Os novos contornos da parentalidade e filiação no Direito brasileiro

June 15, 2017 | Autor: Lisieux Borges | Categoria: Constitutional Law, Civil Law, Family Law
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OS NOVOS CONTORNOS DA PARENTALIDADE E FILIAÇÃO NO DIREITO BRASILEIRO

Lisieux Nidimar Dias Borges. Advogada. Especialista em Direito Civil. Mestre em Direito Privado pela PUC-MG. Professora de Direito Civil pelo Centro Universitário Izabela Hendrix/MG.

Resumo: Este artigo trata das novas possibilidades da parentalidade e da filiação no atual Direito Brasileiro, principalmente, após a Constituição brasileira de 1988, com esta Constituição, novos direitos e novos princípios modificaram toda a estrutura e a concepção da família. Vários critérios passaram a coexistir e possibilitar que tanto os pais, quanto os filhos pudessem fixar seu parentesco entre si, gerando mutuamente direitos e deveres. Hoje, os pais podem ser biológicos, afetivos, registrais, biparentais do mesmo sexo, de sexos diferentes, monoparentais, podem coexistir separadamente ou em conjunto. Surge uma nova Era, nunca antes vista, em sede de parentalidade, que retrata a sociedade plural e aberta da qual o Brasil, hoje, faz parte. Torna-se necessária uma reflexão jurídica sobre estas novas questões que se apontam, bem como também é importante identificar a possibilidade de uma multiparentalidade viável, ou não sendo viável, como tais conflitos de parentalidade serão solucionados. Palavras-chave: Parentalidade; Filiação; Constituição Brasileira de 1998; Sociedade Plural, Conflitos de Parentalidade.

Abstract: This article is about the new possibilities in parenthood and filiation in the modern Brazilian Law, meanly, after the Brazilian Constitution of 1988, with this Constitution news rights and principles modified the whole structure and conception of the family. Lot of craterous coexisted and they are able to allow that parents and kids that they can establish the parental relation, generating mutual rights and obligation between them. Today the parents can be biological ones, the ones that are on the birth certificated and too the ones that give affection to the kids can be just one parent or both, and can be from the same gender or not. A new Age never seen before in parenthood came, that show us the open and plural society that Brazil is today. So, it is necessary that Law rethinks about these new questions that comes. And too, to accept the possibility, or not, about coexist lot of parents for the same kid, in case that is not possible the Law needs to solve how these conflicts will be solved. Key-words: Parenthood; Filiation; Brazilian Constitution of 1998; Plural Society, Parenthood Conflicts. .

Introdução

Vinte e quatro anos se passaram desde a promulgação e vigência da Constituição brasileira de 1988, e dez anos se completam da vigência do Código Civil Brasileiro de 2002, que ainda por vício o chamamos de Novo Código Civil. Estas duas leis, mas não apenas elas1, mas principalmente elas, foram responsáveis por uma modificação paradigmática no entendimento da Família para o nosso Direito.

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Neste sentido as leis: Lei nº 8069 de 13 de3 Julho de 1990 – Estatuto da Criança e Adolescente; Lei nº 8560 de 29 de Dezembro de 1992 – Regula a investigação de paternidade dos filhos havidos fora do casamento; Lei nº 8971 de 29 de

As modificações na Família brasileira ocorreram de forma tão rápida e tão profunda, neste um quarto de século, que a volatilidade das interpretações e julgamentos em sede das questões familiares modifica-se com a mesma rapidez que a nossa sociedade de massa e informação também se modifica. Tanto é assim, que a velha fórmula da família nuclear composta por pais, mãe e filhos que herdamos das Codificações burguesas, ainda persiste, mas convive com uma pluralidade de outras formas de família, aceitas e protegidas pelo Estado. Não existe mais uma família tida como legitima ou ilegítima. No nosso atual Estado Democrático de Direito será possível, e legítima, toda a forma de família que cumprir seu novo papel ou finalidade, qual seja, permitir promoção de individualidade de cada um dos membros da família. A família, então, em um curto período histórico rompeu com todo um sistema desigualitário e patrimonialista construído no Estado Liberal burguês, que recebemos por influência do Direito Português. Rumamos, e estamos e implementando, a concepção de uma Família que seja possível a cada pessoa individualmente considerada, de modo a respeitar as diferenças inerentes a todos nós. Hoje, fala-se, então, em Famílias Possíveis, não mais havendo a prevalência de uma única forma de família regulada e protegida pelo Estado, como ocorria sob a égide do Código Civil brasileiro de 1916 (Casamento Monogâmico), havendo tantas famílias quantas possibilitarem o desenvolvimento promocional dos membros familiares, neste sentido Rodrigues Jr ( 2012). Aqui, se travará a discussão de como hoje é possível, múltiplas formações do vínculo de filiação, tendo em vista, também, as múltiplas formas de famílias possíveis em nossa sociedade, de modo a resguardar a todos os filhos, independentemente de suas origens, os mesmos direitos, acessos e obrigações. Objetivará também tratar da pluralidade parental e como solucionar possíveis conflitos entre estas parentalidades, bem como quais são as tendências atuais do Direito para compreender estas novas formações das relações familiares e de parentesco. Para tanto, irá primeiramente discutir sobre o atual Direito das Famílias, em seguida, os critérios de fixação do parentesco para ao final tratar das diversas formas de parentalidade, sempre tentando conjugar a doutrina, a legislação e a jurisprudência pátria. 1 – O Direito das Famílias2 no Brasil

Nas últimas duas décadas no Brasil (a última do século XX e a primeira do século XXI), o Direito de Família, ou melhor, dizendo, o Direito das Famílias passou por modificações de cunho estrutural e Dezembro de 1994 – Regula os Direitos dos Companheiros aos alimentos e à sucessão; Lei nº 9263 de 12 de Janeiro de 1996 - Regulamento o Planejamento Familiar; Lei nº 9278 de 10 de Agosto de 1996 – Regula o §3º do artigo 226 da Constituição Federal que trata da União Estável; Lei nº 10.406 de 10 de Janeiro de 2002 – Código Civil brasileiro; Lei nº 10.741 de 1º de Outubro de 2003 – Estatuto do Idoso; Lei nº 11.340 de 07 de Agosto de 2006 – Lei Maria da Penha; Lei nº 11.698 de 13 de Junho de 2008 –Regula a guarda compartilhada; Lei nº 11.804 de 05 de Novembro de 2008 – Lei de Alimentos Gravídicos; Lei nº 11.924 de 17 de Abril de 2009 – Dispõe sobre a alteração dos nomes dos enteados, padrastos e madrastas; Lei nº 12.318 de 26 de Agosto de 2010 – Dispões sobre Alienação Parental; Lei nº 12.398 de 28 de Março de 2011 – Concede aos avós o direito de regular visitas com relação aos seus netos 2 Com a Constituição brasileira de 1988 foi possível toda uma releitura da Família, onde se permitiu e reconheceu diversas entidades familiares, donde, então, o Direito de Família, que pertencia quase que exclusivamente à Família legitimada pelo casamento transforma-se em Direito das Famílias, razão pela qual diversos doutrinadores passam a adotar a nomenclatura Direito das Famílias. Neste sentido: Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka (2009), Maria Berenice Dias (2010), Paulo Lôbo (2009), Rodrigo da Cunha Pereira (2010), entres outros .

paradigmático inimagináveis. Abandonou-se a ideia de família legítima, heterossexual, patrimonial, nuclear e desigual para uma família baseada na pluralidade de formas e constituição, centrada na promoção de cada um de seus participantes, que prima pela ideia de dignidade de cada um de seus membros, e a ainda, tem como fundamentos: a igualdade, a liberdade de autodeterminação e solidariedade familiar. Da família desigual e excludente rumo à família promocional e inclusiva de todos. A ideia da família no Direito brasileiro recebe nova interpretação e roupagem. “Assim, a expressão direito das famílias melhor atende à necessidade de enlaçar no seu âmbito de proteção, as famílias, todas elas, sem discriminação, sem preconceitos” (DIAS, 2010, 28). O legislador pátrio também vem acompanhado esta modificação na nomenclatura, como no Projeto de Lei nº 2.285/2007 – ESTATUTO DAS FAMÍLIAS - que visa sistematizar todo o conteúdo relativo ao Direito das Famílias, na atualidade do Direito brasileiro. Segundo Águida Arruda Barbosa (2010), as modificações pelas quais a família tem passado nas últimas décadas “não comporta mais qualquer sistema legal que o intimide, pois, passou a merecer um espaço próprio para poder expandir sua potencialidade” (BARBOSA, 2010,1). Eis, a razão de nossa legislação caminhar para um Estatuto direcionado exclusivamente para as Famílias, não fazendo distinção ou mesmo prevalência para apenas uma possibilidade de família. Esta mudança de paradigma só foi possível com a Constituição brasileira de 1988, que trouxe como regra a igualdade de atuação do homem e a mulher dentro da família, a liberdade do planejamento familiar lastreado na paternidade responsável, a aceitação não-taxativa de diferentes formas de famílias3, a união estável como entidade familiar merecedora de proteção e reconhecimento, a igualdade dos filhos independentemente da origem dos mesmos e o solidarismo familiar, ao se estabelecer que tanto os pais quanto os filhos em momentos de desenvolvimento ou fragilidade deverão se responsabilizar reciprocamente por sua manutenção e sustento. Eis, alguns elementos que permitiram a modificação da família dentro do Direito atual. A família se transformou, e assim, se transformou o Direito que a protege e a regula. Estas modificações podem ser percebidas com muita força em sede de Parentalidade e Filiação. Pois, põe abaixo toda uma estrutura jurídica e de concepção de família que trazia um modelo único de família, a família baseada no matrimônio, a família nuclear formada por PAI, MÃE e FILHOS, onde os membros da família tinham todos eles papéis estáticos e bem definidos: As famílias brasileiras têm passado por processos de reorganização e diversificação nas últimas décadas, em seus tamanhos, formas de vivência e de significados. O modelo de família nuclear (monogâmica e heterossexual), adotado como parâmetro de normalidade a partir do século XIX pelas sociedades ocidentais, no qual homem e mulher se complementam sexualmente pela função reprodutiva, seguindo papéis de gênero naturalizados, e que juntos oferecem o contexto mais propício para a socialização de crianças, tem sido confrontado por diferentes arranjos familiares. Hoje coexistem famílias monoparentais, recompostas, sem filhos, de uniões estáveis, homoparentais, adotivas, entre tantas outras possibilidades que ganharam 3

