OLIVEIRA, Ângela Meirelles de, DIETRICH, Julia, GHANEM, Elie. Políticas públicas e gestão escolar para a equidade e desenvolvimento integral no ensino médio. 2015

May 22, 2017 | Autor: Elie Ghanem | Categoria: Ensino Médio, Educação Integral, Equidade
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Políticas Públicas e Gestão Escolar para a Equidade e Desenvolvimento Integral no Ensino Médio Pesquisa Bibliográfica: Artigos científicos entre 2005 e 2015 e Levantamento Jornalístico: Experiências alinhadas à proposta Ângela Meirelles de Oliveira Julia Dietrich Supervisão: Elie Ghanem 1. Introdução Como a escola pública brasileira lida com as demandas e especificidades das juventudes no ensino médio? Como estas unidades implementam programas e iniciativas de educação integral? Quais boas práticas curriculares, executadas a partir da gestão, vêm sendo implementadas no país para ampliar a jornada escolar, combater a evasão e manter o jovem motivado nos estudos? Como trabalhar com adolescentes de modo a combater desigualdades históricas que os afetam? Com a proposta de trazer luz a estas perguntas e apoiar o desenvolvimento de marcos referenciais para uma gestão que construa um ambiente escolar que dê condições a todos os estudantes aprenderem, o estudo Políticas Públicas e Gestão Escolar para a Equidade e Desenvolvimento Integral no Ensino Médio realizou levantamento da produção acadêmica sobre o tema e de práticas concretas e validadas de escolas brasileiras e internacionais. Este relatório apresenta os resultados iniciais do estudo, que se organizará em três etapas, a serem validadas em seminários técnicos que reunirão especialistas em educação e representantes de diferentes movimentos sociais que lidam com as demandas das juventudes. A primeira fase teve como objetivo o desenvolvimento de um levantamento bibliográfico dos últimos dez anos em periódicos indexados acerca dos temas educação integral, equidade e ensino médio, buscando aferir a presença da discussão no meio acadêmico, bem como as contribuições nacionais e internacionais para contextualização da discussão. Ainda como parte desta primeira etapa, foram realizadas pesquisas jornalísticas, a fim de identificar práticas nacionais e internacionais de escolas que se identificam como de educação integral e que desenvolvem ações para fortalecer a equidade no ensino médio. Após o seminário técnico, em que se espera revisar e discutir o presente estudo, será elaborado questionário de aprofundamento a ser aplicado nas escolas entrevistadas, com o objetivo de verificar estratégias e práticas utilizadas para a promoção do desenvolvimento integral dos seus estudantes a fim de sistematizar seus modos de atuação. A segunda fase consiste na aplicação e tabulação dos questionários, e na realização de nova consulta aos especialistas, retomando a estrutura de seminário da primeira etapa. A partir das contribuições reunidas neste evento, será redigido o estudo final, cujo objetivo é apresentar marcos referenciais para o Equidade e Desenvolvimento Integral no Ensino Médio, construídos com base nas etapas e validações anteriores. 1

O relatório que aqui se apresenta não tem a pretensão de esgotar o tema, e sim de ser a primeira etapa para fomentar uma discussão visando aproximar fontes de saber de diferentes setores em um diálogo colaborativo sobre o ensino médio no país. Por fim, o estudo não se pretende isento e parte da seguinte concepção de educação integral: A Educação Integral compreende que os processos educativos devem garantir o desenvolvimento dos sujeitos em todas as suas dimensões - física, intelectual, social, emocional e simbólica. Para dar conta dessa tarefa, essa concepção propõe uma nova organização da política educacional de forma a garantir a ampliação da jornada e a diversificar de maneira qualificada a oferta educativa, tendo como horizonte a formação de sujeitos capazes de constituir seus projetos de vida com autonomia e responsabilidade pessoal e coletiva. A escola pública universal orientada pela perspectiva integral da educação materializa o direito ao desenvolvimento pleno dos sujeitos em situação de igualdade preconizado na Constituição Federal e é condição para a própria democracia. Porém, o espaço escolar como tradicionalmente concebido não é suficiente para o conjunto de aprendizagens necessárias para que as crianças, adolescentes, jovens e adultos enfrentem os desafios da sociedade contemporânea. Aprendizagens estas que supõem novos arranjos educativos consonantes com o desafio de educar no século XXI. Desse modo, a Educação Integral não é uma modalidade; é uma concepção e, para que esta possa ser traduzida em ações concretas nos municípios e estados, é fundamental que essa perspectiva orientadora se constitua como uma decisão de governo e não de uma secretaria. É determinante que a liderança do programa de Educação Integral seja assumida pelo prefeito ou governador, entendendo a educação como chave para o desenvolvimento do município ou estado. Nesse sentido, a Educação Integral passa a ser não apenas uma proposta da secretaria de educação, mas uma diretriz de governo que orienta a aliança entre os diferentes setores do sistema público e da sociedade em um pacto coletivo pelo desenvolvimento humano e social. (CENTRO DE REFERÊNCIAS EM EDUCAÇÃO INTEGRAL, NA PRÁTICA-PONTO DE PARTIDA, 2015)

2. Levantamento Bibliográfico 2.1 Metodologia O levantamento bibliográfico para esta pesquisa foi realizado nas bases de dados Scielo (Scientific Library Online) e no Portal de Periódicos da CAPES , na perspectiva de que a primeira trouxesse mais resultados de artigos em escala nacional e a segunda, internacional. Na base de Periódicos da CAPES, por sua extensão, ainda foi realizado um recorte temporal (últimos 10 anos, entre 2005 e 2015) e qualitativo (apenas periódicos revisados por pares). A escolha por artigos (descartando livros e teses) se deveu à crença de que esta pesquisa deveria priorizar obras publicadas em periódicos científicos arbitrados, que difundem com maior velocidade, amplitude e concisão. Esta pesquisa ainda se debruçou sobre artigos em português, inglês, espanhol e francês, atentando para a integralidade do texto, não apenas o resumo. As buscas utilizaram palavras-chave escolhidas em diálogo com o Centro de Referências em Educação Integral. Deve-se levar em conta que algumas expressões em inglês “desorientam” 2

as buscas, como é o caso de “integral part of the curriculum”, o que explica a diferença drástica entre o número de artigos encontrados originalmente e os selecionados para análise. Isso se mostra nos quadros abaixo (Figs. 1, 2 e 3). Base de dados: Scielo (Fig.1) Palavras-chave

Registros

Ensino Médio

1770

Ensino Médio, equidade

17

Ensino Médio, educação integral

19

Integral education

1041

Integral education, secondary school

19

Base de dados: CAPES Periódicos (Fig. 2) Filtro

Registros

Palavras-chave: Secondary School, integral education

1234

Em periódicos revisados por pares

912

Entre 2005 e 2015

562

Base de dados: CAPES Periódicos (Fig. 3) Filtro Palavras-chave: Secondary comprehensive education

Registros school,

3149

Entre 2005 e 2015

1156

Em periódicos revisados por pares

1015

Outro ponto que contribuiu para o recorte foi o aparecimento de centenas de registros que abordavam a saúde física do jovem na escola e, para isso, o termo integral é frequentemente usado, já que pensar sobre o corpo é pensar “o ser humano de forma integral.” Da mesma forma, “problemas” relacionados à juventude (drogas, violência, gravidez precoce) inspiram 3

estudos (school-based studies) ou programas “aplicados” (implemented programs) que apenas fazem da escola um lugar conveniente de testagem, diferindo de ações educacionais ou escolares. Ou ainda, registros que propunham abordagens na perspectiva da psicologia (desenvolvimento emocional ou comportamental), em artigos que não necessariamente partilhavam das concepções de educação integral que direcionam esta pesquisa. O foco esteve nas publicações que trouxessem ensaios, pesquisas ou experiências relacionadas com escolas públicas ou gratuitas, não seletivas, de ensino médio (ou similares) ou no período de transição para o ensino médio (últimos anos do ensino fundamental), momento crucial em que se notam expressivos índices de evasão escolar. De maneira geral, o levantamento resultou em pouquíssimos registros, tanto no âmbito nacional quanto internacional. Alguns dos quais exprimem questões candentes para diferentes sociedades, tais como gênero, evasão, violência ou saúde. Levemos em conta que, para determinados países, a ideia de educação já contempla a perspectiva integral, portanto, infelizmente pesquisas sobre essas realidades não deverão aparecer no recorte escolhido, como é o caso da Finlândia. Em geral, são países ou realidades que praticam a educação apenas como instrução que necessitam reafirmar a integralidade da educação. Esta pesquisa, enfim, está proposta como um levantamento bibliográfico realizado com rigor e critério sobre a produção acadêmica a respeito da educação integral no ensino médio, mas, sem a pretensão de ser exaustiva. Procurou retratar algumas linhas mais pronunciadas no conjunto do que é publicado. Após a leitura e sistematização, restaram 15 artigos sob as formas de ensaio, comunicação de pesquisa ou relato de experiência. Esses textos compartilham da perspectiva de educação integral do Centro de Referência e, ao mesmo tempo, trazem reflexões sobre aspectos do ensino médio que poderiam ser incorporados às propostas do projeto Políticas Públicas e Gestão Escolar para a Equidade e Desenvolvimento Integral no Ensino Médio. Em suma, apresentam potencial de contribuir para elaborar marcos referenciais sobre gestão escolar voltada para equidade no ensino médio a partir de práticas nacionais e internacionais. 2.2. Resultados 2.2.1 Ensaios Como ensaios, foram considerados aqueles artigos que não são fruto de uma determinada pesquisa empírica e que, por isso, podem ter uma dedicação mais concentrada em aspectos conceituais. Foram selecionados 3 ensaios, dos quais se destacaram dois importantes temas, que serão, a partir de agora, considerados como eixos temáticos. Eixo 1 – Percursos formativos e diversidade de interesses Dois ensaios estiveram dedicados a este eixo temático. Noddings (2011) sustenta a ideia de que a uma educação verdadeiramente compatível com a democracia é aquela que favorece percursos distintos; mais especificamente na educação secundária, a pesquisadora combate a premissa de que preparar a todos para a universidade está baseado em ideais democráticos e chega a entender que isso é colocar a democracia em risco.

