Para estudar a laicidade, procure o religioso

June 16, 2017 | Autor: Emerson Giumbelli | Categoria: Secularism, Laicidade
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In: GIUMBELLI, E e BELIVEAU, Veronica. (Orgs.) . Religión, Cultura y
Política en las Sociedades del Siglo XXI. Buenos Aires: Biblos, 2013.

Para estudar a laicidade, procure o religioso[1]

Emerson Giumbelli[2]

O objetivo deste texto é estabelecer uma posição, tendo em consideração
debates acerca dos temas da laicidade e do secularismo, que serão aqui
tomados como equivalentes, por razões adiante mencionadas. Trata-se de
temas que vêm recebendo um investimento significativo em período recente, e
o modo como me posiciono em relação à bibliografia a que tive acesso
adquire a forma de um comentário que não se confunde com uma
sistematização. Um empreendimento rigoroso de sistematização exigiria
maiores cuidados com os autores com os quais dialogo. Ao mesmo tempo, é
impossível tomar uma posição frente aos temas aqui discutidos sem emitir
considerações acerca da bibliografia que lhes seja referente – e espero que
essas considerações não se limitem a idiossincrasias. Procederei por
etapas. Na primeira delas, ensaio uma visão geral acerca da bibliografia;
em seguida, discuto a relação entre os termos do debate, sobretudo entre
secularismo e secularização. Prossigo tentando apontar os níveis que
compõem a análise do tema e sugiro uma estratégia para a caracterização do
que denomino configurações de secularismo. Ao final, ilustro os
procedimentos defendidos abordando a laicidade francesa e alguns aspectos
da laicidade em três países latino-americanos. Afinal, a pretensão maior
destas elaborações é estabelecer bases para um empreendimento comparativo
da laicidade na América Latina.



1. Visão geral da bibliografia e discussão da terminologia

Se consideramos a bibliografia em torno dos temas do secularismo e da
laicidade, temos elementos para afirmar que há sobre eles um interesse
crescente. Menciono alguns títulos, limitando-me a livros com pretensões
abrangentes e artigos com visadas sistematizantes: Bhargava (1998), Costa
(2006), Blancarte (2008a), Levey e Modood (2008), Cady e Hurd (2010),
Warner, Vanantwerpen e Calhoun (2010), Calhoun, Juergensmeyer e
Vanantwerpen(2011) são coletâneas reunindo textos de dezenas de autores;[3]
Kuru (2009) e Baubérot & Milot (2011) são monografias com empreendimentos
comparativos; Asad (2003) é uma referência conceitual importante; Cannel
(2010) e Bowen (2010) são dois artigos que tecem balanços sobre a
bibliografia atual. Note-se que a data de publicação desses textos é
recente, e pode-se constatar uma certa efervescência editorial em língua
inglesa sobre o tema do secularismo, impulsionada por projetos de
pesquisas, eventos, blogs, etc.[4] Observo também a presença nessa
discussão, conferindo-lhe importância e elevando o nível do debate, de
autores do porte de Jurgen Habermas – que vem nos últimos anos se dedicando
a refletir sobre religião – e Charles Taylor – que publicou um livro de
grandes proporções (2010), a ponto de se tornar objeto de toda uma
coletânea de comentários (Warner, Vanantwerpen e Calhoun, 2010).
Nessa literatura, é muito comum o uso do plural – laicidades,
secularismos – deixando evidente a disposição comparativa e a exigência de
se recusar modelos privilegiados. É significativo que o volume de
comentários ao livro de Taylor, o qual optou pelo singular (Uma Era
Secular), tenha recorrido ao plural, grafando Variedades de Secularismo
(Warner, Vanantwerpen e Calhoun, 2010). Apesar disso, pode-se constatar o
destaque conferido a determinados países. Estão nessa condição França,
Estados Unidos, Índia, Turquia e mais alguns países de significativa
população muçulmana. Alguns exemplos: Bhargava (1998), apesar de reunir
alguns textos mais gerais, dedica-se a compilar posicionamentos no debate
indiano; Kuru (2009) propõe uma comparação entre França, Estados Unidos e
Turquia; Cady e Hurd (2010) acrescentam a esses três a Índia; a Turquia é
objeto dos textos de Gole (2002, 2010); a França é campo das pesquisas de
Scott (2007) e Bowen (2007), e do texto de Asad (2006); Bowen (2010), por
sua vez, abrange em seu comentário situações na França, Grã-Bretanha,
Turquia, Egito e Indonésia; a bibliografia sobre os Estados Unidos é
volumosa, mas quase sempre voltada a um debate interno. A consulta aos
índices dos livros com abordagens mais gerais demonstra, por outro lado,
uma quase ausência da América Latina como campo de pesquisa, sobretudo em
língua inglesa. Em contraste com os livros organizados por sociólogos
latino-americanos (Costa 2006; Blancarte 2008a) e com o volume de Baubérot
e Milot (2011), a coletânea elaborada por Calhoun, Juergensmeyer e
Vanantwerpen (2011) cita somente México e Peru, com apenas uma ocorrência
cada desses países.
Essa distribuição desigual do interesse por campos de pesquisa tem a ver,
em parte, com a dificuldade de conferir uma definição consensuada, mesmo em
um sentido bastante livre, para o termo. Bowen (2010, p. 680) lamenta a
falta de entendimento sobre o objeto designado pelo termo secularismo. Kuru
(2009, p.3) nota "a ausência de terminologia consistente". Cannel (2010)
inicia sua recensão bibliográfica com uma afirmação preocupante: "... os
significados de 'secular' e 'secularismo' estão constantemente mudando na
literatura, dependendo se um determinado autor acredita que são reais"
(p.86). Na verdade, falta consenso sobre os próprios termos, quando se
lembra que laicidade é palavra pouco popular fora da França – México,
Uruguai e Turquia figuram como exceções importantes – e que secularismo é
uma palavra cujo uso levanta imediatamente a questão sobre sua relação com
seus parentes linguísticos – secularização, secular, secularidade. Nesse
quadro, entende-se porque as pesquisas se voltam para casos clássicos e
modelares, ou para casos onde laicidade e secularismo se tornaram
recentemente pautas socialmente controversas. Todos os países citados
adequam-se a uma dessas condições e alguns deles mesmo a ambas delas.
Evidentemente, há debates sociais importantes na região da América Latina
acerca da laicidade, mas sem a mesma repercussão global que as polêmicas
sobre símbolos e sítios religiosos na França, na Índia e na Turquia, ou a
ascensão de partidos políticos islâmicos em países de significativa
população muçulmana.
Antes de prosseguir, cabe esclarecer a equivalência assumida entre
laicidade e secularismo. Não se trata de recusar o reconhecimento e a
análise de especificidades, expressas na diversidade terminológica,
relativas a tradições históricas ou circunscrições espaciais.[5]
Entretanto, não se pode conferir a essas especificidades – e muito menos à
diversidade terminológica que a expressa – um estatuto de definidor
epistemológico. Em outras palavras: prefiro compreender as especificidades
a partir de uma abordagem que logre aproximações entre situações diversas
(incapazes de caberem em quaisquer dualismos), cujo ponto de contato
sugerirei adiante. Parece-me ser esta uma tendência crescente na literatura
recente, observável dos dois lados, por assim dizer, dos partidos
terminológicos. