Os Arabismos na Língua Portuguesa [Dissertação de Mestrado]

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Descrição do Produto

Filozofski fakultet Sveučilišta u Zagrebu Odsjek za romanistiku Katedra za portugalski jezik i književnost

Os arabismos na língua portuguesa

Arabizmi u portugalskom jeziku

Diplomski rad

Mentor: mr. sc. Želimir Brala

Student: Antonia de Castro Burica

Zagreb, siječanj 2016.

Índice 1. Introdução .................................................................................................................. 5 2. História de Portugal e da Península Ibérica sob o domínio muçulmano .............. 8 2.1. A conquista muçulmana e o estabelecimento do Emirado de Córdova (711 - 756) . 8 2.2. A consolidação de poder: do Emirado ao Califado (756 - 1031) ............................ 11 2.3. O período de taifas, os Almorávidas, Almóadas e o fim do domínio muçulmano na Península Ibérica (1031 - 1492) .................................................................................... 13 3. Aspetos culturais e socioeconómicos ................................................................... 17 3.1. Composição étnica ................................................................................................. 18 3.1.1. Os árabes ........................................................................................................................................ 19 3.1.2. Os berberes ..................................................................................................................................... 20 3.1.3. Os hispano-romanos, moçárabes e muladís ................................................................................... 21 3.1.4. Os judeus, eslavos e escravos ........................................................................................................ 22

3.2. Divisão geográfica e administrativa e aspetos económicos ................................... 23 3.3. Herança cultural ..................................................................................................... 25 4. Situação linguística ................................................................................................. 26 4.1. Línguas românicas ................................................................................................. 27 4.1.1. Moçárabe ......................................................................................................................................... 28

4.2. Língua árabe .......................................................................................................... 30 4.2.1. Árabe andaluz.................................................................................................................................. 32

4.3. Expansão do árabe ................................................................................................ 33 5. Os arabismos ........................................................................................................... 34 5.1. Contato linguístico e empréstimos ......................................................................... 34 5.2. Arabismos nas línguas românicas da Península Ibérica ........................................ 35 5.3. Arabismos na língua portuguesa ............................................................................ 37 6. Campos semânticos ................................................................................................ 40 a). Técnicas e produtos agrícolas.................................................................................. 42 Guerra e vida militar ...................................................................................................... 42 Indústria e comércio ...................................................................................................... 42 Administração e financia ............................................................................................... 42 Vida social e relações sociais ........................................................................................ 42 Ciências, técnicas, artes ................................................................................................ 42

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Alimentação e culinária ................................................................................................. 42 Compartimentalização espacial e detalhes topográicos ................................................ 42 Habituação (povoamento urbano e rural) e vida doméstica .......................................... 42 Flora e fauna; recursos naturais .................................................................................... 43 Religião.......................................................................................................................... 43 Cores e adjetivos ........................................................................................................... 43 Verbos e instrumentos gramaticais ............................................................................... 43 7. Arabismos no português brasileiro........................................................................ 43 7.1. A época do escravidão no Brasil ............................................................................ 44 7.2. A imigração árabe do século XIX ........................................................................... 45 7.3. Análise dos arabismos no português brasileiro ...................................................... 46 8. Conclusão................................................................................................................. 48 9. Transcrição das palavras árabes ........................................................................... 49 10.Bibliografia .............................................................................................................. 50

1.

Introdução A herança árabo-islâmica da Península Ibérica deixou um rasto inapagável e

potente no curso da história. Até nem tanto tempo para trás, muitos percebiam o capítulo do domínio muçulmano na história ibérica como uma invasão e colonização por parte de um conquistador, apesar dele ser culto e refinado. Muitas obras históricas acentuavam a natureza militar da época e marginalizavam a importância da transferência de sabedoria. A Reconquista foi retratada como uma guerra santa, sancionada por Deus e os seus nomeados na Terra, um ato de purificação da Península duma religião inimiga e uma cultura oriental e estrangeira que não tinha permissão para existir no solo europeu. O nacionalismo crescido nas costas da promessa duma terra católica, governada por reis e povos europeus e católicos, atingiu um fanatismo que incitou numerosos descendentes de muçulmanos e não-europeus a falsificar inteiras linhagens e genealogias e borrar a identidade que começou a ser marcada negativamente. Esta imagem negativa do período muçulmano perdeu em força no âmbito académico e hoje podemos contar com uma abordagem mais objetiva, científica e académica. O século anterior introduziu tentativas sérias para reexaminar o mundo árabe-islâmico da Península Ibérica e dar-lhe a importância que merece. A historiografia começou a reanalisar os textos e documentos da época, a filologia e linguística exploraram a história através das palavras e estrutura das línguas que coexistiam e evoluíram juntas no tempo e espaço, a antropologia revisou a imagem dos povos da Península, da identidade árabe, berbere e românice. Nunca mais poderemos negar o esplendor da civilização muçulmana, o elevamento cultural e científico que ela motivou, os grandes nomes como Maimónides ou Averróis que acharam na Ibéria um âmbito livre e estimulante para promulgar as suas ideias e enriquecer o pensamento humano. O nosso objeto de interesse neste estudo será a língua e trataremos de presentar um vislumbre da história e cultura desta época através dos vestígios linguísticos que até hoje permanecem visíveis nas línguas românicas da Península Ibérica. Em alguns casos não é tão fácil discernir a origem estrangeira de algumas palavras, o que nos mostra como estas palavras se integraram perfeitamente nas línguas acolhedoras. Hoje a maioria dos estudos concentram-se nos arabismos que ocorrem na língua castelhana, como ela tem o maior numero de palavras árabes emprestadas. Este

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estudo interessar-se-á com os arabismos na língua portuguesa, e mesmo que estes arabismos contassem um número menor do que em castelhano, isto não indica que a sua influência fosse menor. Não há dúvida que os arabismos enriqueceram a língua portuguesa em vários aspetos. O que é importante é que este processo ainda não acabou: o contato entre o árabe e o português curiosamente persiste durante todos estes séculos, mudando só de contexto temporal e local. Muitos autores dedicaram-se ao estudo dos arabismos portugueses e os seus trabalhos estabeleceram a maioria das etimologias. O mais difícil trabalho que permanece é a datação dos arabismos e o estabelecimento das vias de ingresso, como nem todos os arabismos são resultados dum contato direto entre o árabe e o português. Dependeremos destes trabalhos e em particular dos estudos mais recentes conduzidos por académicos brasileiros que deram um novo ímpeto ao estudo dos arabismos brasileiros. O primeiro capitulo é uma descrição da história da Península Ibérica desde o tempo do início do domínio muçulmano até a queda de Granada, a última cidade muçulmana no solo europeu. Este período de oitocentos anos criou uma era histórica repleta de convulsões, conflitos e convivência. O segundo capítulo introduz alguns aspetos culturais e socioeconómicos que marcaram este período da história, descreve a composição étnica e religiosa, o tipo de administração e organização territorial e administrativa e oferece algumas informações sobre a herança cultural que resultou do contato entre a civilização europeia e a civilização árabo-islâmica. O terceiro capítulo descreve a situação linguística do tempo, as mais importantes línguas no território ibérico e as relações dinâmicas entre elas: o árabe, as línguas românicas e os resultados deste contato, o dialeto árabe andaluz e o idioma moçárabe, ambos importantes como pontos de transferência de arabismos às línguas europeias. O quarto capítulo relata aos arabismos, a natureza do contato linguístico em geral e como ele evoluiu no tempo e local do nosso interesse. Descreve primeiro os arabismos nas línguas românicas da Península Ibérica, principalemente em castelhano, e depois os arabismos da língua portuguesa.

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O quinto capítulo usa o modelo de campos semânticos, a maneira clássica nos estudos de arabismos, ligando a língua com os fatores externos e mostrando quais são os aspetos da vida mais influenciados pela língua árabe. O sexto capítulo introduz um relato sobre os arabismos brasileiros, oferecendo em breve informações sobre este "novo" contexto temporal e o local onde aconteceu (ou continuou) o contato entre o árabe e o português, desde o tempo do Brasil esclavagista e o período do influxo dos imigrantes arabófonos. Para falicilitar a anotação das palavras da língua árabe, incluímos no último capítulo como apêndice uma tabela com o sistema de transcrição fonética usado neste trabalho.

Antonia de Castro Burica - Os arabismos na língua portuguesa

2.

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História de Portugal e da Península Ibérica sob o domínio muçulmano A história de uma língua é inseparavelmente ligada com a história da sua

comunidade de falantes. Estas comunidades podem entrar em contato e assim as suas línguas respetivamente entram em contato, oferecendo um desafio complexo para os que analisam estes fenómenos. Começaremos a descrição da história do contato linguístico entre o português e o árabe com um traçado da história do Portugal, ou o território que depois viria a ser o Reino de Portugal. Este período histórico corresponde ao tempo desde a chegada das primeiras

tropas

lideradas

por

comandantes

muçulmanos

no

começo

do

século VIII até a queda de Granada, a última cidade muçulmana. Estes oitocentos

anos

houveram

par

de na

desenvolvimento

Europa

deste

cultural,

tempo,

mas

científico

e

artístico

também

incluíam

não

guerras,

conflitos, rivalidades e competições de poder que levaram ao declínio da civilização árabo-islâmica e afinal o seu desaparecimento do solo Ibérico. No capítulo seguinte brevemente descreveremos a história política do território

português

acontecimentos

e

no

tempo

do

personalidades

domínio mais

muçulmano

importantes

e

que

traçaremos marcaram

os este

período, seja no território português ou no resto da Península Ibérica. A divisão de capítulos corresponde à três períodos marcados por diferentes situações políticas na Península. O primeiro capítulo descreve a chegada dos primeiros conquistadores e a formação do Emirado em Alandalus. O segundo capítulo relata sobre a governo da dinastia dos Omíadas e o estabelecimento do califado. O terceiro capítulo descreve o período das taifas e a Reconquista cristã que trouxe a fim o domínio muçulmano na Península Ibérica.

2.1. A conquista muçulmana e o estabelecimento do Emirado de Córdova (711 - 756)

A história do contato entre o português e o árabe começou com a chegada

das

primeiras

tropas

lideradas

por

comandantes

muçulmanos

no

começo do século VIII. Foi em Julho de 711 que o general Tāriq ibn Ziyād, 1

1

Tabém Tárique. Tāriq estava sob a autoridade de Mūsā ibn Nuṣayr, general em serviço dos Omíadas e governador do Norte da África.

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com um exército de aproximadamente 7 mil berberes, 2 recém-convertidos ao islão, atravessaram o Estreito de Gibraltar e desembarcaram no sítio que até hoje leva o nome do general. 3 A conquista muçulmana do Norte da África começou alguns anos depois da morte do profeta Maomé, 4 dando início no Egito e terminando em Ibéria. Foi uma proeza extraordinária lograda em menos de cem anos. Cem anos depois da morte do Maomé, os muçulmanos conquistaram a área desde o oceano Atlântico e a costa de Portugal, até e incluindo a Transoxiana na Ásia Central e o que hoje é o Afeganistão. A chegada do primeiro exército muçulmano marcou o começo da queda do estado visigótico, que neste tempo estava em poder na Península Ibérica. Os visigodos

eram

um

povo

germânico,

oriundos

do

leste

europeu,

que

contribuíram à queda do Império Romano do Ocidente durante a migração dos povos bárbaros e na Península Ibérica fundaram um reino que sobreviveu desde 418 até a chegada dos muçulmanos. Enfraquecido por numerosos conflitos internos, contendas entre a nobreza e insatisfação dos seu sujeitos românicos e escravos, o estado visigótico mostrou-se como uma presa fraca para os muçulmanos motivados em novas conquistas territoriais. 5 O exército do rei visigótico Rodrigo, conhecido em legendas como o "último rei dos Godos", foi derrotada perto de Algeciras. 6 Alguns meses depois caiu Toledo, a capital visigótica. A conquista da Lusitânia 7 começou em 713. Até o ano 715, a maior parte da Península foi conquistada, incluindo o atual território de Portugal, cuja conquista foi efetuada pela tomada de Beja e Ossónoba (Faro) em 712 e Évora, Santarém, Lisboa e Coimbra em 714. Só a área do noroeste da Península, o que hoje é a atual província espanhola de Astúrias e o País Basco,

não

foi

conquistada

pelos

muçulmanos,

com

exeção

de

abruptas

incursões e assaltos. As cidades portuguesas de Portucale (Porto) e Braga

2

Berberes ou Imazighen, "homens livres", como chamam a sí próprios, refere-se a um conjunto de povos do Norte da África, na área extendindo do oceano Atlântico até a Oásis de Sīwa em Egito. Até hoje compreendem vários grupos étnicos e pertencem à área linguística das línguas berberes. 3 O nome Gibraltar é derivado da construção árabe ǧabal el- Tāriq, significando "a montanha de Tāriq". 4 Muḥammad (570 - 632), líder religioso e político, segundo o islão o último profeta de Deus. 5 HITTI, P. K. (1946) History of the Arabs. 3rd Ed. London: Macmillan and Co., p. 498 6 No sul da Espanha, 20 quilometros de Gibraltar. 7 Nome da antiga província romana no oeste da península Ibérica. Incluía a parte do território português a sul do rio Douro, parte da província de Salamanca e a Estremadura espanhola.