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A autora defende a estratégia do tracking, ou percurso curricular, por meio do qual os alunos selecionam seus caminhos de estudo segundo interesses próprios e que existiriam duas formas de realizar esse percurso. A primeira seria a de propiciar diferentes programas na educação secundária, como acadêmicos (preparo para a universidade), vocacional/industrial e comercial. E em um segundo sentido, seria a prática de inscrever os alunos em classes compostas por grupos por habilidades e interesses. Dessa forma, prover diferentes programas para diferentes talentos ou interesses seria totalmente compatível com a justiça social, cuidando para que, na implementação de tais programas, não ocorram as usuais diferenças de qualidade entre os técnico/vocacionais (dirigidos a pobres e minorias) e os acadêmicos. A autora sustenta ainda, apoiada em John Dewey, que nenhum assunto é menos intelectual que outro e que, em defesa do futuro da escola secundária, seria necessário abandonar a noção de que os cursos em educação profissional ou comercial são intelectualmente inferiores aos assuntos acadêmicos. Para ela, todos os cursos deverão ser ricos em conteúdos intelectuais, morais e estéticos. Na mesma direção está a reflexão de Barrow (2007). O autor considera que, em alguns aspectos, a defesa das escolas comuns (o mesmo tipo de escola para todos) ocorre à custa da própria educação. Ainda que ele acredite ser valioso o convívio entre diferentes (para promover a compreensão mútua e o respeito) e partilhe dos ideais da comprehensive schooling, ele sustenta que a escola deva ser diferenciada nos últimos anos do nível secundário. De acordo com ele, a mesma escola para todos pode ser feita no início da escolarização, mas, não necessariamente até o fim do secundário. Ele defende que, em determinado estágio, os alunos devem ser divididos, não por notas ou conceitos, mas por “afinidade”, “adequação” a um tema de estudo, ligado a seu nível de compreensão, conhecimento e interesse. Barrow enfatiza, então, que os estudantes têm interesses e habilidades diferentes. Assim sendo, não reconhecer isso formalmente e não abrir a possibilidade de diferentes tipos de conhecimentos, vida e carreira é, por omissão, desvalorizálos. Para ele, é uma conclusão paradoxal quando se está tentando ensinar às pessoas o respeito pela diferença. Eixo 2 – Tutoria e “cuidados pastorais” Em estreita ligação com o eixo anterior, Noddings (2011) defende que a escolha de diferentes processos formativos na educação secundária não deve ocorrer sem o suporte e o aconselhamento de um mentor, para auxiliar os jovens a fazerem “escolhas inteligentes”. É nessa figura do mentor, tutor ou na ideia de “cuidado pastoral”1 realizado pelas escolas secundárias que reside o segundo eixo temático. Tucker (2013) se debruçou sobre o tema defendendo a prática como a melhor forma de apoiar os estudantes de ensino médio que estejam em risco de exclusão temporária ou permanente, bem como jovens em situação de vulnerabilidade. Tucker considera o estabelecimento do Pupil premium (Prêmio aluno) pelo Reino Unido em 2012 - que oferece uma recompensa financeira a escolas que apoiam estudantes de famílias de baixa renda - como um marco no incentivo à promoção e ao 1

Trata-se de um conceito laicizado de apoio individualizado, que já chega a ser adotado como política educacional (Cf. HEARN et al, 2006).

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desenvolvimento destas práticas, baseadas na escola, de acolhimento e cuidados com os alunos. Diversas escolas no Reino Unido implantaram políticas inovadoras de cuidados com seus estudantes para, por exemplo, evitar a evasão. Tais ações visam a não depender da boa vontade do cuidador, e sim tornar-se uma prática instituída dentro da unidade escolar. Tem por objetivo responder diretamente à necessidade dos jovens em situação de vulnerabilidade; segundo Smyth, Down e McInerney (2010 apud TUCKER, 2013, p. 281), os tutores almejam o bem-estar dos estudantes, sendo que “aconselhamento e educação são mais propensos a auxiliar estudantes a permanecer nas escolas que as inflexíveis e punitivas medidas contidas em muitas políticas de gerenciamento do comportamento de estudantes.” Os “cuidados pastorais” são implantados por meio da figura dos não-professores na escola (trabalhadores de suporte pastoral, mentores, assistentes de intervenção focal, assistentes de professor ou advocacy workers são os nomes dados a essa equipe de apoio). Como as necessidades são complexas e multi-facetadas, um trabalho multidisciplinar e especializado é exigido, já que poderão estar focadas em, por exemplo, “gerenciamento da raiva, gerenciamento de habilidades comunicativas, compreensão do impacto de formas específicas de comportamento...” (TUCKER, 2013, p. 289) O trabalho se dá, inicialmente, por meio da identificação das necessidades, momento em que a contribuição dos jovens é apontada por Tucker como essencial; por conta disso, foram criados espaços onde os jovens podem “‘sentar e falar’ sem se sentirem ameaçados ou julgados.” Após essa etapa, a intervenção é feita, individualmente ou em grupo; o autor defende ainda que a “intervenção pastoral focada é mais bem sucedida se possui um alto nível de consistência entre a casa [do estudante] e a escola”. Relata que, em alguns casos, foi necessária a intervenção escolar nas residências e o apoio dos pais. 2.2.2 Pesquisas Foram encontrados quatro artigos com divulgação de pesquisas, três dos quais podem ser também agrupados no Eixo 1 – Percursos formativos e diversidade de interesses. O último artigo é uma pesquisa que também oferece contribuições para o projeto Políticas Públicas e Gestão Escolar para a Equidade e Desenvolvimento Integral no Ensino Médio, mas que, por sua especificidade, será apresentada individualmente. As três primeiras pesquisas também fazem referência às peculiaridades e disposições pessoais de estudantes. Del Río et al (2014) verificam a relação entre estratégias de aprendizagem e padrões de motivação de estudantes da escola secundária, partindo da premissa de que quanto maior atenção à diversidade dada pelas escolas, maior é a competência de aprendizagem autônoma dos estudantes. Como diversidade, as autoras entendem a composição dos estudantes em diferentes aspectos de relacionamento com a escola, como “estudantes com necessidades específicas de apoio educativo, alunos com problemas escolares vinculados a baixo rendimento, estudantes com defasagem curricular e desmotivação, alunos imigrantes” (DEL RÍO et al, 2014, p. 66). O trabalho comparou três modelos de escola em Madri: Centro de Intervenção Adaptativa, Centro de Não-intervenção e Centro Inclusivo Integral. Este último mostrou os melhores resultados nos quesitos motivação 6

