OS DESDOBRAMENTOS DO USO E OCUPAÇÃO DAS ÁREAS DE RESSACA (MACAPÁ/AP)

June 13, 2017 | Autor: Camilo Agenor | Categoria: Gestão Pública, Ordenamento Territorial, Urbanização, Desenvolvimento Social, Ressacas
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OS DESDOBRAMENTOS DO USO E OCUPAÇÃO DAS ÁREAS DE RESSACA (MACAPÁ/AP) Adriane da Costa Brito Graduação em Tecnologia em Gestão Ambiental Camilo Agenor Pureza Graduação em andamento em Direito, Curso em andamento em Técnico em Florestas Resumo: O presente artigo tem como fundamento a concepção da situação conflituosa decorrente do uso e ocupação das áreas de ressaca em Macapá. Parte-se do pressuposto que os impactos provocados nessa relação danosa, de forma dualista, tanto o meio físico (área úmida) quanto o meio social (os moradores) sofrem bastante com tal situação. Dessa forma, a pesquisa tem como objetivo abordar os impactos ambientais decorrentes do uso indevido das áreas de ressaca de Macapá/AP, para uma possível caracterização da área habitada indevidamente, e as ações antrópicas que acentuaram a intensificação da população nas referidas áreas, devido ao fluxo migratório acentuando.

Palavras-chave: Urbanização, Ordenamento Territorial, Desenvolvimento Social, Ressacas, Gestão Pública. Abstract: This article is based on the concept of conflict situation due to the use and occupation of hangover areas in Macapá. It starts from the assumption that the impacts of this harmful relationship, dualistic way both the physical environment (wetland) and the social environment (residents) suffer a lot from this situation. Thus, the research aims to address environmental impacts resulting from the misuse of hangover areas Macapá / AP, for a possible characterization of the wrongly inhabited area and human activities that emphasized the intensification of population in these areas due to migration accentuating.

Keywords: Urbanization, Land Management, Social Development, Surfs, Public Management. Sumário: 1. Introdução – 2. Áreas de ressaca – 2.1. Conceito – 2.2. Principais Ressacas de Macapá – 2.3. Funções ecológicas das áreas ressaca – 3. A qualidade de vida na área úmida enquanto meio de exclusão - 3.1 Considerações Finais

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1. Introdução A transformação de território do Amapá para uma unidade federativa (Estado) através da constituição de 1988, e a criação da área de livre comércio de Macapá e Santana (decreto federal n° 8.387, de 30/12/91), foram alguns dos principais processos que contribuíram tanto para o aumento populacional do Estado do Amapá quanto para a expansão da malha urbana de Macapá gerada por um considerável contingente de imigrantes que aportaram nas cidades de Macapá e Santana, com finalidade de buscar maiores oportunidades de emprego ofertados no setor do comercio e no serviço publico. Neste sentido chegaram ao Amapá pessoas advindas de outras cidades da federação, em maior numero aqueles que saíram do campo, provocando um considerável êxodo rural, bem como imigrantes oriundos do Nordeste brasileiro e, sobretudo os vizinhos do Estado do Pará e de outras regiões da Amazônia, que buscavam não só estabilidade no emprego mais também serviços de assistência a saúde e a educação. No contexto da dinâmica urbana de Macapá os estudos referentes à urbanização da cidade, sejam eles no âmbito do planejamento ou do discurso político, fazem referência às ocupações das áreas de ressacas responsáveis pela estruturação da cidade que demonstra uma dinâmica acelerada de redefinição de uso dessas áreas que se apresentam com características específicas no espaço urbano. As mudanças espaciais não acontecem sem que para isso tenha ocorrido um conjunto de interesses diversos. Há na produção espacial um complexo jogo de interesses que procuram de certa forma, um equilíbrio de forças. Como parte desse processo de produção, no espaço urbano os agentes provocam mudanças no uso residencial e destinam espaços específicos às diversas classes sociais alterando a configuração espacial, conforme os interesses daquela parcela da sociedade que se encontra no poder (TRINDADE JR.,1997) Segundo, Aguiar & Silva 2004 a expansão urbana de Macapá vem acontecendo sem um adequado planejamento, estimulada por um crescimento populacional da ordem de 6,02%, registrado na ultima década, esse

