Os riscos de importação de outras metodologias para o ensino, pesquisa e a educação no Direito

October 3, 2017 | Autor: A. Kretschmann | Categoria: Ensino Jurídico, Filosofia De Direito E Metodologia Jurídica
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ANAIS DA VIII MOSTRA CIENTÍFICA DO CESUCA – NOV./2014 ISSN – 2317-5915

Os riscos de importação de outras metodologias para o ensino, pesquisa e a educação no Direito

Ângela Kretschmann1 [email protected] Emerson de Lima Pinto2 [email protected]

Resumo: O artigo faz uma análise crítica acerca de práticas no ensino e na educação, a partir da recuperação de uma memória histórica vinculada à natureza do saber prudencial, e da compreensão da ciência do Direito como uma ciência prática. Considera a importância da hermenêutica no contexto das práticas de avaliação legalmente exigidas e busca contextualizar o diagnóstico da crise no interior da realidade legal, na qual se insere o ensino jurídico, avaliando os riscos de importação de metodologias aplicáveis ao ensino de ciências naturais e exatas, ao ensino jurídico. Palavras-chave: Ensino Jurídico; Metodologia; Hermenêutica. Abstract: The article presents a critical analysis about the practices in teaching and education, from a historical point of view linked to the nature of prudential knowledge, and the understanding of the science of law as a practical science. Considers the importance of hermeneutics in the context of the practices of legally required assessment and seeks to contextualize the diagnosis of the crisis within the legal reality in which legal education is inserted, evaluating the risks of importing methodologies applied to the teaching of natural and exact sciences, to the legal education. Keywords: Legal Education; methodology; Hermeneutics.

1. INTRODUÇÃO Este pequeno estudo procura chamar atenção para a dialética do Direito, reconhecendo que a importação de instrumentos e metodologias que possam resultar vitoriosas na ensino, em outras áreas, em especial nas ciências naturais, desastrosas quando aplicadas ao ensino jurídico.

importância da natureza mecanismos, estratégias, melhoria da qualidade do podem ser simplesmente

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Doutora em Direito pela Unisinos/RS, Pós-doutora pelo Institut for Information-, Telecommunication- and Media Law (ITM), Münste (Alemanha), professora de Argumentação Jurídica, do Cesuca, e Propriedade Intelectual e Direito e Tecnologia da Informação, na Unisinos. Diretora de Pesquisa no Cesuca 2 Advogado. Doutorando em Filosofia UNISINOS. Mestre em Direito Público UNISINOS. Especialista em Ciências Penais PUCRS. Professor no Curso de Graduação em Direito na UNISINOS e CESUCA. Pesquisador do CESUCA. F A C U L D A D E

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ANAIS DA VIII MOSTRA CIENTÍFICA DO CESUCA – NOV./2014 ISSN – 2317-5915 Nesse sentido, educadores têm ressaltado a importância de uma engenharia no ensino, independente de objeto e natureza que o constitua. O que se pretende mostrar aqui, respeitada a limitação do espaço e o próprio escopo da publicação a que se destina, é que o ensino e a educação jurídicas já possuem uma trajetória histórica que por si mesmo rechaça qualquer simplismo ou pragmatismo na aplicação de regras importadas de outras áreas. O que se deseja é chamar atenção para a necessidade de uma mudança que considere os grandes movimentos e conquistas de métodos e instrumentos utilizados nas demais áreas do conhecimento, mas também, que se perceba que a natureza do objeto a ser estudado requer muitas vezes, e não poderia ser diferente no Direito, que se reflita antes nas necessidades que o objeto mostra, de si mesmo, dada sua natureza específica, antes de simplificarmos com matematismos e reengenharias, que, no Direito, já causaram prejuízos suficientes. A importância de se evitar o simplismo quando se trata de amadurecer e repensar o ensino e a educação jurídicas tem relação com épocas onde a metodologia jurídica resultou em uma matematização do direito, e onde o ideal de justiça restou relegado a segundo plano, dado que a resposta dada por “esquemas” e subsunções parecia indicar certeza e segurança jurídicas. Dado esse resultado, até hoje se busca reconstruir um direito mais próximo da Justiça e da realidade social, o que não tem sido nada fácil, diante do apego ao que parece ser mais simples e mais fácil. Afinal, utilizar um raciocínio por mera subsunção, e justificar seu uso dizendo que o Juiz não é a “boca que pronuncia as palavras da lei” (Montesquieu) é mais simples do que procurar uma resposta que envolva valores, que envolva uma decisão sobre o que pode e o que pode não ser certo fazer, diante de um mundo que se insere em um contexto de grande perda ambiental, de civilização digital, de luta cibernética e de valores o mais das vezes simplesmente descontextualizados. E o que dizer então disso tudo em um país de dimensões continentais e multicultural como o Brasil? Melhor não subestimar o tamanho do problema em si, o tamanho da crise, e buscar auxílio na nossa memória históica, enquanto ainda temos uma.

