Os voos do estúdio Ghibli: um panorama sobre os voos de Miyazaki

May 29, 2017 | Autor: Gabriel Alves | Categoria: Steampunk, Hayao Miyazaki, Cinema de Animação, Animação Japonesa
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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE GABRIEL ALVES DOS SANTOS

VOANDO COM O ESTÚDIO GHIBLI Um panorama sobre os voos de Miyazaki

Niterói 2016

VOANDO COM O ESTÚDIO GHIBLI Um panorama sobre os voos de Miyazaki

Artigo desenvolvido durante a disciplina de estudo da cinematografia estrangeira III, como parte da avaliação referente ao primeiro semestre de 2016. Professor: Daniel Pinna

Niterói 2016

Introdução

As cenas de voo estão presentes em grande parte dos filmes do estúdio Ghibli, sendo o tema central ou de extrema importância em boa parte deles. Nesse artigo vamos traçar um panorama sobre o significado do voo e suas intenções em algumas obras, dando destaque ao filme “Vidas ao vento”, lançado em 2013 e dirigido por Hayao Miyazaki, como também explicitar o uso do gênero steampunk em muitos dos filmes do estúdio. Serão abordados também, ainda que brevemente, o voo nos filmes “Laputa: O castelo no céu”, “O serviço de entregas da Kiki”, “Porco Rosso”, “A viagem de Chihiro” e “O castelo animado”.

O VOO E SEU SIGNIFICADO GERAL NOS FILMES GHIBLI

O voo é um tema recorrente na maioria dos filmes do estúdio, principalmente nos de Hayao Miyazaki, e é usado como metáfora para muitas situações. Análises que podem ser feitas a partir da tradução dessas metáforas são pautas importantes como a liberdade ou o poder que o personagem possui dentro da narrativa, entre outros temas como a vida e a morte e uma indicativa de onirismo por parte dos personagens. Além dos significados metafóricos, os filmes de Miyazaki são repletos de máquinas voadoras com características diversas: é possível notar um grande uso do estilo steampunk na concepção de muitas de suas máquinas voadoras (e outras maquinas em geral), tal como a presença de aviões prémodernos, baseando-se principalmente em modelos que já existiram. A paixão de Miyazaki pelo voo também é ligada constantemente ao fato de seu pai ter trabalhado durante muito tempo com aviação, levando-o assim a abordar o tema diversas vezes ao longo da carreira e atribuindo diversos significados em cada utilização.

ALGUNS DOS FILMES COM VOO E UMA BREVE ANÁLISE SOBRE SEU USO

Nesse momento iremos analisar alguns dos principais filmes que contém cenas de voo que são de extrema importância para a narrativa do filme. As obras a serem analisadas são “Laputa: O castelo no céu”, “O serviço de entregas da Kiki”, “Porco Rosso”, “A viagem de Chihiro” e “O castelo animado”.

O voo para Laputa Em “O castelo no céu” podemos observar um uso intensivo do voo; o filme é quase todo passado no céu, com poucas cenas onde os personagens principais se encontram o chão. A história gira em torno de dois jovens, Sheeta e Pazu, que partem em busca da cidade perdida de Laputa que, não por acaso, é uma cidade flutuante e que mesmo tendo sido destruída ainda desperta a

obsessão pelo voo por parte da maioria dos personagens e os força a voar na maior parte do filme. O voo em Laputa pode ser percebido de muitas maneiras e traduzido em vários significados: há o voo de liberdade, aventura e poder sobrenatural que a personagem Sheeta utiliza em certas ocasiões, o voo aventureiro dos coprotagonistas, que partem em busca da cidade flutuante, o voo dos personagens antagonistas, que geralmente possuí características mais pesadas nos designes de suas aviações se comparados ao estilo utilizado nas aeronaves em que voam Sheeta e Pazu.

Miyazaki faz questão de deixar bem claro a distinção entre os ideais de voo dos personagens e a capacidade que os humanos têm de voar dentro do contexto e período da trama.

Kiki e o voo da liberdade. Em “O serviço de entregas da Kiki” é apresentada a história da jovem bruxa Kiki, que deixa sua família e sua cidade aos treze anos em busca de sua própria independência e autoconhecimento. Numa noite, Kiki decide partir da cidade onde nasceu voando em cima de sua vassoura em busca da tão almejada liberdade. Ela parte para a cidade grande e abre um serviço de entregas, como o título do filme sugere, as quais ela realiza as voando na sua vassoura. A personagem também parte em busca de aventuras, porém a sua independência é o foco, sobretudo.