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crescimento é um forte indicador de contribuição para as áreas úmidas e a formação de aglomerados desordenados, provocando alterações quanto às condições sócio-ambientais das áreas de ressacas. 2. ÁREAS DE RESSACA 2.1 Conceito Ressaca é uma expressão regional empregada para designar um ecossistema típico da zona costeira do Amapá e são descritas como áreas encaixadas em terrenos quaternários que se comportam como reservatórios naturais de água, caracterizando-se como um ecossistema complexo e distinto, Sofrendo os efeitos da ação das marés, por meio de uma intrincada rede de canais e igarapés e do ciclo sazonal das chuvas. Nery, (2004, p. 27). De forma bem simples, pode-se afirmar que as ressacas são bacias de acumulação de água, influenciadas pelo regime das marés, dos rios e das chuvas e servem de lar para as diversas formas de vidas (plantas e animais), que são de grande importância para a cidade de Macapá, visto que o sitio urbano dessa região encontra-se permeado por várias áreas de ressacas, entre as quais vale destacar a ressaca da Lagoa dos índios, a ressaca do Beirol, a ressaca do Muca, a ressaca do Buritizal, a ressaca do Universidade, a ressaca do Novo Horizonte, a ressaca do Congós, a ressaca do Tacacá, entre outras. Dessa maneira, observa-se que algumas dessas áreas permanecem alagadas o ano todo, outras somente se inundam no período chuvoso. Entretanto, as ressacas são elementos novos no âmbito cientifico e não existe ainda uma definição acerca do sentido etnológico do termo, por isso sugere-se usar um conceito estabelecido em um trabalho cientifico desenvolvido por técnicos da Secretaria do Meio Ambiente do Estado do Amapá (SEMA) como sendo: Bacias de recepção, rica em biodiversidade, de dimensões e formas variadas, configurando como fontes naturais hídricas, composta por fauna (camaleões, camarões, jacurarus, insetos, ofídicos, entre outros) e flora variada (junco, buritizeiro, aningás, entre outros), encravadas na formação barreira, apresentando características evidentes como argila e areia no seu domínio,

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com comunicação endógena e exógena pertencente à rede de drenagem da bacia do Rio Amazonas, confundindo com o oceano atlântico. Coelho (2006). 2.2 Principais ressacas de Macapá A partir do momento que as ressacas são ocupadas, recebem, por parte da população, nomes próprios que na maioria das vezes, estão ligados a nome de bairros da cidade, de antigos moradores, de canais e de igarapés. ÁREA RESSACA (KM2) 4,30 1,99 0,26 1,23

ESTIMATIVA DOMICILIOS 876 12.476 526 232

ESTIMATIVA PESSOAS 3.986 12.478 2.822 5.584

1,42

8

32

15,54

377

1.714

Ressaca lago da vaca Ressaca canal do jandiá Ressaca do Pacoval Ressaca do Perpétuo Socorro

1,53 3,57 1,71

1.015 866 757

4.612 3.903 3.590

0,95

2.520

11.626

Ressaca do mucajá Ressaca o coração Ressaca do Marabaixo Ressaca do Infraero II Fonte: IEPA/GERGO

0,06 2,35 0,79 1,01

270 41 45 14

1.416 190 206 54

NOME Ressaca do tacacá Ressaca dos Congos Ressaca nova Esperança Ressaca Chico Ressaca do Ramal do 9 Ressaca do açaí Ressaca da Lagoa dos Índios

2. 3 FUNÇÕES ECOLÓGICAS DAS RESSACAS Conforme citado anteriormente, a área, onde está localizado o núcleo urbano do município de Macapá, tem seu relevo fortemente cortado por ressacas que formam um conjunto de bacias hidrográficas no igarapé da fortaleza e o rio curiaú que por sua vez integra a bacia do rio amazonas. Assim, entende-se por bacia hidrográfica uma área limitada por um divisor de água, que precipita e escorre para o rio principal. Desta forma, pode-se perceber que as ressacas recebem as águas da chuva e as direcionam para os canais que por sua vez, os canais as lançam no rio amazonas.