O Direito das Famílias comporta hoje diversas formas, não possuindo mais um rol taxativo; hoje além de Casamento, podemos citar diversas entidades familiares, tais como: União Estável Heterossexual e Homoafetiva, Família Monoparental, Família Recomposta, Família Anaparental, Família Homoparental, Famílias Simultânea, entre tantas outras possíveis a serem formadas.

visibilidade a partir de mudanças sociais e econômicas conquistadas desde os anos 60 e 70 do século XX. (ALFANO, 2012) A Família brasileira abandona toda a estrutura oitocentista advinda com as influências do Código Napoleônico, deixa de ser desigual, patrimonialista e com finalidade exclusivamente procriativa, passando a se formar hoje com objetivos eudemonistas, respeitando a liberdade de autodeterminação de cada um dos seus participantes, logicamente, respeitando a desenvolvimento pessoal de cada um deles. A Família atual é considerada eudemonista e tem “uma nova função primordial, qual seja, servir de recurso para a estruturação pessoal, para a livre e plena formação da personalidade de seus componentes” (RODRIGUES JR., 2012, 57). A pluralidade familiar é uma realidade jurídica possível pós-constituição de 1988:

“(...) apontou-se como um dos princípios constitucionais gerais de Direito de Família aquele referente ao pluralismo democrático, a evidenciar a substituição do modelo monolítico de família matrimonial pelo modelo plural e democrático das entidades familiares, especialmente a partir da normativa constitucional de 1988”(GAMA, 2008, 135).

Esta abertura pluralista da família que veio com a Constituição de 1988, permitiu uma modificação profunda também em sede compreensão de parentalidade, a velha fórmula da parentalidade, composta pela família nuclear: mães, pais e filhos, que se fixa através do casamento dos pais, passam a coexistir com outras múltiplas formas de parentalidades fixadas por diversos outros critérios: biológico, presuntivo e afetivo, podendo em função destes vários critérios a coexistência de diversos pais ou mães, que poderão ser fixados, causando, em algumas situações, conflitos de parentalidade para um mesmo filho. Durante todo o século XX, a família, então, se modifica ocorrendo uma ampla produção legislativa infraconstitucional, mas as mudanças paradigmáticas vieram, principalmente, com as novas diretrizes trazidas pela Constituição brasileira de 19884, que traz toda uma nova principiologia para a família brasileira. Esta nova principiologia foi amplamente repetida pelo CCB/02. Nestes termos afirma Carlos Bittar Filho (2002):

Para assegurar a tutela integral da personalidade humana, o moderno Direito de Família serve-se de valioso instrumento: a democratização do relacionamento familiar. A antiga prevalência da vontade marital foi varrida do Código Civil, que, em todos os institutos do Direito de Família, foi pautado pela preocupação com a igualdade entre os cônjuges e com a valorização da vontade dos filhos. Cuidada-se da consagração definitiva, no sistema jurídico brasileiro, da democracia no microcosmo familiar ( BITTAR FILHO, 2002, 21). A nova família brasileira, então, pluraliza-se, onde é possível diversas formações familiares, 4

Importante ressaltar que antes mesmo da Constituição brasileira de 1988 houve também uma intensa produção legislativa, via de regra, infraconstitucional modificando os direitos relacionados com a família, o que veio naturalmente contribuir também com as disposições contidas na atual Constituição. Porém, após a Constituição de 1988, que se viu uma produção legislativa intensa para reafirmar as regras de natureza constitucional.

abandonando-se a ideia oitocentista de que a família era aquela formada pelo casamento dos pais, de onde nasceriam os herdeiros legítimos que perpetuariam o patrimônio familiar. Hoje a família é múltipla, suas formações são incontáveis, o que conta agora é que esta família deve ser locus promocional de seus membros, garantindo a todos o desenvolvimento da personalidade e dignidade do s atores familiares, respeitando a individualidade e autodeterminação de cada um deles. “É um ambiente familiar aberto, participativo e democrático que a personalidade humana tende a desenvolver-se em sua plenitude, enriquecendo-se com contribuições de múltiplas origens” (BITTAR FILHO, 2002, 22). Os princípios constitucionais relacionadas à família permitiram toda uma nova compreensão e reinterpretação, onde se busca permitir que a família seja um ambiente igualitário e promocional de todos os seus membros. A doutrina5 ainda que em alguns momentos divergente reconheça como princípios constitucionais da família: Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, Princípio da liberdade, Princípio da igualdade, Princípio da solidariedade familiar, Princípio do pluralismo das entidades familiares, Princípio da Paternidade Responsável, Princípio da proteção integral a crianças, adolescentes e idosos e Princípio da Afetividade. Esta nova principiologia permitiu que família busque ser eudemonista. Fala-se hoje em eudemonismo na família, “O eudemonismo é a doutrina que enfatiza o sentido de busca pelo sujeito de sua felicidade. A absorção do princípio eudemonista pelo ordenamento altera o sentido da proteção jurídica da família, deslocando-o da instituição para o sujeito (...)” (DIAS, 2010, 55). Conjugando - se com esta ideia da Família Eudemonista, alia-se também a ideia de repersonalização das relações civis:

A família converte-se em espaço de realização da afetividade humana, marca o deslocamento da função econômica – política – religiosa – procracional para esta nova função. Essas linhas de tendências enquadram-se no fenômeno jurídico-social denominado repersonalização das relações civis, que valoriza o interesse da pessoa humana mais do que suas relações patrimoniais. É a recusa da coisificação ou reificação da pessoa, para ressaltar sua dignidade. A família é o espaço por excelência da repersonalização do direito. ( LÔBO, 2008, 11). Dias (2010) afirma que é possível inferir a ideia da Família Eudemonista, na primeira parte do §8º do art.226 da Constituição Federal ao se afirmar que o Estado assegurará a assistência familiar a cada um de seus membros. A ideia de buscar a felicidade ou da doutrina eudemonista dentro de uma realidade jurídica sofre severas críticas, uma vez que o conceito de felicidade é mutável, diferindo – se de uma pessoa para a outra, conceito de viés metafísico. No entanto, a ideia de que o Estado brasileiro tem como um de seus fundamentos a dignidade de seus cidadãos, tendo como dever promover a individualidade de cada um deles, não deixa de ser uma facete da felicidade que pertence a cada um, e que deve ser buscada livremente por todos na medida em que suas aspirações vierem surgindo. No entanto, existe um movimento legislativo, no qual se busca a inclusão da Felicidade como Direito 5

Neste sentido, para exemplificar: Maria Berenice Dias (2010), Carlos Alberto Gonçalves (2009); Maria Helena Diniz (2008), Paulo Lôbo (2008), José Sebastião de Oliveira (2002).

Social, a PEC da Felicidade nº 19 de 2010 – Projeto de Emenda Constitucional - de autoria do Senador Cristovam Buarque que propõe a felicidade como direito social, o que já vem trazendo diversas discussões uma vez que ao torná-lo direito é necessário conhecer de fato o conteúdo deste direito para que se possa exigir do Estado o seu exercício, o que de certo modo tentar transforma em jurídico algo que é ideal e indefinível,

pois ao se consagrar o que é felicidade de um modo geral, deixar-se de se respeitar o

individualidade de cada ser humano, que no exercício da expressão de sua liberdade dever ter do direito de buscar sua felicidade e mudar sua própria ideia de felicidade, caso contrário o Estado estaria criando a “Ditadura da Felicidade”, legalmente estabelecida. Com a permissão constitucional de que existam diversas espécies de família, aqueles filhos que ficavam à margem do reconhecimento e das garantias de direitos, pois surgiam de relações extramatrimoniais, ganham espaço e igualam-se, em direitos e obrigações com aqueles filhos advindos do casamento. Assim, a busca pelos pais (pais e mãe), e para fixá-los, erige-se a direito fundamental, logo, aquele estabelecimento da filiação, ou mesmo o reconhecimento da filiação espontânea, que eram vedados pela ordem constitucional anterior (ainda que por algum tempo), pois tais filhos originavam-se de formas de famílias não matrimonializadas, passam a ser permitidos e incentivados pela ordem constitucional e infraconstitucional. O Estatuto da Criança e adolescente, por exemplo, traz em seu bojo no art. 27 a imprescritibilidade das ações de estado, denotando o espírito inclusivo de todos os filhos em uma família, ainda que biológica. Os filhos que surgem de entidades familiares diferentes do casamento, que não podem se fixar pela presunção de paternidade, passam a ter duas opções para estabelecer sua parentalidade 6: o reconhecimento voluntário pelos pais, ou ainda, investigar sua parentalidade biológica. Neste contexto da família e do Direito que a regulamente faz-se de extrema relevância tratar do projeto parental ou da ausência dele, bem como da responsabilidade decorrente de parentalidade. Neste sentido, o presente artigo buscará tratar desta nova realidade familiar possível entre pais e filhos, bem como trazer à tona as diretrizes interpretativas mais condizentes com a Constituição brasileira de 1988.

