Operacionalização de Conceito: Desemprego Jovem em Portugal

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OPERACIONALIZAÇÃO DO CONCEITO

Desemprego Jovem em Portugal

por

Pedro Vaz Serra

Universidade de Coimbra Faculdade de Economia e Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação

2015

INTRODUÇÃO

Sentimos todos, portugueses em particular e europeus em geral, que os últimos anos têm sido particularmente adversos. Fomos confrontados com uma dura realidade que, tendo nascido como uma crise financeira, latente em 2007 e explícita em 2008, nos Estados Unidos, rapidamente chegou à Europa, aqui evoluiu para uma crise económica e, logo depois, para uma crise social. Com a circunstância particularmente adversa que, desde 2008 e até aos nossos dias, a crise financeira não ficou totalmente resolvida, atingindo de forma ténue, mas persistente, o sector financeiro; a crise económica emergiu, de forma agressiva e estrutural; a crise social tornou-se visível, de forma explícita e profunda, com todas as implicações, daí decorrentes, para os cidadãos, nas suas condições de vida e no seu horizonte de esperança por mais e melhor futuro, hipotecado num presente de movimento incerto e de prazo indefinido (Vaz Serra, 2012). Ainda que a União Europeia (UE) seja, no seu conjunto, a maior economia mundial, tem vindo a perder ritmo ao longo dos últimos anos, essencialmente fruto do enorme impacto que a crise de 2008 teve na Europa, para além das dificuldades que têm existido na captação de novos mercados e na consolidação dos actualmente existentes. O Produto Interno Bruto1(PIB) per capita da UE cresceu 25%, entre 1995 e 2011, mas, praticamente no mesmo período, entre 1992 e 2010, o PIB per capita mundial cresceu 40%. Assim, a contribuição da Europa para o PIB mundial que, em 1950, era de 30%, não chegará, até 2050, aos 10% (Eurostat, 2012). 1

O Produto Interno Bruto (PIB), a preços de mercado, representa o resultado final da actividade de produção das unidades produtivas residentes. Pode ser definido de três formas: a) Óptica da produção: o PIB é igual à soma dos valores acrescentados brutos dos diferentes sectores institucionais ou ramos de actividade, mais os impostos líquidos dos subsídios aos produtos (que não são afectados aos sectores e ramos de actividade). É igualmente o saldo da conta de produção total da economia; b) Óptica da despesa: o PIB é igual à soma das utilizações finais de bens e serviços (consumo final e formação bruta de capital) das unidades institucionais residentes, mais a exportação e menos a importação de bens e serviços; c) Óptica do rendimento: o PIB é igual à soma das utilizações da conta de exploração do total da economia (remuneração dos empregados, impostos sobre a produção e a importação líquidos de subsídios, excedente bruto de exploração e rendimento misto do total da economia). (metainformação – Sistema Europeu de Contas) Os valores são brutos quando não deduzem o consumo de capital fixo (Pordata, FFMS). 2

Tudo isto, mas não só, corresponde à face mais visível - pelo impacto que tem na vida das pessoas e nas suas legítimas aspirações - que tem provocado uma regressão dos principais indicadores sociais na UE, nomeadamente na dimensão da pobreza:2 a pobreza monetária,3 a privação material4e a falta de acesso ao emprego (Eurostat, 2012). Na UE, em 2013, quase 81 milhões de pessoas viviam em situação de pobreza monetária, cerca de 40 milhões eram consideradas em privação material grave e perto de 38 milhões viviam em agregados familiares em que os adultos trabalhavam muito menos do que poderiam. Por outro lado, havia 122,65 milhões de pessoas em risco de pobreza ou exclusão social, também na UE e em 2013, o que corresponde a 24,5% da população, sendo que estas podem ser afectadas, simultâneamente, por mais do que uma dimensão da probreza (Eurostat, 2014). Em Portugal, em 2013, o número de pessoas em risco de pobreza ou exclusão social era de 2,88 milhões, o que corresponde a 27,4% da população. É

inevitável,

neste

contexto,

o

agravamento

do

desempenho

macroeconómico que, naturalmente, tem directas e imediatas repercussões nas economias dos países, das regiões, dos meios urbanos e rurais, dos cidadãos. 2