intrínseca e auto atribuição de êxito. Os dados apontaram os benefícios do enfoque inclusivo nos resultados educativos relacionados com competências de aprender a aprender, importantes para o desenvolvimento acadêmico e pessoal dos estudantes na etapa secundária. É nesta ideia de autonomia no aprendizado que está baseada a segunda pesquisa. Vázquez e Daura (2013) descrevem a importância da auto regulação para a aprendizagem nas escolas secundárias e relacionam esta prática com os critérios para o estabelecimento de uma educação integral. Para as autoras, a Aprendizagem Auto Regulada (AAR) é um conceito que se refere ao gerenciamento da própria trajetória acadêmica; citando Paul Pintrich (2000 apud VÁSQUEZ; DAURA, 2013) e Pintrich e Zusho (2002 apud VÁSQUEZ; DAURA, 2013), as autoras definem AAR como “um processo ativo-construtivo por meio do qual o aluno fixa suas próprias metas de aprendizagem, monitora, regula e controla sua aquisição de conhecimentos, motivação, conduta, guiado por metas e por características do contexto do entorno” (VÁSQUEZ; DAURA, 2013, p. 306). A hipótese que orientou a pesquisa de Vásquez e Daura é a de que o baixo rendimento escolar nas escolas secundárias se dá pela pouca capacidade de estudo de forma autônoma pelos alunos, tanto devido a fatores de ordem motivacional quanto pelo baixo conhecimento de estratégias específicas para lidar com atividades acadêmicas. A conclusão indica que, das relações encontradas entre o rendimento acadêmico e os modos de aprendizagem, pode-se desdobrar que os alunos que regulam seu esforço de acordo com as exigências escolares e com independência são os que obtêm melhores qualificações. As autoras defendem que a formação de um aluno por meio da AAR exige que os docentes sejam capazes de modelar as condutas, apresentar objetivos e de assumir um compromisso de formação integral, entendendo o rendimento acadêmico como uma consequência e não uma meta. Por fim, a investigação de Plank et al (2008) demonstra como a evasão na etapa secundária da educação é fruto de um longo processo de desmotivação com escola, e atribui este desengajamento ao currículo. Os autores propõem verificar esta relação, em particular em que medida (proporção) a combinação entre educação profissional (CTE - Carrier and Technical Education) e acadêmica influencia a probabilidade de deixar a escola. Os achados sugerem que uma mescla de “exposição” à educação profissional e acadêmica pode fortalecer a educação do jovem e a motivação na escola, se considerarmos adolescentes até 14 anos. Aqueles que estão em defasagem idade/série (maiores de 15 anos) não mostraram os mesmos resultados. Uma última pesquisa chegou a resultados que oferecem contribuições para os propósitos deste projeto ao enfocar o ponto de vista de estudantes sobre educação integral. Meneses e Sánchez (2013) realizaram uma avaliação de três escolas secundárias rurais na Costa Rica, recolhendo as opiniões e interpretações dos jovens que as frequentavam. As autoras apontam que a perspectiva da educação integral é um princípio fundamental da educação no país, desde 2007, por isso, solicitam que os estudantes avaliem também este aspecto em relação a seu projeto de vida. As contribuições para esta pesquisa estão nos tópicos avaliados pelos estudantes, que oferecem possibilidades de implementação de estratégias na educação secundária rumo à educação integral. São as seguintes: “preparar para ter êxito na vida”, “oferecer orientação vocacional”, “professores ensinam a aprender a aprender”, “a 7

aprendizagem ensina a pensar”, “ensinar a enfrentar e dizer não às drogas e ao álcool”, “aprender conhecimentos sobre educação sexual”. Todos os critérios foram avaliados como positivos. 2.2.3 Experiências Os oito artigos com relatos de experiências em educação integral mostram que a atuação é, na maioria das vezes, parcial ou segmentada, mesmo que o objetivo seja atingir outros aspectos do desenvolvimento do jovem para além do instrucional. Os achados foram divididos em quatro eixos, indicados abaixo. Eixo 3 – Envolvimento das famílias e comunidades Dois artigos trataram de experiências de engajamento das famílias na educação dos jovens na escola secundária. A primeira relata a tentativa de aproximação dos pais com a educação de seus filhos em Bangladesh. Kabir et al. (2014) discorrem sobre a atuação do Ministério da Educação do país em algumas escolas secundárias, em defesa da criação de uma comunidade de aprendizagem focada especialmente nos familiares. Com base na percepção do papel chave dos pais na educação e na motivação dos filhos, tanto em casa como na escola, no ano 2000, teve início uma ação que passou a incentivar o envolvimento dos familiares na escola. Na visão dos autores, apesar de ainda limitadas, as escolas passaram a realizar algumas ações para aproximar os pais: encontros (nos quais são discutidos objetivos e progressos dos estudantes), contatos pessoais (por e-mail, carta e telefone). Os obstáculos maiores são a falta de tempo dos pais, envolvidos com o trabalho, e a sobrecarga dos professores. Eles apontam ainda a importância da gestão escolar criar uma gama de políticas para informar os pais da importância do envolvimento na educação de seus filhos e de envolvê-los efetivamente, por meio de relatórios semanais, telefonemas, dias na escola etc. Além disso, ressaltam a importância de os professores referendarem o papel dos pais na educação dos alunos. Como apresentado pela segunda experiência, uma iniciativa semelhante ocorreu em Quebec, Canadá, entre 2001 e 2005. Deslandes (2006) descreve o desenvolvimento e a implementação de um programa de parceria entre escola, família e comunidade em duas escolas primárias e duas secundárias em uma província canadense nas quais o perfil dos estudantes era de renda baixa e média. Em uma ação conjunta entre a autora do artigo, professora da Universidade de Quebec e pesquisadora sobre o tema e o Ministério da Educação do país, os objetivos do programa foram: desenvolver, implementar e avaliar um programa de colaboração entre escolas e famílias relacionados a um projeto de reforma educacional e apontar modelos de relação família-escola-entorno que pudesse ser transferido para vários ambientes. O programa foi implementado a partir dos seguintes passos: 1) formar uma equipe de ação; 2) obter recursos e apoio oficial; 3) identificar pontos de partida; 4) escrever um plano de ação para um ano; 5) avaliar implementação e resultados; 6) continuar o trabalho em direção a uma parceria no modelo compreensivo ou integral. Segundo a autora, as experiências não podem ser consideradas bem sucedidas. As lições aprendidas dizem da necessidade de integrar este projeto no plano educativo de cada escola, para que se torne prioridade; a segunda diz do envolvimento das lideranças, que deverão mostrar por meio de suas ações a determinação em estabelecer essa parceria; a terceira lição trata da importância da presença de um agente de ligação entre a escola e as famílias, com um relacionamento estável com outros agentes e 8

conhecedor de ferramentas de motivação; a quarta lição é a necessidade de tempo/paciência para que os envolvidos se familiarizem com o projeto e a quinta lição é a percepção de que algumas escolas poderão necessitar de mais recursos financeiros e, por último, de que todas as escolas deverão ter seus ritmos respeitados. Dois artigos apontaram caminhos quanto à importância da relação com a comunidade ou o entorno da escola para a educação integral na etapa em foco. O primeiro artigo relata a experiência promovida pelas autoras (JETTON et al., 2008) em escolas de ensino médio na região do Meio Atlântico2 dos Estados Unidos, entre 2000 e 2007. O distrito onde as escolas estavam localizadas atendia pessoas de 64 países, falantes de 44 línguas. As escolas tinham um nível de alfabetização em inglês próximo a 36% e decidiu-se focar a aprendizagem nas necessidades dos alunos de serem alfabetizados no idioma estrangeiro. Dessa forma, foi criada uma comunidade de aprendizado multidisciplinar entre professores universitários, candidatos ao cargo de professor universitário, supervisor de ensino, diretor de escola, coordenador de alfabetização e professores, que transformou e desenvolveu experiências de alfabetização de adolescentes na educação secundária. Após um período de discussão no qual foi estabelecida uma visão comum do que era entendido como alfabetização em língua inglesa, houve uma sequência de ações para a reestruturação da escola e do currículo. A experiência concluiu que, nessa parceria, foi necessário que os estudantes universitários vivessem a vida comunitária da escola, estivessem presentes nas salas de aula, almoçassem com os professores etc. como forma de mudar os relacionamentos interpessoais em direção a uma prática educativa que educou a todos. Em um segundo caso, que pode ser visto como um exemplo de detalhamento do Eixo 2 – Tutoria e “Cuidados pastorais”, o Ministério da Educação da Espanha implantou a orientação Liderança para Aprendizagem (leadership for learning) a partir da ideia de compartilhamento de aprendizagem com a comunidade. Para tal, incentivou a figura do conselheiro (tutor, mentor) que atua nos níveis escolar, pessoal e profissional na atenção aos alunos. Segundo Martinez, Krichesky & Garcia (2010 apud DOMINGO, 2013), o conselheiro é “um agente educacional comprometido com a melhoria da escola, trabalhando com os professores para impulsionar o desenvolvimento dos estudantes de uma maneira holística, trabalhando de forma próxima com a equipe e promovendo a prática diária”. Algumas dimensões de apoio à melhoria da qualidade e equidade na escola secundária foram identificadas: 1) colaboração profissional e envolvimento do diretor e dos conselheiros de escola são importantes para ajudar as escolas a serem capazes de mudar (em qualidade e equidade). Ambos devem trabalhar em conjunto para garantir a atenção à diversidade como uma questão central, em que está baseada a mudança na escola, sem negligência dos resultados escolares; 2) Fortalecimento e apoio da liderança pedagógica dos diretores, sem incentivo à competição; 3) Trabalho na perspectiva da comunidade, fortalecer os eixos escolares, família e comunidade; 4) Apoio das atividades educacionais como plataforma de inovação em educação e desenvolvimento profissional. Facilidade na criação de propósitos comuns, pela geração e compartilhamento de saberes profissionais sobre bom aprendizado para todos; 5) Trabalho com programas que fortaleçam a atenção à diversidade: desenvolvimento de um currículo 2

A região do Meio Atlântico compreende os estados de Delaware, Maryland, Nova Iorque, Nova Jérsei e Pensilvânia.