2 – Parentalidades no Brasil nos dias de hoje A noção de parentalidade, bem como do exercício das funções parentais, por muito tempo, na sociedade brasileira, ficou atrelada a uma concepção heterossexual e monogâmica. Assim, uma vez em casamento, provavelmente e naturalmente, algum tempo depois, os casados teriam seus filhos, e por consequência, passariam exercer sobre estes a função paterna e materna nos âmbitos sociais e jurídicos dos filhos. 6

Ressalte – se aqui, que o estabelecimento automático da filiação da paternidade através da presunção de paternidade somente se dá em sede de casamento, de modo que nos demais casos, via de regra, o critério biológico é chamado a fixar a filiação e parentalidade. No entanto, dependendo do caso concreto, a ideia da socioafetividade, mesmo inexistindo presunção de paternidade, ou ainda inexistindo a coincidência biológica entre pais e filhos, poderá ser apta a fixar as relações paterno-filiais.

A parentalidade é um conceito, principalmente, psicológico tem relação direta com a construção psíquica que se forma entre pai e filho, mas não é algo inato, é algo que se aprende que se constrói. “Não nascemos pais, tornamo-nos pais... A parentalidade se fabrica com ingredientes complexos. Alguns deles são coletivos, pertencem à sociedade como um todo, mudam com o tempo, são históricos, jurídicos, sociais e culturais” (MORO, 2004). Moro (2004) afirma que outros elementos da parentalidade são mais íntimos, privados, conscientes ou inconscientes, pertencem a cada um dos dois pais enquanto pessoas, e tais elementos estão relacionados à própria história familiar destes futuros pais. Além dos elementos trazidos e transmitidos pelos próprios pais, a própria criança traz e agrega elementos novos a esta relação pertencentes a eles:

O bebê, como sabemos desde os trabalhos de Cramer, Lebovici, Stern e vários outros, é um parceiro ativo na interação pais-crianças, e por aí mesmo parceiro na construção da parentalidade. Ele contribui para a emergência do maternal e do paternal nos adultos que o cercam, o portam, o alimentam, proporcionam-lhe prazer numa troca de atos e de afetos que caracteriza os primeiros momentos da vida da criança (MORO, 2004). A parentalidade como se afirmou é exercício, é construção da relação de parentesco travada entre pais, mães e filhos, que muda e se transforma com a sociedade, e agrega para dentro de si estas modificações sociais. Assim, a família e a sociedade de modo simbiótico trocam entre si

e envolvem-se com as

modificações pelas quais ambos passam, e como produto desta troca imiscuem-se das modificações temporais e culturais atuais cada uma delas. E em um circulo indissociável e vicioso se adaptam as novas tendências impostas pela contemporaneidade. O Direito, então, em cada momento histórico distinto tem uma concepção deste exercício, ou dever parental, de modo que irá estabelecer e delimitar como deve ser a atuação dos pais em relação aos filhos. Assim, as leis determinaram quais os deveres atrelados ao poder parental. 7 Além de o Estado estabelecer um conteúdo mínimo para o exercício do poder parental, como dito, o próprio Estado interferirá diretamente na educação formal dos seus cidadãos, de modo que através de suas leis, irá estabelecer o conteúdo mínimo a ser ensinado nas escolas públicas ou privadas, bem como exigirá através dos Conselhos Tutelares e demais órgãos que acompanhem a frequência dos menores nas escolas. O Estado chega até ao assistencialismo, conferindo aos pais a Bolsa Família8, caso os mesmos mantenham seus filhos estudando, dentre os outros requisitos exigidos para a concessão desta bolsa.

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O atual CCB/2002, em seu art. 1634, estabelece como deve ser o exercício do poder familiar, de modo a limitar e determinar o seu conteúdo, in verbis: “Compete aos pais, quanto a pessoa dos filhos menores: I – dirigir-lhes a criação e a educação; II – tê-los em sua companhia e guarda; III – conceder-lhes ou negar-lhes o consentimento para casarem; IV – nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar ; V – representá-los , até os dezesseis anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos que forem partes, suprindo-lhes o consentimento ; VI – reclamá-los de quem ilegalmente os detenha; VII – exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição. 8 A Bolsa Família é um benefício estatal que tem como finalidade precípua erradicar a extrema pobreza que possuam renda per capita de até R$70,00 por mês. Este programa tem como objetivos principais combater a fome e promover a segurança alimentar e nutricional; combater a pobreza e outras formas de privação das famílias; promover o acesso à rede de serviços públicos, em especial, saúde, educação, segurança alimentar e assistência social; e criar possibilidades de emancipação sustentada dos grupos familiares e desenvolvimento local dos territórios. ( CAIXA, 2012).

Recentemente, pesquisa encomendada pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) e em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) constatou “melhores condições habitacionais, otimismo em relação ao bem-estar das famílias, maior frequência e progressão escolar, melhoria na qualidade dos cuidados de saúde recebidos por mulheres grávidas, maior poder de decisão das mulheres no ambiente domiciliar” (PNUD, Pesquisa, 2012), em razão do Programa Bolsa Família. Este Programa Social virou inclusive referência internacional de modo que alguns países, como Palestina, Tunísia, África do Sul, Egito, Quênia e Índia estão interessados em conhecer a experiência Brasileira (PNUD, Cartilha, 2012). Podemos, então, perceber claramente como o Estado brasileiro atualmente de forma explicita interfere na família e no modus de agir de seus membros, bem diferente do que acorria no Direito Romano Clássico, e até mesmo no Direito Burguês liberal, em que o Estado deixar a cargo do pater familias todas as decisões de natureza privada. Assim, o Estado passa de um abstencionismo para um intervencionismo extremo nas questões familiares. Esta interferência incorre inclusive como limitador e moderador da correção aplicada pelos pais aos filhos. O Estado pune o excesso de correção dos pais tipificando penalmente tais condutas, como por exemplo, os crimes contidos no ECA/90, e no Código Penal , bem como legislação penal extravagante. Em outros momentos sanciona tais excessos através do suspensão ou mesmo extinção do poder familiar , CCB/02, arts. 1635 ao 1638. Com a família e sua evolução histórica, a parentalidade tem sido vista pelo Direito de formas múltiplas podendo se falar em monoparentalidade, biparentalidade e homoparentalidade. Porém, nem sempre foi assim, por muitos séculos perdurou no Direito Ocidental a ideia de uma família monogâmica na qual a parentalidade se caracterizou pela biparentalidade de gêneros (pai e mãe). A monoparentalidade9 se dará sempre que apenas um dos pais, pai ou mãe, exercer a função parental sozinho. A Constituição brasileira de 1988 em seu artigo 226, §4º, define a família monoparental: “entendese também como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes”. A biparentalidade, no entanto, se dará quando o exercício parental se der por duas pessoas, que poderão ser de sexos distintos, biparentalidade de gêneros 10, ou que poderão ser do mesmo sexo, biparentalidade homoafetiva11, quando os gêneros forem idênticos. Hoje, no entanto, as formações familiares são múltiplas e todas elas recebem a proteção do Direito, e a parentalidade exercida dentro delas pode se dar de diversos modos, variando em gêneros e em número de pais, abandonando-se a velha formação familiar nuclear, baseada na tríade pai – mãe - filhos, de natureza heterossexual e com unicidade de pai e de mãe. 9

Ressalta-se, que a monoparentalidade pode se dar em decorrência de diversas circunstâncias, no caso de desconhecimento, ou não reconhecimento, de um dos pais; no caso de separação de fato ou divórcio dos pais, em caso de viuvez, e, ainda, em caso adoção por pessoa solteira. 10 A biparentalidade, seja de gêneros diferentes, ou seja, de gêneros idênticos pode ser dar também por diversas circunstâncias, em decorrência de relacionamento casual dos pais; casamento; união estável; adoção, entre outras. 11 No que concerne à aceitação da biparentalidade homoafetiva, inclusive com modificação registral, constando nome de ambos os pais do mesmo gênero na certidão do filho, é fenômeno recente. Pois, até pouco tempo, nossos tribunais divergiam quanto a possibilidade, inclusive não reconheciam a união estável homoafetiva com os mesmos direitos que a união estável heterossexual, em recente decisão da ADPF nº132 , no ano 2011, o STF reconheceu os mesmos efeitos para a União Estável, seja este heterossexual ou homoafetiva.