O voo é importante nesse filme, pois é através dele que a personagem conseguirá alcançar a independência com que tanto sonha, entretanto Kiki enfrenta adversidades quando subitamente perde os poderes e não pode mais voar. O filme não deixa claro o motivo pelo qual Kiki perde os poderes, entretanto isso ocorre após uma conversa com o seu amigo “Tombo”, onde ela diz que voar não é tão divertido, já que é quase uma obrigação devido ao serviço de entregas. Somente no fim do filme, em um momento de necessidade e desespero, Kiki consegue com muito esforço recobrar os poderes para salvar o amigo “Tombo”.

As aviações de Porco Rosso

Porco Rosso, personagem que dá nome ao filme, é um emblemático aviador de sua época. Ele percorre os céus em seu avião vermelho, em busca de recompensas e é constantemente atacado por outros aviadores que já tiveram seus planos frustrados por ele. Marco Porcellino, seu nome verdadeiro, possui a aparência de um porco e isso é o máximo de fantasia que a obra passa ao expectador. O filme, diferente de muitos outros do estúdio, não retrata o voo de forma mística ou repleta de simbolismos. É apresentada uma história sobre aviação, onde os personagens não

possuem

características

sobrenaturais – exceto pela aparência de Marco, que é tratada como um mero detalhe –, ou buscam por mundos fantásticos.

No entanto há uma cena em que o personagem principal encara o sobrenatural: Porco Rosso narra que durante um voo, quando ele e alguns companheiros pilotos foram surpreendidos por pilotos inimigos, Marco ainda na sua forma humana consegue visualizar uma linha no céu, a qual ele descobre depois ser formada por aviões e seus pilotos. Esse voo pode ser considerado como um símbolo para a morte e o que acontece depois dela, onde os pilotos continuam seguindo indefinidamente rumo ao desconhecido. Marco consegue visualizar isso pois passa por uma experiência de quase morte, mas retorna à vida e especula-se que sua transformação em porco se deu devido a essa experiência, no entanto isso não é especificado durante o filme. Voo e o poder em “A viagem de Chihiro” e “Castelo animado”

Nesses dois filmes, o voo é de extrema importância para a narrativa de cada um, se fazendo bastante presente em “A viagem de Chihiro”, onde há bastante uso do voo para demonstrar o poder de certos personagens e em “Castelo animado”, onde repete as transformações e o sobrenatural por trás do voo dos personagens além de adicionar o uso de máquinas produzidas pelo homem para o auxílio no voo. Em “A viagem de Chihiro”, podemos observar um importante uso de voo atrelado ao misticismo dos personagens Haku e Yubaba. Haku é um jovem que vive com a bruxa Yubaba e seu voo, acompanhado por sua capacidade de morfismo (onde ele se transforma em um dragão), está relacionado ao poder que o personagem possui e é também atrelada à ideia de liberdade. Os mesmos motivos podem ser observados no voo da bruxa Yubaba, que é extremamente poderosa e se transforma em uma espécie de corvo para realizar o seu voo.

Em “Castelo animado”, os personagens que possuem poderes

sobrenaturais

também são capazes de voar, como Howl, a bruxa do pântano e madame Também

Suliman. é

possível

observar o grande uso de máquinas voadoras, onde fica clara a distinção entre o voo com a natureza (realizado por Howl e Sophie em suas máquinas com inspirações biônicas) e o voo contra a natureza (das aeronaves que espalham a guerra e possuem algumas características das aeronaves reais) sendo os dois voos bem influenciados pelo gênero steampunk A própria casa de Howl, que também possui características vindas do steampunk, mais tarde se torna flutuante – o que pode simbolizar a superação dos personagens diante de várias adversidades e a maturidade adquirida por eles ao longo do filme.

AS MÁQUINAS VOADORAS E O STEAMPUNK

Além da misticidade dos personagens que voam sem o auxílio de qualquer artifício produzido pelo homem, Miyazaki utiliza-se muito de máquinas em diversos dos seus filmes. Alguns são facilmente reconhecidos como modelos de aeronaves reais, já que guardam muitas semelhanças ou são fielmente reproduzidas. Outras possuem uma estética steampunk são baseadas em meios não convencionais, como a utilização de modelos biônicos. A estética steampunk é bastante abordada em muitos dos filmes de Miyazaki, que é inclusive reconhecido como um dos expoentes do estilo e por ser um dos primeiros a demonstrar o visual do steampunk no cinema, tendo trabalhado com gênero mesmo antes do estúdio Ghibli ser fundado, como é o caso da série “Conan - o rapaz do futuro” e o cultuado filme “Nausicaa no vale do vento”. Vamos falar sobre essa estética e como ela vem sido abordada por

Miyazaki ao longo de sua carreira, sendo mais relevantes para o contexto os filmes “O Castelo no céu”, “O serviço de entregas da Kiki”, “Porco Rosso”, “Princesa Mononoke” e “O castelo animado”, além do curta-metragem de 2002, intitulado “Imaginary flying machines”.