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inclusivo, trabalhar com tarefas holísticas/multidimensionais e com a integração do currículo, desenvolver metodologias cooperativas e interativas com a participação genuína de todos. Eixo 4 – Gênero e educação afetivo-sexual Outros programas desenvolvidos na escola secundária ou para a escola secundária incluem duas experiências de inclusão de temas que respondem às necessidades da sociedade onde estão inseridos e também compreendem o estudante em formação em seu aspecto integral. Uma destas experiências, relatada por Hsiao-Chin et al. (2014), narra o processo de inclusão da formação para a equidade de gênero nas escolas de Taiwan. A partir de 1996, por pressão dos movimentos de mulheres e impactado pelo caso do estupro e assassinato de uma liderança feminista, o Ministério da Educação anunciou a educação igualitária por gênero como parte da agenda da reforma educacional e a inclusão dos assuntos de gênero no currículo escolar primário e secundário, a partir de uma reforma ocorrida entre 1997 e 1999. Segundo a autora, “Em 10 anos, o sistema educacional de Taiwan progrediu de um sistema totalmente patriarcal e cego para as questões de gênero, para a inclusão da igualdade de gênero nos currículos e a promoção compreensiva de equidade de gênero em sua legislação” (HSIAO-CHIN et al., 2014, p. 6). Ela ainda defende que, no sistema educacional de Taiwan, marcado pela autoridade centralizada, a única maneira de obter tempo para novos conteúdos é colocando-os no currículo oficial. No segundo caso, o Instituto de Educação Secundária de Ourense, na Galícia (Espanha), realizou um programa de educação afetivo-sexual com estudantes e familiares entre novembro de 2003 e junho de 2004. Em uma adaptação do programa Coeducativo de Desarrollo Psicoafetivo y Sexual “Agarimos”, a formação tem por base a ideia de que a educação afetivo-sexual busca melhorar a qualidade de vida das pessoas. Fernández (2007) declara que o programa está dividido em três temas: identidade corporal, identidade de gênero e identidade e valorização pessoal. Dos 30 pais envolvidos inicialmente, somente cinco terminaram a oficina; um deles era homem. Observou-se, ao fim das oficinas, um aumento dos conhecimentos sobre identidade corporal e conduta sexual, mostraram-se atitudes mais igualitárias sobre os gêneros e mais positivas sobre a sexualidade. Também ganhou destaque a importância da educação da inteligência emocional de seus filhos, como forma de proporcionar o desenvolvimento integral de sua personalidade. O programa enfatiza que a formação sobre sexualidade nas escolas está demasiadamente centrada na ideia de prevenção, nos conteúdos biologistas, relegando a um segundo plano a dimensão sexual humana. Defende a colaboração família-escola para a formação socioafetiva e sexual integral dos adolescentes. Eixo 5 – Ambiente físico, apoio personalizado e recursos digitais Por fim, entre as experiências identificadas, encontram-se duas ações que propõem alterações nos ambientes físicos e na infraestrutura escolar de forma a transformar o aprendizado. A ideia da Kunskapsskolan, ou escola do conhecimento, é criação sueca que propõe a formação compreensiva e personalizada dos sujeitos em nível escolar secundário. Composta por 33 escolas na Suécia e 2 no Reino Unido, a proposta prevê que toda a escola, desde a 10

arquitetura à equipe, é pensada para o aprendizado. Eiken (2011) narra que, na Kunskapsskolan, a educação é personalizada em uma combinação de escolha de objetivos, coaching semanal, cronogramas pessoais e um currículo único mantido em uma plataforma na internet. Os alunos são assistidos pelos professores, que auxiliam (coach) os estudantes em estipular os objetivos e as estratégias. Cada professor faz uma espécie de tutoria personalizada (personal coach) para 20 estudantes. A arquitetura é pensada para o aprendizado, todos os espaços são dedicados a isso, com portas de vidro que integram salas, e sem corredores. A segunda experiência trata de uma proposta de transformação das bibliotecas das escolas secundárias em Centros de Recursos para a Ensino e Aprendizagem (Crea), em Madri (Espanha), descrita por Marzal et al. (2012). A ideia é que as bibliotecas escolares passem a servir de suporte ao ensino e a desenvolver a autonomia pessoal nos processos de aprendizagem por meio da alfabetização digital. Além disso, o Crea pode fomentar o desenvolvimento das comunidades virtuais de aprendizagem, facilitar os recursos digitais educativos, ser centro produtor de conteúdos educativos em todos os formatos, além de ser espaço de socialização. A iniciativa considera que o Crea proporciona igualdade de oportunidades para todos os alunos. 2.3. Conclusões Os artigos sobre ensino médio publicados em periódicos especializados, classificados com palavras-chave relacionadas à educação integral e nos critérios citados anteriormente, são quantitativamente pouco significativos: somente 15 nos dez anos que vão de 2005 a 2015. Além disso, não são cumulativos e se caracterizam por abordar aspectos parciais dentro de uma perspectiva de educação integral. Nesta perspectiva, diversos aspectos focalizados visam a fazer frente à iniquidade. O conjunto sugere que uma política de educação integral tendo em vista o nível médio precisaria considerar os pontos focalizados, embora um não dependa necessariamente dos demais. São oito os pontos abordados e estão sumariados a seguir. 1. O respeito à diversidade de inclinações pessoais requer oferta de variedade de percursos, ao contrário das convencionais ofertas homogêneas. 2. O assim chamado maior rendimento escolar depende do desenvolvimento da autonomia na aprendizagem. 3. A combinação da educação profissional com a regular (“acadêmica”) tem efeitos positivos no combate à evasão. 4. A orientação personalizada é importante para apoiar as escolhas de estudantes e promover o engajamento nos estudos. 5. Considerando a pouca disponibilidade de tempo dos pais e dos professores, são necessárias políticas de informação e envolvimento na educação dos filhos, associadas ao referendo dos professores na mesma direção. 6. A cooperação entre a escola e a comunidade requer pelo menos que esta faça parte do plano escolar e conte com agentes cujo trabalho incorpore a tarefa de realizar essa conexão; pode ser eficaz se consistir no esforço articulado em torno de um problema (alfabetizar em 11

uma segunda língua, por exemplo), envolvendo convívio comunitário interno à escola e geração de consensos. 7. Temas que tocam a vida privada e os relacionamentos interpessoais, tais como o das relações de gênero, o da sexualidade, o dos afetos e os das emoções precisam ganhar a centralidade que têm os temas das disciplinas escolares convencionais, inclusive envolvendo pais nas atividades escolares. 8. Combinar apoio personalizado à escolha de objetivos pelos alunos com ambientes físicos da escola concebidos tendo em vista o aprendizado, somados à disponibilidade de recursos digitais como fontes de informação e de relacionamento comunitário. 3. Levantamento jornalístico A fim de complementar a revisão bibliográfica, este estudo fez uso de ferramentas e técnicas jornalísticas3 para sistematizar 29 experiências4 de gestão em escolas nacionais e internacionais que realizam ações para o desenvolvimento integral dos jovens no Ensino Médio. As experiências citadas procuram ofertar as condições necessárias para que todos possam aprender, independente de sua classe social, gênero, orientação sexual, ou outros temas que configuram iniquidade nos processos educativos. Para tanto, foram acessadas as assessorias de imprensa de todas as secretarias estaduais de educação no Brasil, pesquisados trabalhos e publicações do Observatório Jovem, do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (CEERT) e dos Prêmios Nacional de Educação em Direitos Humanos, Itaú-Unicef e Educar para a Igualdade Racial e de Gênero. Também foram acionados especialistas como Pilar Lacerda, diretora da Fundação SM, Jaqueline Moll, pesquisadora e professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFGRS) e diretora da Coordenadoria de Currículos e Educação Integral do Ministério da Educação entre 2007 e 2013 e Cleuza Repulho, presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação de 2011 a 2015, além de organizações, iniciativas e movimentos como Todos pela Educação, Instituto Rodrigo Mendes, Instituto Kaplan e Projeto Jovens Urbanos (Cenpec-Fundação Itaú Social). Ainda com o objetivo de complementar o levantamento, foram feitas pesquisas em outros veículos de comunicação, com destaque para as revistas Nova Escola, Educação e o site Porvir. Após detalhar a indicação com a fonte de origem, foram empreendidas entrevistas por telefone com membros da gestão das escolas selecionadas e, em alguns casos, com professores e estudantes. Após entrevista, algumas experiências foram descartadas, seguindo os critérios de que a escola fosse pública ou comunitária, ofertasse o Ensino Médio ou Ensino Médio integrado ao Ensino Técnico5, se identificasse como uma escola de educação integral ou promotora do desenvolvimento integral e desenvolvesse ações de gestão a fim de promover a 3

O levantamento jornalístico foi conduzido por Ana Basílio e Caio Zinet, jornalistas do Centro de Referências em Educação Integral, supervisionados pela editora Dafne Melo. 4 O estudo tinha como meta identificar 30 experiências. Contudo, como apresentado a seguir, não foi possível alcançar o objetivo proposto. 5 Escolas que ofertassem apenas o Ensino de Nível Técnico não foram consideradas. Em escolas com ambas as modalidades, foram consideradas apenas as que tivessem o Ensino Médio ou Ensino Médio integrado ao Técnico.