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Com relação à importância das áreas de ressaca para o equilíbrio ambiental na cidade de Macapá, Coelho (2006) afirma ser ecologicamente útil e primordial em relação: a) Ao clima da cidade, pois a ressaca é um excelente regulador térmico, por ser fonte de umidade e servir de corredor de vento, já que estes ventos se deslocam para os centros de concentração populacional e de fluxo de automotores, dissolvendo o calor e descentrando os agentes poluentes, proporcionando uma temperatura mais amena no ambiente urbano de Macapá, funcionando assim como fonte de equilíbrio climático. b) A reprodução biológica, já que são criadouros naturais para muitas espécies de peixes e crustáceos que migram para as ressacas com intuito de se reproduzirem e na seqüência retornarem ao rio, pelos canais naturais que interligam os rios às ressacas. c) A circulação e equilíbrio das águas, porque em sua comunicação as águas fluviais, pluviais e as áreas de ressacas se interligam umas com as outras e com os canais de drenagem, no qual há circulação e o equilíbrio das águas, permitindo a determinação da pressão dos leitos pluviais primários, orientando o escoamento e transito das águas interiores e superiores com o rio amazonas, convergindo com as águas do Oceano Atlântico. d) Centro natural paisagístico, uma vez que a harmonia gerada pela rica biodiversidade presente nas ressacas e pelos seus aspectos físicos (solo e água, por exemplo), cria um ambiente saudável que contribui para o bem estar das pessoas e demais seres vivos. Para a cidade, o cenário proporcionado pelas ressacas, valoriza as áreas urbanas situadas próximas a elas, além de possuir um grande potencial econômico que pode ser explorado pelo turismo. Em sua caracterização geral as áreas de ressacas apresentam uma diversidade muito grande na composição em flora e uma variedade de barreira, apresentando características de argila e areia no seu domínio, que logo são

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também denominadas de bacias de acumulação de águas, influenciadas pelo regime de marés ou rios de drenagem pluviais. Segundo Lima (1998) apud Maciel (2001), o tipo de solo das áreas de ressaca é classificado como hidromórficos gleisados e sedimentares de media fertilidade natural, sendo inadequados para suportar determinados tipos de construções devido à baixa resistência. 3. QUALIDADE DE VIDA VERSUS MEIO DE EXCLUSÃO Pensar na qualidade de vida da sociedade contemporânea requer, sobretudo, avaliar os níveis sócio-econômicos considerados dignos. Contudo, está claro que sob o sistema capitalista, os problemas pertinentes ao usufruto dessas condições mínimas de vida não estão à disposição de todos os indivíduos. As ocupações humanas em áreas impróprias ou inóspitas ocorrem desde o surgimento do homem, porém este processo de ocupação foi intensificado na era moderna, principalmente nas cidades onde as áreas com melhores condições ambientais de habitabilidade são rapidamente ocupadas. A pouca disponibilidade de áreas para morar, nas proximidades dos centros urbanos, leva os citadinos a fazer uso das ressacas para residir, implicando na qualidade de vida das pessoas. (SOUZA, 2003, p. 164).

Em

contraponto,

esses

ambientes

de

moradia

reproduzem

as

desigualdades comuns desse modelo econômico e também social, assim como se estende a todas as demais instancias sob a ótica marxista. Deve-se ter em mente que a região é fundamentalmente: “um processo social complexo de formação de contextos regionais que não se resumem à “lógica arreal” ou zonal (...) mais que incorporam, de forma não dicotômica, a “lógica reticular” ou as redes e a ilógica dos processos de exclusão que produzem aquilo que denominamos “aglomerados humanos de exclusão”’’ (HAESBAERT, 2004, p. 184).