2. O PROBLEMA DO DIREITO COM A METODOLOGIA DAS CIÊNCIAS NATURAIS A crise do ensino e educação jurídicas envolve uma espécie de metamorfose na imagem de juristas, que de “sábios” e “prudentes” se vêem muitas vezes comparados a algo similar “a um mero despachante que aplica leis e códigos segundo sua utilidade” (KRETSCHMANN, 2006, p. 8). Aristóteles nos ensinou que devemos prestar atenção no objeto investigado para escolhermos o método, sendo que o Methode antigo não era, como passou a ser conhecido na modernidade, um caminho para o conhecimento universal com exclusão completa do erro, pois o conceito grego de método significava também “un camino de la aproximación objetiva a lo que debe conocerce” (GADAMER, 1993, p. 83 e 134), obtendo a medida de sua adequação em função da peculiaridade do objeto investigado. F A C U L D A D E

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ANAIS DA VIII MOSTRA CIENTÍFICA DO CESUCA – NOV./2014 ISSN – 2317-5915 É possível rastrear o percurso histórico que transformou a phronesis, o saber prático, em um saber técnico, e as consequências dessa substituição para Direito e sua crise. Esse apagamento do saber prudencial vai atingir seu cume na modernidade, quando a idéia de cientificidade irá reduzir o ideal do saber prático à teoria, com privilégio do saber técnico. Na modernidade o que é concebido como “ciência” é o que é dito “científico” pelo paradigma das ciências naturais que naturalmente vão privilegiar a certeza e segurança (e o fim útil). Com isso sobressai a importância da dialética não mais como simples método socrático, mas como verdadeira ciência. Ainda que o método ordenador sob princípios unitários, de Aristóteles, fará surgir a idéia de uma ciência ligada a um sistema, e o tornará conhecido como iniciador da cientifização do mundo,3 devemos lembrar que para Aristóteles igualmente havia o privilégio do método dialético sobre o apodítico. 4 Não é demais relembrar também a grandeza histórica do Direito Romano, grandeza essa que não se situa em uma “sistematização”, como a que resultou do trabalho de Justiniano, ou mesmo de eventual chegada a fundação de uma “ciência” do Direito. O que devemos reter dos romanos é justamente o lugar privilegiado que destacavam para a prudência, o saber prático, e o uso da tópica. Os seus métodos, e em especial a dialética, contrastarão sobremaneira com o privilégio do método apodítico da modernidade. O que podemos dizer, com Karl Engisch, que os romanos, aos quais cabe o inesquecível mérito de terem fundado esta ciência, sabiam muito exactamente o que nela lhes importava – ou seja, o seu caráter prático.5 Porque afinal a prudência é, na definição de Aristóteles6, uma disposição (capacidade, caráter moral), acompanhada de razão, capaz de agir na esfera do que é bom ou mau para um ser humano – por isso o homem prudente é aquele capaz de deliberação. Não poderia ser diferente, pois, que o método que dominava a jurisprudência romana, da racionalidade casuística, através da tópica, seria o que dominaria toda a história jurídica romana, compreendendo inclusive sua época clássica – mesmo que os atos jurídicos de caráter codificador apareçam tanto nas origens de Roma, com a Lei das XII Tábuas, quanto no fim da Antigüidade, com o Corpus Iuris Civilis. É assim, “la casuistique qui constitue, ici aussi, l’étalon de mesure” (KÄSER, 1962, p. 110) E por isso, como diz Max Käser que os grandes mestres clássicos gostavam de indicar na exposição dos casos os motivos das soluções e preferiam se referir à autoridade de juristas mais antigos do que a argumentos concretos. Os romanos, portanto, davam mais importância à consciência jurídica do que às deduções lógicas.7

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Free, exact, and systematic thinking has began (WELLS, H. G. A short history of the world, p. 94). Devido à natureza do saber prático os juízos a ele relativos são juízos de verossimilhança, de aproximação, já que os juízos de certeza são relativos exclusivamente às ciências teóricas (na era moderna será relativo às ciências naturais)– e nesse sentido de novo a necessidade de compreensão de um sentido que não é pejorativo à retórica. E como também refere MacIntyre (1991), o próprio pensamento aristotélico não pode ser ligado a um sistema completo nem quase completo, porque a dialética é essencialmente inacabada, sempre. 5 Cfe. ENGISCH, Karl. Introdução ao pensamento jurídico. Lisboa: Calouste Gulbenkian: 1988. 6ª ed., p. 13. 6 ARISTÓTELES. Obra jurídica. São Paulo: Ícone, 1997. P. 104. 7 ...on peut dire que l’ordre juridique romain ne se laisse pas ramener simplement aux ‘topoì’ étudiés; il est bien plutôt composé d’une multitude d’élements matériels que l’on pourrait peut-être mieux désigner par le terme peu compromettant de ‘figures juridiques’. E a supremacia da intuição não degenerou-se num 4