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equidade. Embora importante para o debate da educação integral, o critério da extensão da jornada escolar não foi tomado como de exclusão, entendendo que algumas escolas selecionadas por este estudo desenvolviam ações contundentes para o desenvolvimento integral dos seus estudantes, mesmo na jornada regular. Ao mesmo tempo, como a temática impacta diretamente os anos finais do Ensino Fundamental II e jovens da Educação de Jovens e Adultos (EJA), quando a evasão é ainda maior e quando as questões que geram iniquidade se expressam com ainda maior intensidade, optou-se por incluir duas escolas de cada modalidade no presente estudo. Para as buscas internacionais, foram levantadas experiências a partir dos eventos de educação realizados na cidade de São Paulo6, como o Transformar 2014 e Transformar 2015 e o BETT Brasil. Também foram acessados sites internacionais de educação, como o Edutopia e o da Rede de Educação Alternativa (REEVO), periódicos de destaque no tema, como o suplemento do NY Times, e vídeos publicados em canais do YouTube especializados no tema, como o Canal Encuentro. Nas experiências internacionais, dada a relevância para o estudo, foram incluídas iniciativas públicas e de terceiro setor de apoio programático e sistemático à permanência dos jovens na escola e combate à evasão em escolas. Nelas, a gestão escolar continuava assumindo papel estruturante, sendo a responsável por implementar o programa na unidade de ensino. Todas as experiências foram selecionadas a partir dos critérios apresentados, mas também pela garantia das fontes acessadas de que respondiam aos desafios contemporâneos da juventude, como a permanência interessada e conclusão da etapa escolar. 3.1 Resultados Foram identificadas 17 experiências nacionais e 12 experiências internacionais. Entre as nacionais, 13 são de Ensino Médio ou Ensino Médio integrado ao Técnico, duas de Educação de Jovens e Adultos, uma de ensino fundamental II e uma de ensino fundamental em escola multisseriada. Nas experiências internacionais, nove são escolas de High School/ Secondary School, equivalente ao Ensino Médio e três são programas de apoio à permanência e combate à evasão escolar. Nas experiências internacionais, salvo na do programa de apoio à permanência de jovens em escolas afegãs, o critério do tempo não se aplicou, uma vez que as experiências mapeadas têm todas jornadas mais extensas do que a média brasileira. As escolas norteamericanas, por exemplo, ofertam, em média, 8 horas diárias de atividades. Todas, internacionais ou nacionais, dialogam diretamente com a concepção de educação integral e promovem ações programáticas, integradas à dinâmica de gestão das unidades escolares, pela permanência interessada dos jovens e conclusão da etapa escolar. As experiências, publicadas na íntegra na plataforma do Centro de Referências em Educação Integral (www.educacaointegral.org.br), foram classificadas com base em temas/ questões da juventude que geram iniquidade nos processos acadêmicos e favorecem a evasão escolar (Figuras 4 e 5). 6

A equipe responsável pelo levantamento jornalístico se encontra em São Paulo (SP).

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Tanto nas experiências nacionais, quanto nas internacionais a questão do desejo de participação dos estudantes na unidade escolar mostrou-se como um ponto de destaque. As escolas que promovem ações de protagonismo juvenil, e envolvem os estudantes no processo de gestão e da implementação do currículo conseguem diminuir os índices de evasão e aferem, segundo as entrevistas realizadas, ganhos em diferentes aprendizagens (tanto em notas nas provas e testes padronizados, quanto em sociabilidade, participação e cultura política e expressão oral e escrita). O levantamento jornalístico demonstrou que a demanda por participação se coloca como uma temática de equidade, influenciando diretamente a permanência ou evasão dos estudantes na etapa escolar. Entre os outros temas identificados como fatores que geram iniquidade pelas escolas mapeadas, figurou a questão de gênero, muitas vezes conectada à temática da sexualidade, a questão étnico-racial, trabalhada tanto na perspectiva da valorização de uma determinada etnia, quanto no enfrentamento ao preconceito e racismo, a questão da inclusão de estudantes com deficiência, a questão da personalização do ensino (de que existem diferentes formas de aprender), e principalmente as questões de inclusão social e trabalho e renda, temáticas encontradas em 11 das 29 experiências listadas. Todos os exemplos listados indicam participação intencional e programada da gestão escolar, que assume ações específicas para atender determinada demanda da juventude a fim de fortalecer a participação discente e a permanência interessada do jovem da escola. Com foco em resultados acadêmicos e no desenvolvimento dos estudantes, em todas as unidades estudadas, há um esforço para que o estudante ocupe o centro das ações curriculares, entendidas para além da sala de aula (assembleias, projetos com a comunidade, etc.) 3.2 Experiências nacionais 3.2.1. Gênero e sexualidade Em muitos casos, porém, a experiência não teve início no corpo gestor da escola, mas com um docente ou grupo de docentes, a partir de projetos pedagógicos, como no caso da Escola de Educação Básica Coronel Antônio Lehmkuhl7, que desenvolveu projeto de enfrentamento à intolerância e valorização das diversas identidades sexuais e de gênero. Esse tipo de atividade é encontrado em muitas escolas do país, porém neste caso, a ação passou a compor de forma estruturada a proposta da gestão escolar, que para além do apoio à iniciativa dos docentes, passou a integrar a ação no planejamento da unidade e nas ações do seu Projeto Político Pedagógico. Ao longo do levantamento, foram encontradas muitas escolas com atividades importantes de professores em relação à promoção do desenvolvimento integral e com foco na redução de desigualdades; contudo, apenas as selecionadas apresentaram a mesma lógica na gestão.

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Centro de Referências em Educação Integral, Escola trabalha questões como lesbofobia, transfobia e homofobia com seus estudantes. Disponível em: http://educacaointegral.org.br/experiencias/escolatrabalha-questoes-como-lesbofobia-transfobia-homofobia-seus-estudantes/. Acessado em 20/11/2015.

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Tabela 4. Relação e divisão temática - Escolas levantadas no estudo Escola

Localidade

Etapa(s) ofertada(s)

Questão da equidade

Tempo Integral

EEB Coronel Antônio Lehmkuhl

Águas Mornas (SC)

Ensino Médio

Gênero e Sexualidade

SIM

EE Indígena Tuxaua Luiz Cadete

Cantá (RR)

Ensino Médio

Étnico-racial

SIM

EE Dr. Antônio Ablas Filho

Santos (SP)

Ensino Fundamental II e Médio

Protagonismo juvenil

SIM

EE Professora Inah de Melo

Santo André (SP)

Ensino Médio e Ensino Fundamental II

Inclusão de estudantes com deficiência

NÃO

Escola Tiquatira

São Paulo (SP)

Ensino Médio integrado ao Técnico

Protagonismo juvenil e trabalho e renda

SIM

Cieja da Sé

São Paulo (SP)

Educação de Jovens e Adultos

Gênero, sexualidade e trabalho e renda

NÃO

CEF 01 de Planaltina

Brasília (DF)

Ensino Fundamental II

Sexualidade, Inclusão, Étnico-racial

SIM

Colégio Estadual Manoel Ribas

Curitiba (PR)

Ensino Médio e Ensino Fundamental II

Trabalho e renda

SIM

Colégio Estadual Antônio Sérgio Carneiro

Salvador (BA)

Ensino Médio

Étnico-racial

SIM

Colégio Chico Anysio

Rio de Janeiro (RJ)

Ensino Médio

Personalização do ensino

SIM

Escola Democrática Rômulo Galvão

Salvador (BA)

Ensino Médio

Protagonismo juvenil

SIM

EE de Educação Profissional Júlio França

Bela Cruz (CE)

Ensino Médio integrado ao Técnico

Trabalho e renda

SIM

Colégio Estadual Coronel Pilar

Santa Maria (RS)

Ensino Médio

Inclusão

SIM

Escola Padre João Bosco de Lima

Mauriti (CE)

Ensino Médio integrado ao Técnico

Trabalho e renda

SIM

CE Helena Celestino Magalhães

Salvador (BA)

Ensino Médio

Trabalho e renda

SIM

Cieja Campo Limpo

São Paulo (SP)

Ensino Médio

Trabalho e renda, inclusão

SIM

EM Maria do Socorro Rocha de Castro

Ouricuri (PE)

Multisseriada

Educação no campo

SIM

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Tabela 5. Escolas e programas internacionais Escola

Localidade

Região

Etapa(s) ofertada(s)