Pobres são os indivíduos, famílias e grupos de pessoas cujos recursos (materiais, culturais e sociais) são tão limitados que os excluem do nível de vida mínimo aceitável do Estado-membro a que pertencem. Na União Europeia considera-se que uma pessoa vive em situação de risco de pobreza quando os seus rendimentos são inferiores a 60% do rendimento médio por agregado familiar do respectivo país. Apesar de tratar-se, essencialmente, de uma competência dos Estadosmembros, a União Europeia pode desempenhar um papel de coordenação, através da definição de normas europeias e da disponibilização de fundos (Eurostat). Limiar do rendimento abaixo do qual se considera que uma família se encontra em risco de pobreza. Este valor foi convencionado pela Comissão Europeia como sendo o correspondente a 60% da mediana do rendimento por adulto equivalente de cada país (INE). 3

Pelo observatório do QCA III (Terceiro Quadro Comunitário de Apoio): percentagem de famílias que acumulam um rendimento monetário equivalente inferior à linha de pobreza monetária e um nível de privação superior ao limiar de provação, correspondente a 150% do índice agregado de privação, isto é, da medida de não-acesso a bens e serviços básicos. Pelo INE (Inquérito às Condições de Vida e Rendimento): associa o risco de pobreza calculado com base na distribuição do rendimento disponível por adulto equivalente e, neste caso, o indicador de privação definido no quadro do EU-SILC, visando obter a proporção de indivíduos que se encontram em risco de pobreza e em situação de privação material. De acordo com a estrutura metodológica do Inquérito às Condições de Vida e Rendimento, o indicador anual de pobreza consistente compara os indivíduos que referem a existência de privação material no momento da entrevista, normalmente Maio a Junho de cada ano, com os indivíduos em risco de pobreza no ano anterior, ou seja, com o ano de referência dos rendimentos recolhidos (INE). 4

3

Neste quadro, caracterizado pela globalização, pela liberalização do comércio e pelo envelhecimento da população, a Europa tem vindo a debater-se com o problema da estagnação do crescimento das suas economias. Uma das principais e mais dramáticas consequências desta situação é, incontornavelmente, o aumento do desemprego, que afecta a grande maioria dos países europeus e que representa um dos mais graves problemas com o qual a Europa tem de lidar, tais são as suas consequências, no presente e para o futuro. As próximas secções deste trabalho vão ser dedicadas a este assunto, ao desemprego, pela abordagem à operacionalização do conceito de desemprego jovem

OPERACIONALIZAÇÃO DO CONCEITO: DESEMPREGO JOVEM

A formação de uma nova geografia competitiva na economia mundial, longe de ser embrionária, é uma realidade forte e consistente que alterou, por vezes drasticamente, o quadro concorrencial e as próprias condições de crescimento económico e de criação (sustentada) de emprego, sobretudo nas economias menos consolidadas e mais vulneráveis (Mateus, 2010). A economia de cada país reflecte, assim, a situação pela qual está a passar – fruto de decisões menos correctas do passado, de ausência de estratégia para o futuro e, claro, do adverso enquadramento macroeconómico, externo e interno – sendo o desemprego uma das faces mais visíveis e adversas, como referimos e, muito em especial, os desempregos5jovem6e de longa duração.7 5

Desempregado é todo o Indivíduo, com idade dos 15 aos 74 anos, que, no período de referência, se encontrava simultaneamente nas seguintes situações: 1) não tinha trabalho remunerado nem qualquer outro; 2) tinha procurado activamente um trabalho, remunerado ou não, ao longo de um período específico (o período de referência ou as três semanas anteriores); 3) estava disponível para trabalhar num trabalho, remunerado ou não. A procura activa traduz as seguintes diligências: 1) contacto com centros de emprego público ou agências privadas de colocações; 2) contacto com empregadores; 3) contactos pessoais ou com associações sindicais; 4) colocação, resposta ou análise de anúncios; 5) procura de terrenos, imóveis ou equipamentos; 6) realização de provas ou entrevistas para selecção; 7) solicitação de licenças ou recursos financeiros para a criação de empresa própria. A disponibilidade para aceitar um trabalho é fundamentada com: 1) o desejo de trabalhar; 2) a vontade de ter um trabalho remunerado ou uma actividade por conta própria, no caso de se poder obter os recursos necessários; 3) a possibilidade de começar a trabalhar num período específico (período de referência ou as duas semanas seguintes) - (metainformação – INE). 6