Antonia de Castro Burica - Os arabismos na língua portuguesa

resistiram

e

como

castigo,

cidades. 8 A resistência

os

10/55

muçulmanos

saquearam

cristã depois formou

as

o núcleo de

arredores

das

onde partiu

a

Reconquista da Península, traçando o seu caminho do norte até o sul. Os muçulmanos continuaram a avançar e atravessaram os Pirinéus. O último ponto que alcançaram foi na sul da França, entre as cidades de Tours e Poitiers que foram defendidas em 732 pelo general Carlos Martel, o futuro fundador do Império Carolíngio. A nova terra dos muçulmanos ganhou o nome de al--ʾAndalus, 9 um nome que até hoje não tem uma etimologia completamente clara. A maioria dos autores relacionam o termo com a palavra árabe que designava a "terra dos Vândalos", que são por efeito os Godos e outros povos germânicos que se situavam na Península. Corriente 10 propõe para os falantes lusófonos o emprego do termo Alandalus, para diferenciá-lo do nome da atual região sul da Espanha, a Andaluzia. O termo Alandalus foi documentado pela primeira vez em 716, 11 numa moeda bilingue onde o nome latim da Espanha (Span), corresponde ao termo árabe al-Andalus. O território atual de Portugal tornou-se parte da

província

chamada

Ġarb

al-ʾAndalus

("o

Ocidente

de

al--ʾAndalus"),

aproximadamente refletindo as fronteiras da Lusitânia romana. Os muçulmanos nunca mostraram muito interesse pelos terrenos montanhosos do nordeste de Portugal (Trásos-Montes e Beira Alta) e concentraram-se principalmente no sul. No seu início, Alandalus foi organizado como emirado, 12 com um governador quase independente, sob a autoridade nominal do governador de Magrebe. 13 O primeiro governador ʿAbd alAzziz escolheu como capital Sevilha, que depois for transferida em Córdova. O Ġarb alʾAndalus nunca era uma província distinta nem gozou de uma autonomia administrativa ou qualquer grau de descentralização da sede de poder, e por isso nunca desenvolveu uma tradição histórica própria, distinta da história coletiva de Alandalus.

8

14

STANISLAWSKI, D. (1959) The Individuality of Portugal: A Study in Historical-political Geography., cap. 10 9 Ár. al-ʾAndalus. 10 CORRIENTE, F. (2006) Romania Arábica: uma questão não resolvida de intrferência cultural na Europa Ocidental. p.4. 11 MATTOSO, J. (1993) Historia de Portugal. p. 363 12 Do árabe ʾimārah. É um território político governado po um emir (ár. amīr, "príncipe"), geralmente membro da classe dominante, como hoje os emirados de Kūwayt ou Qaṭar. 13 Do ár. Al-Maġreb ("a terra do oeste") tradicionalmente incluía a região do noroeste da África desde a fronteira ocidental do Egito até o oceano Atlântico. 14 DISNEY, A. (2009). A history of Portugal and the Portuguese empire. p. 241.

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O primeiro grande evento que mudou o curso da história de Alandalus foi a

queda

da

Abássidas. 16

dinastia Só

dos

houve

Omíadas 15

um

em

sobrevivente

750, da

que

foi

família

substituída

omíada

pelos

depois

do

massacre executado pelos Abássidas - o jovem ʿAbd al-Raḥman, 17 que depois de cinco anos de exílio finalmente chegou à Ibéria onde foi recebido pelos comandantes locais lá estacionados. Em 756 ʿAbd al-Raḥman venceu as tropas de Yūsuf al-Fihri, o emir de Alandalus, na batalha às margens do rio Guadalquivir. Depois que ʿAbd al-Raḥman tomou o título de emir, iniciou-se em

763

uma

diferentes

série

tribos

sunitas e xiitas.

de

árabes,

revoltas

locais

guerreiros

no

sudoeste

berberes

e

da

Península,

denominações

entre

islâmicas

-

18

A chegada de ʿAbd al-Raḥman marcou um novo período na história de Alandalus. A

dinastia omíada

de Córdova

e o

Emirado que

ele

fundou

governarão uma grande parte da península durante quase três séculos, e nesse ínterim o império atingirá o seu auge cultural e enfrentará numerosas dificuldades que com tempo iriam levar ao seu inevitável declínio.

2.2. A consolidação de poder: do Emirado ao Califado (756 - 1031)

Desde

o

estabelecimento

do

Emirado,

a

península

viu

numerosas

revoltas contra a poder central do emir. As maiores revoltas aconteceram durante

o

governo

do

emir

al-Ḥakam

I, 19

quando

começou

uma

grande

insurreição de berberes em 814, o que resultou com a primeira expulsão da comunidade berbere para a África. Durante o governo do emir ʿAbd alRaḥman

II 20

surgiram

revoltas

nas

províncias

do

norte,

em

Aragão,

no

sudoeste da Galícia, em Sevilha e Murcia e na região no sul de Régio. Neste

15

Os Omíadas (ár. el-ʾŪmawiyyūn) estavam em poder califal desde 661 até 750, durante qual o califado cobria a mais larga área durante a sua história. Foi este o segundo dos quatro califados estabelecidos depois da morte do profeta Maomé. 16 Os Abássidas (ár. el-ʿAbāssiyyūn) estabeleceram o terçeiro califado, depois de destronar a dinastia dos Omíadas em 750. Ficaram em poder efetivamnte até 1258, quando o cã mongólico Hulegu saqueou a capital em Bagdá. 17 Também Abderramão I. 18 DISNEY, A. (2009). A history of Portugal and the Portuguese empire. p. 146. 19 796-822. 20 822-852.

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período de lutas internas, os cristãos, estabelecidos no extremo norte da península, conseguiram a mobilizar-se e avançar ao sul do Douro e em 878 tomaram dos muçulmanos a cidade de Coimbra. Com a chegada do emir ʿAbd al-Raḥman III 21 no poder em 912, começou o

período

de

superioridade

militar

e

política

e

difusão

duma

cultura

e

civilização distintamente andaluza. ʿAbd al-Raḥman III reclamou as províncias que o Emirado perdeu durante o período de conflitos internos, como Sevilha, Régio e Toledo. Com tempo, o seu poder expandiu através do Estreito de Gibraltar e incluiu a província de Ceuta 22 em Marrocos. Em 920, comandou uma expedição ao norte para quebrar o poder militar dos senhores cristãos, o que conseguiu na batalha de Valdejunquera contra as forças do rei de Leão, Ordonho II 23 e Sancho Garcês I, 24 penetrando Navarra e Aragão até a cidade de Pamplona. As regiões cristãs do norte enfraqueceram e perderam o que tinham de poder militar ou influência política. No ano 929 ʿAbd al-Raḥman proclamou-se califa 25 do Califado de Córdova. As suas campanhas militares continuaram até 939, quando depois de 27 anos de contínuas triunfos foi vencido na batalha de Simancas pela força combinada do Rei Ramiro II de Leão 26 e a Rainha Toda Aznares, a viúva do Sancho Garcês I. 27 O tempo de ʿAbd al-Raḥman III, o seu sucessor al-Ḥakam II 28 e depois de

al-Manṣūr

considera-se

como

o

período

de

máxima

prosperidade

do

Califado. A corte omíada era uma das mais luxuosas da Europa e os califas iniciaram

numerosos

projetos

arquitetónicos,

especialmente

na

capital

de

Córdoba, erguendo mesquitas, banhos públicos, hospitais e escolas. Eram mecenas de artes e ciências. Junto com o Constantinopla, a capital do Império Bizantino e Bagdá, neste tempo a sede do Califado dos Abássidas, Córdoba era uma das três sedes culturais do mundo.

21

Ou Abderramão III, 8º emir de Córdova (912-929) e 1º califa de Córdova (929-961). Hoje uma cidade autónoma espanhola na margem africana, enfrentando a cidade de Algeciras em Espanha. 23 Rei da Galiza e Leão (871-924). 24 Rei de Pamplona (ca. 860-925). 25 Do ár. xalīfah. Título político para o governador de um califado (ár. xilāfah), o equivalente da monarqía em termos políticos islâmicos. 26 900-965. 27 876-958. 28 Ou Aláqueme II (915-976). 22

Antonia de Castro Burica - Os arabismos na língua portuguesa

ʿAbd

al-Raḥman

III

promovia

uma

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forte

centralização

e

consolidação

política e territorial do Califado, o que levantou em poder a instituição do hāǧib, isto é, prefeito do palácio califal e funcionário do governo. O mais poderoso deles foi o hāǧib al-Manṣūr ibn Abi ʿĀmir, 29 que tomou o poder completo do jovem califa Hišām II. 30 Ele tornou-se de facto califa, mantendo o Hišām II longe do palácio e da poder e deixando-lhe apenas uma importância nominal. As suas conquistas militares incluiram o noroeste do litoral norte africano e territórios

no

Retomou

a

Campostela,

norte cidade

da

península,

de

movendo

Coimbra a

e

fronteira

incluindo destruiu entre

o

Zamora, o

Barcelona

santuário

território

em

cristão

e

Leão.

Santiago e

o

de

Califado

novamente até o rio Douro. Depois da morte de al-Manṣūr em 1002 o califado caiu num período de guerra civil entre os apoiantes do Hišām II e os sucessores do al-Manṣūr. O período de fitna 31 (ár. Fitna al-ʾAndalus) oficialmente começou em 1009. O Califado foi finalemente abolido com o destronamento do seu último califa

Hišām

III. 32

O

território

do

Califado

dividiu-se

em

várias

taifas, 33

principalidades independentes que continuaram o conflito de poder.

2.3. O período de taifas, os Almorávidas, Almóadas e o fim do domínio muçulmano na Península Ibérica (1031 - 1492)

O Ġarb al-ʾAndalus foi dividido em duas grandes taifas, a de Badajoz e de Sevilha, e quatro taifas menores: Faro, Mértola, Silves e Huelva. Até o médio do século XI só as mais grandes taifas sobreviveram, as de Badajoz e Sevilha, absolvendo as demais. 34 Badajoz foi fundado em 1009 e incluía o sul e

centro

do

Portugal

e

era

governado

pela

família

Banū

al-ʾAfṭas,

clã

proveniente da dinastia dos Abássidas. Em 1039 Lisboa tornou-se parte de Badajoz. A taifa de Sevilha foi fundada pela família de Banū ʿAbād em 1023 e

29

Ou Almançor (ca.938-1002). Filho e sucessor do al-Ḥakam II (966-1013). 31 Do ár. fitna ("divisão, guerra civil"). 32 1026-1031. 33 Do ár. ṭā'ifa ("facção"). 34 Disney, A. R.: A History Of Portugal And The Portuguese Empire. New York: p. 148. 30

Antonia de Castro Burica - Os arabismos na língua portuguesa

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incluía o Algarve e o sul de Alentejo. As suas campanhas expansionistas enfraqueceram

bastante

a

taifa

de

Badajoz.

Aproveitando

a

fragmentação

política do território muçulmano, os reinos cristãos começaram avançar do norte e construíram um poder militar que com tempo destruirá completamante o poder militar muçulmano. Desde 1055 os governadores de Badajoz e Sevilha foram obrigados a pagar tributos ao reino de Leão e Castela. Os cristãos avançaram até a linha do Mondego, tomando Lamego, Viseu e Coimbra. Em 1085 caiu também Toledo, a antiga capital dos Visigodos e uma das primeiras cidades que caíram sob o domínio muçulmano quase 400 anos atrás. Os reis de Badajoz e Sevilha, vendo que os cristãos estão a avançar sem grande resistência das taifas enfraquecidas por conflitos entre si mesmas, decidiram pedir auxílio à um poderoso governador norteafricano, Yūsuf ibn Tāšfīn, 35 chefe da dinastia dos Almorávidas, 36 cujo império estendia desde o rio Senegal até a costa do Mediterrâneo e durou desde 1040 até 1147. A vinda dos Almorávidas em 1086 marca o último período do Portugal e da Ibéria muçulmana. Ibn Tāšfīn conseguiu, com o seu exército de berberes, derrotar as tropas do rei de Leão e Castela Alfonso VI na batalha de Zalaca. 37 Ibn

Tāšfīn

voltou

para

Marrocos

como

vencedor,

mais

no

ano

seguinte

atravessou o Gibraltar mais uma vez, mas como conquistador. Em 1090 derrotou Granada e depois Sevilha. O último rei da taifa de Sevilha, alMuʿtamid, 38 que recorreu a ibn Tāšfīn quatro anos atrás, foi deportado pelo chefe almorávida com a sua família em 1092 para a África. A sua taifa caiu em poder dos Almorávidas e o mesmo aconteceu com a taifa de Badajoz, que foi ocupada em 1094. Os Almorávidas eram originalmente uma fraternidade religiosa fundada nas meadas do século XI e rapidamente expandiram o seu governo pelo nordeste da Africa e finalmente Alandalus. Reteram o título de emir, mas

35

Em governo desde 1061 até 1106, também o fundador da cidade de Marrakesh, a capital do seu império. 36 Do árabe al-murābiṭūn ("guarda de fronteira, eremita, homem religioso"). 37 Também chamada a batalha de Sagrajas. 38 1061 -1091.

