades. Sim,
este é o modo de funcionar a que está reduzida a produção desejante no
capitalismo, geralmente[12]. Mas o desejo é por si mesmo revolucionário por
ser produtor não apenas de fantasias mas de mundos e é por isso que a
questão das oficinas se reveste de um caracter imediatamente político. Eis
o que traçou o destino da arte não objetiva na Rússia revolucionária.
Progressivamente, com a estalinização, talvez não houvesse mais lugar para
a criação de novas formas, de novos mundos, mas apenas para a adaptação à
ordem vigente. E isto talvez tenha acabado por celar o próprio destino do
socialismo que se buscava construir...
O que queremos aqui deixar claro é que a tarefa necessária para a
sobrevivência de nosso mundo humano passa justamente pelo estabelecimento
de outras e melhores relações entre produção desejante e produção social,
no sentido da expansão da vida. Eis a principal razão pela qual perguntar
para que fazemos oficinas com os usuários de psiquiatria nos pareceu tão
importante.
-----------------------
[1] Ver a esse respeito SARACENO, B. Reabilitação Social. Uma Prática à
Espera de Teoria. In: Reabilitação Psicossocial no Brasil. São Paulo,
HUCITEC, 1996.
[2] LAPIDUS Y OSTROVITIANOV. Manual de Economía Política . Buenos Aires,
Sigloveintiuno, 1972,

[3]TARABUKIN, N. El Ultimo Cuadro. Barcelona, Gili, 1978, p. 155
[4] Outra forma de denominar os movimentos da arte de vanguarda russa ao
deste período. Não objetivo designa aqui não representacional.
3 GROPIUS, V. Bauhaus: Novarquitetura. S. Paulo, Perspectiva, 1988, p. 32
[5]TARABUKIN, N. Op. Cit. p. 167.
[6] Nos referimos ao congresso realizado pelo Instituto Franco Basaglia em
novembro de 1996 no Rio de Janeiro, que teve como temática "Paradigmas da
Atenção Psicossocial".
[7] LOPES, Marcia Cavalcanti Raposo. Repensando o Encontro entre Trabalho e
Terapia. Dissertação de Mestrado. Rio, Instituto de Medicina Social,
Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva, UERJ, 1996.
[8] ABBES,C., BENEVIDES DE BARROS, R., JOSEPHSON, S., PASSOS, e RAUTER,
C., Clínica Transdisciplinar em Instituições Públicas. In: Cadernos de
Subjetvidade. Núcleo de Estudos e Pesquisas da Subjetividade do Programa de
Estudos Pós-Graduados em Psicologia Clínica da PUC-SP. 1997. (no prelo)
[9]SAUER, E. Org. O Papalagui. São Paulo, Marco Zero, S/D
[10] Foucault nos mostrou que paralelamente à coletivização da produção que
o capitalismo produz, ele também foi capaz de produzir estratégias de poder
altamente individualizantes, que ele denominou poder disciplinar.
[11]Aqui trabalhamos com idéias desenvolvidas por Deleuze e Guattari em O
Anti-Édipo: Capitalismo e Esquizofrenia. Rio, Imago, 1976.
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