Questão da equidade

Escola Domingo F. Sarmiento

Argentina

América do Sul

Ensino Médio

Inclusão social

Escola Agrotécnica de Tintina

Argentina

América do Sul

Ensino Médio

Monument Mountain Regional High School Montpelier Public School

Estados Unidos Estados Unidos Estados Unidos Peru

América do Norte

Ensino Médio

Inclusão social e juvenil Protagonismo juvenil

América do Norte

Ensino Médio

Protagonismo juvenil

SIM

América do Norte

Ensino Médio

Protagonismo juvenil

SIM

América do Sul

Ensino Médio em Alternância

Trabalho e renda

SIM

Argentina

América do Sul

Apoio ao Ensino Médio

Inclusão social

NÃO

América do Norte

Ensino Médio

Personalização do ensino

SIM

Pathaways to Education

Estados Unidos Canadá

América do Norte

Apoio ao Ensino Médio

Inclusão social e trabalho e renda

NÃO

Escola Democrática de Hadera

Israel

Ásia

Personalização do ensino

SIM

High Tech High

Estados Unidos Afeganistão

América do Norte

Educação Infantil ao Ensino Médio Ensino Médio

SIM

Ásia

Apoio ao Ensino Médio

Inclusão social e personalização do ensino Gênero

MC² High School Centros Rurais de Formação em Alternância Vos me Importas Escola Magnet Museu Normal Park

Afeganistão Livre

É uma escola? SIM protagonismo

SIM SIM

NÃO

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Além da escola catarinense Lehmkuhl, foi possível encontrar trabalho contundente na CEF 01 Planaltina, de Brasília que, embora atendendo estudantes do Ensino Fundamental II, integrou a discussão de gênero e sexualidade ao PPP da escola, estabelecendo “uma rede interna e também uma externa de apoio à disseminação das práticas pela diversidade, com envolvimento de diversas pessoas e organizações”8. Outra experiência que lidou com a mesma perspectiva investindo em uma gama de ações para diminuição das desigualdades a partir das questões de gênero e sexualidade foi a iniciativa paulistana do Transcidadania, programa intersetorial capitaneado pela Secretaria Municipal de Direitos Humanos em Centros Integrados de Educação de Jovens e Adultos (Ciejas)9. No caso estudado, do CIEJA Sé, escola pioneira a implementar a proposta, os professores assumem o papel de tutores dos estudantes, que são em sua maioria transexuais e travestis, excluídos do sistema regular de ensino. Os jovens e adultos recebem uma bolsa de incentivo à permanência na escola, associada a uma gama de serviços específicos, como centro de saúde especializado, monitoramento da assistência social e centros de apoio para empregabilidade. A proposta fez com que a escola assumisse a função de ponto focal de todas as políticas setoriais e reestruturasse todo seu planejamento para integração dos estudantes e qualificação do corpo docente. Dessa forma, a partir da discussão de gênero apresentada pelo programa, a unidade passou a investir em uma atuação proativa pela inclusão social dos estudantes. Como resultado, enquanto a evasão na modalidade figura em 35%, no Cieja Sé é de 9%. 3.2.2. Inclusão social Com a mesma proposta de incluir socialmente os estudantes, porém sem o apoio direto da gestão pública, o Colégio Estadual Manuel Ribas, de Curitiba (PR)10, desenvolveu uma série de ações para apoiar os estudantes a permanecerem mais tempo na escola. Localizada em uma comunidade de catadores de lixo, a escola enfrentou grande resistência dos pais dos estudantes do Ensino Fundamental II, que viam a ampliação da jornada como um risco para a composição da renda e estrutura familiar, uma vez que os jovens ou participavam da coleta de materiais ou cuidavam da casa e dos irmãos menores. A partir de um trabalho integrado com a comunidade (oferta de almoço aos familiares, discussões para qualificação do trabalho dos pais, reorganização do currículo em diálogo com as características do território), a escola não apenas reverteu a situação, quanto começou a ofertar atividades em jornada ampliada também para o ensino médio – mesmo sem recursos do governo estadual para a modalidade, tendo os familiares como principais apoiadores da iniciativa. 8

Centro de Referências em Educação Integral, Debate sobre diversidade integra projeto político pedagógico de escola. Disponível em http://educacaointegral.org.br/experiencias/debates-sobrediversidade-integram-integrar-projeto-politico-pedagogico-de-escola-em-planaltina-df/ . Acessado em 20/11/2016. 9 Centro de Referências em Educação Integral, Programa intersetorial da prefeitura de SP apoia travestis e transexuais. http://educacaointegral.org.br/experiencias/programa-intersetorial-da-prefeitura-de-spapoia-travestis-transexuais/ .Acessado em 20/11/2016. 10 Centro de Referências em Educação Integral, Aproximação das famílias e tempo integral reformularam escola do Paraná. Disponível em: http://educacaointegral.org.br/experiencias/aproximacao-das-familias-tempo-integralreformularamescola-do-parana/. Acessado em 20/11/2016.

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3.2.3 Trabalho e renda A preocupação de integrar o cotidiano dos estudantes e a demanda da juventude por trabalho também se apresentou nas escolas Padre João Bosco de Lima, de Mauriti e Júlio França, de Bela Cruz, ambas no Ceará e representantes do Programa de Educação Integral do Ceará11, que busca compor o currículo acadêmico a disciplinas ligadas à empregabilidade e ao mundo do trabalho. No estado como um todo aferiu-se diminuição da evasão e aumento de interesse dos estudantes pela escola em tempo integral, reafirmando que a questão do trabalho, quando endereçada pela escola, fortalece a participação, interesse e permanência discente. Nas experiências mapeadas, para além da implementação do programa de educação integral do estado, percebeu-se uma série de ações programáticas para fortalecer a participação do estudante. Na escola Júlio França12, os estudantes são convidados a pensar projetos não apenas com foco no mundo do trabalho, mas na resolução de problemas locais, que afetam diretamente suas comunidades. O currículo e a estrutura de gestão também são debatidos intensamente por meio de assembleias com participação dos jovens e de seus familiares. Já na escola de Mauriti, 1º lugar entre as escolas públicas do ENEM, segundo o INEP, o ganho expressivo no rendimento escolar veio associado à promoção do protagonismo juvenil na unidade e na oferta de um currículo diversificado, combinando a oferta do programa de educação integral do estado, com atividades extras, desenvolvidas pela própria unidade em diferentes campos do conhecimento (linguagens, artes, esportes, etc.) e a partir das demandas e interesse dos jovens. A mesma postura de gestão, integrando atividades com foco no contexto local ao currículo integrado (profissional e acadêmico) foi aferida para os estudantes do Ensino Médio regular em tempo integral ofertado na ETEC Tiquatira, em São Paulo (SP)13. Embora parte do sistema Paula Souza, e realizando seleção de estudantes (vestibulinhos), a escola enfrentou dificuldades com a participação dos meninos na jornada ampliada. Para tanto, instaurou ferramentas de gestão compartilhada, reorganizando, inclusive, o uso dos espaços da escola, configurando ambientes que respondessem às expectativas dos estudantes. A proposta, segundo a própria unidade, encontra eco em relatórios e estudos contemporâneos14 que colocam a questão do ambiente como estruturante para a qualidade dos resultados acadêmicos.

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Centro de Referências em Educação Integral, Ceará foca em programa de educação integral profissionalizante. Disponível em: http://educacaointegral.org.br/experiencias/ceara-foca-emprograma-de-educacao-integral-profissionalizante/ Acessado em: 20/11/2015. 12 Centro de Referências em Educação Integral, Estudantes de escola pensam projetos voltados para as demandas do território. Disponível em: http://educacaointegral.org.br/experiencias/estudantes-deescola-ce-usam-demandas-territorio-para-pensar-projetos/ Acessado em: 20/11/2015. 13 Centro de Referências em Educação Integral, Escola se propõe a debater os espaços educacionais e configura Grêmio Escolar. Disponível em: http://educacaointegral.org.br/experiencias/escola-sepropoe-debater-os-espacos-educacionais-configura-gremio-escolar/ Acessado em: 20/11/2015. 14 Casassus, Juan. A escola e a desigualdade. Brasília: Plano, 2002

