Ontologia e Normatividade: O problema ontológico em Meinong

October 10, 2017 | Autor: Henrique Assai | Categoria: Ontologia
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL – PUCRS
FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM FILOSOFIA – DOUTORADO



José Henrique Sousa Assai













Ontologia e Normatividade: O problema ontológico em Meinong


























Porto Alegre
2014
José Henrique Sousa Assai


Ontologia e Normatividade: O problema ontológico em Meinong

















Artigo científico como critério avaliativo ao Seminário de Filosofia Medieval junto à PUCRS no PPG/Doutorado em Filosofia



Prof. Dr. Roberto Pich



















Porto Alegre
2014
Resumo

O problema da crise de autointerpretação do sujeito engendrou quatro possíveis respostas na Tradição filosófica: o monismo da natureza (Espinoza, Hobbes); o monismo do sujeito (o "eu" fichteano); o monismo dialético (Schelling, Hegel) e o dualismo (Descartes e Kant). Nesses modelos, pensar a ontologia de forma holista torna-se tarefa não só árdua, mas irreconciliável; dessa forma, o escopo fundamental da ontologia de Meinong está eivada dessa matriz dual de tradição kantiana na qual desemboca, inclusive, na dificuldade em se pensar qualquer esfera objetiva de forma holista, pois a dicotomia "sujeito e objeto" já pressupõe essa não-conciliação. Esse quadro teórico acarreta danos também para uma teoria normativa social. Pretendo nesse brevíssimo excurso textual explicitar que uma ontologia inflacionada, da qual Meinong é herdeiro, traz consequências pesadas para a Tradição filosófica social, pois, se levada a sério em suas pretensões, não é capaz de mediar um pensar normativo acerca da realidade.


Palavras-chave: Ontologia. Normatividade. Filosofia Social.
