Ao comparar a região amazônica (esta em maior escala) com a região que compreende o estado do Amapá (esta em menor escala), nota-se o favorecimento dos espaços dotados de mínima ou nenhuma infra-estrutura

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necessária ao mínimo bem-estar social. Logo essas áreas úmidas remetem especialmente ao estado do Amapá. O Mapa a seguir, elaborado a partir da base geográfica da SEMA e IEPA/CPAQ/GERCO (2002) apud Souza (2003, p. 69), mostra a localização das áreas de ressaca na cidade de Macapá: FIGURA

1-

Delimitação

das

ressacas

do

município

de

Macapá

Fonte: Souza (2003,p. 69) Dentre os muitos problemas envolvidos na ocupação e no uso de áreas úmidas, os quais sejam, genericamente, impactos ambientais, a problemática da qualidade de vida é pertinente, no sentido de não prover o bem-estar social à população ali residente por parte do Estado. Logo, as áreas úmidas correspondem a espaços de “aglomerados humanos de exclusão” desprovidos de quaisquer ações políticas no sentido de melhorar a vida dos referidos residentes no que concerne a infra-estrutura básica (HAESBAERT, 2004, p. 184).

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Figura 2 – Cartograma de qualidade de vida nas ressacas de Macapá e Santana

Fonte: Souza (2003, p.244) (adaptado). Logo é perceptível que a qualidade de vida não se restringe ao saneamento básico, mas a muitos outros aspectos ligados a renda, alimentação, e ao acesso aos serviços básicos sócias, dentre outros. Deve-se considerar ainda, os empecilhos referentes à legislação ambiental que rege esses espaços (o que inclui a lei n°055/99, que tomba as áreas de ressaca), o que torna as áreas de ressaca um reflexo dessa problemática. Um exemplo disso é a área de ressaca do tacacá, que sofre descaso por parte do Estado e

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do sistema econômico excludente em que se vive, por isso as áreas úmidas são compostas por bolsões de pobreza (SOUZA, 2003, p. 244). Tabela 1- Percepção de qualidade de vida da população urbana das ressacas do município de Macapá Percepção da População Macapaense da Qualidade de Vida Respostas

%

Estar bem financeiramente

26,3

Ter saúde / estar saudável

23,7

Ter emprego/ melhor condição de trabalho

13, 2

Ter moradia

8,0

Ter boa educação

7,8

Ter saneamento básico

6,1

Ter acesso a serviço / cultura / boa alimentação

5,8

Não sabe

3,5

Outras respostas

5,6

Fonte: jornal folha do Amapá (2002) apud Souza (2003, p. 259) Conforme se constata na tabela acima, depois do “estar bem financeira”, “estar saudável” é prioridade da população macapaense. Adotando uma visão holística, sabe-se que todos os elementos que concernem à qualidade de vida devem ser percebidos numa totalidade, no sentido de se completarem. O saneamento básico, como já se indica no próprio nome, é a base para uma boa qualidade de vida. Mais está claro que, conforme os estudos apontam, aqueles que não estão bem financeiramente devem fazer uso de espaços não dotados dessa estrutura básica. Assim, existem alguns problemas na moradia em Macapá não apenas pelo fenômeno da migração, mas também pela não absorção do mercado de trabalho de toda esta população imigrante e daquelas famílias oriundas do meio rural. Vale ressaltar ainda que, a falta de políticas de habitação por parte do Estado colabora para esse cenário. Assim, o que se constata, não apenas na ressaca do tacacá, mas em todas as demais áreas úmidas da cidade, é que