Antonia de Castro Burica - Os arabismos na língua portuguesa

reconheciam

a

autoridade

suprema

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da

corte

Abássida

em

Bagdá.

A

austeridade religiosa e intolerância que marcava o período almorávida em Alandalus

resultou

em

crescente

insatisfação

dos

muçulmanos

e

outros

grupos religiosos e étnicos. O herdeiro do Yūsuf Ibn Tāšfīn, o ʿAlī ibn Tāšfīn, expulsou a antiga comunidade de moçárabes em 1126. Neste tempo o poder almorávida já começou a enfraquecer e a dissolução dos Emirado Almorávida em 1144 resultou novamente em aparecimento de taifas, marcando assim o segundo período de taifas. No mesmo tempo, as tropas do recém-criado reino de Portugal começaram o seu avanço para o Sul muçulmano (1139-1147). Em 1170 em Coimbra, o primeiro rei de Portugal e o seu fundador, Dom Afonso Henriques, 39 concedeu um foral aos muçulmanos livres que viviam no território

que

ele

tomo

(como

Lisboa

e

Alcácer

do

Sal),

garantindo-lhes

liberdade de religião, proteção e conservação de propriedades, por meio de que paguem os impostos necessários. 40 Os

Almóadas 42

eram

a

41

dinastia

seguinte

no

palco

da

história

de

Alandalus. Uma ordem político-religiosa como os seus antecessores, nasceu da ideia do eremita Ibn Tūmart, 43 líder religioso dos berberes do Alto Atlas, e ganhou poder militar através do general ʿAbd al-Muʾmin ibn ʿAlī 44 depois da morte de Ibn Tūmart. Conseguiram derrotar os Almorávidas, conquistaram a capital em Marrakesh em 1149 e impuseram a sua poder na Península, tratando de unificar as taifas e criar um governo islâmico capaz de enfrentar os cristãos, o que os seus precedentes os Almorávidas não conseguiram. Assim aconteceu que pela primeira vez em história muçulmana a Andalusia achou-se firmemente unificada com o litoral do norte da Africa, num império que incluía o norte da África até a fronteira com o Egito e o sul da península Ibérica.

39

Ou Dom Afonso I. 1143-1185. Em verdade, esta legislação é nada mais do que uma adaptação daquela implementada pelos soberánios muçulmanos aos seus sujeitos cristãos e judeus. Depois também serviu como modelo para as legislações posteriores tratando a minoria muçulmana. 41 KEMNITZ, E.-M. VON (1996) A construção de uma nova sociedade: o caso específico da minoria moura. p. 4. 42 Nome derivado do árabe al-muwaḥḥidūn ("os monoteistas, os unificadores"), refletindo o natureza fundamentalista do movimento religioso que criou a dinastia. 43 1080-1130. 44 Líder militar desde 1128 até 1146, califa almóada desde 1146 até 1163. 40

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A chegada dos Almóadas marca o fim do período das segundas taifas e também o fim da época muçulmana na história da Península. O avanço das tropas cristãs para o sul mostrou-se irreversível, apesar das tentativas do Almóadas. No mesmo ano que a cidade de Marrakesh foi tomada, os cristãos conquistaram Santarém e Lisboa. A Reconquista, já neste tempo com este nome, gradualmente começou ganhando um caráter de guerra santa, seguindo o modelo das Cruzadas que se iniciaram no fim do século XI e inspirada por fanatismo religioso, ambições territoriais e a promessa de pilhagem. A Reconquista oficialmente começou em 718, quando o nobre godo, Don Pelágio das Astúrias, 45 reprimiu o avanço das tropas muçulmanas na batalha de Covadonga. O processo de reclamação do território foi acelerado desde a união de Castilha e Leão, e até o fim do século XIII a reconquista foi praticamente completa, com os grandes centros de Toledo, Córdova e Sevilha de novo em mãos cristãs, deixando assim só Granada ainda sob o domínio muçulmano. As campanhas militares dos Almóadas não conseguiram parar o avanço da Reconquista. En 1212 um exército de Castelhanos, Portugueses, Aragoneses e Navarros derrotou as tropas muçulmanas na batalha de Navas de Tolosa. Esta batalha é uma das mas famosas batalhas da Reconquista e provavelmente o ponto de inflexão no curso da história. Um curto período de governo da dinastia dos Naṣridas

46

tinha a Granada como a sua capital,

mas reconheceram a autoridade suprema da coroa castelhana. Durante este tempo Granada ganhou as suas caraterísticas arquitetónicas mais famosas, como o palácio real de Alhambra. 47 Em Portugal, a Reconquista durou alguns cinco séculos. O avanço da Reconquista levou à queda de Badajoz pelos Leoneses em 1229, Beja e Aljustrel em 1234 e Mértola em 1238 pelos Portugueses. Até 1242 Portugal já tinha sob a sua dominação a maioria do Ġarb al-ʾAndalus. O rei português Dom Afonso III 48 em 1248 declarou-se rei de Portugal e o Algarve - este Reino vai continuar com o mesmo nome até a proclamação da República em 1910, marcando assim a individualidade do Algarve como um território político e

45

Fundador e o primeiro monarca do Reino das Astúrias (718-737). Banū Naṣr, a última dinastia muçulmana ibérica, governava o Emirado de Granada desde 1283 até 1492. 47 Do ár. Al-Ḥamrā ʾ ("a vermelha"), indicando à cor do material usado para a construção. 48 1248-1279. 46

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histórico, "um reino separado do Reino de Portugal, mas ao mesmo tempo nele integrado". 49 Em 1469 o matrimónio entre o rei Fernando de Aragão e a Isabela I de Castela unificou permanentemente as duas coroas e os dois reinos castelhanos, o que será o núcleo da Espanha moderna. Em 1492, o ano que marca por várias razões e acontecimentos o fim oficial da Idade média, Fernando entrou em Granada com o seu exército castelhano. O último rei muçulmano na Ibéria, Boabdil 50 da dinastia Naṣrida rendeu a cidade ao exército superior. Apesar de prometer à população muçulmana uma âmbito de tolerância religiosa, o cardinal Ximénez de Cisneros, chefe da Reconquista da Igreja Católica, começou com a forçada conversão da população muçulmana e judia ao catolicismo, acompanhada por destruição da vasta herança literária muçulmana. O último ato de expulsão foi assinado em 1609 pelo rei Filipe III, resultando numa deportação forçada de praticamente todos os muçulmanos restantes da Península.

3.

Aspetos culturais e socioeconómicos Alandalus foi desde o seu início um lugar onde se encontraram e conviveram três

religiões abrâmicas - o islão, o cristianismo e o judaísmo. Esta convivência 51 criou um ambiente que estimulou o desenvolvimento de estudos científicos em vários ramos, incluindo a medicina, química, astrologia, matemática, junto com importantes obras de filosofia, literatura e artes. Este era o tempo de grandes nomes como Ibn Xaldūn e Averróis, quais vamos descrever brevemente no capítulo seguinte. As contribuições humanísticas e científicas dos muçulmanos de Alandalus são essenciais para entender a história do contato entre a língua árabe e a língua portuguesa e o vocabulário de origem árabe que o português emprestou.

49

OLIVEIRA-LEITÃO, A. (2008) Do Garb al-Ândalus ao «segundo reino» da «Coroa de Portugal»: território, política e identidade. p.70 50 Abū ʿAbdallah Moḥammad XII,1482-1492. 51 O termo de convivência é especialmente popular na literatura espanhola, marcando o período do domínio muçulmano em Espanha, também extendindo no inteiro território ibérico sob o domínio muçulmano, até a conquista de Granda e expulsão dos Judeus em 1492. Foi um período de relativa paz entre as três religiões e tolerância religiosa do ponto de vista dos soberanos muçulmanos, o que opõe a situação depois de 1492, quando as autoridades espanhois e portuguesas levaram a cabo o período de tolerância e a Inquisição fazia conversões forçadas de judeus e muçulmanos ao catolicismo.

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3.1. Composição étnica

A população dos territórios sob a dominação muçulmana gozava de uma diversidade rara, em comparação com qualquer situação no solo da Europa neste tempo. Quando os primeiros árabes e berberes chegaram à Península, acharam-na já habitada por uma população nativa. O número exato desta populaçãp é difícil de estimar, como antes da chegada dos árabes e os seus modos de administração e governo, nunca foi efetuado nenhum censo de população. No tempo da chegada de ʿAbd al-Raḥman I em 756 a população árabe estimava-se aproximadamente entre 50 e 60 mil de pessoas, enquanto a população indígena, os hispano-romanos e godos, contavam entre 5 e 6 milhões de pessoas. 52 A chegada dos árabes desfez as instituições sociais existentes e eliminou a poder dos grupos privilegiados da aristocracia e o clero visigótico, melhorando assim a condição de vida para as classes baixas.

Dois processos importantes influenciaram a criação de sociedade e cultura distintivamente andaluza: a arabização e a islamização. Ambos aconteceram em diferentes degraus em todos os territórios conquistados pelos muçulmanos e geralmente coincidem no mesmo tempo, mesmo que a intensidade e os resultados dependem de vários fatores, um dos quais é a cultura receptora. A islamização é, segundo M. S. Alves Conde, "um fenómeno de essência cultural, não militar, lenta, gradual e irreversível."

53

Assim podemos opor os convertidos de origem nativa que

adotaram a nova religião, costumes e língua, assimilando-se completamente na sociedade muçulmana, e a comunidade dos moçárabes, que não adotaram a religião, mas aceitaram a língua e os costumes seculares, observando o diferente nível de islamização

que

ambas

comunidades

sofreram.

O

processo

de

arabização

acompanhava a islamização e desenvolvia-se ao longo de cinco séculos do domínio

52

ZAYED, A. S. M. (1993) Datos dialectales andalusíes (gramaticales y léxicos) en algunos documentos tardíos granadinos y moriscos. p. 10. 53 CONDE, M. S. A. (1997) Ocupação humana e polarização de um espaço rural do Garb-al-Andalus: o Médio Tejo à luz da toponímia arábica. p. 4.

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muçulmano. O que mais acelerou a arabização da sociedade eram os casamentos mistos, e a partir da 3ª e 4ª geração a maioria da população considerava-se bilingue.

54

Para melhor entender estes processos e ligá-los com a difusão linguística, vamos descrever em breve a composição étnica da Península Ibérica sob o domínio muçulmano.

3.1.1.

Os árabes

Os árabes eram a comunidade dominante e soberana do novo sistema social que se criou com o estabelecimento do Emirado de Córdoba. Embora constituíssem o grupo mais numeroso, nunca eram um grupo etnicamente homogéneo. Os árabes chegaram à Península em várias ondas e como membros de várias tribos, o que durante a história de Alandalus irá gerar conflitos entre os seus descendentes. Os primeiros árabes que chegaram eram os iemenitas eum ano depois da chegada do Ṭāriq ibn Ziyād ocuparam a região de Silves no sul de Portugal. Muçulmanos provenientes do Egito estabeleceram-se perto do Faro e em Beja.

55

A chegada dos

árabes sírios, que se estabeleceram no sul da Península (nas regiões de Beja e no Algarve), provocou conflitos com os que tinham chegado antes. A maioria dos árabes habitaram a região da vale do rio Guadalquivir. Desde o início os árabes eram inferiores em número, comparado com os berberes. Mesmo assim, os árabes sempre representavam a parte superior da divisão social deste tempo, ocupando posições altas de governadores, comerciantes internacionais, administradores e proprietários de terrenos importantes. A aristocracia muçulmana, seja de origem árabe ou convertidos do cristianismo, vivia nas cidades e em centros de poderes onde tinham acesso à administração local. Ao longo dos séculos, os árabes misturaram-se com o resto da população da Península, os beberes, hispano-romanos ou godos, criando assim uma mistura que serviu como base à uma civilização que vários autores chamam de hispano-árabe. Os árabes influenciaram a

54

KEMNITZ, E.-M. VON (1996) A construção de uma nova sociedade: o caso específico da minoria moura. p. 3. 55 STANISLAWSKI, D. (1959) The Individuality of Portugal: A Study in Historical-political Geography. cap. 10

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vida e história da Península em vários modos: através da língua, formas literais, trajes, modo de vida, cerimónias de culto, arquitetura sacra e profana etc. Junto com as comunidades moçárabes e muladís, as quais descreveremos no capítulo seguinte, existia uma comunidade de muçulmanos que, depois de cair sob o domínio cristão após do avanço da Reconquista, ganharam permissão de manter as suas leis cívicas e a sua religião, com tempo deixaram de usar a língua árabe, converteram à fé cristã e assim assimilaram-se com a sociedade cristã. Estes muçulmanos chamavam-se mudéjar. 56 Os seus descendentes que adotaram a fé cristã depois do fim do último reino muçulmano no solo ibérico, os mouriscos, 57 eram sujeitos à vários atos de expulsão e perseguição, o último que ocorreu em 1727 em Granada. Os mudéjar contribuíram à preservação das tradições e costumes de origem árabe e islâmica no Portugal cristão e vários filólogos buscam na herança linguística dos mudéjar as vias de transmissão de arabismos às línguas românicas ibéricas.