A tarefa filosófica de explicitação temática não é algo simples, porém parece ser ela mesma um método argumentativo onde a rigorosidade conceitual torna-se importante no processo de compreensão filosófica. O Seminário de Filosofia Medieval que nesse semestre tematizou o 'Sobre o ente e o possível: estudos de casos sobre o ente possível, na filosofia medieval e na filosofia contemporânea' possibilitou-me (re) pensar, apesar de que a presente abordagem temática não seja fundamento no meu plano de pesquisa doutoral, um elemento importante e pressuposto do meu argumento doutoral (que é sobre pesquisa normativa social): "a categoria do possível como modalidade fundante do ente". E qual a relação dessa questão com a minha atual pesquisa? Em meu projeto de pesquisa tenho um pressuposto filosófico de que a Teoria Crítica, entendida nesse caso habermasianamente, não consegue dar conta, sob o ponto de vista normativo, das questões sociais de forma mais concreta e isso ocorre – não apenas pelo que procuro explicitar em meu projeto doutoral – pelo fato de o dualismo teórico habermasiano no tocante a sua teoria normativa da sociedade possui um déficit de uma ontologia social (não trata das instituições sociais enquanto instâncias de mediação normativa). Esse dualismo deve-se, sobretudo, porque o dualismo 'mundo da vida e sistema' é "incapaz de refletir sobre os seus próprios pressupostos ontológicos" , pois sem uma base ontológica de cunho social não vejo ser possível enfrentar minimamente o problema dos complexos institucionais como medium normativo (haverá sempre o déficit institucional). Ora, é justamente nesse ponto que procurei relacionar minha pesquisa com a reflexão ontológica de Meinong, pois sua ontologia inflacionada tem em seu escopo um dualismo, a saber: subsistência (Bestand) e existência (Existenz). Àquilo que Platão cognominou de ideia, Meinong chamou de "objetos subsistentes" e isso significa uma forma de dualismo em sua ontologia – já que "o que deve ser objeto de conhecimento não tem nenhuma necessidade de existir" – que resulta como tentativa de responder ao problema da crise de autointerpretação do sujeito na modernidade. Esse problema da dualidade presente em Meinong transfere-se para as questões da normatividade de cunho social, no momento em que partimos da ideia central de que sendo na realidade social há – e o termo 'haver' para Meinong diz respeito à esfera da teoria dos objetos de maneira geral – o quadro referencial 'sujeito (coletividade) vs estado de coisas a serem transformadas'. Essa segunda tipificação, que eu esboço nesse brevíssimo quadro acima, diz respeito àquilo que os filósofos da Teoria Crítica chamam de 'patologias sociais', ou seja, os problemas sociais que, diante de um quadro analítico e de dever-ser, necessitam ser alterados para que haja uma vida melhor para as pessoas incorporadas no tecido social.
A suspeita que apresento brevemente aqui contra o dualismo metodológico é que uma vez que seja aceito ele pressupõe uma irreconciabilidade entre o sujeito e o objeto (que nesse caso é um existente ou um estado de coisas existentes para questões sociais). Essa distinção permite que os atores sociais, em última instância, estariam encapsulados numa reductionem ad infinitum que não permitiria resolver as porosidades da teia social e seus problemas. Talvez quando Meinong sugeriu que a existência pertence a esfera da metafísica e esta, por sua vez, trata " tanto do inorgânico quanto do orgânico e do psíquico, para descobrir aquilo que é pertinente do ponto de vista do conjunto disso que pertence a domínios tão diferentes [...] a metafísica é [...] a ciência da totalidade da realidade efetiva", poderíamos supor que ao se pensar uma ontologia social também estamos fazendo uma forma de metafísica. Então, o predicado "existe" é aplicável a todos os objetos espaço-temporais no mundo e, nesse sentido, penso que uma forma de superar o dualismo ontológico é se orientar por uma ontologia holista . O problema, no fundo, é o modo como se faz ontologia e aqui não caberia a retomada que Meinong fez do jovem Platão, porém temos que lançar mão do Platão mais tardio .
Quando Meinong propõe que sua teoria dos objetos seja uma forma de metateoria (uma ciência independente inclusive), ele reafirma a proposta dual de sua filosofia onde "há" uma ciência que possui maior relevância dentre as demais e "há" outras ciências que depreendem seus pressupostos da primeira. Esse argumento não se sustenta no momento em que se possa inferir uma ontologia holista. Nesse caso, para tratar das patologias sociais (problemas societários) que um específico tipo ideal de solução ao correspondente problema social seja inatingível para os sujeitos sociais.
Por fim, tomando por referência um quadro normativo, tendo a concordar com Meinong que "todo pensamento que é aparentemente sobre um objeto possui, de fato, a característica de estar direcionado ao objeto ao qual ele se refere e esse objeto pertence ao domínio do ser" , pois objeto, nesse caso, ocupa não apenas entidades físicas, mas também nos permitiria pensar numa amplitude para as entidades sociais (construções dos agentes sociais) e essa teleologia torna-se importante no processo de aprendizagem social que se depara com as incongruências no próprio corpo societário, pois a relação a ser estabelecida não é de mero espectador, porém de participante no processo social. Pensamento, para Meinong, tem um sentido de questionar-se sobre algo (ato mental) e, no caso de uma pesquisa crítica, pensar sobre os problemas sociais e propor respostas aos mesmos é questionar-se acerca de algo. Por outro lado, se levarmos a fundo a tese do Au ersein , onde um determinado objeto pode ter uma série de características independentemente de sua existência, reduziríamos a pesquisa filosófica, sob o ponto de vista ontológico, a um dualismo que não responderia, na perspectiva crítica (da Teoria Crítica) às patologias sociais.













Referências

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HABERMAS, Jürgen. A consciência de tempo da modernidade e sua necessidade de autocertificação. p. 11. In: _______. Discurso Filosófico da Modernidade. Tradução Luiz Repa e Rodinei Nascimento. São Paulo: Martins Fontes, 2012. 540 p.

