Os climats da vinha da Borgonha

May 26, 2017 | Autor: Virgílio Loureiro | Categoria: History of Wine, History of Taste, Drinking Culture
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ENOTURISMO

Os climats da vinha da Borgonha foram recentemente reconhecidos pela UNESCO como Património Cultural da Humanidade. São 1247 parcelas de vinha que começaram a ser individualizadas há quase dois milénios e que, a partir da Idade Média, graças à vontade dos Duques da Borgonha, ao génio dos monges beneditinos e ao trabalho de muita gente, se transformaram numa obra-prima de reconhecido valor universal, do ponto de vista histórico, estético, etnológico e antropológico. 110 | EPICUR N. II OUTONO 2015

Os climats da vinha da Borgonha TEXTO VIRGÍLIO LOUREIRO FOTOGRAFIAS BOURGOGNE TOURISME

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uando se faz turismo na Borgonha e se sai de Dijon em direção a sul, com o im de conhecer a célebre Côte d’Or, é conveniente seguir pela estrada Nacional 74, para que se possa adequar a velocidade da viatura ao ritmo da região. Qualquer turista será sensível à quietude que o envolve, à beleza da paisagem, às vinhas geométricas, às aldeias pitorescas que se sucedem umas atrás das outras. A jornada poderá ser dividida em duas partes, usando a manhã para visitar a Côte de Nuits, que termina em Nuits St.-Georges e é célebre pelos seus vinhos tintos, e a tarde para percorrer a Côte de Beaune até Santenay, mais famosa pelos seus brancos. Com o tempo bem aproveitado, ainda dá para almoçar num belíssimo restaurante e provar vinhos num dos inúmeros negociantes especializados da região. Será sempre um dia muito bem passado e permitirá dizer aos amigos, mais tarde, que se conhece a Borgonha. Porém, quando se faz enoturismo e se é um admirador confesso dos brancos e tintos da Borgonha, os cerca de sessenta quilómetros que separam Dijon do limite sul da Côte d’Or, em Santenay, podem demorar vários dias a percorrer e provocar emoções fortes e a um ritmo extasiante. Em primeiro lugar não se toma uma estrada secundária, mas a mais famosa estrada do vinho de todo o mundo – a lendária Departamental 122 – que passa pelo centro das localidades cujas tabuletas anunciam algumas das mais icónicas Denominações de Origem Controlada do planeta. Cada vinha murada – um clos – merece uma paragem e, se o acesso ostentar um portão com o nome gravado, obriga a uma fotograia. Cada pedreira deve ser olhada com cuidado e as suas pedras comparadas com as dos muros das vinhas e as das paredes das igrejas ou mosteiros próximos. Cada aldeia tem de ser visitada com minúcia, à procura das pequenas adegas onde vinhos emocionantes apuram as suas qualidades. Conversar com os pequenos produtores é uma tarefa obrigatória, para entender o espírito do lugar e a alma dos vinhos artesanais, embora seja uma tarefa (muito) difícil, que deve ser planeada e marcada com a devida antecedência. As igrejas góticas e os mosteiros devem ser percorridos e venerados, pois em muitos deles se escreveu a história do vinho da Borgonha a letras de ouro e iluminura. As vinhas mostram nuances que não podem passar despercebidas, devendo andar-se a pé por alguns dos muitos caminhos e trilhos existentes. O viço das cepas, a dimensão dos cachos, o número de rácimos e o tamanho dos bagos variam com a localização das vinhas, denunciando que a região é muito mais complexa do que a homogeneidade da paisagem faz supor. Alguns locais icónicos serão de visita