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todos os elementos constituintes da qualidade de vida considerada aceitável ou boa são inexistentes nestes espaços. Segundo Souza (2003), dentre a população amostral de 344 pessoas residente na área de ressaca tacacá, 58,6% afirmam residir ali por não terem opção1, em detrimento de apenas 9,68% que afirmam gostar de morar naquele espaço. Esses últimos podem ter afirmado gostar de morar naquele espaço por diversos motivos, provavelmente psicológicos, no sentido de apego ao lugar, como por exemplo, os laços familiares, topofilia por espaços úmidos, fatores nostálgicos que remetem a outros lugares, entre outros. O que está claro é que se trata de pessoas sem senso critico suficiente para perceberem as deficiências estruturais que acabam por não lhe imprimirem uma qualidade de vida mínima (ainda que lhes pareça aceitável, por comodismo ou quaisquer outros fatores). Os dados2 mostram que ainda 38% da população da área de ressaca tacacá são analfabetos funcionais, pois ainda que saibam Ler, apresentam graves problemas de interpretação textual. Entretanto, apenas 65% dos adultos são alfabetizados. Estes dados estão relacionados não apenas com quase 10% que afirmam gostar de residir naquela área úmida, como que não tiveram opção de morar em outro lugar senão no que já vive. Influenciando também o saneamento básico da saúde da população, Souza (2003) ainda relata em sua pesquisa dados acerca da ocorrência de doenças. Contudo, não foram constatados casos e hepatite nem leptospirose. Mas 4,84% dos casos de doenças remetem à dengue, e quase metade 46,77%, a malária, que são doenças mais comuns em áreas de ressaca. Outros dados indicam ainda que 6,45% declararam aparentar verminoses e 16,3% outras doenças. Esses números nada mais são do que reflexo da falta de saneamento, comuns nestes ambientes. Além disso, o acesso a água é outro problema encontrado, porque dados indicam que 72,58% da população têm que armazenar água, em função da falta de água para a comunidade. Dentre as formas de armazenamento de

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água, as mais utilizadas são as caixas d’água (41,3%) e baldes plásticos (41,3%), em decorrência da falta de condições financeiras para a aquisição de caixas d’água. Souza (2003) indica ainda que 8,7% da população afirmaram usar tambores

para

o

armazenamento

de

água

e

8,7%,

outros

meios.

Diferentemente de outras áreas de ressaca, dentre os residentes da ressaca tacacá, nenhum afirmou utilizar latas, o que pode indicar condições não tão graves quanto da ressaca Lago da Vaca, em que 16,77% disseram utilizar as latas. Já na ressaca do lago do pacoval a situação piora, onde 68,3% dos moradores afirmaram utilizar as latas como forma de armazenamento de água. Quanto às formas de abastecimento de água, os números indicam que apenas 3,22% dos domicílios possuem água canalizada. Em detrimento disso, 80,65% possuem poços com encanação interna e outros 11,29% não possuem encanação interna. Outra informação importante é que, o consumismo na sociedade contemporânea tem aumentado cada vez mais e em conseqüência disso, a produção de lixo também tem aumentado progressivamente. Não obstante, sabe-se que a população que reside em áreas de ressacas não apresenta altos índices de consumo. E em se tratando de áreas ambientalmente protegidas, a coleta de lixo é outro problema relacionado à qualidade de vida de tais comunidades, tanto na questão de saúde, como também no que tange a antropização desses meios antes naturais, que passam a ser degradados. Vale frisar, que estes são aspectos socioambientais decorrentes da ocupação e do uso das áreas úmidas, não apenas como espaços de flagelos de uma sociedade desigual. A maioria dos habitantes de zonas alagadas degrada o meio natural, o que acarreta não apenas em problemas de saúde para si mesmos, como igualmente, impactos a vida biótica. Logo é justamente nesse momento que se deve pensar de forma holística no ecossistema desses espaços alagados.