3.1.2.

Os berberes

Os berberes dominavam em número nos primeiros exércitos invasores muçulmano. Como os árabes, migraram à Península em várias ondas até o século XII. Eram nominalmente vassalos dos árabes, mas não povoavam os mesmos territórios férteis dos seus soberanos, nem as regiões em vizinhança das capitais e centros de podere. Assim as áreas interiores da Península, montanhosas e desfavorecidas até pelas comunidades indígenas, tornaram-se terras dos berberes. No Ocidente, a região do Algarve continha a maior comunidade berbere, conforme os historiadores árabes.

A maioria dos berberes provieram de tribos nómadas. Ao estabelecer-se na Península, alguns continuaram viver instalados em campos militares e assim ficaram mais resistentes aos contatos com a população sedentária das cidades em Alandalus. O resto dos berberes sofreu uma arabização forte e moveu para os centros urbanos.

56

Do ár. mudaǧǧan ("doméstico, domesticado"), que também é nome dum estilo aruitetónico que desenvolviu-se entre os séculos XII e XVI nos territórios cristãos da Península Ibérica, incorporando elementos do estilo hispano-muçulmano. 57 Nome derivado do termo mouro.

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No princípio, os hispano-romanos e godos chamavam os berberes de mouros, uma palavra proveniente do latim maurus. Em breve esta palavra começou a significar qualquer muçulmano, seja ele de origem árabe ou berbere.

3.1.3.

Os hispano-romanos, moçárabes e muladís

Durante todo o período do domínio muçulmano os povos indígenas da Península eram a comunidade mais numerosa. Uma das caraterísticas mais importantes que os diferenciava era a religião cristã. A barreira religiosa começou a dissolver-se especialmente à partir do século X, quando surgiu uma tendência de conversão ao islão. Este processo de islamização, que também influenciou a comunidade berbere, era "lento e gradual", como diz Jose Mattoso. 58 A conversão foi motivada por vários fatores sociais e culturais. Os mais importantes foram a integração e assimilação social e a evitação de pagamento da ǧizya, um imposto cobrado a uma parte de cidadãos não muçulmanos (cristãos e judeus) de um estado islâmico. Um número menor de cristãos emigraram para as províncias do norte controladas por reis cristãos. Ao longo do tempo, a maioria da população da Península converteu. Os convertidos chamavam-se muladís

59

, oriundos de várias camadas da sociedade, e

junto com os árabes e berberes, contavam aproximadamente 80 por cento do total dos habitantes sob o domínio muçulmano, e também a maioria da população do Ġarb el-ʾAndalus, até o século XI.

60

A diferença étnica entre os convertidos e os de origem

árabe persistiu apesar de todos serem muçulmanos, o que resultou em perturbações civis durante a história de Alandalus. Uma outra comunidade de cristãos eram os moçárabes. 61 Eles mantiveram a fé cristã, mas não resistiram à integração e assimilação social e cultural, incorporando vários aspetos da cultura árabe como seus. Além de passar por um forte processo de arabização, conservaram alguns elementos da sua herança hispano-visigótica. Habitaram os centros urbanos, e no Ġarb al-ʾAndalus em Coimbra, em Lisboa, no

58

MATTOSO, J. (1993) Historia de Portugal. p 407. Do árabe hispânico muwalladīn ("concebidos por mãe não árabe“). Alguns historiadores como Hitti chamam os muladís de neo-muçulmanos. 60 GLICK, T. (1979) Islamic and Christian Spain in the early Middle Ages. Cap. 1. 61 Do ár. mustʿarab ( "arabizado"). 59

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Algarve e especialmente na região da Beira, onde a organização social e instituições moçárabes sobreviveram a passagem da Reconquista portuguesa. A maioria dos moçárabes eram membros da classe média: comerciantes, proprietários pequenos, artesãos ou vassalos de soberanos árabes.

3.1.4.

Os judeus, eslavos e escravos

Como



explicamos,

o

termo

de

convivência

descrevia

a

situação

socioeconómica e política entre as várias comunidades étnicas e religiosas que habitavam os territórios sob o domínio muçulmano. Os muçulmanos, os cristãos e os judeus viviam em condições de paz e intercâmbio cultural. Os judeus chegaram ao território da Península já na época romana e rapidamente estabeleceram uma comunidade forte e ligações permanentes que deixaram um rasto inapagável na história da Península. Enfrentando discriminação religiosa desde a época dos reis godos, especialmente depois da conversão ao catolicismo do rei Recaredo 62 em 589, aceitaram com uma dose de alívio a chegada dos muçulmanos e o seu sistema social que os punha no mesmo nível como os seus vizinhos cristãos e ambos gozavam uma posição protegida. Pagavam como os cristãos o imposto de ğiyza e dominavam nos negócios de comércio e artesanatos, especialmente com ouro e prata. No território de Espanha existiam grandes comunas de judeus, especialmente em Granada e Córdova, que durarão até o final ato de expulsão em 1492. No território português as principais comunas judaicas localizavam-se nas cidades litorais, como Lisboa e Faro. 63 Além dessas comunidades mais importantes e numerosas, o domínio muçulmano também incluía outros elementos étnicos que merecem ser mencionados, como os escravos, chamados saqalibah em árabe. Este era o termo que os árabes usavam para chamar os eslavos importados como escravos da Europa central e oriental, especialmente durante os séculos IX e X. Eles serviam como guardas pessoais do califa, formando assim uma distância necessária entre os árabes em posições altas e os seus servidores berberes. Com tempo estes escravos-mercenários conseguiram a

62 63

586 -601. MATTOSO, J. (1993) Historia de Portugal. p. 407.

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comprar a sua liberdade e entraram na sociedade como homens livres e até existem algumas taifas que eram governadas por estes ex-escravos.

64

3.2. Divisão geográfica e administrativa e aspetos económicos

Ao conquistar partes do atual território português, os muçulmanos mostraram preferências para colonizar o árido sul do Portugal, especificamente o sul do rio Tejo, o que hoje são as províncias de Alentejo e do Algarve. Mesmo assim, o interesse para estes territórios nunca atingiu o interesse reservado para o território espanhol, especialmente a vale do rio Guadalquivir e a costa mediterrânea da Espanha, onde se concentrava a maioria da população. Como diz Orlando Ribeiro: "O território português viveu sempre na periferia do mundo árabe e longe dos grandes centros de irradiação cultural do Sul da Península. Quando se quebrou a unidade política do califado, os reinos de taifa que aqui se constituíram foram, salvo o de Badajoz (que estendeu o seu domínio até Lisboa), pouco importantes, pequenos e efémeros. Faltam por isso em Portugal os grandes monumentos, e apenas no traçado tortuoso das ruelas e becos de algumas cidades do Sul, e nas muralhas e castelos que as defendiam, se encontram vestígios materiais da dominação muçulmana."

65

Ao Norte do rio Douro não se

encontram nenhuns vestígios materiais da presença dos muçulmanos, e a toponímia de origem árabe é minimal. A administração muçulmana criou uma divisão hierárquica do território conquistado. Alandalus foi dividida em províncias, um sistema adotado da administração omíada. Estas províncias chamavam-se em árabe kuwar (em plural, em singular kūra) e até hoje não temos um número exato delas, 66 nem podemos traçar as suas fronteiras com certeza. Hitti 67 menciona oito kuwar no Ġarb al-ʾAndalus: a de Ossónoba (Faro, depois transferida para Silves), Beja, Évora, Lisboa, Santarém, Mérida, Coimbra e Idanha-a-Velha. As kuwar eram organizadas como os antigos conventos romanos e as cidades crescidas arredor deles, geralmente protegidas por uma fortaleza ou outros tipos de fortificações. Cada kūra foi governada por um

64

ZAYED, A. S. M. (1993) Datos dialectales andalusíes (gramaticales y léxicos) en algunos documentos tardíos granadinos y moriscos. p. 10. 65 RIBEIRO, O. (1987) A formação de Portuga. p.33 66 O número registrado por vários historiadores e cronistas varia de 18 até 41. 67 HITTI, P. K. (1946) History of the Arabs. p. 354.

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governador chamado wāli, cujas responsabilidades incluíam assuntos militares, judiciais, tributações e impostos.

68

As unidades menores que fazem kuwar são mudun

(singular madīna), que correspondiam às civitates romana, e qurā (singular de qarya), povoamentos rurais e finalmente ḥusun (singular ḥisn), fortificações e fortalezas com administração própria. As cidades perto da fronteira, que sofriam risco de ser atacadas frequentamente, como Lisboa e Santarém, eram bem fortificadas e ergueram alcáceres e alcáçovas. O que hoje é parte do território de Portugal, formava no tempo do domínio muçulmano a província chamada Ġarb al-ʾAndalus. Como diz A. Oliveira-Leitão: "Assim, como facilmente se verifica, al-Ġarb al-Ândalus foi uma simples designação geográfica, sem significado administrativo concreto, por mera oposição ao aš-Šarq alÂndalus (Andaluzia levantina e região de Múrcia); o termo al-Ġarb assinalava, sem dúvida, grande parte da velha Lusitânia romana – incluindo portanto a sua região mais oriental, correspondente à moderna Estremadura, bem como, a Norte do Mondego, a kūra colimbriense, mas excluindo as kuwār mais setentrionais, isto é, o território dos velhos conventos de Viseum e Lamecum, onde o domínio muçulmano terá sido sempre bastante ténue."

69

As cidades do Ġarb al-ʾAndalus não eram tão grandiosas e

desenvolvidas como Córdova, Sevilha ou Granada, mas as grandes cidades centrais como Lisboa, Beja, Coimbra e Silves tinham alguns milhares de habitantes, cujo número lentamente crescia. Quando o Califado dividiu-se em oito taifas em 1031, quatro delas situavam-se no atual território português: Faro (ou Santa Maria do Algarve), Lisboa, Mértola e Silves. No período das segunda taifas, as que ocupavam parte ou se situavam completamente no território português eram Badajoz, Évora e Beja, Mértola, Santrém, Silves e Tavira. 70 Relativo aos aspetos económicos, a região do Ġarb al-ʾAndalus era uma região de economia pastoral e agrícola. Só o litoral do Algarve era adequado para desenvolver uma cultivação intensa e introduzir irrigação. A rede de irrigação construída no tempo dos Romanos foi reconstruída e renovada por tecnologias novas, trazidas pelos árabes.

68

DISNEY, A. (2009). A history of Portugal and the Portuguese empire. p. 397. OLIVEIRA-LEITÃO A. (2008) Do Garb al-Ândalus ao «segundo reino» da «Coroa de Portugal»: território, política e identidade. p. 6 70 OLIVEIRA-LEITÃO A. (2008) Do Garb al-Ândalus ao «segundo reino» da «Coroa de Portugal»: território, política e identidade. p. 10 69

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A vale do rio Tejo (entre Lisboa e Santarém) mostrou-se ideal para fazer colheitas de trigo, arroz e frutas da época (damascos, pêssegos, cidras). Os árabes trouxeram métodos e sortes agrícolas novas, como o limoeiro, a laranjeira azeda e provavelmente o arroz. Desenvolveram a cultura da oliveira, a colheita de azeitonas e a fabricação do óleo de azeitonas, que ainda hoje representa um dos símbolos do Algarve.

3.3. Herança cultural

Completaremos esta descrição com as contribuições culturais no tempo do domínio muçulmano, o que inclui a herança material e não material, da arquitetura até a própria língua. Os muçulmanos eram mecenas da educação e patrocinavam a abertura de lugares de ensino, localizados em mesquitas, livrarias e universidades. Como a educação foi sempre ligada à religião e à presença de mesquitas, e como mesquitas representavam uma essencialidade em cada lugar habituado por muçulmanos, cresceu o número de lugares que ofereciam educação elementar à qualquer estrato social. As 800 escolas públicas aumentaram o número de gente com possibilidade de ler e escrever, especialmente nas classes mais baixas.