_______. Theorie des Kommunikativen Handelns: Handlungsrationalität und gesellschaftliche Rationalisierung. Frankfurt am Main: Suhrkamp Verlag, 1995a. 534p.

______. Theorie des Kommunikativen Handelns: Zur Kritik der funktionalistischen Vernunft. 1. ed. Frankfurt am Main: Suhrkamp Verlag. 1995b. p.593.

LUFT, Eduardo. The syndrome of the house taken over. Veritas, Porto Alegre, v. 58, n.2, p. 295 – 307, 2013.

_______. Ontologia Deflacionária e ética objetiva: em busca dos pressupostos ontológicos da teoria do reconhecimento.Veritas, Porto Alegre, v. 55, n. 1, p. 82 – 120. 2010

MEINONG, Alexius. Untersuchungen zur Gegenstandstheorie und Psychologie. Leipzig: Johann Ambrosius Barth. 1904, 45 p

_______. Sobre a teoria do objeto. Tradução de Celso Braida. [?]: Rocca Brayde, 2005. 145 p.

PLATÃO. Filebo. Tradução Carlos Alberto Nunes. Disponível em: < http://br.egroups.com /group /acropolis/ >. Acesso 26 nov. 2014

PONTES, André Nascimento. Existência enquanto predicado de primeira ordem: algumas consequências e objeções. Argumentos: Revista de Filosofia, Fortaleza, ano 2, n. 3, p. 36 – 45, 2010.









HABERMAS, Jürgen. Theorie des Kommunikativen Handelns: Handlungsrationalität und gesellschaftliche Rationalisierung. Frankfurt am Main: Suhrkamp Verlag, 1995a. 534p. Cf. ______. Theorie des Kommunikativen Handelns: Zur Kritik der funktionalistischen Vernunft. 1. ed. Frankfurt am Main: Suhrkamp Verlag. 1995b. p.593.
LUFT, Eduardo. The syndrome of the house taken over. Veritas, Porto Alegre, v. 58, n.2, p. 295 – 307, 2013.
A modernidade gerou para a Filosofia dois problemas centrais: [a] a crise de autointerpretação do sujeito e [b] a (im)possibilidade de conciliação entre sistematicidade e criticidade. Naquilo que eu apresento de forma muito elementar nesse breve artigo relaciona-se com a primeira questão: a crise de autointerpretação do sujeito que, por sua vez, gerou quatro possíveis respostas ao problema: o monismo da natureza (Espinoza, Hobbes); o monismo do sujeito (o "eu" fichteano); o monismo dialético (Schelling, Hegel) e o dualismo (Descartes e Kant). Do dualismo kantiano, onde o sujeito não faz parte do mundo fenomênico, Habermas, por exemplo, herda também tal proposta e a transfere para sua teoria da sociedade quando ele separa mundo da vida e sistema como esferas autônomas de uma única realidade.
MEINONG, Alexius. Untersuchungen zur Gegenstandstheorie und Psychologie. Leipzig: Johann Ambrosius Barth. 1904, 45 p. Na versão brasileira: cf. _______. Sobre a teoria do objeto. Tradução de Celso Braida. [?]: Rocca Brayde, 2005. 145 p.
PONTES, André Nascimento. Existência enquanto predicado de primeira ordem: algumas consequências e objeções. Argumentos: Revista de Filosofia, Fortaleza, ano 2, n. 3, p. 36 – 45, 2010.
MEINONG, 2005, p. 99.
MEINONG, 2005, p. 130.
LUFT, Eduardo. Ontologia Deflacionária e ética objetiva: em busca dos pressupostos ontológicos da teoria do reconhecimento.Veritas, Porto Alegre, v. 55, n. 1, p. 82 – 120. 2010
PLATÃO. Filebo. Tradução Carlos Alberto Nunes. Disponível em: < http://br.egroups.com/group/ acropolis/ >. Acesso 26 nov. 2014.
MEINONG, 2005, p. 144.
PONTES, 2010, p. 41.
MEINONG, 1904, p. 9.


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