Considera-se desemprego jovem o que atinge os jovens entre os 15 e os 24 anos. 4

Sendo nosso objectivo abordar a temática do desemprego e, em particular, do desemprego jovem, em Portugal, é importante, desde logo, efectuar uma abordagem conceptual, de forma a termos presente, com rigor, o que estamos a identificar e a processar. Esta operacionalização dos conceitos revela-se ainda mais relevante pelo facto de tratarmos uma realidade, expressa estatisticamente, variável entre países e entre períodos, ao longo da história. Naturalmente que, sendo o desemprego causa e consequência de tantas e tão importantes variáveis e conceitos, não é possível abordá-lo sem considerar, também, todos os conceitos com ele relacionados, de forma directa ou indirecta, a montante, ou a jusante. É neste sentido que, como vimos nas páginas anteriores, tivemos necessidade de definir o PIB, pobreza, pobreza monetária, privação material, desempregado, desemprego jovem e desemprego de longa duração pois, todos eles, de alguma forma, são conceitos relacionados e só faz sentido abordar o desemprego com este enquadramento, pois o conjunto de relações, umas mais visíveis e lineares do que outras, entre todas estas realidades, fazem parte da construção e do equilíbrio, por vezes muito ténue, que origina e resulta da identificação, apropriação e implementação de modelos, políticas, soluções e resultados. Para além dos já referidos, é determinante definir o conceito de população activa, população inactiva e taxa de actividade. Para melhor identificação e sistematização da informação, apresentamos na tabela 1 os indicadores mais directamente relacionados com a temática do desemprego.

Desempregado de longa duração é um trabalhador sem emprego, disponível para o trabalho e à procura de emprego há 12 meses ou mais. Nos casos dos desempregados inscritos nos Centros de Emprego, a contagem do período de tempo de procura de emprego (12 meses ou mais) é feita a partir da data de inscrição no Centros de Emprego (metainformação – INE). 7

5

Tabela 1: Descrição e definição de conceitos

DESCRIÇÃO

CONCEITO

População Activa

População Inactiva

É inactivo quem não está empregado nem desempregado, como é o caso da população estudantil, doméstica e reformada.

A taxa de actividade representa o número de activos por cada 100 pessoas com 15 e mais anos. Os activos são a mão-de-obra disponível Taxa de Actividade para trabalhar, incluindo-se na população activa os trabalhadores que estão empregados e desempregados. A taxa de desemprego representa o número de desempregados por cada 100 activos. Os activos são a mão-de-obra disponível para Taxa de Desemprego trabalhar, incluindo-se na população activa os trabalhadores que estão empregados e desempregados. Percentagem da população desempregada dos 15-24 anos no total da população activa do mesmo grupo etário. Dispersão regional das taxas de desemprego Taxa de Desemprego Jovem

A taxa de desemprego de longa duração representa o número de desempregados há Taxa de Desemprego mais de um ano por cada 100 activos. Os de Longa Duração activos são a mão-de-obra disponível para trabalhar, incluindo os trabalhadores que estão empregados e desempregados.

DEFINIÇÃO Conjunto de indivíduos com idade mínima de 15 anos que, no período de referência, constituíam a mão-de-obra disponível para a produção de bens e serviços que entram no circuito económico (empregados e desempregados) População que, independentemente da sua idade, no período de referência não podia ser considerada economicamente ativa, isto é, não estava empregada, nem desempregada.

FONTE (metainformação – INE-Instituto Nacional de Estatística

(metainformação – INE-Instituto Nacional de Estatística)

(metainformação – Taxa que permite definir o peso da população activa sobre o total da população INE-Instituto com 15 e mais anos Nacional de Estatística)

Taxa que permite definir o peso da população desempregada sobre o total da população activa

(metainformação – INE-Instituto Nacional de Estatística)

Coeficiente de variação das taxas de desemprego (grupo etário dos 15-64 anos) nas regiões. A variação normal (mede o modo como a situação das regiões difere da média nacional) do desemprego (emprego) é dividida pela média nacional ponderada. A dispersão regional das taxas de desemprego fornece a dimensão da extensão regional do desemprego. Peso da população desempregada há 12 ou mais meses sobre o total da população activa