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ANAIS DA VIII MOSTRA CIENTÍFICA DO CESUCA – NOV./2014 ISSN – 2317-5915 Por isso o Direito, como ciência, é uma ciência prática pois o bem que o homem quer atingir com o Direito não é um estado, mas uma atividade, que só pode alcançar dentro da tradição em que se insere. Como ciência liga-se ao saber prático, à phronesis, por isso necessária a virtude da prudência, o saber prático – adquirido pelo hábito – que estará ligado a um bem de excelência e não de eficácia – pois é uma atitude dirigida a um fim ligado à atualização das possibilidades e potencialidades, e atingir o Bem supremo, esta possibilidade, que Aristóteles chama de Felicidade – não se faz aqui nenhuma separação entre moralidade e legalidade, ou teoria do direito (política) da cultura – pois política é ação. 8 Com a modernidade, entretanto, o conceito de ciência restou reduzido ao que a “razão iluminada” concebeu como certo e científico. E o direito passa a ser uma ciência apenas enquanto encerrar uma ordem sistemática de regras (dogmática), considerando assim duas ordens distintas, uma ordem moral e uma ordem legal.9 Importa ressaltar então que não precisamos, necessariamente, recusar o Direito como uma ciência, tudo depende do conceito que temos de ciência, e o fato do conceito moderno de ciência predominar na atualidade, e sendo um conceito reduzido e restrito, em geral fica-se limitado ao que a Modernidade definiu como Ciência. Sem esquecer que na crítica à Ciência Feyarabend, um dos maiores Físicos do século XX, chegou a afirmar que a Ciência era a maior bruxaria que já tinha conhecido. Que autoridade é essa então, que os próprios cietistas põe à prova? Foi, portanto, com a época moderna que a noção aristotélica da phronesis, a sabedoria prudencial, foi abandonada. Com o desenvolvimento do conhecimento científico-teorético da modernidade a juris-prudentia foi transformada em juris-scientia, resultado de um conjunto de representação que vai associado a certas concepções metafísicas de base, como o nominalismo e o voluntarismo, “e um modelo ‘calculatório’ do saber, decorrente da noção moderna de ‘razão’ ” 10 – e o paradigma pré-moderno da prudência cedeu lugar ao paradigma moderno da ciêncial, ou do positivismo.11 O pensamento jurídico resultou caracterizado por uma racionalidade teorética, onde o direito aparece como mero objeto. E a redução ou esquecimento da razão prática e supervalorização da racionalidade teorética produziu danos que ainda hoje se tenta consertar. subjetivismo sem limite devido à tradição dos ancestrais (Cfe. KÄSER, Max. Sur la méthode des Jurisconsultes Romaines. Cit., 113-115). 8 O homem assim está inserido numa comunidade histórica que o condiciona e que é por ele condicionada, homem que é unidade de teoria e práxis (OLIVEIRA, Manfredo Araújo de. Ética e sociabilidade, cit., p. 85). 9 Definição dada por MIAILLE, Michel. Introdução crítica ao direito. Lisboa: Estampa, 1994. 2ª ed., Trad. de Ana Prata, p. 301. 10 Cfe. LAMEGO, José. Hermenêutica e jurisprudência., cit., p. 28 e 160. Tudo isso relaciona-se com o niilismo e a distância declarada pelo positivismo entre juízos de fato e de valor. E a busca de segurança jurídica levou ao abandono definitivo do pensamento clássico de origem aristotélica (prudência) segundo o qual a compreensão do direito e as soluções jurídicas deveriam corresponder a juízos de verossimilhança, ao contrário da busca pela certeza própria das ciências da natureza inaplicáveis `a moral e ao direito, enquanto ciências do espírito (BAPTISTA DA SILVA, Ovídio Araújo. Execução e Jurisdição. São Paulo: RT, 1996, p. 107, 114-115). 11 Dizendo com António M. Hespanha, que a imagem histórica que temos tanto da justiça quanto do direito judiciário, como zonas adjectivas da ordem jurídica, contribuem para que a atividade constitutiva ou substantiva de fazer a lei torne-se mais interessante do que a atividade subordinada de aplicá-la (HESPANHA, António Manuel. Justiça e litigiosidade: história e prospectiva. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 1993, p. 383). F A C U L D A D E