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Como tudo começou A exemplo de todos os territórios do Império Romano onde a vinha se podia cultivar, também a Borgonha produziu vinho no início da era cristã, como o comprovam os inúmeros vestígios arqueológicos e a célebre denominação La Romanée. Os herdeiros do Império continuaram a reverenciar a vinha, recuando a esse tempo a fama do monte Corton, cujas encostas calcárias o Imperador Carlos Magno ofereceu aos beneditinos da Abadia de Saulieu, em 775, com a condição de aí se produzir vinho branco, há séculos conhecido com a designação «Corton-Charlemagne». Porém, a construção vitícola da Borgonha, iniciada pelos romanos e continuada pelos beneditinos, teve um forte impulso no século XII, depois de os monges brancos se rebelarem contra o luxo em que viviam os monges negros da Abadia de Cluny e fazerem do Mosteiro de Cister o seu lugar inspirador. Liderados por São Bernardo e alimentados pelo fervor da fé e pela convicção dos ideais, os cistercienses izeram do trabalho agrícola uma forma de arte, colocando ao seu serviço toda a sabedoria, inteligência, sentido de observação e perfeccionismo que os distinguia. No ano em que fundaram Cister, 1098, receberam do Duque da Borgonha a sua primeira vinha, em Meursault, e entre 1109 e 1116 receberam várias terras em Vougeot, onde plantaram vinhas, construíram adega e, bastante mais tarde, muraram a propriedade e ediicaram o afamado Château, dando origem ao mítico Clos de Vougeot. Entretanto, as inúmeras propriedades que os monges cistercienses foram obtendo em toda a Côte d’Or, através de doação, compra ou arrendamento, permitiram-lhes dar trabalho a muitos frades conver-

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obrigatória, como o Clos de Vougeot, onde ainda se podem ver as gigantescas prensas usadas pelos frades no século XVI, os restos da célebre abadia de Cîteaux [Cister], que tanta inluência teve na construção da Borgonha (e da Europa) vitícola, ou os célebres Hospices de Beaune, fundados em 1443, onde desde 1794 se fazem os famosos leilões de vinho, em Novembro. Mesmo que se possa dedicar muito tempo a desvendar os segredos do percurso, ica-se com a sensação de que quase tudo icou por ver e por sentir. E, quando se é um enóilo perseverante, antes da despedida, já estaremos a fazer projetos para a próxima visita. A Côte d’Or é assim. Toca-nos a todos nós, enóilos, de uma forma intensa e magnética, obrigando-nos a regressar. O seu segredo começou a ser construído há dois mil anos e chama-se: climats.

sos (castanhos) e conhecer em profundidade o comportamento das videiras nos diferentes locais. O espírito analítico levou-os a registar o estilo de vinho que as uvas de cada parcela originavam, a capacidade que os vinhos tinham para envelhecer e reinar o aroma e sabor, os locais onde as uvas amadureciam mais depressa, as vinhas mais afectadas pelas geadas,... Veriicaram em pouco tempo que as vinhas de meia encosta eram quase sempre melhores do que as da planície ou das que se situavam próximas da linha de cumeeira das colinas, mesmo quando a distância entre elas era de poucos metros. Também chegaram à conclusão de que o comportamento das vinhas era surpreendentemente consistente de ano para ano, justiicando o seu mapeamento, hierarquização e delimitação, que passaram a fazer através de muros de pedra ou sebes vegetais. Estava inventado o conceito de terroir, a que os monges chamaram pela primeira vez climat em 1584. Intimamente associado a este conceito emergiria o conceito de cru – uma parte homogénea de uma vinha que origina vinhos com caráter e identidade próprios – e um dos grandes legados dos cistercienses à Viticultura. Importará salientar que, na Borgonha, este conceito se restringe a uma parte homogénea de terreno (que pode ser de vários produtores), enquanto em Bordéus engloba a vinha e o prestígio do produtor. E isso faz toda a diferença, pois na Borgonha os vários proprietários de um dado cru podem produzir vinhos de qualidade muito variável, como acontece, por exemplo com o Grand Cru Clos de Vougeot, que tem vinhos do Domaine Leroy, Mugneret-Gibourg, Méo-Camuzet, Anne Gros, Dufouleur Frères, René Engel, Henri de Villamont ou Château de Marsannay, entre outros, com notoriedades e qualidades bem diferentes. E isso nunca acontece em Bordéus. Todo o processo de identiicação e caracterização dos climats demorou séculos a ser desenvolvido, sendo aprimorado pela evolução da técnica vitícola e enológica, enriquecido pela construção dos muros das vinhas com as pedras resultantes das espedregas, valorizado com a construção de adegas, casas, igrejas ou mosteiros com as pedras das pedreiras próximas e, naturalmente, moldado à estratégia dos Duques da Borgonha e às regras do mercado. Mesmo assim, é seguro airmar que o mapeamento dos climats da Côte d’Or está concluído há mais de 250 anos, constituindo um feito ímpar e uma antecipação em vários séculos do futuro da Viticultura cientíica. A motivação para este caráter pioneiro foi, aliás, de peso. Por um lado, impulsionou-a o desejo de produção do «sangue de Cristo», um