O que é o steampunk?

O steampunk é um subgênero da ficção científica, onde a tecnologia atual é constantemente transmutada para o passado, geralmente para a era vitoriana e o começo do século XX, sendo adaptada aos recursos e contexto que época que possui. As máquinas baseadas no conceito steampunk são, em geral, máquinas movidas a vapor e dão preferência a uma energia mecânica, porém possuindo a mesma funcionalidade das máquinas atuais feitas de materiais completamente diferentes e movidas a energia eletrônica como computadores e aviões. Para ilustrar o gênero e sua influencia nos filmes do diretor, faremos uma breve análise do steampunk presente em “Nausicaa no vale do vento”, “O castelo no céu”, “O serviço de entregas da Kiki” e “O castelo animado”. Há também pequenas referências em seu último filme “Vidas ao vento”, que apresenta um modelo de avião levemente baseado no steampunk logo no início do filme.

Nausicaa no vale do vento

O filme é o dos primeiros do diretor, realizado antes da existência do estúdio Ghibli e trata de temas importantes como ecologia e antibelicismo, além de trazer um fator crucial para a necessidade de máquinas no filme: o vento. Nesse filme pode se observar uma das primeiras vezes onde o amor de Miyazaki pelo voo e pela estética steampunk são expressados, podendo ser observado principalmente em objetos utilizados pelos personagens como meio de sobrevivência ao próprio ambiente, como mascaras contra os gases tóxicos e as máquinas voadoras, por exemplo. Nesse momento o conceito de steampunk ainda é mostrado de forma menos elaborada, se comparado aos filmes posteriores do diretor, já que é um dos primeiros a ser realizado por ele.

Castelo no céu

As influencias de steampunk nesse filme são bem claras. Há inúmeras máquinas voadoras e são todas influenciadas pelo estilo steampunk. Existem modelos biônicos como insetos de metal, que são usados pelos protagonistas enquanto os antagonistas utilizam máquinas com uma aparência mais

pesada. Há também a presença de robôs mecânicos que cuidam da cidade de Laputa, além da própria cidade ser portadora de uma tecnologia mais evoluída que a tecnologia terrestre, mas ainda assim possui muitas características desse estilo, como o grande uso da energia mecânica e o vapor. Graças às características de Laputa, a cidade pode ser considerada um nirvana feito sob a ótica do steampunk. Nesse filme também pode se observar um grande apreço por seus objetos voadores da parte da maioria dos seus personagens, fomentando assim o uso de tal obsessão como uma das linguagens do estilo.

O serviço de entregas da Kiki Talvez o uso mais importante desse estilo no filme “O serviço de entregas da Kiki” é a cidade que ela escolhe viver após deixar a casa dos pais. A cidade é basicamente movida à energia mecânica e um dos elementos mais importantes para essa conclusão é a torre do relógio, que é o primeiro ponto onde Kiki pára após chegar à cidade e que também adquire certa relevância na medida em que o clímax do filme se aproxima.

Não há grande presença de máquinas, porém o estilo pode ser observado nas poucas ocasiões em que elas aparecem no filme, como quando o personagem Tombo cria um objeto voador a partir de uma bicicleta e uma hélice, por exemplo, e também na paixão e admiração que tanto ele quanto outros personagens sentem pelo dirigível que está na cidade e que também possuirá destaque com o desenvolver da história. Outro fator importante é a relação dos personagens com o voo de modo geral, sendo esse um fator importante na consagração de Kiki como um exemplo da linguagem steampunk no cinema de Miyazaki.

O castelo animado

Esse é um dos filmes em que Miyazaki mais se utiliza do steampunk, tanto na criação das máquinas como no visual quanto na direção de arte e na confecção de alguns dos cenários onde a história se passa. O filme é ambientado na era vitoriana, e isso fica óbvio em cada cidade aonde os personagens vão, onde é possível observar a existência de características como uma torre de relógio. O próprio castelo pode ser citado como um dos objetos do filme com mais destaque no gênero, onde pode se observar uma gama de características do estilo como o uso de metal, engrenagens, rodas e madeira em sua estrutura, como também um designer baseado em um conceito biônico, a mecânica que faz o castelo se mover etc., além das máquinas voadoras em determina-

das cenas, que se apropriam do mesmo estilo biônico e steampunk, ora mais leve e fantasioso (para os protagonistas), ora mais bruto e realista (como os aviões de guerra).