As relações jurídicas de parentesco de pais, mães e filhos, na atualidade, conforme já vem se advertindo, passou, e ainda, passa por constantes modificações tanto interpretativas, quanto legislativas. Neste sentido, fica cada vez mais evidente o papel que os julgadores terão para definir conceitualmente cada um destes atores da relação de filiação, bem como para estabelecer quais direitos e quais deveres caberão a cada um destes. A própria sociedade de informação e de massa, que hoje fazemos parte, tem influenciado velozmente nestas modificações que a família tem passado, isto explica e justifica o porquê do Direito legislado nem sempre ter conseguido acompanhar tais modificações, não obstante, nas últimas duas décadas tenhamos tido uma vasta produção legislativa em sede de Direito de Família. A Constituição brasileira de 1988, em seu artigo 227, §6° teve importante papel ao consagrar a igualdade entre os filhos, pois daí em diante, foi possível toda uma construção jurídica do Estatuto da Filiação, que permitiu o acesso de direitos aos filhos, sem que houvesse uma preocupação direta com a forma de família em que os mesmos foram originados. Passa-se a permitir, que os filhos e os pais possam se fixar uns em relação aos outros com objetivo de garantia de direitos e deveres mútuos. O casamento deixa de ser o centro único de fixação da paternidade, e outros critérios para a fixação da paternidade passam a ser utilizados em pé de igualdade com a presunção trazida pelo casamento. Assim, o critério biológico e o socioafetivo, também, são hábeis a dizer quem são os pais e os filhos, o que denota uma democratização, ou pluralização, rumo aos pais. Através da História é possível confirmar que, durante séculos, os filhos considerados ilegítimos eram ignorados, invisíveis ao olhar do legislador, que reproduzia um sistema social baseado no casamento legítimo dos pais, ou seja, reconhecido pelo Estado de modo a proteger o patrimônio familiar. Porém, hoje, Filhos são filhos, independentemente do modo que seu vínculo de parentesco se formou, e merecem, todos eles, os mesmos tratamentos, direitos e deveres. Esta é, também, a linha de pensamento de Veloso (1997). O referido autor reforça o entendimento que para perfeita existência da igualdade entre os filhos é preciso à exata compreensão de que não existem mais categorias entre os filhos. A família, então, após a Constituição de 1988 sofreu uma modificação paradigmática em seus alicerces, forma-se em função, e, para os sujeitos de que dela participam, devendo promover o desenvolvimento de todos, principalmente, através de uma exata delimitação entre os direitos e os deveres de cada um de seus participantes. Assim, agora os filhos podem livremente se fixar em razão de seus pais, uma vez que com a igualdade garantida pelo texto constitucional esta é uma das consequências lógicas consagradas. Apesar desta sensação de bem-estar trazida pela ideia de acesso democrático dos filhos na busca pelo pai, um ponto antagônico surge neste contexto pluralizado das formas de fixação do vínculo de filiação, pois a doutrina pátria, e os tribunais brasileiros, cada qual com os seus argumentos, optam por algum dos critérios de estabelecimento como sendo o apto para estabelecer a real ou verdadeira paternidade.

A doutrina pátria12, influenciada por ideias psicanalíticas, passa a compreender a paternidade como função, ou seja, como expressão de liberdade do pai em formar um vínculo afetivo com os seus filhos, de maneira que somente haveria paternidade efetivamente, caso houvesse uma aceitação e comprometimento dos pais neste sentido. Este argumento, no entanto, mostra-se falacioso, pois ainda que seja mais saudável, ou desejável, esta forma de manifestação da parentalidade através do afeto, não é possível olvidar-se que o Estado através de seu Direito por razões diversas, desde a segurança jurídica das relações de parentesco, bem como da necessidade de desencargo de natureza assistencial, e ainda, da democratização das formas de fixação da filiação busca a fixação atualmente da parentalidade por diversos critérios, e não apenas através de um único critério. Logo, seria descabido apenas considerar esta paternidade socioafetiva como sendo a real ou ideal, pois, inviabilizaria uma igualdade entre os filhos que se fixam por outros critérios. Já os tribunais brasileiros 13, seguindo uma direção diversa, fazem opção em dar prevalência para o 12

Neste sentido podemos citar alguns doutrinadores, João Baptista Villela, Maria Berenice Dias, Rodrigo da Cunha Pereira, Paulo Lôbo, Maria de Fátima Sá, Ana Carolina Brochado, dentre outros já citados ao longo deste texto, que acreditam ser a paternidade socioafetiva, ou critério afetivo o melhor dentre as demais . 13 Neste sentido julgados: RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE FILIAÇÃO. INTERESSE. EXISTÊNCIA. I. O pedido deduzido por irmão, que visa alterar o registro de nascimento de sua irmã, atualmente com mais de 60 anos de idade, para dele excluir o pai comum, deve ser apreciado à luz da verdade socioafetiva, mormente quando decorridos mais de 40 anos do ato inquinado de falso, que foi praticado pelo pai registral sem a concorrência da filha.II. Mesmo na ausência de ascendência genética, o registro da recorrida como filha, realizado de forma consciente, consolidou a filiação socioafetiva, devendo essa relação de fato ser reconhecida e amparada juridicamente. Isso porque a parentalidade que nasce de uma decisão espontânea, deve ter guarida no Direito de Família. III. O exercício de direito potestativo daquele que estabelece uma filiação socioafetiva, pela sua própria natureza, não pode ser questionado por seu filho biológico, mesmo na hipótese de indevida declaração no assento de nascimento da recorrida.IV.A falta de interesse de agir que determina a carência de ação, é extraída, tão só, das afirmações daquele que ajuíza a demanda - in status assertionis -, em exercício de abstração que não engloba as provas produzidas no processo, porquanto a incursão em seara probatória determinará a resolução de mérito, nos precisos termos do art. 269, I, do CPC.Recurso não provido.(REsp 1259460/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/06/2012, DJe 29/06/2012) DIREITO DE FAMÍLIA. AÇÃO NEGATÓRIA DE PATERNIDADE. EXAME DE DNA NEGATIVO. RECONHECIMENTO DE PATERNIDADE SOCIOAFETIVA. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. 1. Em conformidade com os princípios do Código Civil de 2002 e da Constituição Federal de 1988, o êxito em ação negatória de paternidade depende da demonstração, a um só tempo, da inexistência de origem biológica e também de que não tenha sido constituído o estado de filiação, fortemente marcado pelas relações socioafetivas e edificado na convivência familiar. Vale dizer que a pretensão voltada à impugnação da paternidade não pode prosperar, quando fundada apenas na origem genética, mas em aberto conflito com a paternidade socioafetiva. 2. No caso, as instâncias ordinárias reconheceram a paternidade socioafetiva (ou a posse do estado de filiação), desde sempre existente entre o autor e as requeridas. Assim, se a declaração realizada pelo autor por ocasião do registro foi uma inverdade no que concerne à origem genética, certamente não o foi no que toca ao desígnio de estabelecer com as então infantes vínculos afetivos próprios do estado de filho, verdade em si bastante à manutenção do registro de nascimento e ao afastamento da alegação de falsidade ou erro. 3. Recurso especial não provido. (REsp 1059214/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 16/02/2012, DJe 12/03/2012) PROCESSO CIVIL. INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. AÇÃO DE ESTADO. IMPRESCRITIBILIDADE. ASCENDÊNCIA BIOLÓGICA COMPROVADA. SÚMULA N° 7/STJ. RECURSO NÃO PROVIDO.1. A inexistência de vínculo afetivo entre a investigante e o investigado não afastam o direito indisponível e imprescritível de reconhecimento da paternidade biológica (Lei 8.069/90, art. 27).2. Irrelevância da alegação - não comprovada nos autos, segundo a análise da prova feita pelas instâncias ordinárias (Súmula 7) - de que haveria vínculo sócio afetivo, entre a investigante e o então companheiro de sua mãe, para afastar o direito ao reconhecimento da paternidade reconhecida por exame de DNA.3. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no Ag 1138467/MG, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 17/11/2011, DJe 29/11/2011) CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. FAMÍLIA. RECONHECIMENTO DE PATERNIDADE E MATERNIDADE SOCIOAFETIVA. POSSIBILIDADE. DEMONSTRAÇÃO. 1. A paternidade ou maternidade socioafetiva é concepção jurisprudencial e doutrinária recente, ainda não abraçada, expressamente, pela legislação vigente, mas a qual se aplica, de forma analógica, no que forem pertinentes, as regras orientadoras da filiação biológica. 2. A norma princípio estabelecida no art. 27, in fine, do ECA afasta as restrições à busca do reconhecimento de filiação

critério biológico, principalmente, através dos testes de DNA que garantem, com quase cem por cento de certeza, a verdade biológica. Mas esta prevalência ocorre prioritariamente para fixação de paternidade não existente, ou seja, ausência de paternidade. No entanto, já é possível perceber a tendência de alguns julgados que em casos de conflitos dos critérios presumido, biológico e o socioafetivo, os juízes tendem a fazer a opção pela fixação do pai afetivo, visando o melhor interesse do filho menor. 3 - Paternidade, Parentalidade e seus conflitos 14