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Denominações de Origem da Borgonha: as mais complexas do mundo A Borgonha desenvolve-se de norte para sul no centro-leste da França, abarca uma área geográica com mais de 200 km de extensão e integra várias sub-regiões produtoras de vinhos com qualidade e estilo muito diferentes: Chablis, Côte d’Or (dividida em Côte de Nuits e Côte de Beaune), Côte Chalonnaise, Mâconnais e Beaujolais. Salvo honrosas exceções, os grandes vinhos da Borgonha produzem-se todos na Côte d’Or, onde existem 33 dos 34 Grand Crus da região (o restante é em Chablis). Para se perceber um pouco dos vinhos da Borgonha e da importância que têm os climats, convém saber que, correspondendo a qualidades (e preços) muito diferenciados, existem quatro níveis hierárquicos de vinhos: desígnio de fé, que deveria ser controlado pela Igreja e particularmente pelos monges enólogos. Por outro, havia o incentivo do enorme negócio que o vinho de qualidade constituía, dado ser a bebida das elites, da gente endinheirada e do povo em dias de festa. Se tivermos em conta que os mosteiros eram os locais onde toda a nobreza se instalava sempre que viajava – e andava sempre a viajar – é fácil perceber a importância de servir à sua mesa vinhos de grande qualidade. Estes traziam prestígio, inluência e poder, principalmente se fossem considerados «os melhores vinhos da Cristandade», como proclamava orgulhosamente, no século XV, o Duque da Borgonha, Filipe III, casado com Isabel de Portugal, ilha de D. João I. A originalidade da Borgonha A genialidade da obra dos monges beneditinos deve-se, em primeiro lugar, às caraterísticas geográicas muito peculiares da Côte d’Or. Apercebemo-nos delas com facilidade quando fazemos a viagem de Dijon para Beaune. Toda a região é plana ou um pouco ondulada, com cotas entre 250 a 300 m acima do nível do mar, à exceção de uma cadeia de pequenas colinas, de cota raramente superior a 400 m, que a protege dos ventos atlânticos. Nestas condições, o clima tem de ser homogéneo, só havendo lugar a pequenas diferenças motivadas pela proteção das colinas e pela sua exposição. Em contraste, o solo é muito heterogéneo e complexo, tanto quanto à natureza das rochas calcárias que lhe deram origem, como à fertilidade, fortemente dependente da sua profundidade, da maior ou menor presença de rocha e da facilidade de drenagem das águas pluviais. As diferenças de comportamento de vinhas próximas ou contíguas podem ser, portanto, devidas à exposição ou ao tipo de solo e são detetáveis se as vinhas forem plantadas com a mesma casta e seguirem a mesma técnica de cultivo. De início, as castas utilizadas seriam, à boa maneira medieval, várias. Porém, o sentido de observação dos monges permitiu selecionar as mais aptas à região, que teriam de ser de ciclo curto e amadurecer precocemente. Através de seleções sucessivas, eles terão elegido a casta «Noirien», mais tarde conhecida por Pineau (talvez devido ao facto de o cacho de bagos miúdos e muito apertados lembrar uma pinha) e, inalmente, por Pinot Noir, cujas caraterísticas se adaptam na perfeição à Borgonha e cujo peril aromático dos seus vinhos varia com muita facilidade. Houve outras castas a disputar o protagonismo da Pinot Noir, como a Gamay, que ainda era mais precoce,