Observatório do QCA III-Quadro Comunitário de Apoio III)

(metainformação – Eurostat)

É interessante, a este propósito, realçar o facto de que quem trabalhar uma hora por semana, nem que seja por troca de uma refeição, ou de outro bem qualquer, é considerado empregado. Por outro lado, um desempregado, que por qualquer motivo, não procure emprego nos últimos trinta dias, deixa de ser considerado, estatisticamente falando, desempregado. Por fim, destacamos a circunstância de o desempregado ter de procurar emprego, remunerado ou não, ou seja, pode trabalhar sem a legítima e adequada remuneração. Falamos, assim, de uma realidade difusa, difícil de caracterizar e, portanto, de operacionalização complexa e sujeita a alguma instrumentalização. Uma realidade, de construção social, que temos, cada vez mais, de procurar entender para melhor combater.

6

Mas uma questão, a este propósito e desde já, terá de ser colocada: se um indivíduo pode estar, realmente, sem emprego, sem ser, oficialmente, desempregado, como podemos actuar, de forma a identificar a situação e salvaguardar o acesso a um nível mínimo de segurança e bem-estar, para o próprio e, em boa verdade, para a sociedade? Vejamos, também, as definições, neste âmbito, de alguns dos conceitos utilizados pelo Instituto do Emprego e da Formação Profissional (IEFP). Tabela 2: Descrição de conceitos (IEFP)

DESCRIÇÃO

CONCEITO Colocações

Ofetas de Emprego

Ofertas de emprego satisfeitas ao longo do mês, com candidatos apresentados pelos Centros de Emprego.

FONTE IEFP-Instituto do Emprego e Formação Profissional

Empregos disponíveis comunicados pelas entidades empregadoras aos Centros de Emprego

IEFP-Instituto do Emprego e Formação Profissional

Total de pessoas com idade igual ou superior a 16 anos (salvaguardadas as reservas previstas Pedidos de Emprego na lei) inscritas nos Centros de Emprego para obter um emprego por conta de outrém.

IEFP-Instituto do Emprego e Formação Profissional

Os pedidos de emprego, por sua vez, podem ser formalizados por pessoas em circunstâncias diversas, a saber: 

Empregados: têm um emprego, que pretendem abandonar;



Ocupados: trabalhadores ocupados em programas especiais de emprego;



Desempregados: não têm emprego e estão imediatamente disponíveis para trabalhar, podendo ser um novo emprego (para quem já esteve empregado, anteriormente) ou o primeiro emprego (para quem nunca trabalhou, anteriormente, sendo o caso da esmagadora maioria dos jovens);



Indisponíveis temporariamente: um candidato inscrito no Centro de Emprego, mas que não reúne as condições imediatas para o trabalho.

7

Estes conceitos, utilizados pelo IEFP, ajudam-nos a compreender melhor a realidade do desemprego, ao nível da sua abordagem conceptual. A questão que colocámos pode ser, agora, dissipada tendo em atenção que o desempregado é todo o indivíduo que não tem emprego e que está imediatamente disponível para trabalhar. Fiquemo-nos então por esta operacionalização proposta: desempregado é todo o indivíduo que, não tendo emprego, deseja tê-lo e, para isso, inscreve-se nos Centros de Emprego do IEFP, no sentido de procurar uma colocação, uma formação, um apoio na sua procura, quase sempre difícil e, por isso, demorada. Vejamos, nas próximas secções, a aplicação prática destes conceitos.

O DESEMPREGO NA UNIÃO EUROPEIA

Para o conjunto dos 27 Estados-membros8 da EU, a evolução da taxa de desemprego não é nada satisfatória, sendo difícil traçar um cenário positivo.