71

A educação no nível alto

realizava-se em universidades que também faziam parte de mesquitas, como as grandes universidades em Córdova, Granada e Sevilha. ʿAbd al-Raḥman III fundou a universidade de Córdova como parte da famosa mesquíta de Córdova, que precedia as duas mais importantes universidades do mundo muçulmano até hoje, o al-Azhar em Cairo 72 e a Niẓāmiyya em Bagdá, 73 e tinha uma biblioteca com mais de 400 000 livros. Estes centros de sabedoria atraíram e criaram algumas das mais importantes personagens científicas desta época, incluindo o Averróis, Avicena e al-Ġazāli. O ensino dependia da disponibilidade de livros e papel: Córdova abriu uma das primeiras fábricas de produção de papel no solo da Europa, de onde a arte viajou para a Italia no tempo do Renascimento.

71

SCOTT, S. (1977). History of the Moorish Empire in Europe. p. 467-8. Século X. 73 Século XI. 72

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As personagens mais importantes desta época eram intelectuais que raramente se limitavam a só um ramo de ciências. As contribuições mais importantes aconteceram nos ramos da medicina, filosofia, botânica, matemática e astronomia. Os nomes mais importantes eram o de Ibn Xaldūn, o grande historiador que hoje e considerado como um percursor teórico de várias disciplinas sociais, como a sociologia e a historiografia; Al ʾIdrīsī, geógrafo e cartógrafo que publicou uma mapa-múndi do mundo conhecido nesta época, com ênfase no Mar Mediterrâneo; Al Kindī, um polímata de interesses vastos, que escrevia sobre matemática, astrologia, medicina e filosofia grega com mesma facilidade; Al Zahrāwī que era o mais celebrado cirurgião europeu; Ziryāb que revolucionou a corte de Córdova, introduzindo novas modas de roupas e estilos de cabelo. A personagem mais popular, conhecida pela sua versão latinizada de Averróis (o que também fala bastante sobre a sua fama) era o Ibn Rušd. Este grande polímata contribuiu à medicina, matemática, astronomia, filosofia e música, formando assim um opus impressionante. As obras destes autores tinham sido traduzidas em latim e lidas em toda a Europa, introduzindo um vocabulário que refletia a língua científica do tempo: o árabe. Assim começaram entrar expressões e terminologia árabe nas línguas europeias, como nomes de constelações e vários corpos celestes, junto com termos matemáticos e medicinais.

4.

Situação linguística A época da convivência refletia-se em aspetos linguísticos. Corriente usa o termo

Romania Arabica para descrever um espaço linguístico-cultural compartilhado por comunidades de língua maternas diversas: comunidades arabófonas e culturalmente arabico-islâmicas e de outro lado neolatinas e cristãs. 74 Neste capítulo descreveremos a situação linguística do tempo do domínio muçulmano na Península Ibérica e como a mesma mudava com tempo. Concentrar-se-emos em duas línguas maioritárias, em termos de número de falantes e de influência - a língua árabe e as línguas românicas. Estas línguas são também importantes para os interesses deste estudo, junto com a língua moçárabe, que com a língua árabe construí a base do léxico de arabismos na

74

CORRIENTE, F. (2006) Romania Arábica: uma questão não resolvida de interferência cultural na Europa Ocidental.

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língua portuguesa. Exploraremos a difusão da língua árabe e os contatos com as outras línguas faladas na Península.

4.1. Línguas românicas

Quando os muçulmanos entraram na Península Ibérica, estavam já extintas todas a línguas faladas no período pré-romano 75 (com excepção do basco), resultado dum extenso processo de romanização que introduziu o latim a partir do século II a. C. O latim coloquial falado na Península (e em todas as antigas províncias ocidentais do Império Romano) é designado na literatura como "latim vulgar", definido como “a língua falada pelas camadas pouco influenciadas ou não influenciadas pelo ensino escolar e pelos modelos literários”. 76 Esta língua nunca foi homogénea - refletia diferenças da evolução em várias partes do Império, o que depois evoluiu em línguas distintas. Geralmente o século IX é quando começaram a formar-se estas múltiplas línguas românicas, ou os idiomas de transição entre o latim e as línguas românicas, como as categorizamos hoje. As diferenças continuaram a evoluir no território sob domínio muçulmano. Antes de chegarem os primeiros muçulmanos língua portuguesa da época estava em contato com as tribos germânicas ibéricas(os godos, suevos e alanos) e este contato também deixou algum vestígio no vocabulário (hoje alguns 100 vocábulos de origem germânica). 77 A invasão muçulmana e a Reconquista são os acontecimentos determinantes na formação de três línguas peninsulares: o galego-português no oeste, ocastelhano no centro e o catalão no leste. Todas estas línguas nasceram no norte da Península e foram levadas para o sul com o progresso da Reconquista. Com o avanço dos cristãos para o sul, os dialetos românicos do norte entraram em contato com os dialetos moçárabes do sul e este processo marca o início da diferenciação e da formação definitiva do português em relação ao galego-português. 78 A influência árabe nos dialetos centro interiores e sul (como o algarvio) revela a persistência da população moçárabe depois da Reconquista. A partir do século XIII os centros políticos e culturais do Reino Português transferem-se para o sul, em Santarém e depois para Lisboa,

75

Grupos de povos indo-europeus (Proto-Celtas e Celtas, Tartessos, Cónios) e não-indoeuropeus (Aquitânicos e Iberos). 76 CASTRO, I. (2006). Introdução à história do português. p. 53. 77 HOUAISS, A. (1986) As projeções da língua árabe na língua portuguesa. 78 ASSIS, M. C. DE () História da língua portuguesa.

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trazendo consigo a língua portuguesa como língua administrativa, o que marginalizou o uso do moçárabe e deu ao português o papel de língua culta.

4.1.1.

Moçárabe

Os moçárabes 79 eram uma comunidade de cristãos ibéricos que viviam sob o governo muçulmano de Alandalus. A natureza da sociedade moçárabe refletia-se na sua língua: era uma comunidade que mostrava um encravamento forte em termos raciais e culturais, mantendo e defendendo as suas tradições, a religião e a língua. Os moçárabes não se preocupavam com o estudo de latim e cultivavam o uso da língua árabe. Assim a maioria deles eram bilingues: ao lado do árabe (que era usado como língua de administração e comércio), usavam a sua língua materna - uma língua românica patois derivada do latim vulgar e escrita em letras árabes. À medida que o número de cristãos que convertiam ao islão crescia, diminuía o número de falantes de idiomas românicos e estes idiomas ficaram caraterísticos à população moçárabe. O "românico moçárabe" tinha várias caraterísticas que distinguiram-no dos falares românicos no noroeste, fora do domínio muçulmano, devido principalmente ao seu caráter conservador e à inevitável influência do árabe.

O caráter conservador do moçárabe em relação ao português é óbvio em certos traços linguísticos como a preservação do ditongo -ai- e dos -l- e -n- intervocálicos, também a preservação dos grupos de consoantes mediais -cl- e -ly- e dos grupos iniciais de pl-, fl- e pl- latinos. No campo fonológico preservou as oclusivas surdas. Em acentuação é importante de notar a mudança do o acentuado em u. A documentação escrita do românico moçárabe e relativamente escassa, o que cria dificuldades na reconstrução duma gramática compreensiva. A literatura árabe existia antes de que começou a sua documentação escrita no século XII.

79

Do ár. musta'rib ("arabizado").

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A forma literária que os moçárabes criaram chamava-se aljamiado. 80 Estes textos são específicos por numerosos arabismos ajustados em morfologia românica, como o plural do ár. kitāb ("livro") tornando em moç. kitābs ("livros"), calques semânticos e sintáticos.

81

Muitas palavras religiosas nestes textos ficaram em original árabe. A

natureza bipolar desta forma é óbvia do modo em qual referiam à ela: era língua portuguesa do ponto de vista dos árabes e língua árabe do ponto de vista dos povos românicos, os falantes de português. 82 A poesia lírica escrita em moçárabe 83 é considerada como uma das mais antigas no solo europeu e aparece em 1040. Estas pequenas estrofes são geralmente partes incorporadas em mais longas poemas narrativas chamadas muwaššaḥ. 84 Este tipo de poesia popularizou-se no século XI com a nova forma métrica que introduziu e estimulou o processo de assimilação cultural e linguística na Península, influenciando a língua dos falantes românicos e as suas próprias formas líricas. Os trovadores franceses dos séculos seguintes com certeza inspiraram-se por esta forma e os seus herdeiros ibéricos. Também existe mas um corpus de textos em línguas românicas e escrita árabe a literatura dos mouriscos. Isto não indica que os mouriscos foram bilingues: a maioria deles nunca aprendeu a língua árabe Segundo Corriente e Houaiss, são os moçárabes emigrados para o norte que, como possuidores da cultura árabo-islâmica, introduziram arabismos nas línguas românicas da Península. 85

86

A maioria destes arabismos tratavam-se de palavras

conetadas com administração municipal, como bairro (do ár. barri) ou aldeia (do ár. al ḍayaʿa).

80

Do ár. al-agamiyya ("estrangeiro"). LÓPEZ-MORILLAS C. (1994) Aljamiado and the Moriscos' islamicization of Spanish. Perspectives in Arabic Linguistics VI. Series IV - Current Issues in Linguistic Theory. p. 18. 82 HOUAISS, A. (1986) As projeções da língua árabe na língua portuguesa. 83 Que também influênciou a lírica galego-portuguesa, com a implementação de arcaismos romanicos e conservação do -n- intervocálico em cantigas de amigos. 84 Também na literatura como muwashshash, da palavra árabe que significa 85 CORRIENTE, F. (1996) Novedades en el estudio de los arabismos en iberoromance. 86 HOUAISS, A. (1986) As projeções da língua árabe na língua portuguesa. 81

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4.2. Língua árabe

A língua árabe hoje é a maior em termos de falantes na sua família linguística semita. 87 É uma língua oficial em 22 países do mundo, a maior parte delas no Norte da África e no Oriente Médio. A sua importância deve muito à posição de lingua litúrgica do islão, a língua do Corão e outros textos religiosos islâmicos. O árabe é a segunda mais importante fonte do léxico português, depois do latim.

88

É considerada estar em

relação de adstrato 89 às línguas românicas. A língua árabe era o médio primário de transferência da herança clássica dos Gregos e dos Romanos antigos para a Europa medieval, acompanhada por comentários de autores árabes do tempo da Idade de ouro islâmica. 90 A promulgação destas obras de filosofia e ciência pelos árabes da Península Ibérica e Sicília pela Europa medieval abriu as portas ao Renascimento em Itália. A língua árabe falada na Península Ibérica era uma mistura de idiomas árabes provenientes principalmente da Península Árabe. Com o estabelecimento da posição social dominante pelos árabes a sua língua também ganhou em prestígio. A arabização e a islamização daram um posto especial à língua árabe nesta nova sociedade. Kees Verstegh, autor de numerosas publicações sobre a linguística árabe, inclui a língua árabe falada em Alandalus dentro da família dos dialetos de Magrebe, junto com os dialetos da Mauritânia, Marrocos, Algéria, Tunésia e Líbia. 91 Ele nota nos estudos que existem evidências confirmando que durante o longo período de contato entre o árabe e as línguas românicas na Península Ibérica, o árabe quase completamente substituiu as línguas românicas. Um académico moçárabe do século IX, Paulo Álvaro de Cordóba, nota a gravidez da situação em que a língua árabe substitui o latim como língua de erudição e como os jovens do seu tempo preferiam usar versos líricos árabes e estudar poesia árabe do que comunicar em línguas românicas. Segundo outros estudos, o árabe nunca conseguiu completamente despojar as línguas românicas como línguas coloquiais e o latim certamente preservou o seu estado de língua de alta

87

Com mais de 242 milhões de falantes, segundo o Ethnologue. MARANHÃO, S. DE M. (2012) A língua portuguesa e a Romania Arabica. p. 5. 89 Um asdtrato refere-se à uma língua que está em contato com uma outra língua ou idoma, o que resulta em influências mutuais. Muitas vezes a via de emprestimos é influenciada pelo prestígio de uma língua sob a outra. 90 Ou Renascimento islâmico, período entre os séculos VIII e XIII, com foco especial na cidade de Bagdá, grande centro de ensino do mundo árabe. 91 VERSTEEGH, C. (1997). The Arabic language. p. 165 88