A questão em torno dos conflitos de parentalidades possíveis trata-se de questão de alta complexidade, que precisa de um maior detalhamento, ou dados fáticos, que permitam uma melhor apreciação pelo julgador. Conquanto, possa existir conflitos de parentalidade tanto quanto os pais e quanto as mãe, o que ordinariamente ocorre são os conflitos em sede de paternidade. Neste momento, serão trazidas discussões no que concerne a paternidade, porém não se desconsidera aqui a possibilidade de conflitos de maternidade em hipóteses parecidas. Como premissa inicial, via de regra, a paternidade biológica é também a paternidade registral, já a paternidade socioafetiva, quando não se tratar de adoção, sua exteriorização se dará faticamente, sem quaisquer formalizações. Os conflitos ocorrem quando mais de um pretenso pai, ou quando o suposto filho passa a divergir quanto uma parentalidade estabelecida ou a se estabelecer. Como já se disse anteriormente é possível a coexistência de uma biparentalidade de mesmo gênero, uma vez que atualmente, desde de 2011 o STF assentiu a possibilidade de União Estável Homoafetiva, de modo que não existe qualquer vedação legal no sentido da possibilidade de um biparentalidade na qual tenhamos dois pais. Mas, geralmente, o que ocorre é sempre uma dupla parentalidade, em que aqueles que exercem a função parental tenham tido, ou ainda tenham, algum vínculo afetivo, ou relacional. No entanto, importante diferenciar biparentalidade do mesmo sexo, que seria exatamente esta hipótese em que o exercício parental decorrer de vinculo relacional entre pessoas do mesmo sexo, de modo que estes passam ao exercício parental em relação a determinado filho, e a hipótese de uma de uma dupla paternidade ou bipaternidade. Nesta hipótese, teremos a coexistência de dois pais que litigam em torno de estabelecer quem deve ser considerado o pai de determinada pessoa. Em se tratando desta situação, os referidos supostos pais não tiveram e não têm entre si relação anterior, porem disputam quem deverá exercer as funções parentais. Este conflito poderá facilmente acontecer no caso, por exemplo, de um pai que é o

e, quando conjugada com a possibilidade de filiação socioafetiva, acaba por reorientar, de forma ampliativa, os restritivos comandos legais hoje existentes, para assegurar ao que procura o reconhecimento de vínculo de filiação socioafetivo, trânsito desimpedido de sua pretensão. 3. Nessa senda, não se pode olvidar que a construção de uma relação socioafetiva, na qual se encontre caracterizada, de maneira indelével, a posse do estado de filho, dá a esse o direito subjetivo de pleitear, em juízo, o reconhecimento desse vínculo, mesmo por meio de ação de investigação de paternidade, a priori, restrita ao reconhecimento forçado de vínculo biológico. 4. Não demonstrada a chamada posse do estado de filho, torna-se inviável a pretensão. 5. Recurso não provido. (REsp 1189663/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 06/09/2011, DJe 15/09/2011). 14 Ainda que a parentalidade diga a respeito de ambos os pais ( pais e mãe) como já se delineou anteriormente, em regra as questões de parentalidade ficam muitas vezes adstritas a fixação do pai, tendo em vista que em regra, mas não sempre existe a certeza da maternidade. Esta certeza quanto a maternidade, hoje em dia, é mitigada pelas conquistas biotecnológicas da humanidade.

registral e de outro que é o biológico. Ambos os pais podem ser considerados pais pelo Direito, possuem circunstâncias fáticas que se adéquam aos os critérios que Direito utiliza para fixar a filiação, mas, caso ocorra esta divergência poderá surgir à necessidade de um posicionamento jurisdicional que deva decidir quem é o pai. A alta questão de indagação que envolve esta situação de dupla paternidade consiste em saber se somente um dos pais será fixado como tal, no caso dos pais com diferentes critérios de fixação que queiram se fixar em relação ao filho de forma autônoma, ou se seria possível fixar dois pais que não estejam vinculados. Hodiernamente, o que ocorre em casos de conflitos da paternidade é a determinação da apenas um dos pais para cada filho. No entanto, em conformidade com nosso atual sistema jurídico, plural e eudemonista que vigora com a Constituição brasileira de 1988, a tendência é que se vise maiores benefícios para os filhos e pais que estejam em litígio. Assim, a decisão judicial que permitir a desconstituição da paternidade biológica em favor da paternidade socioafetiva, e logo, modificando a perfilhação, deverá modificar também

o registro de

nascimento atestando a nova filiação, sob pena se assim não fizer , passe-se a permitir um dupla filiação, qual seja , pai biológico e pai socioafetivo. Ressalte-se que nesta hipótese de não modificação do registro, a existência do pai biológico ou registral seria apenas figurativo, ou mesmo relegado a ascendente genético, e como tal, deixaria de ter deveres ou mesmo direitos na órbita do filho, para apenas ser um dado histórico na vida deste Desta forma, o que realmente parece ocorrer não é uma transmutação plural da fixação do vínculo paterno-filial, mas sim, apenas de modificação de um dogma para outro dogma, que antes era da legitimidade e agora passa o ser da real, da verdadeira, ou da melhor paternidade. Não é estranho o fato de que o legislador faça a opção por alguma das formas de estabelecimento de parentalidade, pois, na verdade, sempre foi assim, sempre foram os ditames culturais e sociais que implicaram nestas escolhas legislativas, o que se critica, é o fato do atual Estado brasileiro, com vistas a ser Democrático de Direito, fazer uma opção de algum destes critérios como sendo o melhor dentre todos os outros, uma vez que ao trazer a igualdade entre os filhos, passa a aceitar diversos critérios para fixar esta filiação, tais critérios representam as diversas possibilidade de origem e famílias de cada um destes filhos. Assim, mostra-se incompatível com nosso atual contexto constitucional, que Direito brasileiro opte por apenas um critério como sendo o ideal. Neste sentido, que o se pretende afirmar é que a parentalidade e a filiação são fenômenos extrajurígenos, que em função de sua relevância social inserem-se na realidade jurídica, através de produções normativas, que se originam das fontes materiais ou fontes formais do Direto, seguindo as orientações e as aspirações de cada sociedade em momentos históricos específicos. Sendo assim, em atenção às atuais diretrizes que o Estado brasileiro se propôs, a parentalidade e a filiação devem ser vistas como acessíveis a todos, e, que gradações de valores, entre uma ou outra forma de manifestação do fenômeno paterno-filial no âmbito jurídico, devem ser totalmente afastadas, uma vez que objetiva-se a manutenção da ideia da igualdade entre os filhos. Logo, caso exista a eleição de uma das

formas de parentalidade como sendo a melhor, entre as demais, acabará por determinar que os filhos que não possuem esta forma de manifestação dita “melhor”, ou “ideal” de ficarão fadados a ter uma paternidade de segunda categoria. Aqui, não se afasta a ideia de que as questões de valor irão influenciar a escolha do legislador, que é sensível ao meio social que o permeia, bem como também é agente social que recebe através de sua cultura as percepções da realidade das coisas, e que, então, forma sua opinião sobre os valores sociais ao criar a norma. Também não se desconsidera a importância do valor na formação da consciência social que irá dar eficácia as normas existentes, ou mesmo sancioná-las com a caducidade. O que se pretende afastar é a ideia de que dentro do sistema jurídico plural que concede igualdade aos filhos, através de critérios diferenciados, que alguns destes critérios que surgem exatamente para garantir o equilíbrio na igualdade da filiação, possam ser utilizados, ou mesmo interpretados de maneira que passem ao invés de igualar a discriminar os filhos. Feitas esta considerações preliminares, que indicam de certa forma as direções que as interpretações sobre o tema tenderão a seguir, passa-se, neste instante, a discutir como a paternidade e a filiação são postas, e vistas, no atual contexto do Direito brasileiro. Nenhum dos critérios existentes, atualmente, para o estabelecimento da filiação deve ser considerado como melhor, ou pior, que os outros, uma vez que todos eles serão aptos para fixar a filiação, bem como já se afirmou, que a existência de critérios distintos depende da construção cultural de cada sociedade, e não que esta construções sejam verdades inafastáveis. No entanto, a existência de critérios distintos e múltiplos, para fixar o vínculo de parentesco, trouxe um problema de caráter instrumental: quais destes critérios deverão ser utilizados quando a condição fática do filho permitir utilização de quaisquer deles? Ou seja, existindo apenas um filho, mas diversos supostos pais, que possam se estabelecer por diferentes critérios, qual, destes homens, deverá ser considerado o pai? Seria possível que uma paternidade já estabelecida seja desconstituída em detrimento de outra? Ou ainda, pode o atual Direito brasileiro aceitar a coexistência de pais? E como fica a questão registral e a divisão de direitos e deveres destes pretensos pais? Antes de passarmos a tentativa de construção de uma resposta em sede de conflitos de parentalidade é importante destacar que a parentalidade diz respeito ao exercício parental seja da mãe ou do pai, como já dito. Porém, nossa herança jurídica ocidental e patriarcal construiu uma preocupação de solucionar os conflitos atinentes à paternidade, pois sempre se acredito ser a maternidade um dado estático e fático de fácil constatação. Atualmente, no entanto, sabemos que não existe mais esta rigidez no que concerne à certeza da maternidade, uma vez que não necessariamente a mulher que sofre o parto será considerada mãe para os efeitos legais, em virtude de hipótese das mães de substituição que emprestam seus úteros para que a mãe biológica possa ter seus filhos. Neste sentido é a atual Resolução vigente do CFM nº 1957/10 que permite esta possibilidade. Porém, esta própria Resolução já traz solução para possível conflito ao afirmar que para todos os efeitos será considerada mãe a biológica e não aquela que gera em substituição. Eis, a razão pela qual, geralmente, não se trata dos conflitos relacionados à maternidade, persistindo aqueles atinentes à paternidade na maioria das hipóteses. Porém, apenas como título de exemplo, recente nota trazida pelo Jornal Hoje em Dia do dia 19 de outubro de 2012, trouxe