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ANAIS DA VIII MOSTRA CIENTÍFICA DO CESUCA – NOV./2014 ISSN – 2317-5915 Esse direito recusou o pluralismo jurídico, e manteve-se separado por completo da moral, buscando legitimar-se exclusivamente pelo procedimento. É um modelo de direito com uma razão sem conteúdo, pois a “‘modernidade’ do direito supõe o necessário aniquilamento de qualquer tentativa de construção de uma ‘razão de conteúdo’” - através do culto exclusivo aos meios (procedimento) descuidando do fim do direito (Ihering volta a ser atual).12 Essa razão sem conteúdo, que se legitimou apenas pelo procedimento, tornou o Direito um instrumento e a segurança jurídica o fim único a ser perseguido. Foi assim que o positivismo jurídico, em suas diversas formas, a jurisprudência dos interesses a a teoria pura do direito acabaram sendo expressão da transformação do Direito e em mero instrumento de poder. 13 Para o Direito o privilégio da segurança tolheu, obscureceu e mesmo expulsou as possibilidades daquilo que é contingente e verossímil. O que é simplesmente contingente e verossímel foi reduzido à ideia de pseudociência.14 Enquanto a busca de segurança nas ciências naturais nada mais representa do que uma atitude, além de lógica, sábia, prudente, no Direito, a tentativa de livrar a humanidade da insegurança levou a outro extremo. Levou à separação entre moral e direito, e mesmo à exclusão da própria liberdade, onde a “ordem” passou a ser resultado de uma determinação arbitrária, acabando a busca pelo sentimento do justo. 15 3. AVALIAÇÕES COMO BUSCA DE SEGURANÇA O contexto extremo de busca de segurança jurídica, em detrimento dos valores da justiça produz ainda efeitos no mundo jurídico contemporâneo, nas escolas de direito, na vida acadêmica, nos livros produzidos, nos currículos, nas ofertas de cursinhos e toda a gama de produtos que o que se chama “industrialização de sabatinas” pode produzir. O que se percebe é que a pedra jogada na água ainda produz ondas que afetam a vida no campo jurídico. O modo de avaliar, o modo de exigir e condicionar alunos, estudantes de cursos de direito, para que respondam a certas questões ainda denota que boa parte do mundo acadêmico ainda está presa às ideias de ciência moderna, e do significado de direito vinculado a essa concepção. Já foi analisado em outro trabalho o perfil que a sociedade contemporânea assume tendo em vista o fenômeno perceptível de que a Sociedade é comunicação e tudo que se 12

Cfe. GRAU, Eros Roberto. O direito posto e o direito pressuposto, cit., p. 22 e 72-73. Para o autor, trata-se de um modelo de direito exclusivamente posto, que recusa qualquer direito pressuposto, ou também em outros termos, o direito formal/moderno recusa qualquer possibilidade de justiça material que ameace o primado da justiça formal. 13 Cfe. COING, Helmut. Fundamentos de filosofia del derecho, cit., p. 33. 14 Quando vista “desde o alto”, pelos responsáveis pelo “curso da sociedade”, pelos guardas do “bem comum”, a liberdade do indivíduo devia preocupar o observado; ela é suspeita desde o início, pela simples imprevisibilidade de suas conseqüências, de ser de fato constante fonte de instabilidade, elemento de caos que se deve refrear para assegurar e manter a ordem (BAUMAN, Zygmunt. Ética pós-moderna. São Paulo: Paulus, 1997, p. 12). 15 A respeito em KRETSCHMANN, Angela. História crítica do sistema jurídico: da prudência antiga à ciência moderna. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. F A C U L D A D E

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ANAIS DA VIII MOSTRA CIENTÍFICA DO CESUCA – NOV./2014 ISSN – 2317-5915 comunica faz parte da sociedade, bem assim, a função da lei na visão sistêmica e a percepção da decisão judicial na visão sistêmica (PINTO; CHAVES, 2014, p. 81). Essa questão é pensada também ao nível do indivíduo. Nesse contexto se encontra o processo de formação de instrumentos de aprendizagem adequados às peculiaridades que os Cursos de Direito exigem, como locus de experiência de realização da educação jurídica. Em um pequeno livrinho, Pedro Demo (2010, p. 3), vai insistir na relação entre avaliar e aprender, e mais especialmente, vai argumentar favoravelmente pela avaliação, como diz, “apesar de todos os incômodos e mal-estares que pode provocar e quase sempre provoca”. Entende que o único sentido de avaliar é tendo em vista o cuidado com a aprendizagem do aluno. Porém, como uma aversão cada vez maior, contra as avaliações, toma conta dos professores, o autor busca colocar a avaliação no seu lugar próprio, “sempre e unicamente a serviço da aprendizagem”. Ora, naturalmente não é essa a função da prova da OAB, nem do ENADE, que têm a função claramente “avaliativa”, classificatória, e eliminatória. A avaliação serve nesse sentido apenas para testar se o aluno consegue “reproduzir” conhecimento, ou seja, a prova não é o instrumento adequado para avaliar se o candidato/estudante tem condições de crítica. Entretanto, é necessário pensar no objetivo da avaliação para que ela sirva aos propósitos – construindo-se uma avaliação pedagógica (com função diagnóstica e prognóstica, como indica Pedro Demo), que sirva como aprendizagem, e pode-se complementar, uma aprendizagem de mão dupla, pois serve tanto para alunos como para professores, sendo possível formar uma cadeia circular e autopoiética para o desenvolvimento, tanto do aprendiz, quanto do mestre que deseja “avaliar” e ser capaz de efetivamente auxiliar na aprendizagem. Como o autor destaca, a “razão é autopoiética ou hermenêutica: não sabemos reproduzir a história. Ao contarmos uma história, o fazemos na condição de sujeitos, não de objetos” (DEMO, 2010, p. 13). Tudo isso tem relação com a natureza política do ser humano, capaz de escapar das vicissitudes e determinismos da natureza, e conduzir-se para onde desejar. Porém, tanto maior a capacidade política quanto maior o aprendizado alcançado, conquistado, o conhecimento construído, reconstruído, manejado pelo próprio ser que compreende e compreende-se no mundo. Daí também o papel da linguagem como fundante do desenvolvimento dessa própria potencialidade. O ser humano – e aqui tratando-se diretamente com o aluno, e o professor – não pode negar sua natureza política, e nesse sentido, político que tem natureza criadora e com potencial que pode sempre reverberar diante de novos incentivos. A sala de aula, e o professor são, ou deveriam ser, ou mesmo representar, o locus privilegiado onde o incentivo ao protagonismo criador do ser poderia transcender a si mesmo. Para tanto, alguns sistemas avaliativos podem podar essa libertação do ser, podem inibir a busca da crítica e da reflexão. Daí a importância de se trabalhar nesse contexto, dado que as avaliações são situações impositivas, às quais, não obstante a natureza política e desviante do ser, o aluno não tem como escapar - a não ser que abandone o caminho que escolheu. É possível compreender a aprendizagem a partir da teoria autopoiética de Maturana e Varela, que é utilizada por Pedro Demo (2010, p. 11) para mostrar que não é a realidade F A C U L D A D E