. VIDAS AO VENTO E O VOO FINAL DE MIYAZAKI

Introdução “Vidas ao vento” foi lançado em 2013 e é o último filme dirigido por Hayao Miyazaki até o momento, sendo assinado como sua despedida da direção de longa metragens. É também um dos que mais transparece o amor do diretor por aviões, que adaptou a história a partir de dois personagens históricos: Jiro Horikoshi e Tatsuo Hori. Além disso, a paixão de Miyazaki fica mais uma vez explícita quando ele confere ao personagem traços autobiográficos, sendo a maior declaração à aviação realizada por ele no cinema.

Resumo

O filme narra a história de Jiro Horikoshi, que sonha em ser piloto, mas abandona a ideia graças à sua miopia. Após sonhar com o seu ídolo, o italiano Giovanni Battista Caproni, Jiro decide que vai se tornar um projetista de aeronaves graças ao conselho que Giovanni lhe dá em uma das cenas de voo mais belas e emblemáticas do filme.

Após o grande terremoto que abalou Kanto em 1923, o personagem principal conhece seu par romântico, a personagem Naoko Satomi, a qual só votará a ver anos mais tarde e com quem virá a ter um relacionamento, entretanto ela sofre de tuberculose e passa a maior parte dos seus dias internada enquanto Jiro trabalha fora. Na conclusão do filme Naoko descobre que não pode ser curada e abandona Jiro, enquanto ele está prestes a criar um avião veloz e ágil, diferente de todos os modelos fracassados até então, porém nas ultimas sequências é revelado ao espectador que seu avião foi amplamente utilizado durante a II guerra mundial pelos pilotos Kamikaze, entretanto o filme faz apenas uma breve menção. Na sequencia final Jiro sonha com Giovanni mais

uma vez e lhe diz estar arrependido por ter criado o avião, no entanto Jiro o conforta, dizendo que, apesar de tudo, o seu sonho de construir um lindo avião se realizou. Miyazaki se influencia em eventos reais para criar o pano de fundo da história, como a biografia do engenheiro aeronáutico Jiro Horikoshi, adaptando a ela elementos fantásticos também, como a história do romance entre Jiro e a personagem Naoko Satomi, que é uma história adaptada do livro “The Wind has risen”, que por sua vez foi baseado na vida do próprio autor Tatsuo Hori e suas experiências com sua noiva. Além dessas influencias realistas, o filme é permeado com cenas oníricas, onde as cenas de voo ficam ainda mais belas.

O voo

O voo nesse filme é tratado de maneira semelhante ao voo em “Porco Rosso”, onde falar de aviação é o foco principal do diretor, que opta por deixar de lado os voos fantásticos comumente utilizados; se em muitos dos outros filmes Miyazaki trata o voo como uma ideia atrelada ao poder sobrenatural de alguns personagens, nesse ele trata de uma maneira delicadamente única, onde sua paixão se une a paixão do personagem principal para criarem uma ode às aeronaves e, sobretudo, a ideia de fazer voar no lugar de realizar o voo propriamente. A obra é produzida sob uma ótica bem realista e ao mesmo tempo possui cenas que usam elementos fantásticos e são provindas dos sonhos do personagem; Na realidade o personagem enfrenta as adversidades do voo quando seus modelos falham, ao passo que experimenta a liberdade traduzida nas cenas oníricas em que ele voa com sua maior inspiração: Giovanni Caproni.

Apesar da ótica realista, há uma conexão entre o realismo fantástico utilizado em “Porco Rosso”, na cena em que os aviões de guerra ascendem ao céu, simbolizando assim a morte daqueles pilotos. Há também uma sutil cena de voo sem o auxílio de aviões; um momento muito breve, também na ultima sequencia do filme onde Naoko se encontra com Jiro uma ultima vez em um de seus sonhos e após uma conversa ela voa dos sonhos do personagem, simbolizando a morte da personagem.

Vidas ao vento

Porco Rosso

O filme também trata a noção de um voo dramático que é usado para o mal e faz menção à frase dita por Giovanni, quando é revelado ao espectador a função que os aviões criados por Jiro tiveram durante a II guerra mundial e a destruição causada por eles, em especial sobre os ataques dos pilotos Kamikaze.

BIBLIOGRAFIA

Shaner, A. DEFINING STEAMPUNK THROUGH THE FILMS OF HAYAO MIYAZAKI. [s.l.] The Pennsylvania State University, 2011.

Resenha: Vidas ao Vento. Disponível em: . Acesso em: 31 jul. 2016. FILMES CITADOS 

Nausicaä no vale do vento



O castelo no céu



O serviço de entregas da Kiki



Porco Rosso



A viagem de Chihiro



Castelo animado



Vidas ao vento

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