uma situação de conflito em sede de maternidade em razão de barriga de

substituição. Conforme noticiado, um Casal de Goiás, tendo em vista a impossibilidade de gestação da esposa, pediram a irmã do marido para gerar seu filho. Esta hipótese está em conformidade com as disposições da Resolução do Conselho Federal de Medicina vigente, porém, o casal não pode registrar sua filha, tendo em vista, que a criança apenas tem a declaração de nascido vivo expedida pela maternidade, na qual é registrada como sendo filha tia , irmã do pai biológico, doadora da barriga. (HOJE, 2012, 17). Percebam que como já dito , via de regra, mãe é aquela que sofre o parto, é necessário que agora exista uma preocupação de nossa sociedade e do próprio Direito para aparar as arrestas, pois do ponto vista lógico as maternidades e hospitais não poderão sair colocando no certidão dos nascidos vivos, nomes de outra pessoas que não tenha sofrido o parte, é necessário que esta situação seja regulamentada. No caso do casal de Goiás, foi necessário que eles acionassem o Poder Judiciário para modificar a certidão, e somente um ano depois, que conseguiram por fim registrar sua filha. (HOJE, 2012, 17). Todas estas questões relativas aos conflitos de paternidade e maternidade passam existir, tendo em vista, a abertura de critérios de fixação, pois, caso se parta da premissa de que todos estes critérios são aptos a fixar a parentalidade, e que, para garantia da igualdade entre os filhos não é possível a hierarquia entre os mesmos, ou valorações, o operador do direito fica sem saber qual critério de estabelecimento deverá aplicar em casos como este. E ainda, fica sem saber quem são os pais. Conforme já advertido, por ser mais comum os conflitos em sede paternidades, nos deteremos mais a este ponto. Importante ressaltar aqui, que o Direito pátrio, já aceita a coexistência de pais (dois pais ou duas mães) para um mesmo filho, pois, hodiernamente, é possível a adoção de crianças por pares homoafetivos. Não apenas a adoção é aceita, mas o STF em 05 de maio de 2011, no julgamento da ADIN nº 4277 e a ADPF nº 132 igualou as uniões estáveis homoafetivas às relações estáveis heterossexuais, conferiu as relações homoafetivas todos os direitos concernentes as relações heterossexuais, inclusive os direitos relacionados à filiação. O problema que se invoca é a possibilidade de dois pais ou mães que não sejam pares, busquem ao mesmo tempo a paternidade. Seria, então, permitido que dois ou mais possíveis pais queiram fixar sua paternidade registral? Eis, a questão que precisa de profunda reflexão. Estaríamos, então, diante de uma multiplicidade de sujeitos na posição de pais, que teriam direitos e deveres comuns com relação a um mesmo filho? E, ainda, como seriam divididas as responsabilidades entre estes pais? Neste ponto, especificamente, que existe mais de uma possibilidade de fixar a filiação, a solução da questão deverá ser remetida ao ato decisório, não obstante, seja possível a previsão, em maior ou menor grau, de como o juiz irá fundamentar a sentença, tendo em vista, que é necessário como leciona Ronald Dworkin (1999), que o juiz seja coerente com o Direito que aplica, devendo buscar uma integridade do Direito, de modo a interagir o passado, o presente e o futuro, respeitando as direções principiológicas de uma determinada sociedade política. Assim, o operador do direito deverá aplicar à espécie, os fundamentos e os argumentos que se sustentem pelo acatamento das aspirações atuais de seus destinatários. Claro, que deverá ser remetido ao ato decisório sempre que existir o conflito de paternidades, mas, pode ser que exista, ou não, norma específica para a solução do caso concreto, mas o fato de inexistir norma para o caso específico não ira escusar o Juiz de proferir provimento à situação fática litigiosa apresentada, de modo que será esperado do mesmo que ele diga, o que é o Direito, e nesta hipótese específica quem é o pai,

ou quem são os pais. Os conflitos de paternidades é uma questão bastante complexa em nossos dias atuais, como já afirmado, no entanto, mostra-se menos problemática do que a hipótese de ausência de qualquer pai. Sendo assim, em sede de estabelecimento da filiação, tendo em vista, o acesso garantido aos filhos de buscar seu pai para fins de efeitos jurídicos, deve-se primeiramente investigar um critério apto para fixar a filiação, que condiga com a condição de cada filho. Assim, existindo apenas um critério viável, seja o presumido, o biológico ou afetivo, este deverá ser utilizado. Destaque-se que há agora, uma ordem invertida de prevalência, antes era a forma da família que determinava o tipo de filiação, mas com a Constituição de 1998 é a condição específica do filho que irá fixar sua filiação, sem que exista qualquer carga discriminatória em razão da família a que pertença. É importante ressaltar, que cada vez mais a família caminha no sentido de permitir mais de uma hipótese de fixação de pais para apenas um filho, é também, neste sentido, que a legislação pátria vem caminhando. Em 2009 foi promulgada a Lei nº 11.924 de 17 de Abril, na qual alterou a Lei de Registros Públicos, nº6015 de 1973, artigo 57, acrescentando parágrafo 8º, que veio a permitir que o enteado ou enteada acrescente ao seu nome o patronímico do padrasto ou madrasta, sem prejuízo de seus apelidos de família. Para Maria Berenice Dias (2012), no entanto, esta possibilidade de acréscimo de nome do padrasto ou madrasta não muda em nada a filiação, não obstante fique visível a parentalidade socioafetiva. Opinião esta que não anuímos, vez, que a parentalidade socioafetiva é apta a produzir todos os efeitos das outras formas de parentalidade. O que parece ter sido a intenção do legislador foi na verdade possibilitar uma multiparentalidade, onde não se substitui os pais registrais, porém agrega-se a estes uma nova realidade da parentalidade dos filhos, qual seja uma parentalidade socioafetiva formada posteriormente, donde poderá também surtir efeitos enquanto parentalidade. Assim, fica claro que a determinados filhos, tendo em vista, as novas conformações familiares a que pertençam, além de possuírem os nomes de seus pais registrais, será possível, também, que o apelido de família do pai afetivo, ou padrasto, possa constar de seus registros. Esta lei permite, assim, o acréscimo do nome, mas, nada fala sobre quais efeitos este acréscimo tratará na esfera jurídica dos filhos ou dos padrastos e madrastas. A apuração destas responsabilidades serão remetidas ao ato decisório. Logo, existindo múltiplos critérios para fixar pais e filhos, a solução de quem são os pais e os filhos é levada para o ato decisório, uma vez que não existe norma jurídica em sentido estrito, que resolva a controvérsia, devendo o juiz aplicar normas, princípios, bem como em construções argumentativas, que levam em conta as aspirações éticas existentes em cada sociedade, e as aspirações individuais de todos os envolvidos no litígio. No que concerne a tais conflitos, inexiste uma resposta única, sendo que cada caso concreto deverá ser individualmente considerado e analisado. Porém, o que se pode de certa forma afirmar é que existe uma tendência do julgador a estabelecer a parentalidade para aqueles pais que tenham exercido efetivamente a função parental. Pouco importa, desta forma, qual é o critério adotado para se fixar em relação a um filho, pois o relevante será , em regra, qual dos supostos pais exerce a função parental. Mas, é preciso cogitar,

também, a hipótese de fixação de mais de um pai em caso de não existir conflito. Logo, inexistindo conflito e consenso não seria inviável que mais de um pai se fixe em relação a um mesmo filho através de critérios distintos. A princípio não existe vedação para a fixação da multiparentalidade, principalmente se esta for consentida. A ausência do estabelecimento do pai, apesar de possível na atualidade, é contrária a direção que o Estado brasileiro tomou com sua Constituição de 1988, uma vez que ao igualar os filhos, permitiu em função desta igualdade, que todos estes tenham também o direito de buscar seu pai, e vice-versa, podendo também, o pai fazer o mesmo. Esta possibilidade de ausência de fixação da paternidade é um problema atual, no entanto, existem reais esforços das legislações locais, no sentido de inviabilizar que isto ocorra, o próprio Direito brasileiro com sua lei nº8650/92, através da Investigação Oficiosa da Paternidade, tenta afastar que os filhos fiquem desamparados assistencialmente por parte daquele que, se não confere afeto ao filho, ao menos funciona como provedor. O Direito francês possui a Ação para fins de subsídios que pode ser intentado pelo o filho contra todos aqueles que tiveram relações sexuais com mãe ( FACHIN, 1992). O Direito Português no seu Código Civil tem também a Investigação Oficiosa, tanto contra o suposto pai, quanto contra a suposta mãe. Estes exemplos demonstram a preocupação estatal de conferir aos filhos seus pais (pais e mães). 4 – Reprodução Assistida e Homoparentalidade

Ressalta-se, aqui, que não obstante a igualdade entre os filhos seja uma das diretrizes do Estado Democrático de Direito brasileiro, e, desta forma, possibilita que os filhos possam se igualar em direitos, este mesmo Estado vem normatizando no sentido de permitir que não exista a biparentalidade, enquanto dualidade de gêneros ( pai e mãe), uma vez que com a nova resolução do CFM n º 1957 do dia 06 de janeiro de 2011, concede-se a possibilidade de que mulheres solteiras possam sofrer a inseminação artificial. Esta possibilidade da mulher solteira poder sofrer a inseminação artificial nos traz à tona a discussão de qual autonomia deverá prevalecer: da mãe, que deseja exercer seu direito à procriação, independente de seu estado civil, ou do filho, que mesmo antes de nascer não terá direito a um pai, mas tão somente a um ascendente genético, que a princípio é sempre anônimo. Outra hipótese, aonde não se irá mais respeitar as dualidade de gêneros na parentalidade trata-se da possibilidade atual e exercitável de filiação homoafetiva, seja mediante inseminação artificial ou através da adoção. Pode-se perceber, então, que o “ acesso foi ampliado. Quem quiser ter um filho – solteiro, casado, separado ou homossexual – poderão, agora, ter acesso a essas técnicas, antes limitadas a casais heterossexuais”. (pe360graus, 2012). Não se discute aqui, que novas formações familiares estão se travando, a própria ideia de adoção de crianças por pessoas do mesmo sexo, com o respectivo assentamento na certidão do filho denota esta modificação paradigmática. A adoção por pessoas assumidamente em relações homoafetivas é algo que na