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ANAIS DA VIII MOSTRA CIENTÍFICA DO CESUCA – NOV./2014 ISSN – 2317-5915 externa que simplesmente se impõe ao sujeito, mas que é o sujeito que a capta “de modo reconstrutivo, interpretativo ou hermenêutico”. Ainda que possa acabar em um “fechamento estrutural”, uma autorreferência ao extremo, fato é que a questão pode bem ser aplicada ao aprendizado, considerando que o sujeito compreende a realidade que o cerca a partir de si, e não a partir de algo externo que se impõe a ele. O processo de transformação do perfil da educação exige a presença da filosofia, onde “a coisa”, o conhecimento, nunca obtém voz como ela mesma. A palavra como coisa é indireta, uma vez que ela não é retirada (suspensa), mas se dá na mediação, identificando a validade do que significa desenvolver a ideia de diálogo e mediação (GUNTER, 2008)16 e, no meio destes, o diálogo realiza a tarefa de mediador e se mostra ligado em si na busca de uma alteridade que impulsione o processo de construção singular do conhecimento jurídico. É muito interessante trazer essa visão de Pedro Demo para o aprendizado jurídico e a crítica que as provas da OAB têm recebido. Pode-se dizer que não obstante o sujeito compreender a realidade a partir de si mesmo, as avaliações, e bem assim, a prova da OAB, constituem uma realidade externa que é compreendida pelo sujeito, e que a ela tenta amoldar-se, afinal, para chegar onde deseja. Gadamer, por sua vez, nos orienta para um caminho além, no sentido de que não é compreensível o fato de que se pode formar uma consciência estruturada “pela ciência” e “para a ciência” visto ser uma consciência humanamente formada, que aprendeu a implicar no seu pensamento os pontos de vista do outro e a buscar o consenso sobre o que é comum e por ambos os significados. O autor demonstra, de certa maneira, sua preocupação com os rumos que tem levado essa natureza de saber do ser humano (GADAMER, 2011)17 como forma de autoconsciência. Tal autoconsciência insere-se num universo onde a cibernética ocupa espaço cada vez mais significativo, inclusive, substituindo a força de “trabalho humano”, o que leva a

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FIGAL, Günter. Oposicionalidade: o elemento hermenêutico e a filosofia. Petrópolis: Editora Vozes., p. 66. Todavia, ela só foi conquistada junto a modelos; ela não está apoiada em investigações concentradas na coisa mesma. O caráter mediado e mediador do conhecimento filosófico ainda carece de uma clarificação, e, para tanto, é preciso que digamos, por outro lado, o que é exatamente um conhecimento mediado e mediador”. (grifo nosso) 17 GADAMER, O Caráter Oculto da Saúde. Vozes. 2011. p. 22-3. O que é esse saber do ser humano de si mesmo? É possível entender o que seja “autoconsciência” através dos meios científicos? Trata-se de uma objetificação teórica do seu eu, que se deixa comparar com o modo da objetificação, a qual possui algo como uma obra ou instrumento que podem ser projetados antecipadamente pelo ser humano de acordo com um plano arquitetônico? E evidente que não. E certo que mesmo a consciência humana, de uma maneira complicada, ainda pode ser feita objeto da pesquisa científica natural. A teoria da informação e a técnica mecânica podem ser fecundas para o estudo do ser humano, esclarecendo o modo funcional da consciência humana através de seus modelos. Mas essa construção de modelos não pretende dominar cientificamente a vida orgânica e consciente do ser humano. Ela se satisfaz em evidenciar, através da simulação, o mecanismo altamente complicado que permite a reação vital e especialmente a consciência humana. Pode-se então perguntar se isso não é apenas a expressão de que a cibernética ainda se encontra nos seus primórdios e, por isso, a sua verdadeira tarefa, a do conhecimento científico natural de sistemas tão altamente complicados, ainda não tenha crescido. (Grifo nosso). F A C U L D A D E