________________________________________ 1

32,26% responderam residir ali por outros motivos. 2 Souza (2003)

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Dessa maneira, Souza (2003) indica em sua pesquisa que 59,68% do lixo produzido na ressaca tacacá são coletados, enquanto 1,61% são enterrados. A não assistência por parte do Estado é percebida quando se constatam 4,84% do montante lançado a céu aberto, e ainda 24,19% sendo queimados. Porém, o ecossistema local é ainda ameaçado por 9,68% de lixo arremessado no rio, no lago e no igarapé. Sendo que apenas 6,45% dos domicílios possuem fossa séptica, mas segundo Souza (2003), trata-se de um número equivocado, porque, as fossas sépticas possuem algum tipo de sistema de tratamento. Deduzindo que se trata de fossas rudimentares, essas fossas poderiam ate mesmo ser pensadas como positivas diante de outras formas alternativas mais agressivas ao meio ambiente. Contudo, as fossas são formas ambientalmente muito impactantes. Outro aspecto importante é a taxa de desemprego, que, por exemplo, segundo Souza (2003), na ressaca tacacá, 8,87% dos moradores estavam inativos. Ressaltando que ter um emprego ou melhores condições de trabalho é a prioridade de 13,2% da população macapaense, sendo sua preocupação principal a de bem estar financeiro (Jornal Folha do Amapá, 2002; apud 2003, p 259). Contudo, a ação do governo a quem compete à gestão do espaço mundial é contraditória, pois, enquanto se constata o poder publico assistindo a população que reside em áreas úmidas no que tange o saneamento básico, pode-se afirmar que apesar de parecer uma atitude correta para com a população, trata se de condições mínimas de qualidade de vida, pós a atitude mais correta seria implementar políticas habitacionais que atendam aos aglomerados humanos de exclusão, como coloca Haesbaert (2004, p.164), solucionando de vez a problemática em que estão inseridos, pelo menos no que concerne à moradia. Dessa maneira, ainda que o Estado figure como aparato legitimado tanto pelo empresariado como pelo povo, esta longe de atuar no sentido de provar à população o exercício da cidadania e o acesso aos serviços básicos sociais. Sendo muito mais um intermediador dos interesses antagônicos das empresas

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e da sociedade, no intuito de minimizar conflitos e disparidades que venham a perturbar a reprodução do capitalismo, o Estado só age no sentido ideológico que lhe foi conferido quando há movimento social anterior. “É coerente dizer que esse modelo de desenvolvimento impõe ao homem condições aviltantes de vida, como também favorece a degradação ambiental, por meio da exploração predatória e indiscriminada dos recursos naturais e isso, por sua vez, vai causar impacto direto na condição de saúde e bem-estar da população” (NERI, 2004, p. 10).

Diante disso, a participação popular para pressionar o Estado a lhe dotar os direitos sociais que lhes deveriam ser reservados, precisa existir e persistir para alcançar os fins que almejam. Os dados de Souza (2003) indicam que 38,71% dos moradores da ressaca Tacacá têm participação social, sendo um pouco mais da metade (54,17%) freqüentadores de reuniões e 41,67% afirmaram contribuir financeiramente quanto a sua participação social. Se as demandas sócias não foram atendidas, é preciso que a comunidade da ressaca Tacacá reveja os métodos de ação popular. Levando em consideração a área de ressaca Tacacá, a maior de Macapá, alguns diagnósticos a respeito de sua recuperação podem ser considerados (Tabela 2), levando em conta as políticas habitacionais que devem ser anteriores a este processo de recuperação. Tabela 2 – Estágios de ocupação das margens das áreas úmidas de Macapá – situação 2000

Áreas úmidas Lagoa dos Índios Sá Cumprido Cristo Chico dias Beirol Tacacá Pedrinhas Pacoval

Percentual dos Estágios de Ocupação das Margens Fortemente Passiva de Preservada Antropizada Recuperação

Extensão (Km2)