atualidade se mostra socialmente e juridicamente aceito, de modo que nossos Tribunais vêm acompanhando esta modificação paradigmática. 15 Porém, esta possibilidade de que o filho tenha duas mães, dois pais, ou mesmo apenas uma mãe por escolha desta última, vem relativizar a ideia de fixação da parentalidade (pai e mãe) que se vem construindo através dos séculos. É importante, ressaltar, que não obstante a ideia de uma biparentalidade de gêneros se enquadre na ideia de uma parentalidade biológica, mister, que se perceba que hoje uma parentalidade desta espécie, é apenas mais uma forma de expressão de parentalidade, donde n ou com dualidade de gêneros, ou unidade de gêneros é apta a formar uma família, e daí decorrer todos os direitos a ela inerentes. Eis, o porquê em nossa atualidade ser admitido na união estável homoafetiva, ou, a uma mulher solteira, exercerem suas autonomias e decidirem pela possibilidade de ter um filho (através de uma inseminação artificial na hipótese da mulher solteira, ou através de adoção ou inseminação artificial no caso da união estável homoafetiva). A questão de alta indagação relacionada às questões acima expostas encontra-se, principalmente, no conflito entre o direito das pessoas buscarem uma parentalidade e consequente filiação e o direito dos filhos de terem uma biparentalidade biologicamente estabelecida. Assim, a própria ideia da família nuclear que mesmo mitigada, permanece em nossos tempos, perde sua posição central, donde nem sempre o direito à paternidade poderá ser concedido a todos, apesar dos esforços políticos e legislativos, neste sentido, pois, o fato de se permitir buscar o pai, não significa com certeza, afirmar que, o suposto pai será encontrado, ou mesmo fixado, o que nos leva a questionamentos: 

Será que a biparentalidade de gêneros é essencial para a fixação da filiação?



Não permitir que algum filho estabeleça sua biparentalidade de gêneros não seria uma forma de desigualdade entres estes e os demais que possuem ambos os pais de gêneros opostos?



Ou, por fim, estaríamos caminhando rumo à uma superação de gêneros em sede de parentesco e filiação, donde o relevante é a função exercida buscando-se sempre a promoção seja dos pais, ou seja dos filhos?16

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Neste sentido: Infância e Juventude. Inscrição no cadastro de adoção. Pretendente que admite manter relação homoafetiva. Deferimento com base em estudos psicossociais. Reconhecimento das uniões estáveis homoafetivas como entidades familiares. Ausência de circunstâncias incompatíveis com a natureza da adoção. Recurso improvido. (9000004192011826 SP 9000004-19.2011.8.26.0576, Relator: Presidente Da Seção De Direito Privado, Data de Julgamento: 27/02/2012, Câmara Especial, Data de Publicação: 28/02/2012). Habilitação unilateral em cadastro de adoção por parte de requerente que mantém união homoafetiva. Possibilidade. Avaliações técnicas favoráveis. Equiparação da relação homoafetiva à união estável. Recurso não provido. (9000003342011826 SP 900000334.2011.8.26.0576, Relator: Presidente Da Seção De Direito Privado, Data de Julgamento: 30/01/2012, Câmara Especial, Data de Publicação: 30/01/2012). DIREITO CIVIL. FAMÍLIA. ADOÇÃO DE MENORES POR CASAL HOMOSSEXUAL. SITUAÇÃO JÁ CONSOLIDADA. ESTABILIDADE DA FAMÍLIA. PRESENÇA DE FORTES VÍNCULOS AFETIVOS ENTRE OS MENORES E A REQUERENTE. IMPRESCINDIBILIDADE DA PREVALÊNCIA DOS INTERESSES DOS MENORES. RELATÓRIO DA ASSISTENTE SOCIAL FAVORÁVEL AO PEDIDO. REAIS VANTAGENS PARA OS ADOTANDOS. ARTIGOS 1º DA LEI 12.010/09 E 43 DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. DEFERIMENTO DA MEDIDA. 1º12.01043 ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. (STJ - 889852 RS 2006/0209137-4, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 27/04/2010, T4 QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/08/2010).

Como já vem se delineando, a ideia da família contemporânea brasileira aceita diversos formatos, com diferentes participantes. A própria Constituição Federal de 1988, como norma hierarquicamente superior, em sede de Direito de Família traz em seu bojo a possibilidade de um número não taxativo de formações familiares, de modo que o pluralismo familiar é agora a regra. Além disso, normas de caráter infraconstitucional introjetando as diretrizes constitucionais começam a repensar o próprio conceito de família, como o que ocorreu com a Lei nº 11.340 de 2006, Lei Maria da Penha, nesta, o legislador infraconstitucional em suas disposições gerais traz um conceito largo e abrangente de família, aceitando sua constituição não apenas baseada em vínculos biológicos, mas também, afetivos, sejam estes vínculos de natureza homossexual ou heterossexual. 5 - Parentalidade Biológica17 – Projeto Pai Presente

Não obstante seja possível se chegar à conclusão de que a filiação hoje se pode manifestar mesmo que inexista uma biparentalidade biológica de gêneros, a questão da fixação do pai para os filhos é uma questão que ainda é muito forte na consciência coletiva de nossa sociedade, tanto é assim que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) no ano de 2010, através do Provimento nº 12, criou projeto nacional, homônimo ao mineiro, Pai Presente, com o objetivo de permitir o reconhecimento da filiação das crianças em idade escolar, com o auxílio do Ministério da Educação, que fez o levantamento das crianças enquadradas nesta situação. O referido levantamento foi encaminhado para as Corregedorias de Justiças, para que as mesmas tomassem as devidas providências. No Estado de Minas Gerais, as mães dos alunos são chamadas para indicar os supostos pais, que serão intimados a reconhecer a paternidade voluntariamente, ou então, a se submeterem ao exame de DNA no caso da recusa do reconhecimento voluntário. ( TJMG, PROJETO, 2012). No entanto, apesar desta grande modificação na compreensão da parentalidade, hoje, na sociedade brasileira, a ideia de busca de uma mãe e um pai biológico, na situação de ausência de outra forma de parentalidade é algo socialmente muito forte, principalmente, na hipótese de esta ser o único critério (biológico) possível para fixar esta parentalidade. Tanto é a assim, que recentemente um programa televisivo de grande repercussão no Brasil, Fantástico, criou um quadro, iniciado no dia 26 de fevereiro de 2012, chamado QUEM É MEU PAI? Neste quadro, o repórter Marcelo Canellas acompanha o dia-a-dia do Projeto Pai Presente, que além de mostrar a ótica do Judiciário e da decisão pela existência ou não do pai biológico, traz ainda o lado fático

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Ainda que qualquer tentativa de prever as futuras diretrizes do Direito das Famílias seja algo cientificamente impossível de ser estabelecido sem margens de erro, é, no entanto, previsível, com base na nova principiologia familiar que exista uma superação da ideia de gêneros para a fixação do parentesco. 17 Importante ressaltar que sempre houve uma maior preocupação com o estabelecimento da paternidade, pois, por muito tempo vigorou a regra de que a mãe sempre certa era, e que, o pai era o marido da mãe, de modo que, não se discutia a principio, a incerteza da maternidade, sendo o parto algo indiscutível e delimitador da maternidade. Porém, com o desenvolvimento biotecnológico atual, é possível e viável que a mãe biológica não sofra o parto, ficando a cargo de uma mulher receptáculo gerar o filho de outra. Em nosso ordenamento jurídico, estas mães de substituição, via de regra, são parentes da mãe biológica, e de antemão fica estabelecido que a mãe para efeitos jurídicos e biológicos não é aquela que gera.

da história, onde os filhos e os supostos pais demonstram seus pontos de vistas e anseios sobre a questão da parentalidade. Na maioria dos programas apresentados pode-se perceber que existe pelos filhos uma necessidade interna de conhecer sua procedência e até mesmo almejam que talvez seja possível não apenas um reconhecimento biológico e jurídico de suas condições de filhos, mas também, uma aceitação a que pertençam à família daquele pai, o que nem sempre é querido ou proporcionado pelo pai e pela família do mesmo. (QUEM É..., 2012). 6 – Mas afinal, quem é meu pai?

O exercício parental e a possibilidade de estar inserido dentro de um grupo familiar, que possibilite aos pais e aos filhos o pertencimento e o solidarismo do ambiente familiar, se tornaram mais relevantes do que a ideia de um pai ( sexo masculino). Fica cada vez mais evidente, que o exercício da parentalidade é muito mais relevante do que quem exercer esta função parental, pouco importando o gênero ou número de pessoas que exercem estas funções. O importante hoje, em respeito à dignidade e a individualidade de cada pessoa, é permitir aos filhos que tenham seu desenvolvimento garantido, e aos pais que também possam se vincular aos filhos, pois a filiação como vem se defendendo até aqui, é também uma faceta que atinge aos pais, de modo que tanto os pais e o filhos se conectam em reciprocidade de direitos e obrigações, neste sentido é o artigo 229 da CCB/88. Meu pai pode ser o presumido, pode ser o biológico, pode ser o afetivo; pode ser o adotivo; pode ser o padrasto; pode ser aquele que me criou e nunca me adotou; pode ser apenas um homem; mas pode ser dois homens em união estável; pode ser minha mãe que assumiu sozinha a monoparentalidade, pode ser ainda de duas mulheres, que mesmo sendo mulheres, estabeleceram para mim a figura paterna que não tive. Na verdade, a paternidade e a maternidade, hoje, ainda são relevantes, podem e devem ser estabelecidos para os filhos, porém perdem espaço para a atual noção de parentalidade e função parental que nossa doutrina e jurisprudência estão sedimentando. Meu pai, minha mãe podem ser todos estes que se obrigam e exercem em minha direção assistência material, moral, dever de cuidado, guarda, proteção, solidarismo, e em alguns momentos por que não, afeto

CONCLUSÃO

A Parentalidade e a Filiação, hoje, no Brasil, apresentam-se de forma multifacetada, com múltiplos critérios para estabelecer pais e filhos. E, esta possibilidade de diversos critérios para o estabelecimento da relação paterno-filial possibilitou que tanto os filhos quanto os pais pudessem se manifestar de diversas formas. No entanto, manifestar de formas diferentes não pode denotar diferença de tratamento aos filhos, no que tange aos direitos e garantias concedidas, sob pena de nunca se sustentar à igualdade entre os mesmos, como estabelecer nos atual Constituição brasileira.