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ANAIS DA VIII MOSTRA CIENTÍFICA DO CESUCA – NOV./2014 ISSN – 2317-5915 refletir cada vez mais acerca de nossa práxis (GADAMER, 1988)18 que deve indicar o modo como desenvolvemos nossa caminhada em direção a edificação de nossos desejos. No Direito, entretanto, destaca-se o fenômeno da compreensão, que carrega não apenas toda a referência humana de mundo, como apresenta uma validade própria no ambiente da Ciência, resistindo à experiência de ser transformado em método da Ciência. As ciências do espírito acabam desaguando com as formas de experiência que se situam distante da Ciência, tais como a experiência da filosofia e a experiência da educação, nas quais se manifesta uma verdade que não pode ser comprovada com os meios metodológicos da Ciência.19 As investigações sobre a tarefa da hermenêutica que partem da experiência da tradição histórica procuram analisar o fenômeno hermenêutico em toda sua compreensão. O reconhecimento dele é essencial como experiência de verdade, que não deve só ser justificada filosoficamente, mas que seja ela própria uma práxis filosófica. Com isso, a hermenêutica a que se refere não é uma doutrina de métodos das ciências do espírito, mas a tentativa de entender o que são na verdade as ciências do espírito, para além de sua autoconsciência puramente metodológica, e o que as liga ao conjunto de nossa experiência de mundo20 e pode contribuir substancialmente para a educação jurídica. 4. APRENDENDO COM A CRISE A crise no ensino jurídico já é um fato largamente pesquisado, trabalhado, difundido, e que só não é capaz de implodir a si mesma porque pouco realmente foi possível realizar para mudar essa realidade desde que a consciência do problema tornou-se notória e indiscutível. O que tem se tornado desgastante é observar Cursos de Direito lutando para unir a teoria e a prática como se isso bastasse para alavancar e retirar o ensino jurídico da crise em que se meteu, ou buscando adotar metodologias que nada mais fazem do que “colocar a poeira embaixo do tapete”, uma vez que a crise deve ser enfrentada a partir das pessoas que compõe toda a esturutra. Como destacam Rodriguez e Falcão (2008, p. 49), buscar unir teoria e prática é algo banal, e não é o que poderá trazer alguma mudança efetiva no quadro da crise. Os autores sugerem, aliás na linha do discurso produzido por Pedro Demo,21 que sejam desenvolvidas capacidades analíticas e práticas “procurando responder à inquietude dos alunos face à ausência de uma única solução correta no direito”, caminhando em direção a uma ”engenharia jurídica” – isso para conseguir alterar o que parece estar sedimentado no ensino: estudo de regras (e mesmo casos, mas só para o fim de aprender as regras) de modo enciclopédico, individualista (aulas expositivas) e acrítica (visando a pura assimilação) – é necessário, dizem os autores, pensar a longo prazo. 18

GADAMER, Hans-Gerg. A diversidade da Europa. Herança e futuro. (1985) In A herança e o futuro da Europa. Edições 70: Lisboa, 1998. p. 21-2 19 GADAMER, O Caráter Oculto da Saúde. Vozes. 2011. p. 20-30. 20 Ibdem, p. 31. 21 Vídeo do educador e filósofo Pedro Demo: https://www.youtube.com/watch?v=t8Z0_d7Oc-Q , acesso em 27 de outubro de 2014. F A C U L D A D E

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ANAIS DA VIII MOSTRA CIENTÍFICA DO CESUCA – NOV./2014 ISSN – 2317-5915 Sugere-se que se pense sobre a linguagem cotidiana e a mediação necessária da filosofia que verifica a importância que o diálogo filosófico gadameriano assume para o protagonismo reflexivo e originário no diálogo entre a técnica, a ciência e a hermenêutica como filosofia prática. A compreensão do papel da linguagem, associada à compreensão da hermenêutica como filosofia prática pode contribuir substancialmente no processo educativo. Isso ocorre porque a mediação pela linguagem, através da filosofia, emerge aqui no sentido hermenêutico, no sentido de uma transposição, eis que está presente em algo diverso e pode ser, contudo reconhecido nessa alteridade como “aquilo que é” preciso. O debate22 que envolve os especialistas (GADAMER, 2011) nas mais variadas áreas e sua proeminência na sociedade dentro deste modelo tecno-cientifico (DUTT, 1998) do qual a educação tem se tornado refém23 tem proporcionado o encontro com o diálogo de Gadamer que se constitui em elemento cada vez mais importante no processo de construção de horizontes humanos, que não ignoram as contribuições da ciência moderna, mas enfatizam que não se abdique do elemento hermenêutico fundado na experiência da consciência humana de valores24. Destaca-se, entretanto, que não se pode falar em “engenharia” no ensino do Direito sem destacar as diferenças de objetos a que se vinculam as diversas ciências, em especial o Direito das Ciências Naturais. No caso do Direito o método é necessariamente dialético, o que efetivamente distingue “a prática do ensino do direito da prática do ensino das ciências chamadas naturais” (RODRIGUEZ e FALCÃO, p. 50). No Brasil, tradicionalmente quem estuda Direito o faz para resolver problemas da vida real, tratar de litígios, opinar sobre assuntos problemáticos que exigem respostas “consistentes com o ordenamento jurídico vigente”, e assim, as faculdades concentram-se em explicar “o que o direito é”, mas sem explicar “o que o direito faz na sociedade” (COUTINHO, 2012, p. 2) – ocorre que, como destaca o autor, a pesquisa oupa um lugar secundário, senão terciário, na profissão jurídica, “quem fez Direito no Brasil geralmente é juiz, promotor ou advogado; não é pesquisador”. Isso quer dizer que a profissão sempre foi 22