Grand Cru É a categoria de vinhos mais alta e corresponde invariavelmente a um sítio especíico, pelo que tem uma denominação própria, geralmente o nome da vinha: Clos de Vougeot, Chambertain, Échezeaux, Musigny, La Tâche, Montrachet,... Quando pertencem a um único proprietário têm a designação adicional de Monopole. A sua produção representa menos de dois por cento do total da Borgonha e corresponde a cerca de 550 ha de vinha, quase toda situada a meio das encostas suaves das colinas.

Premier Cru É a segunda categoria e, a exemplo da primeira, também está conotada com sítios especíicos, cuja designação engloba o nome da comuna seguido do nome da vinha – Chassagne-Montrachet, (Les) Caillerets, – ou, se o vinho provém de mais do que uma vinha Premier Cru, engloba o nome da comuna, seguido do nome da categoria: «Chambolle-Musigny, Premier Cru». Existem cerca de 635 Premier crus na Borgonha, cujas vinhas se situam quase sem exceção a meiaencosta e representam à volta de 10% da produção total da Borgonha.

Apelação Comunal São vinhos provenientes de vinhas situadas na parte inferior das encostas ou junto às linhas de cumeeira, onde a maturação das uvas não é tão perfeita, quer pela maior fertilidade das terras, quer por estarem mais desabrigadas. Existem 43 denominações comunais, como por exemplo Meursault, Nuits St.-Georges, Chambolle-Musigny, Gevrey-Chambertain. Estes vinhos são vulgarmente conhecidos por villages, são com frequência associados ao nome da vinha mais famosa da comuna e representam cerca de 35% dos vinhos da Borgonha.

Apelação Regional «Borgonha» É a mais básica de todas as categorias e os vinhos assim certiicados são, em regra, banais e baratos. As vinhas atingem grandes produções graças aos terrenos férteis e planos em que se encontram, representando mais de 50% da produção total. Existem 22 denominações regionais, como as genéricas Bourgogne e Bourgogne Grand Ordinaire, ou as especíicas Chablis ou Beaujolais.