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Em perspectiva semelhante, trabalhando com a questão da participação e buscando evitar a evasão, o Colégio Estadual Helena Celestino Magalhães15, de Salvador (BA), a partir da proposta de educação integral do estado, firmou parcerias com instituições locais para ofertar oportunidades de estágio integradas à jornada ampliada. Com a perspectiva de pensar o tempo letivo dos estudantes, o Centro Integrado de Educação de Jovens e Adultos (Cieja) Campo Limpo16, em São Paulo (SP) oferta as aulas em módulos disponíveis em três períodos, garantindo que o estudante que consegue trabalho possa continuar seus estudos. A unidade atende principalmente jovens, muitos deles com deficiência além de outros egressos do sistema prisional ou cumprindo medidas socioeducativas desenvolvendo uma série de ações integradas com foco na redução de desigualdades. Entre os exemplos das atividades realizadas, a gestão criou um espaço para que as mães dos jovens com deficiência pudessem desenvolver, no próprio espaço da escola, práticas laborais como artesanato e culinária para ajudar com a renda familiar, enquanto seus filhos estão em aula. O levantamento também identificou uma escola que atende jovens de até 15 ou 16 anos de idade, a depender da demanda local. A escola Maria do Socorro Rocha de Castro, de Ouricuri (PE), desenvolve projeto pedagógico que ultrapassa as segmentações das modalidades escolares, uma vez que é multisseriada e abarca crianças e adolescentes no mesmo tempo e espaço pedagógico. Como diferencial das demais unidades com essa modalidade, a escola, que tem apenas uma professora e uma funcionária de apoio (que constroem e fazem as vias de gestão escolar) aposta na metodologia e conceito da educação contextualizada, tomando o meio rural, o campo, como alicerce estruturante do seu projeto pedagógico. Com planejamento flexível, a escola assume as necessidades da comunidade, incluindo a lida e os tempos do meio rural como insumos pedagógicos e de envolvimento dos estudantes. Tida como uma conquista da comunidade, os jovens, mesmo tendo que apoiar a família na colheita, seguem participando e não evadem, uma vez que os conteúdos aprendidos fortalecem a própria cultura e economia local. 3.2.4 Protagonismo Juvenil Entendendo a demanda da juventude por participação na gestão e no desenho curricular, as escolas Antônio Ablas Filho17 e Rômulo Galvão18 lançaram mão de diferentes estratégias –

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Centro de Referências em Educação Integral, Em Salvador, escola de educação integral dialoga com necessidades da juventude. Disponível em: http://educacaointegral.org.br/experiencias/em-salvadorprograma-de-educacao-integral-favorece-dialogo-de-escola-jovens-ensino-medio/ Acessado em: 20/11/2015 16 Centro de Referências em Educação Integral. Disponível em: http://educacaointegral.org.br/experiencias/cieja-campo-limpo-reformulou-o-curriculo-para-fortalecera-autonomia-dos-estudantes/. Acessado em 20/11/2015. 17 Centro de Referências em Educação Integral. Disponível em: http://educacaointegral.org.br/experiencias/clubes-juvenis-garantem-percurso-de-aprendizagemautonomo-em-santos/

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todas assimiladas na cultura escolar, e envolvendo não apenas o corpo diretivo e os estudantes, mas os docentes, funcionários e familiares. A primeira desenhou suas ações a partir do programa de tempo integral do estado de São Paulo19, assumindo, além do desenho proposto de tutoria e acolhimento dos estudantes, assembleias semanais em que os jovens debatem temas de seu interesse e incidem diretamente na organização da escola. E a segunda, que passou a assumir o nome Escola Democrática após a revisão do PPP, a partir da proposta do Programa de Educação Integral (ProEI) da Bahia, realiza discussões periódicas com toda a comunidade escolar sobre o funcionamento e proposta pedagógica da unidade. Entre as inovações, os estudantes participam da avaliação dos professores, discutindo, a partir de estratégias de mediação, o que entendem que funciona e não funciona também na sala de aula. Com perspectiva semelhante, assumindo a participação do jovem na gestão de projetos individuais e coletivos, o Colégio Chico Anysio, do Rio de Janeiro, implementou modelo de ampliação da jornada escolar desenvolvido em parceria com o Instituto Ayrton Senna. Na escola, que apresentou ganho importante não apenas no rendimento escolar, mas no comportamento e participação dos estudantes, os jovens são convidados a desenhar propostas para a própria escola, tanto a partir do que desejam aprender, quanto para qualificar o ambiente da unidade. 3.2.5 Étnico-racial Também pautando o protagonismo, mas com foco na valorização e respeito à diversidade étnico-racial, as escolas Tuxaua Luiz Cadete e Antônio Sérgio Carneiro investem em ações em diálogo com a comunidade local. A primeira, indígena20, e única experiência encontrada na região norte do país, atende estudantes de aldeias com diferentes culturas, origens e substratos linguísticos e, para tanto, organiza ações de compartilhamento entre as culturas, buscando que os jovens indígenas não apenas entendam a escola como pertinente no seu contexto individual, mas de toda a comunidade, aproximando culturas e investindo na colaboração entre os povos para preservação das diferentes práticas locais. A segunda21 desenvolve ações semelhantes só que com foco em uma comunidade específica, de origem quilombola. Ao perceber que os estudantes estavam se distanciando da própria cultura por sofrerem preconceito, a gestão decidiu investir na reformulação de toda concepção pedagógica da unidade, tomando a valorização da cultura quilombola como ponto

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Centro de Referências em Educação Integral. Disponível em: http://educacaointegral.org.br/experiencias/colegio-aposta-em-gestao-democratica-para-aumentarenvolvimento-ensino/. Acessado em 20/11/2015. 19 Centro de Referências em Educação Integral. Disponível em: http://educacaointegral.org.br/experiencias/programa-de-educacao-integral-fomenta-autonomia-dosestudantes/ Acessado em 20/11/2015. 20 Centro de Referências em Educação Integral. Disponível em: http://educacaointegral.org.br/experiencias/territorio-comunidade-compartilham-seus-saberes-escolaroraima/. Acessado em 20/11/2015. 21 Centro de Referências em Educação Integral. Disponível em: http://educacaointegral.org.br/experiencias/escola-quer-fortalecer-identidade-negra-quilombola-nabahia/. Acessado em 20/11/2015

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de partida para todas as atividades escolares. Além de melhora no rendimento escolar, a escola conseguiu aproximar os familiares e fortalecer seu vínculo no território. 3.2.6 Inclusão de jovens com deficiência Também estimulando o vínculo com a comunidade e o enfrentamento do preconceito, as escolas Professora Inah de Melo e Coronel Pilar não criam cisões entre os estudantes com deficiência e demais. Mesmo com as dificuldades de garantir a inclusão e participação efetiva de todos os jovens na escola, as unidades operam com o fortalecimento e qualificação do corpo pedagógico para pensar ações que efetivamente envolvam todas as turmas. Em Santo André (SP), a escola Inah de Melo22 virou polo de referência no atendimento dos jovens com necessidades especiais e hoje, quase 10% do seu público apresenta alguma deficiência. Já o Colégio Coronel Pilar, em Santa Maria (RS)23, desenvolve projeto pensando nessa integração desde 1993 e tem no Atendimento Educacional Especializado (AEE) o grande alicerce para suas ações. Lá o AEE segue à risca seu objetivo, participando ativamente do planejamento e apoiando os professores regulares na inclusão dos jovens com diferentes tipos de deficiência. 3.3 Experiências Internacionais Tomando o campo como ponto de partida24, identificamos a experiência peruana das escolas de alternância como importante referencial para o Ensino Médio brasileiro. A fim de incentivar a permanência dos estudantes de zonas agrícolas na escola, o programa do governo federal peruano em parceria com uma organização de 3º setor, apoia o desenvolvimento de escolas com matrizes curriculares construídas com base nas necessidades locais e em tempos mais flexíveis, normalmente no formato de alternância, garantindo a presença do jovem no apoio às famílias e à lida. Outras experiências versam sobre a aproximação dos jovens com seu contexto local, desenvolvendo ações complementares para inclusão social daqueles menos favorecidos e que enfrentam necessidades de trabalho e complementação de renda, como as escolas argentinas Domingo Sarmiento25 e Agrotécnica de Tintina26. Na mesma perspectiva, buscando o apoio dos jovens em situação de vulnerabilidade, foi listado programa intersetorial de apoio à

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Centro de Referências em Educação Integral. Disponível em: http://educacaointegral.org.br/experiencias/escola-estaudal-de-santo-andre-e-polo-de-atendimento-aestudantes-com-deficiencia-visual/ . Acessado em 20/11/2015. 23 Centro de Referências em Educação Integral. Disponível em: http://educacaointegral.org.br/experiencias/colegio-rs-e-exemplo-de-inclusao-de-estudantesdeficiencia/ . Acessado em 20/11/2015. 24 Vale destacar o fato de que no levantamento, para além da experiência da escola de Ouricuri, não foi possível encontrar nada de destaque no campo. 25 Centro de Referências em Educação Integral. Disponível em: http://educacaointegral.org.br/experiencias-internacionais/escola-argentina-de-ensino-medio-encaradesafio-da-diversidade-social-da-inclusao/ Acessado em 20/11/2015. 26 Centro de Referências em Educação Integral. Disponível em: http://educacaointegral.org.br/experiencias-internacionais/dialogo-territorio-como-condicao-para-umaeducacao-cidada-e-norte-de-escola-argentina/ Acessado em 20/11/2015.