Tabela 3: Taxa de Desemprego (%)

Anos/Países 1980 1990 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012

EU 27

8,80 8,40 8,40 8,40 8,50 8,10 7,20 6,30 6,20 8,80 10,00 10,00 10,60

Portugal Espanha 6,70 4,70 3,90 4,00 5,00 6,30 6,70 7,60 7,70 8,00 7,60 9,50 10,80 12,90 15,90

11,10 16,00 13,90 10,50 11,40 11,30 11,00 9,20 8,50 8,30 11,30 18,00 20,10 21,70 25,00

Grécia

Holanda

7.00 11,10 10,20 10,30 9,70 10,50 9,90 8,90 8,30 7,70 9,50 12,50 17,70 24,30

7,70 2,70 2,10 2,60 3,60 4,60 4,70 3,90 3,20 2,80 3,40 4,50 4,40 5,30

Áustria Alemanha 3,20 3,50 3,60 4,00 4,30 4,90 5,20 4,70 4,40 3,80 4,80 4,40 4,20 4,30

1,60 2,30 1,80 2,60 3,70 5,10 4,50 4,70 4,10 5,10 5,10 4,40 4,80 5,10

Fonte: Organização Internacional do Trabalho (OIT) 8

Hoje, já são 28 os Estados-membros da UE, com a entrada da Croácia, em 2013. Mas como, para o efeito do tema por nós abordado, as estatísticas disponíveis, até 2012, ainda não integram a Croácia como Estado-membro da UE, esta é considerada, estatisticamente, como sendo a UE a 27, o que na realidade acontecia, à data. 8

Segundo dados da OIT, em 2012, o país com pior desempenho ao nível do desemprego é a Espanha, em que 25% da sua população activa está desempregada, seguida pela Grécia com 24.3%. Portugal é o terceiro país da EU que apresenta a pior taxa de desemprego, registando 15.9%. A média dos 27 Estados-membros é de 10.6% e os três países com menor taxa de desemprego são a Áustria, Luxemburgo e a Holanda, com 4.3%, 5.1% e 5.3% respectivamente. O DESEMPREGO EM PORTUGAL

Desde 2008 que se regista um agravamento considerável da taxa de desemprego, quer na UE, quer em Portugal - para além da Espanha e da Grécia sendo a trajectória crescente consequência, em grande parte, do abrandamento do crescimento das respectivas economias. Também é possível verificar que, no espaço de dez anos, a taxa de desemprego, em Portugal, mais do que triplicou, passando de 5%, em 2002, para 15.9%, em 2012, ultrapassando o valor da média da EU, desde 2006. Constata-se, assim, que Portugal é um dos países mais atingidos por este fenómeno. Através de uma análise da sua evolução histórica por períodos específicos, verifica-se que, entre os anos de 1980 e 1985, a taxa de desemprego em Portugal encontrava-se entre os 6% e os 8%. Em 1986, com a entrada na UE, na altura Comunidade Económica Europeia (CEE), este indicador registava 8.6%, descendo para os 4.3%, em 1991. O período entre 1992 e 1998 é caracterizado por um ligeiro aumento da taxa de desemprego, de 4.1% para 4.9%. Por esta altura, já se faziam sentir os efeitos da globalização e foram designados como os anos de preparação para a entrada na União Económica e Monetária9 (UEM). A adesão de Portugal à UEM foi

9

A União Económica e Monetária (UEM) implica a coordenação das políticas económicas e orçamentais, uma política monetária comum e uma moeda comum, o Euro. Embora os 28 Estados Membros da UE participem na união económica, alguns países levaram o processo de integração mais longe, tendo adoptado o Euro. Estes países formam a zona euro. A decisão de formar uma União Económica e Monetária foi tomada pelo Conselho Europeu na cidade holandesa de Maastricht, em Dezembro de 1991, tendo sido posteriormente consagrada no Tratado da União Europeia (Tratado de Maastricht). Com a União Económica e Monetária, a União Europeia dá mais um passo no seu processo de integração económica, iniciado com a sua fundação em 1957. 9

em 1999. No entanto, foi em 2002 que a moeda única europeia entrou em circulação, sendo, a partir daí, que a taxa de desemprego começa o seu percurso ascendente. As consequências da adesão tornaram-se preocupantes, ficando a economia portuguesa mais exposta e frágil. Portugal perdeu autonomia na condução da sua política monetária, bem como da política cambial. Estes dois factores, combinados com a globalização e uma apreciação da taxa de câmbio real, explicam a perda de competitividade da economia portuguesa, fazendo com que o valor das importações superasse o das exportações e provocando uma diminuição da produção, com o impacto muito adverso, daí decorrente, nas empresas e no emprego. É a partir de 2002, até aos dias de hoje, que a economia portuguesa apresenta uma estagnação10da actividade económica, também marcada pela crise financeira que teve início em 2008, coincidindo esta situação com um aumento da taxa de desemprego.