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Os valores estratosféricos que as vinhas podem atingir foram comprovados numa das últimas transações efetuadas, em que o comprador teve de pagar mais de 2.500€ por cada cepa! produzia muito mais e originava vinhos mais escuros e mais alcoólicos. Felizmente que o sentido de observação dos frades e, também, o seu gosto apurado, logo detetaram que os vinhos não podiam rivalizar com os de Pinot Noir. A opção entre fazer muito vinho vulgar, à base de Gamay, e menos vinho mas de peril aristocrático, à base de Pinot, foi mais um golpe de génio, autocraticamente tomado pelo Duque da Borgonha, João I, o Sem Medo, que decretou, em 1395, o arranque de todas as cepas de Gamay, invocando que o vinho desta casta vulgar era «nocivo» e «prejudicial à saúde dos seres humanos»! Para compreender estes comentários, importará referir que, na época, o estilo de vinho apreciado era o macio clarete (ou vermelho), enquanto o rascante tinto (ou negro) era considerado nocivo e próprio para consumo por gente rude. O importante, no entanto, é que a decisão do Duque se tornou decisiva para compreender os climats da Borgonha (Côte de Nuits). A partir de então, tinham em comum um clima homogéneo e uma casta muito sensível às variações do terreno, produzindo vinhos que se podiam distinguir com base na natureza do solo e exposição. Quanto aos climats da Côte de Beaune e aos seus famosos vinhos brancos, a história é mais recente, não obstante se fazer branco famoso em Corton desde o tempo do Imperador Carlos Magno, bem como tintos ilustres em Pommard e Volnay. De facto, os climats da Côte de Beaune só começaram a ser realmente famosos a partir do início do século XVII, quando foi reconhecida a qualidade dos brancos de Meursault, Puligny, Volnay e Chassagne — sendo a mais famosa vinha de brancos do mundo, a mítica Montrachet, referenciada pela primeira vez apenas em 1600. A casta Chardonnay começou então a emergir entre as várias castas brancas cultivadas, graças à sua precocidade e plasticidade, depois de já ser famosa em Chablis há séculos (parece que introduzida pelos cistercienses), onde, ironicamente, era conhecida por Beaunois, nome que sugere ser originária de Beaune. Muitos fatores terão contribuído para o atraso da airmação dos climats da Côte de Beaune face aos da Côte de Nuits, mas salientam-se dois dos mais importantes: a grande quantidade de pedra (nomeadamente margas) da região, mais desfavorável à casta Pinot Noir do que à Chardonnay, e o menor reconhecimento do vinho branco, que era menos valorizado que o tinto claro e, assim, não gerava tantos lucros. As voltas da História No início do século XVII, o imenso património vitícola da Borgonha, quase todo pertença dos bispados, mosteiros e nobreza, começou a mudar de mãos, fruto da decadência reinante e da emergência de uma nova classe de pessoas com dinheiro, sobretudo em Dijon. A Abadia de Saint-Vivant vendeu a vinha de Romanée em 1631, a Catedral de Langres vendeu o célebre Clos de Bèze em 1651, os cistercienses venderam as terras de Corton em 1660, e o Clos de La Perrière em 1662, e o Capítulo de Saulieu vendeu a célebre vinha de Corton, oferecida quase mil anos antes por Carlos Magno, em 1660. Começavam a soprar novos ventos na Borgonha e a vinha estava a ser lentamente laicizada.

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De súbito, passado pouco mais de um século, a Revolução Francesa provocou o leilão como «bens nacionais» de todos os bens da Igreja e da aristocracia, onde se incluíam mais de 12.000 ha de vinhas cistercienses. Então, quase todas as vinhas mudaram de donos. Estavam criadas as condições para a destruição da obra de arte dos monges enólogos, iniciada quinhentos anos antes. Mas, surpreendentemente, como que por milagre, tal não aconteceu. É certo que houve excessos, perdas de privilégios, mudanças radicais, a expulsão dos frades, cabeças cortadas, muitas trapaças e trapalhices, mas os climats da Côte d’Or lá foram resistindo. A juntar a tudo isto, a legislação francesa sobre as heranças, ao considerar todos os herdeiros em pé de igualdade, estimulou o fracionamento contínuo dos climats. Ainda assim, dividida por cada vez mais proprietários, a paisagem da Côte d’Or continua incólume e os seus vinhos quase intocáveis. Esta obra exemplar, quase perfeita, reconhecida por todos, permite obter grandes proventos e prestígio aos viticultores e a toda a Côte d’Or, se as vinhas forem geridas em conjunto. O segredo está na conciliação e garantia de harmonia entre todos os herdeiros, nomeadamente através da criação de sociedades comerciais. Só assim se percebe que as melhores vinhas tenham variados donos, muitos deles proprietários de ilas de videiras ou, apenas, de cepas, num hino à inteligência, ao bom senso e, obviamente, aos interesses económicos em jogo. Os valores estratosféricos que as vinhas podem atingir são testemunho disso mesmo, como o prova uma das últimas transações efetuadas, em que o comprador teve de pagar mais de 2.500€ por cada cepa! O que a ciência do século XXI ainda não consegue explicar Quando se entende, em toda a sua profundidade, a história vitícola da Côte d’Or, não se pode deixar de sorrir com os maus tratos inligidos diariamente ao conceito de terroir (climat) pelos muitos produtores de vinho (e não só) de outras regiões vitícolas do mundo. De fato, são raríssimas as regiões onde é possível conjugar um clima homogéneo, um solo heterogéneo e uma única casta, tinta ou branca, que reage de forma notória a detalhes da paisagem ou do solo. E, se entrarmos em linha de conta com a história, a cultura e o savoir-faire, diicilmente se encontra outra região vitícola onde o conceito se possa aplicar Apesar de tudo isto, os cientistas continuam, de forma incansável, a tentar descodiicar os segredos do terroir e, acima de tudo, as subtis relações causa/efeito entre terroir e estilo de vinho. A sua principal diiculdade é a de não ser possível tipiicar o estilo do vinho com base na composição química qualitativa, que conta mais de seiscentos compostos distintos. Quando se passa para a composição química quantitativa, procurando analisar grupos de compostos, o número de combinações é de tal maneira grande que não permite, pelo menos até hoje, chegar a conclusões. Dizemos nós: ainda bem. Pois, se isso vier a ser possível, o encanto do vinho acabará e a bebida dos deuses passará a ser, apenas, mais uma mera bebida dos homens. E