24%

14%

62%

62

24% 65% 92% 17% 81% 55%

48% 18% 8% 12% 19% 25%

28% 100% 17% 71% 20%

9,20 5,64 11,90 14,20 30, 80 8, 4º 52,25

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Fonte: Silva, A. q. (apud Souza (2003, p.16a). Segundo estas informações de Souza (2003, p. 165) a ressaca Tacacá é uma área de grandes chances de ser recuperada, ao contrario de ressaca de pedrinhas, por exemplo, quase totalmente antropizada. Com isso, a área da ressaca Tacacá com 17% de sua extensão preservada (numero que poder ser menor hoje), está mais facilmente passível de recuperação total, ao passo que a ocupação não se estendeu por toda a área ainda. Por outro lado, a ressaca Tacacá é a que obtém o menor índice de qualidade de vida na cidade de Macapá e isso é devido ao menor acesso aos serviços sociais básicos. Trata-se de um espaço não servido por escolas publicas, postos de saúde e postos policias (SOUZA, 2003, p. 245). Figura 3 – Gráfico dos valores de índice de qualidade de vida

Fonte: Souza (2003, p.242). Diante desse quadro da realidade excludente em que vivemos, em que as ressacas, “Por piores que sejam as condições ambientais, estas áreas representam para milhares de pessoas, a única possibilidade de acesso à

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cidadania” enquanto pessoas dignas (SABROZA & LEAL apud NERI, 2004, p.4). 3.1 Considerações finais A verdadeira mudança nos índices de qualidade de vida dos bolsões de pobreza de Macapá ocorreria, sobretudo, na prática das políticas habitacionais, ausentes no histórico do governo municipal hoje em dia, em qualidade e em ritmo insuficiente, sendo que para atingir tais fins habitacionais, seria condizente o governo tomar as pesquisas acadêmicas com base para ações neste sentido. Uma vez dispondo das informações necessárias, inclusive produzidas pelos órgãos oficiais como o senso demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Estado teria em mãos todo o aparato informacional necessário para aumentar os índices de qualidade de vida e, não negligenciando os números, mas pensando na dignidade e no bemestar das pessoas encontradas nos bolsões de pobreza de Macapá ante aos meros números.

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REFERÊNCIAS AGUUIAR, J. S. & SILVA, L. M. S. Caracterização e Avaliação das condições de Vida das Populações Residentes nas Ressacas Urbanas dos Municípios de Macapá e Santana. P. 165-236. In TAKIYAMA, L.; SILVA, A. Q. da (org.) Diagnósticos das Ressacas do Estado do Amapá: bacias do igarapé da fortaleza e do Curiaú, Macapá-AP, CPAQ/IEPA e DGEO/SEMA, 2004. ANDRADE, R. F. Políticas de desenvolvimento regional, migração, urbanização e saúde na Amazônia Brasileira com ênfase ao município de Macapá. Dissertação (Mestrado e Enfermagem) – centro de ciências da saúde, universidade federal do Pará, Belém, 1995. GOMES, P. C. C. A condição urbana: ensaios de geopolítica da cidade. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002. HAESBAERT, Rogério. Desterritorialização, multerritorialidade e regionalização. In: LIMONARD, Ester; HAESBAERT, Rogério, Brasil no século XXI: por uma outra regionalização. São Paulo: Max Limonard, 2004.p 173-193. IBGE. DP/DEPIS. Censo demográfico 1950/1991 e resultados preliminares de Censo Demográfico de 200. Macapá/AP, 2000. INSTITUTO BRASILEIRO DE ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL. Área de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente. Documento de informações básicas de Macapá. Macapá, 2003. NERI, Sara Heloiza Alberto. A utilização das ferramentas de geoprocessamento para identificação de comunidades expostas a hepatite A nas áreas de ressacas do município de Macapá e Santana/ AP. Tese de mestrado. Universidade federal do Rio de Janeiro. 2004. p.173 MACIEL, N. C. Ressacas do Amapá: diagnostico preliminar – propostas de recuperação, preservação e uso sustentado. 2 Vol., Secretaria de Estado do Meio Ambiente- SEMA/AP, 2001. SOUZA, Josiane do socorro Aguiar de. Qualidade de vida urbana em áreas úmidas: ressacas de Macapá e Santana – AP. Dissertação de Mestrado – Universidade de Brasília – Centro de Desenvolvimento Sustentável, 2003.p.124.

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