O DESEMPREGO JOVEM EM PORTUGAL

Relativamente à evolução da taxa de desemprego jovem, verificamos que a Grécia, Espanha e Portugal são os países com pior desempenho, por oposição à Holanda, Áustria e Alemanha, que possuem os melhores indicadores. Desde 2008, países como Portugal, Espanha e Grécia, têm seguido um percurso preocupante. Em 2012, a taxa de desemprego jovem foi, em média e considerando

os

27

Estados-membros,

de

25%.

Espanha

e

Grécia,

comparativamente com 2008, mais do que duplicaram a sua taxa de desemprego Do ponto de vista prático, a UEM significa: a coordenação das políticas económicas dos Estados Membros; a coordenação das políticas orçamentais, nomeadamente através de limites máximos para a dívida e o défice públicos; uma política monetária independente aplicada pelo Banco Central Europeu (BCE); uma moeda única e a zona euro (Vaz Serra, 2012). A expressão Estagnação Económica designa uma situação de crescimento económico nulo ou muito baixo. Apesar de menos grave do que uma situação de recessão económica, a estagnação pode também ter repercussões muito negativas sobre a economia dado que taxas de crescimento económico muito baixas, são geralmente insuficientes para criar novos empregos. De facto, devido à evolução tecnológica e aos consequentes ganhos de produtividade, para que os níveis de emprego do factor produtivo trabalho se mantenha, é necessário um crescimento económico mínimo que absorva esse crescimento de produtividade e origine a necessidade de mais trabalho. 10

10

jovem, apresentando valores historicamente elevados, com 53.2% e 55.3%, respectivamente, em 2012. Já o desemprego jovem, em Portugal e em 2012, atingiu 37.7%, mantendo-se como o terceiro país da UE com a pior taxa de desemprego jovem. Tabela 4: Taxa de Desemprego (%) por grupo etário

Anos

Total

1992 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012

4,10 5,00 6,30 6,70 7,60 7,70 8,00 7,60 9,50 10,80 12,70 15,70

15-24 10,00 11,60 14,50 15,30 16,10 16,30 16,60 16,40 20,00 22,40 30,10 37,70

25-34 4,60 5,60 7,50 7,20 8,90 9,10 9,80 8,70 10,90 12,70 14,00 18,10

Grupo etário 35-44 45-54 55-64 2,70 1,90 1,90 4,00 3,50 3,70 5,10 4,30 4,30 5,50 5,20 5,60 6,50 6,10 6,20 6,30 6,30 6,30 6,70 6,60 6,50 6,70 6,10 6,60 8,50 8,20 7,70 9,80 9,50 8,90 11,00 10,90 13,40 13,00

> 65

0,40 0,60 1,00 1,70

Fonte: INE, inquérito ao emprego Nota: nos anos 2011 e 2012, o INE agrupou os dados no grupo etário entre os 45 e 64 anos.

Através da análise da tabela 4, verifica-se que o aumento do desemprego se faz sentir em todos os grupos etários. Contudo, é nos jovens entre os 15 e 24 anos que esse aumento é mais significativo. Destaca-se, também, o grupo dos 25 aos 34 anos – os jovens adultos - que contribui de forma muito significativa para a tendência de aumento do desemprego, apesar de apresentar valores ligeiramente mais baixos, comparativamente ao grupo dos jovens. Nestes valores, podemos constatar a enorme fragilidade que existe no mercado de trabalho em Portugal, nomeadamente em períodos de crise económica, como a desencadeada a partir de 2008. Em todos os anos, segundo os dados do INE, verifica-se que a taxa de desemprego jovem representa mais do dobro da taxa de desemprego total, o que revela uma grande desigualdade social, pondo em evidência os jovens como o

11

grupo mais sacrificado e vulnerável.

Tabela 5: Taxa de Desemprego Jovem (%), por nível de escolaridade (completo)

Anos

Total

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012

8,60 9,40 11,60 14,50 15,30 16,10 16,30 16,60 16,40 20,00 22,40 30,10 37,70

Nível de Escolaridade Secundário Superior 9,40 10,20 9,50 13,70 9,90 17,80 14,20 23,80 13,70 20,60 15,30 24,30 16,00 29,00 14,80 25,90 14,30 27,30 18,10 24,50 21,30 26,10 27,20 29,00 35,50 39,10

Fonte: INE, Inquérito ao Emprego.