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permanência da juventude. Realizado em Córdoba, a iniciativa Vos me importas27 lança mão de diferentes atividades – desde a efetivação de matrículas em creche de filhos de pais adolescentes a oficinas de geração de renda para complementação do ganho familiar de jovens em vulnerabilidade. Reunindo diversos serviços públicos, o programa é operacionalizado nas escolas, que assumem função de interlocução local da oferta de oportunidades educativas e do sistema de garantia de direitos da juventude. Programa semelhante acontece em diferentes províncias canadenses28, apoiando jovens em situação de vulnerabilidade social ou risco de evasão a permanecerem na escola. Como proposta, a iniciativa investe na ampliação da oferta educativa e em tutores que acompanham o desenvolvimento do jovem, aconselhando-o a concluir os estudos. Também como apoio às escolas, a iniciativa Afeganistão Livre29 apoia meninas em diferentes etapas escolares a estudarem, a partir da qualificação da equipe escolar sobre o direito das mulheres à educação e de estratégias de mobilização e conscientização comunitária da importância da escola para o desenvolvimento local e do país. A proposta também lança mão do protagonismo das próprias jovens para o desenvolvimento de campanhas e iniciativas de educação entre pares, a fim de que uma estimule a outra a permanecer na escola. Entre as escolas mapeadas na listagem jornalística, aferiu-se que o protagonismo juvenil emerge, novamente, como uma temática central nas ações de combate à evasão e nos resultados acadêmicos, dentre as quais destacam-se a Monument Regional High30 e a High Tech High31, que, sem desenvolver qualquer mecanismo de seleção, têm público bastante diverso econômica, social e culturalmente e conseguem resultados acadêmicos importantes. Para tanto lançam mão de estratégias de participação e de personalização do ensino, em que várias ferramentas pedagógicas são utilizadas pelo corpo docente para manter os estudantes ativos e motivados. 3.4 Conclusões O levantamento jornalístico não foi concluído como esperado. A proposta era de encontrar 30 exemplos, sendo 10 deles internacionais, que apresentassem boas práticas de gestão na

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Centro de Referências em Educação Integral. Disponível em: http://educacaointegral.org.br/experiencias-internacionais/vos-importas-programa-ressignificapermanencia-da-juventude-nas-escolas/ Acessado em 20/11/2015. 28 Centro de Referências em Educação Integral. Disponível em: http://educacaointegral.org.br/experiencias-internacionais/pathways-education-programa-canadenseapoia-jovens-se-manterem-na-vida-escolar/. Acessado em 20/11/2016 29 Centro de Referências em Educação Integral. Disponível em: http://educacaointegral.org.br/experiencias-internacionais/por-meio-da-educacao-afeganistao-livrepromove-direito-de-meninas-mulheres/. Acessado em 20/11/2016 30 Centro de Referências em Educação Integral. Disponível em: http://educacaointegral.org.br/experiencias-internacionais/todo-poder-aos-estudantes/ Acessado em 20/11/2016 31 Centro de Referências em Educação Integral. Disponível em: http://educacaointegral.org.br/experiencias-internacionais/rede-de-escolas-da-california-personalizaensino-aprendizagem/ Acessado em 20/11/2016

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promoção do desenvolvimento integral (em educação integral) com foco no fortalecimento da equidade no ensino médio. Não foi possível atingir o esperado, uma vez que, como critérios, a experiência deveria ser indicada por fonte de relevância no tema, ou referendada por outros veículos especializados ou pelas próprias secretarias de educação, capazes de identificar a qualidade e pertinência da proposta em suas unidades de ensino. Embora tenha sido possível identificar muitas escolas com projetos individuais de docentes, poucas ações tinham caráter sistemático e haviam sido internalizadas em uma perspectiva de gestão. Entre os pontos encontrados, aferimos que apenas duas escolas do levantamento de experiências nacionais conseguem incidir na reformulação de sua estrutura a fim de enfrentar as diferentes questões da equidade, entendendo-as como interdependentes. Ambas são os CIEJAS da cidade de São Paulo, que, como a própria política de EJA prevê, atuam sistematicamente para garantir a permanência desse jovem, que se apresenta como fruto da ineficiência do próprio sistema e, portanto, excluído, resultado dos processos de iniquidade. Talvez por atenderem um público que apresenta de forma tão latente a complexidade da permanência na escola, os CIEJAs conseguem atuar de forma sistemática, integrando serviços públicos e da comunidade, e fortalecendo o vínculo dos jovens com seu território e com suas famílias, lidando com todas as temáticas que afetam seu afastamento da escola: etnia e raça, trabalho, desejo por participação, necessidades específicas ou deficiência, etc. Vale destacar, porém, que todas as escolas identificadas, mesmo sem conseguirem atuar com todas as questões da mesma forma, apresentaram essa preocupação. Muitas indicaram que são “reféns” do próprio sistema a que respondem, e que almejariam maior liberdade no desenho de seus programas e currículos, podendo incidir mais ativamente para a permanência do estudante, mudando, por exemplo, a organização do tempo ou trabalhando com “grades curriculares” menos rígidas. Contudo, em sua maioria, as escolas de tempo integral lançam mão de variadas estratégias para qualificar o tempo letivo, rompendo com a lógica de turno e contraturno, de currículo base e currículo diversificado. Todas fortalecem a integração das áreas do conhecimento, a interlocução com o mundo do trabalho, empreendedorismo e projetos de atuação local/ na comunidade e todas viabilizam algum grau de autonomia para que o jovem trilhe seu percurso de aprendizagem. Muitas, inclusive, lançam mão de tutores, responsáveis por acompanhar os jovens em seus “projetos de vida”, ponto que destacam como muito importante para o sucesso de seus projetos pedagógicos. Dessa forma, embora o levantamento tenha apresentado dificuldades, as experiências nacionais e internacionais encontram eco na literatura encontrada, na qual foi possível aferir que no olhar para o desenvolvimento integral desse jovem, há a necessidade de fortalecer seu poder de escolha e apoiá-lo nesse percurso, garantindo seu direito à participação na comunidade escolar, e autonomia no manejo de sua aprendizagem e currículo. Ao mesmo tempo, as experiências nacionais dialogam diretamente com os temas apresentados pelas iniciativas internacionais, destacando que o desafio do Ensino Médio não é

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exclusivo do Brasil e que as práticas sustentadas tanto na academia, quanto nas experiências nacionais fortalecem, acima de tudo, a necessidade de reafirmar o protagonismo das juventudes em serem co-autores dessas escolas, especialmente no desenho e implementação dos currículos. Para além de programas bem desenhados, as escolas que têm apresentado êxito com as questões deste estudo, conferem autonomia aos estudantes, tornando-os membros ativos da gestão, tanto pedagógica quanto administrativa e das rotinas da unidade. 4. Referências BARROW, R. Common Schooling and the Need for Distinction. Journal of Philosophy of Education, Vol 41, N. 4, 2007. BLOSSFELD, H.-P., & SHAVIT, Y. Persisting barriers: Changes in educational opportunities in thirteen countries. In: Y. Shavit & H.-P. Blossfeld (Eds.), Persistent inequality. Boulder, CO: Westview, 1993, p. 1-24. CASASSUS, J. A escola e a desigualdade. Brasília: Plano, 2002, 210p. DAYRELL, J. CARRANO, P. MAIA, CARLA. Juventude e Ensino Médio: Sujeitos e Currículos em Diálogo. Belo Horizonte: UFMG, 2014. DEL RÍO, M. C., MOLINA, E. C., LÓPEZ, C. B., GARCÍA, M. G. Enfoques de atención a la diversidade, estratégias de aprendizaje y motivación en educación secundaria. Perfiles Educativos, vol. XXXVI, nº. 145, 2014. DESLANDES, R. Designing and Implementing School, Family and Community collaboration Programs in Quebec, Canadá. The School Community Journal, Vol. 16, nº. 1, 2006. DOMINGO, J., CABALLERO, K., BARRERO, B. Support for the leadership for learning in secondary education. The case of the school counselors in Spain. European Scientific Journal, Vol. 9, nº. 13, may 2013. EIKEN, O. The Kunskapsskolan (“The Knowledge School”): A Personalised Approach to Education, CELE Exchange, Centre for Effective Learning Environments, Vol. 1, OECD Publishing, 2011. FERNÁNDEZ, M. V. C. et al. Intervención y evaluación de un programa de educación afectivosexual en la escuela para padres y madres de adolescentes. Revista Diversitas – Perspectivas en Psicología, Vol. 3, nº. 2, 2007. FERREIRA, N. S. A. As pesquisas denominadas “estado da arte”. Educação & Sociedade, ano XXIII, nº. 79, Agosto/2002. HEARN, L., CAMPBELL-POPE, R., HOUSE, J., CROSS, D. Pastoral care in education. Perth (Australia), Child Health Promotion Research Unit, Edith Cowan University, 2006. HSIAO-CHIN, H., SHU-CHING, L. The formation of Gender Education Policies in Taiwan, 19951999. Chinese Education and Society, vol. 47, nº. 4, July-August 2014, p.5-13.

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