GADAMER, O Caráter Oculto da Saúde. Vozes. 2011. p. 140. “O mesmo vale, basicamente, de forma que mal arrisco lembrar num círculo de especialistas, para os conceitos de inconsciente e de subconsciente. Esses são conceitos antilógicos, quer dizer, conceitos que efetuam o pensar a partir de um antagonismo, o qual eles tão somente sabem descrever como sendo aquela tal negação.” 23 DUTT, Carsten (Editor), En conversación com Hans-Georg Gadamer: Hermenéutica – Estética – Filosofia Práctica. Editora Tecnos: Madrid, 1998. p. 99 DUTT: “Usted ha advertido con gran insistencia del socavamiento de la razón social por medio de los falsos ideales de la sociedad de expertos y funcionarios. (…) la sociedad industrial altamente tecnificada donde vivimos el experto es una figura en la que ya no puede en absoluto dejarse de pensar. Es imprescindible en los más diversos ámbitos para asegurar el dominio necesario de procesos teóricos y técnicos complejos. (…) Sin embargo, esa especialización y clasificación en una estructura fija de tareas no lo es todo en nuestra existencia social. Esa no es la verdad con respecto a nuestra forma de vida. En realidad nuestra praxis no consiste en la acomodación a funciones preestablecidas o en la invención de medios adecuados para fines prefijados: eso es técnica; nuestra praxis consiste más bien en determinar fines comunes mediante una elección sensata hecha en común, y en acomodarios por medio de una reflexión práctica a lo que hay que hacer en nuestra situación concreta. Eso es razón social!” 24 GADAMER, O Caráter Oculto da Saúde. Vozes. 2011. p. 17. “Com base no atual estado técnico da civilização, a ciência faculta para si o poder de fundamentar também a vida social em bases racionais e de romper o tabu da inquestionável autoridade da tradição. (...) a forma silenciosa na qual esferas cada vez mais amplas da vida humana são submetidas ao domínio técnico e a decisão pessoal de cada um e do grupo é substituída por automatismos racionais.”(...) F A C U L D A D E

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ANAIS DA VIII MOSTRA CIENTÍFICA DO CESUCA – NOV./2014 ISSN – 2317-5915 identificada com a vertente prática e aplicada, enquanto a pesquisa não raras vezes é vista até mesmo de forma pejorativa, porque distanciada dos interesses de uma parte ou cliente. Entende-se, portanto, que é através da pesquisa que, tanto professores quanto alunos podem efetivamente escapar aos determinismos que acompanham as Faculdades de Direito, que necessitam inserção nos mais variados esquemas verticais de poder, como as exigências do MEC e ainda as da OAB, ao mesmo tempo em que podem, considerando a mais diversas “molduras” que são impostas, realizar uma avaliação crítica do que serve e do que não serve para a prática jurídica, destacando nessa prática o conhecimento da Lei e sua aplicação, e sua necessária vinculação à Justiça, não simplesmente como utilidade,25 mas como um valor a ser perseguido incansavelmente. No ensino jurídico a práxis tem se constituído em método importante para a construção de um conhecimento sólido e resistente à tensão natural da realidade social. Nesse sentido, a práxis educativa no direito tem se formado lenta e gradualmente, mas numa constância importante, na medida em que os alunos do Curso de Ciências Jurídicas podem ser bastante refratários a experiências que não possuem sentido formalistaobjetivista, ou seja, a um ensino que de alguma forma se afaste da tradição. No contexto civilizacional digital no qual se vive, mais fácil é trazer a realidade dos tribunais para a sala de aula, onde um caso deixa de ser abstrato e passa a ser trabalhado em várias instâncias, e por várias regiões (Tribunais Regionais Federais, ou Tribunais de Justiça dos estados). O modo de percepção do problema é visto de forma diversa por vários tribunais. Ninguém pode arvorar-se de ter a resposta certa e imediata, como antigamente poderia ser dito de grandes juristas pelo fato de que conheciam bem (decorada) a letra da Lei. Agora o jurista precisa revelar-se o sábio prudente, que não apenas conhece a jurisprudência, o pensamento e reflexão dos tribunais, mas também pode fundamentar e buscar alterar o que entende que os tribunais não estão compreendendo segundo uma visão de Justiça que entende mais adequada. Ele pode não ser um mero reprodutor de decisões em sua busca pela Justiça, mas para tanto, deve inserir-se na tradição e reconhecer-se parte de uma história, a sua história – que ele tem condições de escrever, e para a qual o Curso de Direito tem papel fundamental. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS O caminho do diálogo hermenêutico e sua necessária aproximação com a práxis educativa instiga-nos a compreender que o momento do ajuste do indivíduo à familiaridade ocorre com singularidade em nossas relações humanas e sociais. Reconhecemos mais do que uma barreira da nossa redução a observadores objetivos. Nesse percurso é que a práxis vital de cada um surge de modo hermenêutico em direção a uma autoconsciência e alteridade por meio da melhor compreensão da teoria. Hoje estamos inseridos num processo que produz nivelamento das formas de conhecimento. Há a necessidade de (re)construir a ciência e a técnica como instrumento que acompanha o desenvolvimento da humanidade e oportunize possibilidades de construir 25