O Estado, então, ao menos no Ocidente, elegeu, por muito tempo, o casamento monogâmico como reprodutor social, político e cultural de um modo de vida em que a propriedade privada estabelecia o estrato social, o poder político e o econômico. Assim, a parentalidade e a filiação estavam atreladas à presunção do casamento dos pais, mas as distorções trazidas por este modo de estabelecimento, rapidamente, direcionou a busca de outro (s) critério (s) para fixar a paternidade, a biologia foi à eleita. Mais tarde, as incursões da Psicanálise dentro do Direito, fez surgir uma nova manifestação da paternidade, ou critério fixador, o afeto. Agora, diversas são as formas de estabelecer pais e filhos, e os conceitos dos mesmos estão cada vez mais diluídos. Assim, o novo paradigma de Estado brasileiro (Democrático de Direito) tem como um de seus alicerces o pluralismo social, que por consequência, determina o respeito às diferenças, bem como, que a todos, em iguais situações, sejam consentidos iguais acessos. Logo, para que seja garantido este amplo acesso de todos, faz-se necessário afastar a ideia de que existe apenas um único critério para o estabelecimento das relações de filiação. Por este especial motivo, que não obstante, seja possível, que em um determinado momento histórico, possa o Direito optar por um critério principal de fixação de parentalidade, como ocorria sob a égide do Código napoleônico, esta, então, não poderá ser a direção adotada pelo Direito brasileiro atual, como querem alguns doutrinadores, que afirmam ser a paternidade afetiva a verdadeira paternidade, não pelo o fato do Direito não poder fazer esta opção, pois até poderia, e talvez até o faça, mas sim, porque a pluralidade querida e abraçada por nosso paradigma de Estado impossibilita, e mesmo, inviabiliza que alguma forma de acesso a direito a parentalidade e a filiação seja discriminatória dos outros acessos ou critérios já existentes. Logo, a coexistência de um Estado Democrático de Direito, bem como de um Princípio de Igualdade entre os filhos, que consagra o direito à paternidade independentemente da origem dos mesmos, afasta que a própria interpretação em sede de paternidade seja restritiva a apenas um critério de fixação, devendo se respeitar diferentes critérios para filhos de origens distintas. Desta forma, se houve com a Constituição Federal de 1988 uma abertura das formas de fixação de paternidade, ao se afirmar no seu artigo 227, §6º que “os filhos havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias”, a direção legislativa, e mesmo doutrinária, em coerência com atual sistema imposto constitucionalmente, deverá permitir que qualquer critério para fixar a paternidade seja apto a produzir efeitos, ainda que este critério seja meramente biológico, ou ainda presuntivo, pois, caso assim não o seja, seria possível chegar à conclusão de que o sistema brasileiro atual aceitaria a possibilidade de filhos sem pais. No entanto, este não é o direcionamento constitucional, uma vez que a dicção do art. 227, § 6º da CRF/88 é no sentido de se consagrar o Princípio da Paternidade Integral. A paternidade, aqui, é vista como um direto, mas não como um direito unidirecional, e sim, como uma relação jurídica, acarretando direitos, não apenas para uma das partes, mas para ambos os atores da relação paterno-filial, de modo que a autonomia de uma das partes não poderá suprimir o direito da outra. Talvez, este seja o ponto mais conflituoso da questão do estabelecimento da paternidade: a recusa de uma

das partes para o estabelecimento. A preocupação, via de regra, é estabelecer o pai para o filho, muitas vezes, desconsiderando que o pai também tem o direito de firmar seu status paterno, podendo também almejar exercer seus direitos que decorrem de seu parentesco com o seu filho. A recusa do estabelecimento da paternidade pode derivar de diversas causas: a existência ulterior de um pai, a ausência do desejo de ser pai, escolha do pai pelo filho, tendo em vista o caráter econômico, entre outras. No entanto, não obstante a individualidade e a autonomia dos sujeitos sejam importantes para a formação do próprio Direito, a relevância social do estabelecimento dos pais (pai e mãe), impulsiona que o Estado aponte a necessidade de que exista a responsabilidade parental dos mesmos, ainda que inexista qualquer traço de afetividade, pois, ainda que desejável o afeto, este não é requisito essencial, ou único, para a existência de pais e filhos. A autonomia, como direta expressão da liberdade, deve sim, ser considerada, mas com a compreensão de que neste sistema jurídico em que se preza pela igualdade dos filhos, dos pais e das mães, caso exista algum conflito de autonomia, no momento de fixação da filiação, deverá o intérprete primar pela hipótese em que seja possível a maior incidência de direitos para o maior número de sujeitos. Claro, que este é um direcionamento querido em função de se buscar um acesso plural de diretos, no entanto, as circunstâncias específicas, fáticas e contingenciais de cada caso devem ser consideradas, razão pela qual, não é possível, soluções uniformes em todos os casos. No entanto, a transferência da solução das questões relativas à paternidade e à filiação para as circunstâncias do caso concreto, não obstante tenha que ser uma etapa da resolução do conflito, pois as situações fáticas que recebem normatividade pelo Direto, podem, e, irão variar, em maior ou menor grau. Torna-se necessário, também, que além de considerar a situações especificadas de cada caso, que existe uma coerência entre as leis e os princípios de um determinado ordenamento jurídico com a decisão prolatada, pois, somente assim será possível afastar por parte dos julgadores elevado grau de subjetividade e arbítrio na tomada das decisões (DOWRKIN, 1999). Outro problema, que nasce com o próprio pluralismo, é a possibilidade de conflitos existentes entre os diversos critérios para fixar a paternidade e com as técnicas de reprodução assistida, possibilitando a existência de múltiplos pais que podem ser fixados por critérios diferentes, então, de uma evolução histórica que vai de total ausência do conhecimento da paternidade, passa-se para um estágio atual, em que se é possível diversos pais que podem ser fixados. E a solução para estas questões ainda estão sendo construídas, não havendo uniformidade. O futuro da parentalidade e os caminhos que se seguirá não são possíveis delinear sem margens de erros, mas certo é que se trilha um caminho em via aberta, em mão dupla, na busca da fixação de uma filiação, que além de meramente assistencial seja também apta a promover o indivíduo no ambiente social que o permeia. A parentalidade e a filiação, hoje, então, não possuem um conceito predeterminado, mas alcançam seu sentido e sua abrangência, tendo em vista o caso concreto e condição específica dos pais e do filho, pois, as direções jurídicas do atual Estado brasileiro, buscam diversas formas ou critérios que se adaptem ao multiculturalismo inerente e componente das sociedades políticas hodiernas (HABERMAS, 2002 ) A família, hoje, se modificou substancialmente, em nada se parece com aquela família do início do século XX, que herdamos historicamente de Portugal, e com origem nas codificações burguesas. De lá para

cá, a família pluralizou-se. É plural em suas várias espécies, é plural em suas finalidades, é plural em seus gêneros, e, principalmente, é plural no que concerne as diversas possibilidades de estabelecimento e fixação da parentalidade e filiação. Hoje, muitos podem ser meus pais (pais e mães). Aliás, posso ter diversos pais e todos ao mesmo tempo. E, mais uma vez, aliás, hoje podemos ter diversas combinações de parentalidade, que nada se assemelha a velha fórmula da família nuclear. Mas, até a família nuclear tem ainda respeitado o seu espaço. Podemos, se quisermos, ter uma família nuclear, feita nos moldes do século XIX. Por que, não? Podemos ter, sonhar, e concretizar, todas as famílias possíveis neste nosso contexto de Estado Democrático de Direito, pois, este paradigma de Estado, traz uma abertura da família em um rol não taxativo de possibilidades e conformações. Tivemos a grata supressa de poder vivenciar o dia, o período histórico no Brasil, em que a discriminação de qualquer natureza é total, e completamente, repudiada, ainda que em alguns momentos de modo meramente formal. Não mais faz parte de nossa vivência social, e jurídica, aquela família rodeada e fundada no preconceito e na desigualdade. Muito pelo contrário, a família é aquilo que nos confere e nos garante uma existência promocional, digna, permeada na igualdade e liberdade de cada componente da família. Mesmo sabendo que muito temos que conquistar em sede de Direito das Famílias, antes da Constituição brasileira de 1988, sonhávamos com o dia em que nossa sociedade fosse mais justa, igualitária e solidária, e hoje, mesmo que não completamente, a Família e o seu Direito no Brasil caminha para concretizar este sonho, pois cada vez mais, o ideais preambulares de nossa Carta Magna, estão sendo exigidos, dia após dia, por nossos concidadãos, que mesmo que vagarosamente, passam a exigir esta família cheia de liberdade, de igualdade e respeito.

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