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cultura. A verdade é no meio destas duas posições, as duas línguas coexistindo e competindo em número de falantes. O que é certo é que o árabe gradualmente quase completamente substituiu o latim como língua de administração e educação. Segundo Leite de Vasconselos, 92 as povoações portuguesas de Santarém, Évora, Mértola, Lisboa, Alcácer, Cacela e Ossónoba sofreram uma arabização intensa. Os falantes de árabe chegaram em várias ondas durante de diferentes partes do mundo árabe. Todos os muçulmanos com certeza trouxeram a língua clássica, a língua divina do Corão, junto com os dialetos neoárabes falados por diferentes tribos - sírios, iemenitas, palestinos, egípcios etc. 93 O estabelecimento do Califado atraiu um novo influxo de falantes árabes, graças à patronagem extensiva que a corte dava às ciências e artes. Corriente argumenta que o árabe clássico, um koiné literário construído especialmente para escrever o Corão (no século VIII) e distinto dos dialetos árabes antigos, não deveria ser o ponto inicial na busca etimológica dos arabismos nas línguas românicas. O árabe falado pelos conquistadores introduzido à Península mostrava diferencias da língua clássica e pertencia a um pacote dialetal que incluia dialetos árabes setentrionais e traços de dialetos árabes do sul. A influência da língua literária no falar quotidiano era fraca. 94 A evolução do árabe coloquial e os dialetos árabes ainda é um assunto que ocupa muitos linguistas e filólogos que procuram explicar as várias hipóteses de evolução. A dicotomia entre o árabe literário e o árabe falado designa-se como situação de diglossia. 95 Versteegh atribui ao árabe antigo (o árabe falado em época pré-islâmica e incluindo também a língua clássica do Corão) a função de registo alto e ao árabe andaluz, resultado das conquistas islâmicas e que evoluiu em dialetos modernos, a posição do registo baixo. 96 Os dialetos dos conquistadores evoluíram com tempo e por

92

LEITE DE VASCONCELOS, J. (1911). Lições de philologia portuguesa. ZAYED, A. S. M. (1993) Datos dialectales andalusíes (gramaticales y léxicos) en algunos documentos tardíos granadinos y moriscos. p. 46 94 CORRIENTE, F. "Linguistic interference between Arabic and the Romance languages on the Iberian Peninsula" em JAYYUSI, S. E MARÍN, M. (1992). The legacy of Muslim Spain. 95 Em situações de diglossia numa sociedade ou comunidade de falantes existem duas línguas (ou registos) que coexistem mas são funcionalmente diferentes, o registo alto sendo mais prestígio do registo baixo. Esta situação é frequente em áreas onde as comunidades usam línguas crioulas, como em Haiti onde o crioulo de Haiti representa o registo baixo e o françês o registo alto. 96 VERSTEEGH, K. (1997). The Arabic language. p. 98 93

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volta do século IX já podemos falar de uma unidade nova, com caraterísticas próprias e únicas que podemos atribuir ao dialeto árabe andaluz. Depois da queda do império muçulmano, quando o árabe perdeu a sua posição de língua de cultura, o latim voltou outra vez a reconquistar a sua antiga importância, mas agora ironicamente serviu como um dos mais importantes canais de difusão dos arabismos em toda e Europa.

4.2.1.

Árabe andaluz

Esta variedade do árabe fragmentária ainda é extensivamente citada e pouco estudada. Federico Corriente, o filólogo espanhol que iniciou uma revolução no estudo da influência da língua árabe nas línguas românicas ibéricas, deu ao árabe andaluz o crédito necessário no estudos de empréstimos e iniciou um esforço para descrevé-lo. Por causa da convivência, o árabe andaluz 97 foi influenciado pela línguas românicas faladas na Península, em aspetos gramaticais e lexicais, e pelo fato que as línguas românicas sempre eram faladas pela população rural. 98 Corriente nota que estas influências são principalmente fonológicas, como a aquisição de fonemas novos (especialmente o /p/ que não existia em árabe) e a redução de distinções fonémicas em alguns consoantes árabes (um fenómeno que aconteceu em quase todos dialetos árabes). Também são registradas influências morfológicas, como a perda da diferença entre o género na segunda pessoa da conjugação e mudanças sintáticas e léxicas.

99

Uma diferença notável entre o dialeto andaluz e o resto dos dialetos do Magrebe falados na Norte da África é que o andaluz nunca foi influenciado pela segunda onda de tribos árabes que invadiram a África, a partir do século XI. 100 Esta língua evolveu do árabe que chegou com os primeiros falantes árabes à Península, e sumiu logo depois da expulsão dos últimos mouriscos da Península. Segundo a maioria dos académicos, o falar árabe dos habitantes de Tânger e Tetouan

97

Também na literatura como hispano-árabe. ZAYED, A. S. M. (1993) Datos dialectales andalusíes (gramaticales y léxicos) en algunos documentos tardíos granadinos y moriscos. p. 47 99 CORRIENTE, F. "Linguistic interference between Arabic and the Romance languages on the Iberian Peninsula" em JAYYUSI, S. E MARÍN, M. (1992). The legacy of Muslim Spain. 100 VERSTEEGH, K. (1997). The Arabic language. New York: Columbia University Press. p. 95 98

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em Marrocos e outras cidades em Tunísia, que acolheram os muçulmanos depois da expulsão no fim da Reconquista, ainda preserva alguns traços do árabe andaluz. O árabe andaluz espalhava-se rapidamente é era língua quotidiana de alguns 5 até 7 milhares de pessoas durante os séculos XI e XII. Em 1567, o rei espanhol e português Felipe II promulgou um decreto que proibiu à comunidade de mouriscos o uso do seu idioma em todas as ocasiões, formais e informais, em conversação ou escrita. Este ato avançou o processo do desaparecimento gradual do árabe andaluz. Sobreviveu até o começo do século XVII, quando aconteceu a expulsão definitiva dos mouriscos. Os últimos documentos encontrados contendo árabe andaluz fragmentário foram encontrados em Valência no século XVII.

4.3. Expansão do árabe

A disseminação da língua árabe mostrou-se crucial para o criação do dialeto andaluz e todas as influências linguísticas nas línguas românicas faladas na Península. Um dos fatores mais importantes era a posição sócioeconómica que o árabe tomou na sociedade: como língua da alta cultura e educação, foi usado na administração, na corte, nas mesquitas, nas universidades, em obras literárias e científicas e na conversação erudita. Foi reforçado por autores, artistas e artesãos, locais ou os que vieram do Médio Oriente. O segundo fator importante para a expansão do árabe, segundo J. Mattoso, era o elemento judeu urbano.

101

Eles usavam a língua

árabe nos seus negócios de comércio em toda a área da Península. No século XI, iniciou-se um processo de marginalização da língua moçárabe relativamente à língua árabe, que começou com uma afirmação forte como língua culta dos meios urbanos. O moçárabe migrou para os meios rurais. Nos séculos XI e XII o moçárabe entrou num período de declínio, e quando as dinastias Almorávidas e Almóadas perseguiram os cristãos, os falantes moçárabes continuaram a usar o árabe nos centros urbanos. Não podemos saber com certeza quando é que a Reconquista encontrou o moçárabe durante a sua conquista para o sul. Alguns traços dialetais do dialeto centro-meridional português parecem resultar duma influência moçárabe, o que

101

MATTOSO, J. (1993) Historia de Portugal. p. 375.

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reforça a hipótese que os moçárabes ainda populavam esta área quando os portugueses chegaram lá nos séculos XII e XIII. 102 Depois do avanço da Reconquista e a definitiva queda da poder dos muçulmanos, a língua árabe restringiu-se entre os mudéjar durante três séculos, até que desapareceu completamente do plano linguístico ibérico. A último lugar onde a cultura muçulmana e a língua árabe sobreviveram era o Emirato de Granada que resistiu até o final do século XV. Depois do ato de expulsão dos muçulmanos, desapareceu a língua definitivamente, deixando um traço forte que vai durar até hoje e impregnar-se em todas as modalidades linguísticas da Ibéria.

5.

Os arabismos No capítulo seguinte descreveremos em termos linguísticos gerais situações de

contatos entre línguas, como eles evoluem e quais são os resultados que podemos esperar. Depois introduziremos o estudo dos arabismos nas línguas românicas da Península Ibérica e especificamente os arabismos do português.

5.1. Contato linguístico e empréstimos

As situações quando duas línguas entram em contato e influenciam uma a outra ocorrem em continuidade geográfica, proximidade social ou em casos de conquistas e migrações ou, especialmente em tempos modernos, com viagens ou exposição a meios de comunicação social. 103 O contato linguístico, segundo Weinreich, resulta em interferência linguística. As situações quando duas (ou mais) línguas encontram-se em contato, devido ao desenvolvimento do bilinguismo e uso recíproco acontecem desvios da norma linguística. 104 Bloomfield 105 menciona dois tipos de contato: o contato direto, que ocorre em casos de proximidade territorial, conquistas, colonizações, migrações e escravidão e que cria empréstimos íntimos - esta foi a situação que ocorreu na Península Ibérica em

102

FERNANDES, M.A. (2008) O dialeto algarvio: abordagem histórica. p. 8. CRYSTAL, D. (1997). A dictionary of linguistics and phonetics. p. 107. 104 WEINREICH, U. (1968). Languages in contact. p. 21. 105 BLOOMFIELD, L. (1933). Language. p. 45. 103

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caso da língua árabe em contato com as línguas românicas; e os contatos indiretos, via canais artificiais em casos de interferência política, comercial e cultural. Este tipo de contato cria empréstimos culturais, tipo de arabismos que também existe na língua portuguesa. Trask 106 descreve empréstimos como resultados destes contatos linguísticos e a sua adoção e incorporação na língua acolhedora. No início eles passam por alterações fonológicas e gramaticais e em casos mais avançados, criam-se pidgins 107 e línguas crioulas, 108 em meio de vários níveis de bilinguismo. A última fase é o mais extrema, um abandono parcial ou completo duma língua em favor duma outra língua. Em relação às partes do sistema linguístico, o léxico sempre representa o plano da língua mais suscetível à mudança e reflete reconfigurações sociais na história da respectiva comunidade de falantes na adoção de estrangeirismos e empréstimos. A diferença entre estrangeirismos e empréstimos é fixada no estágio de integração do vocábulo na estrutura da língua acolhedora - o empréstimo tem um radical estrangeiro que, adaptado, muitas vezes não revela a sua origem estrangeira facilmente à comunidade que o adotou, enquanto o estrangeirismo fica "em meio caminho" entre um vocábulo obviamente estrangeiro e um empréstimo, incompletamente integrado em relação aos fonemas, flexão e grafia.

5.2. Arabismos nas línguas românicas da Península Ibérica

Corriente nota alguns problemas que resultaram do uso contínuo de etimologias incorretas e falta de rigor científico no estudo dos arabismos.

109

O mais importante é a

hipótese que os empréstimos têm origem no árabe clássico e a via de ingresso não passava necessariamente através do árabe andaluz. A falta de verificação dos resultados etimológicos resulta na circulação de palavras românicas ligadas com

106

TRASK, R. (2007). Language and linguistics. p. 136 Um pidgin é geralmente criado espontâneamente, como uma mistura de línguas que ocorrem em contato e serve como meio de comunicação entre falantes que não têm uma língua comum. Não pode ser língua materna. 108 Uma língua crioula evolui de um pidgin quando é transferida para a geração seguinte e aprendida como língua materna. Mostra um sistema gramatical e funcionalidade mas evoluida do que da língua pidgin. 109 CORRIENTE, F. "Linguistic interference between Arabic and the Romance languages on the Iberian Peninsula" em JAYYUSI, S. E MARÍN, M. (1992). The legacy of Muslim Spain. 107

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etimologias incorretas. Existem também estudos que rejeitam qualquer interferência gramatical ou morfológica que occoreu entre o árabe e as línguas românicas, e hoje a maioria dos académicos geralmente concorda somente com o empréstimo do sufixo pronominativo relativo árabe (nisbah) 110 em castelhano. Muitos provérbios árabes foram calqueados, traduzidos literalmente em línguas românicas. Segundo Houaiss, o único arabismo sintático que encontramos em português é de influência bem tardia, como por exemplo a construção "rei dos reis", um calque proveniente do árabe e que provavelmente denota uma escolha estilística de cultura alta.

111

Corriente argumenta que o canal principal de interferência entre o árabe e as línguas românicas eram as comunidades dos moçárabes e mudéjar. Datamos a maioria dos empréstimos em línguas românicas nos séculos IX e X, quando ocorreu a imigração dos moçárabes para o norte. Os mudéjar contribuíram com um número de empréstimos menor em comparação com os moçárabes, o que foi provavelmente relacionado ao seu estado social baixo, que nos olhos dos cristãos não era algo que merecia ser imitado. Ao lado destas duas fontes mais importantes de empréstimos às línguas românicas, a terceira era o canal que corria de outras línguas, especialmente as românicas como françês e italiano, que por sua volta emprestaram léxico árabe durante encontros esporádicos com comunidades arabófonas que aconteceu desde a época medieval até hoje. Os italianos mantinham longos e intensivos contatos comerciais com o Levante e foram influênciados pelo árabe falado em Sicilia. 112 Neuvonen 113 menciona três vias de ingresso de arabismos nos falares ibéricos: 1). a influência direta, resultante da convivência entre os muçulmanos e cristãos em Alandalus; 2). a influência indireta, por meio dos escravos e imigrantes oriundos das áreas sob o domínio muçulmano; 3). contato intraromânico.