Nos diversos sentidos propostos por SANDEL, Michael. Justiça – O que é fazer a coisa certa. Tradução de Heloísa Matias e Maria Alice Máximo. 4ª. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011. F A C U L D A D E

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ANAIS DA VIII MOSTRA CIENTÍFICA DO CESUCA – NOV./2014 ISSN – 2317-5915 entendimento (re)significado pelo diálogo hermenêutico gadameriano26 indutor de uma cultura carregadora de preocupação com a responsabilidade para com o outro, dentro de uma perspectiva intergeracional27, de proteção ambiental e de outros riscos a natureza humana28. No Direito, entretanto, o cuidado com a importação e reutilização de metodologias que são muito úteis em outras ciências deve ser visto com muito cuidado, pois há razões históricas de sobra para que se tenha receio na importação de métodos de outras ciências. A razão compreensiva exigida pelo Direito implica em uma metodologia dialética, e não dialógica, simplesmente, exige um passo sempre além, dentro de um contexto que sempre se atualiza, nas passadas de Heráclito do rio que sempre se transforma. Portanto, não será a importação de métodos das ciências naturais, ou a valorização excessiva de pesquisa empírica, que resolverá o problema da qualidade do ensino e da educação jurídicas. É importante prestar atenção no objeto investigado. O Direito é uma ciência social aplicada, entretanto, a transformação da realidade depende não apenas da coleta de dados e sua análise, mas também da reflexão sobre o que pode ser feito para além de uma análise empírica, mas reflexiva, crítica, criativa – e em especial, dialética. De todo modo, é importante que no direito a pesquisa empírica tome seu lugar, sem atropelar a investigação teórica, ou seja, buscar dados, por si mesmos, não basta ao investigador jurídico, ele busca dados porque tem uma pergunta que fez e que deseja responder, e mais do que isso, tem um caminho que entende é o certo a seguir, dependendo da resposta que encontrar, ou então, buscará refletir sobre os dados justamente para encontrar esse caminho ou criá-lo.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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PALMER, Richard E. Hermenêutica. Lisboa: Edições 70. p. 197-200. DUTT, Carsten (Editor), En conversación com Hans-Georg Gadamer: Hermenéutica – Estética – Filosofia Práctica. Editora Tecnos: Madrid, 1998. p. 98-100. La solidaridad se experimenta únicamente en aquellas cosas que no pierden sino que, al contrario, ganan por el hecho de que sean muchos los que participan en ellas; eso mismo vai para lo que llamamos arte y cultura. (Grifo nosso) 28 GADAMER, O Caráter Oculto da Saúde. Vozes. 2011. p. 15-6. “Hoje, pelo contrário, a exploração técnica das riquezas naturais e a remodelação artificial do nosso meio ambiente tornaram-se tão planificadas e amplas, que suas consequências ameaçam o ciclo natural das coisas e desencadeiam processos irreversíveis em grande escala. O problema da proteção ambiental é a expressão visível dessa totalização da civilização técnica. Cabe à ciência, evidentemente, tarefas de crescente importância, e ela tem de representar esse papel diante da consciência pública, já que os efeitos de nossa civilização técnica começam a atingir a consciência geral. Por um lado, isso conduz a uma cegueira emocional, com a qual a esfera pública reage a esses fenômenos, no sentido de crítica cultural. Trata-se de evitar, a tempo, a iconoclastia ameaçadora que disso resulta. Por outro lado, há a crença supersticiosa na ciência, que fortalece a irresponsabilidade tecnocrata, com a qual o poder técnico se dissemina desenfreadamente. Em ambas as direções, a ciência tem de realizar algo como uma desmitologização dela mesma, e deve fazê-lo, precisamente, com os meios mais apropriados da informação crítica e da disciplina metódica. “ 27

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