Pela análise da tabela 5, verificamos uma realidade preocupante: os valores do desemprego jovem, ainda que todos extraordinariamente elevados, são sempre, reiteradamente, ao longo dos últimos doze anos, maiores para os jovens com mais habilitações – com o ensino superior - do que para aqueles que apenas concluíram o ensino secundário, o que traduz uma realidade particularmente adversa: o desemprego jovem qualificado. A qualificação da população, nomeadamente dos jovens, deve ser usada como factor de competitividade das economias. Contudo, a realidade mostra que está a verificar-se um grande desperdício a esse nível, com repercussões inevitáveis e graves no presente e futuro do país, para além, naturalmente, nas legítimas e fundadas expectativas e aspirações dos próprios jovens.

12

Tabela 6: Taxa de Desemprego Jovem (5), por Género

Anos

Total

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012

8,60 9,40 11,60 14,50 15,30 16,10 16,30 16,60 16,40 20,00 22,40 30,10 37,70

Género Homens Mulheres 6,20 11,60 7,20 12,10 9,80 13,90 12,40 17,00 13,50 17,60 13,60 19,10 14,50 18,40 13,50 20,30 13,30 20,20 18,70 21,60 21,20 23,70 28,70 31,70 36,40 39,20

Fonte: INE, Inquérito ao Emprego.

Por fim e relativamente à análise do desemprego por género, apresentado na tabela 6, é possível constatar que as raparigas são as mais atingidas por este fenómeno – as mulheres, em Portugal e em 2013, correspondem a 48% da população activa e a 60,4% dos diplomados no Ensino Superior (Pordata) - ainda que não se afastando de forma muito significativa dos valores registados nos rapazes.

CONCLUSÃO

Como pudemos constatar ao longo destas páginas dedicadas à operacionalização do conceito de desemprego jovem, Portugal vive, ainda, o forte impacto da crise iniciada em 2008 que, entre muitos outros factos e circunstâncias, tem no desemprego e, muito em particular, no desemprego jovem, um dos seus indicadores mais adversos, constituindo um dos maiores flagelos das sociedades contemporâneas. Através dos dados apresentados, verificámos que a taxa de desemprego atingiu nos últimos anos números historicamente elevados - ainda que não completamente surpreendentes, para todos os que souberam antecipar as causas e 13

consequências das enormes alterações estruturais ocorridas nos últimos anos afectando vários países da UE, sobretudo a partir de 2008, mas de uma forma muito incisiva os países do sul da Europa. Portugal tem sido um dos países mais sacrificados, com quase 16% da sua população desempregada. Porém, é no escalão dos jovens que estes números assumem valores muito preocupantes. Perto de 40% dos jovens portugueses, entre os 15 e os 24 anos, encontram-se desempregados e sem perspectivas futuras – consistentes e fiáveis - relativamente ao mercado de trabalho. Mais preocupante ainda é o facto de grande parte destes jovens possuir qualificações superiores, o que significa, desde logo, que Portugal não está a conseguir criar oportunidades para os que têm mais habilitações. E diz algo, também, sobre a capacidade de afirmação e as características dos produtos e serviços concebidos, gerados e transaccionados em Portugal e a partir de Portugal, que, numa primeira análise, pela impossibilidade em captar jovens habilitados, deixam transparecer uma fileira de especialização com pouco valor acrescentado. A partir da operacionalização do conceito de desemprego jovem, que demonstrámos neste trabalho, acreditamos ser possível, para além de desejável e urgente, perceber muito bem (e combater) as causas desta chaga social, que é também económica e financeira – ausência de investimento estrangeiro, fiscalidade pouco competitiva e instável, burocratização de processos, efeitos da globalização,

segmentação

do

mercado

de

trabalho,

empregabilidade,

produtividade, métodos e conteúdos de educação e ensino, legislação laboral, entre outras – para podermos actuar (e combater) sobre as suas consequências – risco de pobreza e exclusão social, alterações ao nível da saúde e bem-estar, emigração, demografia, entre outras - e inverter este ciclo desprovido de qualquer movimento virtuoso, gerador de um presente incerto e de um futuro sem esperança. Está, desta forma, lançado, ou relançado, o tema. E a pertinência do conceito.

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