110

Este sufixo é geralmente usado para criar adjetivos relativos de um substantivo. Assim temos a palavra andalusí em castelhano que corresponde à palavra árabe andalusiyy (com o -í final tônico em castelhano conservando o acento árabe), significando relativo à Alandalus. 111 HOUAISS, A. (1986) As projeções da língua árabe na língua portuguesa. 112 A presença muçulmana em Sicilia durou dois séculos, desde o século IX até o XI. 113 NEUVONEN, E. K. (1951) Los arabismos de las Cantigas de Santa Maria. p. 47.

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A frequência dos arabismos varia entre diferentes línguas árabes - galego e catalão norte contam o menor número de arabismos. 114 A preservação ou desaparecimento dos arabismos depende de vários fatores e da estrutura da língua acolhedora. Assim por exemplo português preservou a forma alfaiate (do árabe alxayyaṭ), mas em castelhano era com tempo trocada com a palavra proveniente do galego, sastre. Também temos competições entre sinónimos árabes e românicos, uma situação que ocorre em cada processo de aceitação de empréstimos. Um exemplo no castelhano e português mostra duas palavras do mesmo significado, mas provenientes de duas diferentes palavras árabes: em português alfândega (do árabe al-funduq, "estalagem, hospedaria") e em castelhano aduana (do árabe al-dīwān "oficina").

5.3. Arabismos na língua portuguesa

O léxico português é híbrido e consiste de vocábulos provenientes de várias línguas, com o latim como a fonte mais importante que gerou a maioria do vocábulos. Além do árabe que se considera como a fonte segunda, o português também tem palavras de origem grega, germânica, hebraica, provençal, francesa, italiana e depois do século XV com o começo da expansão ultramarina, foi influenciado por línguas como mandarim, malaio e japonês. 115 Hoje ainda não há concordo sobre o número exato dos arabismos na língua portuguesa. Segundo Houaiss, num total de 3 000 até 3 200 palavras do vocabulário português primitivo, 116 existe no mínimo 800 palavras de origem árabe (25 por cento deste vocabulário primitivo). 117 Muitos arabismos atestados em dicionários portugueses hoje já pertencem à categoria de arcaísmos e são raramente ou não usados na língua corrente, como as palavras alfageme, "barbeiro ou afiador de espadas" e anafil, "trombeta mourisca". Os arabismos na língua portuguesa são de origem diretamente árabe ou introduzidos por meio da língua árabe, embora oriundos de outras línguas (como o

114

A isolação e receção fraca de arabismos nestas línguas dá uma importança linguística especial aos poucos arabismos que existem nestas línguas, que podem ser usados para construir uma cronologia de datas de empréstimos, especialmente dos que provieram do árabe andaluz. 115 AZEVEDO, M. (2005). Portuguese: A Linguistic Introduction. p. 61. 116 Considera-se como vocabulário básico ou primitivo o que foi formado antes do Renascimento, quando dum grande influxo de palavras eruditas de origem latina e grega aumentaram o vocaulário básico. 117 HOUAISS, A. (1986) As projeções da língua árabe na língua portuguesa.

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grego, persa ou sânscrito). 118 Como arabismos consideramos também vocábulos de origem árabe introduzidos na língua portuguesa por uma língua-ponte - geralmente francês ou italiano 119 - mas pode também ser uma língua não-românica como o inglês, turco ou haúça. Arabismos são também todas a palavras derivadas por meios da derivação morfológica dum arabismo como base, como por exemplo as palavras tarifação, tarifar ou tarifário da palavra tarifa, originalmente do árabe taʿrifa, significando "um ato de identificar, identificação". Arabismos são também estrangeirismos árabes que não concordam à norma gráfica da língua portuguesa e por isso, por exemplo, às vezes são escritos com um hifen para separar o artigo definido árabe e o substantivo (como Al Qaeda, Al-Qaedianos, alquaediano). Geralmente eles são adquiridos recentemente, como empréstimos culturais espalhados por meios de comunicações social. A maioria dos arabismoms no português são substantivos. Existem alguns verbos (como acaçalar e recamar), adjetivos (como baldio e mesquinho) e advérbios (como debalde). Os termos gramaticais são geralmente exeções, mas hoje a maioria de estudos reconhece a origem árabe da preposição até ( do português antigo atá e do árabe ḥattā) 120 e a exclamação oxalá (do árabe wa shaʾ Allah, "e queira Deus"). 121 Também temos alguns calcos como fidalgo (contração de filho d'algo, do ár. ibn alahad). 122 Tradicionalmente, o estudo de arabismos nas linguas românicas e na língua portuguesa limitava-se ao estudo de empréstimos que datavam desde o primeiro contato, a chegada dos muçulmanos à Península, e continuaram até que continuava a interação das comunidades que preservaram alguma forma árabe em comunicação. Estabelecer limites espaço-temporais para este episódio da história linguística ainda hoje representa dificuldades. Descrevendo a situação do contato entre a língua árabe e

118

Como as palavras como talismã (da palavra grega bizantina télesma, significando "rito ou cerimónia religiosa compleção", emprestado em árabe como ṭilasm, em plural ṭilasmāt), guitarra (da palavra grega antiga kithára, emprestado em árabe como qīṯāra) ou laranja (da palavra sânscrita nāraṅga, emprestado em árabe como nāranj). 119 Como a palavra arsenal que chegou via o italiano (ou francês), do árabe dār aṣ-ṣināʿa, significando "a casa de manufactura". 120 Comparável com a versão castelhana hasta. Outras sugestões propõem uma origem latina, como contração do latim ad ista ("até isto") ou ad tenus ("até que"). 121 Comparável com o castelhano ojalá. 122 Comparável com o castelhano hidalgo.

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a língua portuguesa, Maranhão 123 propõe três pontos espaço-temporais que marcam os mais importantes contatos entre estas duas línguas: 1). o primeiro ocorreu durante a Idade Média na Península Ibérica, quando a cultura árabo-islâmica e a língua árabe gozava de um prestígio que permitiu a transição de numerosos empréstimos; 2). o contato que ocorreu como resultado da Reconquista na Península Ibérica, quando entraram em contato populações cristãs e populações muçulmanas ou arabizadas, especialmente os moçárabes; 3). a transmissão intraromânica, onde os arabismos provieram de línguas que os acolheram anteriormente. Recentemente, académicos (especialmente os brasileiros) iniciaram um esforço para incluir uma outra via de arabismos para o português, particularmente o português brasileiro, proveniente do contato dos falantes de português no Brasil e os escravos africanos, falantes arabófonos. Maranhão oferece uma nova proposta de divisão dos pontos espaço-temporais cruciais que podem incluir todos os arabismos na língua portuguesa:

124

a). a presença muçulmana na Península Ibérica durante a Idade Média; b). o Brasil esclavagista, particularmente no século XIX; c). o Brasil da imigração, desde a metade do século XIX. Esta divisão representa três épocas diferentes, três contextos sócioeconómicos diferentes que resultaram de relações de poder diferentes entre as comunidades arabófonas e os lusofalantes. O resultado foi uma aquisição assimétrica de arabismos para a língua portuguesa - seja em quantidade de vocábulos ou a maneira como se dividiram em campos semânticos. A lusitanização, o processo de "lusitanizar" as palavras árabes, tratava-as em todos os planos linguísticos. O mais óbvio sinal que alude à origem árabe de uma

123

SILVA, B. DE P. e MARANHÃO, S. DE M. (2012) Arabismos do português brasileiro: a herança da imigração. p. 3. 124 MARANHÃO, S. DE M. (2012) A língua portuguesa e a Romania Arabica. p. 12.

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palavra do vocabulário português é a presença do artigo definido al-, geralmente aglutinado ao substantivo. A aglutinação do artigo no árabe pode ocorrer em duas maneiras: aglutinando o artigo em sua forma pura diretamente ao substantivo que o segue ou aglutinando a forma do artigo que antes sofreu a assimilação fonética árabe. Na gramática árabe as consoantes dividem-se em dois grupos: as solares e as lunares. As palavras que começam com uma consoante solar 125 e recebe o artigo definido, assimila os /-l/ final do artigo e a consoante inicial do substantivo conforme o último, formando assim uma consoante geminado (ár. al-zayt > pt. azeite). As consoantes lunares não se assimilam com o artigo e não ocorre nenhuma mudança (ár. al kunya " tipo de nome derivado do nome do respetivo filho mais velho"> pt. alcunha). A questão da aglutinação do artigo definido árabe ao substantivo que o segue é uma questão pertinente à aquisição de empréstimos árabes pela língua portuguesa. Segundo Corriente, 126 achamos nos arabismos castelhanos a forma do artigo aglutinado em 60 por cento de casos, mas no catalão só em 32 por cento. Como já observamos o catalão é um dos idiomas ibéricos com o menor número de arabismos e tem vários exemplos onde existem duas variantes da mesma palavra, uma com o artigo aglutinado e outra sem o artigo, e neste caso as formas sem o artigo geralmente sobrevivem até a língua moderna. Arabismos sem o artigo são também comuns em italiano. Existem algumas teses que explicam este processo. Steiger em 1947 explica que a aglutinação resultava da transmissão oral, que era o processo principal de transmissão do árabe na Península. Elcock em 1960 explica que o adstrato berbere (que era apenas superficialmente arabizado) influenciou à aquisição das palavras no português com o artigo aglutinado.

6.

Campos semânticos O léxico de cada língua pode organizar-se em campos semânticos ou

“campos associativos quanto ao sentido e forma e quanto à origem pela família etimológica”.

127

Campos semânticos são zonas lexicais constituidas por vocábulos

unidos pelo sentido ou sistemas de conceptos. O termo de campo semântico tem as

125

Estes consoantes são parecidos em termos de ponto de articulação ao /-l/ do artigo. CORRIENTE, F. (1996). Linguistic interference between Arabic and the Romance languages of the Iberian peninsula. p. 31. 127 CARVALHO, N. (2009). Empréstimos linguísticos na língua portuguesa. 126

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suas raizes na linguística de Humboldt e Herder no século XVIII e foi pela primeira vez diretamente descrito por Stephen Ullmann nos anos sessenta do século XX. Coseriu descreve campos semanticos como conjuntos de unidades lexicais que compartilham entre si um conteúdo lexical contínuo, ou significado comum, e relações dinâmicas. Berruto 128 descreve na sua obra "A semântica" os critérios de delimitação dos campos semânticos, observando que o termo supraordinado do campo semântico não é necessariamente lexicado por uma palavra. Ele também descreve a problemática da definição dos campos semânticos: conforme a definição ampla, o campo semântico é um conjunto de termos cujo significado refere a um conceito comum, e conforme uma definição mais rigorosa, o campo semãntico é um conjunto de co-hipónimos diretos de um mesmo termo supraordinado. 129 A estrutura do léxico emprestado em campos semânticos nos permite perceber quais são as áreas do quotidiano da vida que receberam a maior influência linguística, refletindo

diretamente

influências

socioeconómicas,

científicas

e

culturais.

A

organização dos arabismos em português em campos semânticos é uma obra de longa história e elaborada por numerosos linguistas e filólogos durante o tempo, o mais notáveis sendo Leite de Vasconselos, 130 Houaiss,

131

mais recentemente filólogos brasileiros como Vargens

Silva Neto,

134

132

Teyssier,

133

e

e Maranhão. 135

Neste estudo usaremos os modelos de campos semânticos propostos por Maranhão (que descreve 13 campos semânticos) e Vargens (que descreve 17 campos semânticos). Cada um dos campo semântico será acompanhado por exemplos incluindo algumas das palavras mais frequentes da língua portuguesa moderna e alguns exemplos interessantes no ponto de vista linguística.

128

BERRUTO, G. (1994). Semantika. p. 106. BERRUTO, G. (1994). Semantika. p. 107. 130 LEITE DE VASCONCELOS, J. (1911). Lições de philologia portuguesa. 131 HOUAISS, A. (1986) As projeções da língua árabe na língua portuguesa. 132 SILVA NETO, S. e BARADINHO NETO, R. (1970). História da língua portuguêsa. 133 TEYSSIER, P. (1982) História da língua portuguesa. 134 VARGENS, J. (2007). Léxico português de origem árabe. 135 MARANHÃO, S. DE M. (2012) A língua portuguesa e a Romania Arabica. 129

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a). Técnicas e produtos agrícolas

Açude, almuinha, safra, romã, limão, azeitona, gergelim, berinjela, espinafre, açúcar, café, tamarindo. Guerra e vida militar

Alferes, algema, almirante, arrais, arsenal, bodoque, calibre, refém, alvoroço, almanaque, damasceno. Indústria e comércio

Açougue, alambique, armazém, azenha, azémola, almocreve, alfaiate, almoxarife, magarefe, alqueire, resma, quilate, sucata. Administração e financia

Aduana, alfândega, alvará, aval, leilão, tarifa, alforria, leilão, xerife, assassino, açoite. Vida social e relações sociais

Xadrez, azar, mesquinho, fulano, beduíno, mudéjar, malê. Ciências, técnicas, artes

Algarismo, álgebra, zero, achaque, elixir, enxaqueca, nuca, xarope, máscara, alquimia, alaúde, açude, azenha, guitarra. Alimentação e culinária

Almôndega, cuscuz, escabeche, alcorça, garfo, garrafa, jarra, taça. Compartimentalização espacial e detalhes topográicos

Cova, gruta, cascata, lezíria, refice, aldeia, arrabalde, bairro, rincão, alfoz, quintal. Habituação (povoamento urbano e rural) e vida doméstica

Alcova, alicerce, almofada, andaime, azulejo, chafariz, divã, sofá, taipa, jarra, arrabalde, azulejo, saguão, babuche, algibeira, alfinete.