A passeio, pela Borgonha vinícola TEXTO CAROLINA LICATI/EPICUR

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Produtores

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Château de la Tour Rue de la Montagne 21640 Vougeot Tel.: 00 33 3 80 62 86 13 www.chateaudelatour.com Domaine Bertagna 16 Rue du Vieux Château 21640 Vougeot Tel.: 00 33 3 80 62 86 04 www.domainebertagna.com

Este é um passeio para descobrir a região dos tintos mais conhecidos da Borgonha. A Côte de Nuits é a zona vinícola com cerca de 40 km que se encontra entre Dijon e Ladoix-Serrigny. Inicie a sua incursão pelo terroir da Borgonha precisamente onde tudo começou: no Château de Clos de Vougeot, uma antiga adega dos monges cistercienses. Construída no séc.XII, ainda hoje abriga a confraria dos «Chevaliers de Tastevin». Inicie-se nos vinhos da Borgonha com uma degustação que lhe permitirá entender as diferenças entre os prestigiados terroirs. Alguns produtores recebem visitantes nesta área: Château de la Tour, Domaine Bertagna ou Domaine René Leclerc . Na hora de experimentar a deliciosa gastronomia local, escolha um charmoso restaurante gourmet, como o Simon, em Flagey-Echezaux, ou o cobiçado Chez Guy, no centro de Gevrey Chambertin, cidadeícone dos grandes tintos da Borgonha. Só aqui encontramos nove dos seus 33 Grands-Crus! À tarde, visite uma fábrica de queijos, com direito a degustação de algumas variedades típicas da região, dos espécimes mais cheirosos aos mais fresquinhos. Como dizia Charles de Gaule, «não é fácil governar um país onde existem 365 tipos de queijos»! Conheça o processo de fabricação do Epoisse, um dos mais venerados. Prosseguindo na Route des Grands Crus, não deixe de espreitar o vinhedo do mais caro e renomado vinho do mundo: o insuperável Romanée-Conti. Prepare a câmara fotográica para o clássico retrato ao lado da cruz e muro que marcam e delimitam este domínio. Em direção a sul, pare em Nuits-St. Georges, onde é possível visitar caves como as de Domaine Dufuleur ou Maurice-Gavignet.

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Côte de Nuits – Pinot Noir, the King

Domaine René Leclerc 29 Route de Dijon 21220 Gevrey-Chambertin Tel.: 00 33 6 31 05 68 50 www.domaine-rene-leclerc-gevreychambertin.com

Restaurantes Restaurant Simon 12 Place de l'Église 21640 Flagey-Echézeaux Tel.: 00 33 3 80 62 88 10

Domaine Armelle e Bernard Rion 8 Route Nationale 21700 Vosne-Romanée Tel.: 00 33 3 80 61 05 31 www.domainerion.fr

www.restaurant-simon.fr Chez Guy 3 Place de la Mairie 21220 Gevrey-Chambertin Tel.: 00 33 3 80 58 51 51 www.chez-guy.fr Restaurant La Cabote 24 Grande Rue 21700 Nuits-Saint-Georges Tel.: 00 33 3 80 61 20 77 www.restaurantlacabote.fr