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Flora e fauna; recursos naturais

Anta, gazela, girafa, papagaio, javali, alcatra, zambujeiro/azambujeiro, alecrim, arruda , algodão, alcachofra, anil, alcatrão, âmbar, giz, alcóol, soda. Religião

Imame, uléma, mussurumim, islão, jihad, mesquita, minarete, moçafo, tecebá. Cores e adjetivos

Azul, lilás, cafre, chué, baldio, mesquinho. Verbos e instrumentos gramaticais

Atarracar, safar, açacalar, recamar, fulano, até, arre, debalde, salamaleque, oxalá. Topónimos

Albuferia, Alcácer do Sal, Alcântara, Algarve, Oriola, Palmela.

7.

Arabismos no português brasileiro O estudo de arabismos no português brasileiro ainda é considerado como uma

tendência nova no estudo de arabismos. Em 2006 Vargens propôs uma revisão dos arabismos portugueses que tinha como objetivo incluir todas as épocas e contextos de contato, inclusivo com a via de entrada brasileira que na totalidade dos estudos conduzidos, nunca recebeu a importância que merece. Com a publicação do seu livro "Léxico português de origem árabe" em 2007 começa uma tendência positiva de incorporação dos arabismos brasileiros no estudo geral dos arabismos portugueses. Vargens descreve 769 unidades lexicais novas. Sebba e Quintela 136 propõem três pontos de ingresso de arabismos no português do Brasil: a). a herança cultural e linguística árabe trazida pelos colonizadores portugueses quando chegaram no Brasil;

136

SEBBA, M. A. Y. e QUINTELA, A. C. (2012) O léxico árabe na língua portuguesa. p. 8.

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b). a escravatura do século XVIII e a vinda dos escravos africanos islamizados, que denominamos em geral como malês (25 palavras no campo semântico da religião); c). o influxo de imigrantes árabes desde o final do século XIX, a maioria sendo síriolibaneses (12 palavras no campo semântico da culinária).

7.1. A época do escravidão no Brasil

A presença dos escravos islamizados no Brasil foi sistemática e duradoura desde o século XVIII até os meados do século XIX. Os escravos chegaram no Brasil com uma heterogeneidade étnica, cultural, religiosa e linguística. As maiores comunidades de escravos islamizados que desembarcaram na Bahia eram os iorubas ou nagôs, seguidos pelos haúças (os mais intensamente islamizados), depois os nupes, bornos e borgos. A maioria dos escravos muçulmanos chegaram do Sudão central, cativados durante as guerras entre Califado de Sokoto 137 e as tribos africanas da região do Golfo da Guiné e depois vendidos aos traficantes de escravos portugueses. Houaiss em 1922 nota que entre 300 e 400 línguas africanas chegaram no Brasil via os escravos. Ao chegar no Brasil, o islão foi praticado em segredo. Depois da revolta dos malês138 em 1835, o governo brasileiro criminalizou qualquer prática do islão e uso da língua árabe, o que rapidamente levou ao desaparecimento dos ambos. O desaparecimento do árabe é devido também ao fato que apenas um número limitado de pessoas da comunidade muçulmana conhecia a língua em tal nível que podia ler e escrever. No Brasil no século XIX a língua árabe era firmemente ligada à prática do islão e a resistência da religião levou à preservação da língua, como a língua própria era raramente usada em outro âmbito que não fosse religioso. Segundo Dobronravin, entre os afro-muçulmanos do século XIX a língua árabe era a principalmente língua escrita, ao lado do português, limitada ao âmbito religioso - gravada em amuletos, orações e suras do Alcorão - a assim nunca se desenvolveu como língua da

137

Localizado no território de que hoje é Nigéria, este califado era a mais poderoso império sub-saariano antes do começo da colonização europeia. 138 O termo malê ( do ár. muʿallim "professor, instrutor", através do haúça malami que significava "professor" e "muçulmano", enquanto no ioruba a mesma palavra só significava "muçulmano"), que no início usavam-no apenas por adeptos de outras crênças para se referirem aos africanos islamizados. Depois passou a ser usado como etnónimo de todos os afro-muçulmanos e foi generalizado com este significado no português brasileiro.

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comunicação quotidiana. 139 A língua árabe no Brasil nunca atingiu o nível de alta cultura e prestígio que tinha na Ibéria medieval, e ficou sempre ligada às comunidades escravas, considerada inferior à língua dos donos portugueses. 140 Mesmo assim, os falantes do árabe tinham uma alta opinião desta língua, sendo língua do Corão e parte da sua cultura e identidade. Com tempo, a competência linguística limitou-se a copiar orações corânicas em caráteres árabes e decorá-las. Um número de documentos desta natureza foram caturados dos malês durante a revolta e hoje são analisados por especialistas.

7.2. A imigração árabe do século XIX

Segundo Maranhão 141 existiam dois fluxos de imigração de falantes arabófonos no Brasil do século XIX: o primeiro entre 1860 até 1938, com a chegada de um grande número de árabes cristãos e entre 1945 e 1985, quando chegaram em maioria árabes muçulmanos. Todos estes emigrantes eram principalmente sírios, libaneses e palestinos. Por causa da religião que era mesma como a da maioria dos brasileiros, o grupo dos árabes cristãos passaram pelo processo de integração na sociedade mais facil do que no caso do segundo grupo, que preservou o árabe como língua de maior prestigio. Estas comunidades geralmente dedicaram-se à mascateação e abriram várias lojas no ramo de tecidos, roupas e tapetes. Em contraste com os demais grupos de imigrantes, como os alemães e japoneses, as comunidades árabes estabeleceramse em centros urbanos junto com os brasileiros e não se isolaram, o que explica a facilidade com qual os novos termos árabes acharam o seu lugar no vocabulário português brasileiro. À estas comunidades de imigrantes acredita-se a contribuição de termos designativos de alguns pratos típicos da culinária sírio-libanesa. Vargens documenta 12 itens lexicais introduzidos na primeira fase da imigração árabe e todos pertencem ao campo da culinária.

139

DOBRONRAVIN, N. (2004) Escritos multilíngues em carácteres árabes: novas fontes de Trinidad e Brasil no século XIX. 140 Esta situação não se pode descrever como diglosia, como a funcionalidade da língua árabe era demasiado limitada até para ser consierada como registo baixo. 141 MARANHÃO, S. DE M. (2012) A língua portuguesa e a Romania Arabica. p.5.

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7.3. Análise dos arabismos no português brasileiro

Hoje ainda existem dúvidas sobre o total número de arabismos importados no Brasil. Como já notamos, os arabismos brasileiros poodem dividir-se em dois campos semânticos: o de religião e o da culinária. Vargens documenta vários arabismos legados por afro-muçulmanos no tempo do Brasil esclavagista na sua obra "Léxico árabe na língua portuguesa" e regista 24 arabismos, enquanto o Dicionário Aurélio regista 16, Houaiss 17 e o Dicionário Michaelis 11. 142 Dos arabismos que Vargens regista, só um - aluá 143 - pertence ao campo da culinária. No campo da religião predominam quase absolutamente os arabismos de origem malê e descrevendo: a) .orações islâmicas (açubá, adixá, aiassari, ailá); b). ministros de culto religioso (alicali, alufá, lemano); c). crente (amim, malê, mussurumim); d). templo (djema, maçalami); e). entidade (aligenun); f). objetos litúrgicos (tecebá); g). preceitos (assumi, azaca, jihad, sacá); h). saudações e locuções interjetivas (barica da suba, bissimilai, maneco lassalama, sala, maleco). Os arabismos provenientes da imigração sírio-libanesa que imigrou desde o século XIX são quase exclusivamente relacionados com o campo culinário, mas alguns estudos novos começam a revelar mais diversidade e introduzem campos semânticos

142

MARANHÃO, S. DE M. (2010) O contato português-árabe na Bahia escravagista: sócio-história e consequências linguísticas. p.3. 143 No Brasil é uma bebida doce não alcóolica, resultado de fermentação de farinha de arroz ou de milho e outros ingredientes.

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novos para empréstimos recém-descobertos. 144 Alguns dos arabismos mais comuns da área de culinária são: bahar (pimenta síria, mistura de várias especiarias moídas), chilchi halawi (xarope de tamarindo), fanília (essência de baunilha, em verdade da mesma origem como a palavra portuguesa baunilha, do castelhano vainilla), fulful ábia (pimenta-do reino branca), fulful mathun (pimenta do reino), fulful ahdar (pimenta do reino verde), fulful assuid (pimenta do reino preta), hardel arabi (mostarda), janjabil (gengire), mai ward (água de rosas), tahine (tehine), zafarán (açafrão).

144

O estudo de Oliveira e Maranhão "Arabismos do campo semântico do vestuário na língua portuguesa das minas setecentistas" analisa um corpus de 20 vestuários do Minas Gerais do século XVIII e identificaram 26 lexemas de origem árabe.

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8.

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Conclusão Em comparação com a herança arquitetónica de origem árabo-islâmica em

Espanha, podemos refletir que é lamentável que Portugal também não herdou uma Alhambra ou uma Giralda. Os vestígios visíveis são fáceis para observar, mas raramente pensamos sobre a língua, mesmo que a usemos todos os dias e nem sequer temos de estar acordados. A língua é portadora da herança numa forma discreta e refinada. Pode ser que os portugueses não herdassem nenhum sítio material para comprovar que os muçulmanos realmente ocuparam o seu território, mas a abundância de provas linguísticas não pode ser negada. Mais do que um simples objetos de estudo académico, os arabismos portugueses refletem uma época histórica que durou quase oitocentos anos e, segundo um número crescente de autores, era um dos mais importantes catalisadores do Renascimento na Europa. Este é um papel importantíssimo. O contato entre as línguas na Península Ibérica e a natureza das palavras emprestadas comprova justamente isso. Se a Reconquista não apagasse a influência árabo-islâmica no tempo que aconteceu, podia ter surgido um Portugal bastante diferente do que conhecemos. Hoje sabemos que devemos a criação de Portugal ao sucesso da Reconquista, que trouxe do norte o povo lusófono que substituiram os falantes arabófonos. O que restou eram os arabismos. Alguns séculos depois, os arabismos portugueses ganham um novo impulso. O contato entre o árabe e o português ocorre mais uma vez, num contexto novo. Os falantes árabes não chegam como conquistadores, mas como escravos. Os falantes portugueses não se consideram como portugueses, mas brasileiros. O resultado foi uma diferente aquisição dos arabismos. Os arabismos brasileiros até hoje não acharam o posto devido no estudo de arabismos em geral, mas vários esforços recentes tratam de mudar esta situação e publicam-se estudos dedicados somente aos arabismos brasileiros. Para continuar a popularização dos arabismos brasileiros, neste trabalho também dedicamos um capítulo aos conhecimentos mais recentes sobre este tópico. Esperamo que esta tendência continuará e que enriquecerá o estudo de arabismos em geral, e também que o autores seguintes reconhecerão a necessidade de reavaliar as etimologias e teses existentes.

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9.

49/55

Transcrição das palavras árabes Neste trabalho, decidimos usar o alfabeto DIN 31635 para a transcrição

de palavras árabes. Este alfabeto é um padrão de romanização do alfabeto árabe elaborado pelo Instituto Alemão para Normatização (Deutsches Institut für Normung) em Berlim e oficialmente adotado em 1982. Hoje este sistema é, junto com o sistema de transliteração do Hans Wehr, 145 a norma mais extensivamente usada em publicações e geralmente no mundo académico. Em

caso

continuamente

de

palavras

numa

forma

árabes que

frequentas, desvia

da

que

na

transcrição,

literatura

usam-se

referiremos

em

anotação a forma em DIN 31635 em primeira menção e continuar com o uso da forma mais frequente.

Fonte: http://transliteration.eki.ee/pdf/Arabic_2.2.pdf

145

Usada no Dictionary of Modern Written Arabic, pelo arabista alemão Hans Wehr, publicado pela primeira vez em 1961 em Wiesbaden, Alemanha. A diferença entre os dois sistemas é que DIN 31635 usa só uma letra romana para corresponder à letra árabe, enquanto Hans Wehr usa combinações de letras na transcrição românica.

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