Domaine Dufuleur Père et Fils 17 Rue Thurot 21700 Nuits-Saint-Georges Tel.: 00 33 3 80 61 21 21 www.dufouleur.com Domaine Maurice Gavignet 69 Rue Félix Tisserand 21700 Nuits-Saint-Georges Tel.: 00 33 3 80 62 11 79 www.domainealainmauricegavignet.com/vins.html

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A Côte de Beaune é a região vinícola situada entre Ladoix-Serrigny ao norte e Santenay ao sul. É famosa pelos seus Grands Crus de branco, mas não só. Também oferece tintos de altíssima qualidade que vale a pena descobrir. A norte de Beaune, encontra-se a colina de Corton, conhecida por produzir o vinho preferido do famoso imperador Carlos Magno. Neste terroir excecional, encontram-se Grands Crus de tinto e de branco. Nada como degustá-los, por exemplo, na adega Comte Senard, onde é possível harmonizar um vinho diferente com cada prato. À tarde, continue o passeio por Pommard, Volnay e Meursault, pequenas cidades que deram origem a grandes vinhos. Em Pommard, é possível disfrutar de uma degustação e visitar o deslumbrante Château de Pommard. Em Meursault, poderá fazê-lo também no Château de Meursault ou no Caveau Monnet, situado no centro da aldeia. Siga até Puligny-Montrachet, a cidade do vinho homónimo, um ícone dos brancos da Côte de Beaune. Harmonize outra refeição com vinho no restaurante Table d’Olivier Lelaive, reconhecido produtor da região. Saboreie a diferença entre cada vinho, a elegância do Puligny, a força do Chassagne e o volume do Meursault. Se preferir uma enoteca onde poderá apreciar vinhos de diferentes produtores ao mesmo tempo, o Caveau de Puligny é uma boa escolha. De regresso a Beaune, não deixe de visitar o maravilhoso Hospices de Beaune, que no séc. XV era considerado o hospital mais moderno do mundo e cujo telhado colorido é o mais frequente cartão postal da Borgonha.

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Côte de Beaune – Império do Chardonnay

Domaine Comte Senard 1 Rue des Chaumes 21420 Aloxe-Corton www.domainesenard.com

Le Montrachet 10 place du Pasquier de la Fontaine 21190 Puligny-Montrachet Tel.: 00 33 3 80 21 30 06 www.le-montrachet.com

Château de Pommard 15 Rue Marey Monge 21630 Pommard Tel.: 00 33 3 80 22 12 59 www.chateaudepommard.com

Cellier Volnaysien 2 Pl. de l'Église, 21190 Volnay Tel.: 00 33 3 80 21 61 04 www.restaurant-lecelliervolnaysien.com

Château de Meursault 5 Rue du Moulin Foulot 21190 Meursault Tel.: 00 33 3 80 26 22 75 www.chateau-meursault.com

Restaurantes

Produtores

Caveau de Puligny 1 Rue de Poiseul 21190 Puligny-Montrachet Tel.: 00 33 3 80 21 96 78 www.caveau-puligny.com

Beaune Caves Madeleine Popietes Ma Cuisine Le Benaton 1*Michelin Loiseau des Vignes 1* Michelin

Hotéis e Pousadas Beaune

Restaurantes Domaine Comte Senard 1 Rue des Chaumes 21420 Aloxe-Corton www.domainesenard.com

Hotel Le Cep 4* Hotel de la Poste 4* Hotel de la Paix 3* Hotel Athanor 3*

Challanges Château de Challanges 4*

Table d'Olivier Lelaive Place du Monument 21190 Puligny-Montrachet Tel.: 00 33 3 80 21 95 27 www.olivier-lelaive.com

Aloxe Corton Hotel Villa Louise 3*

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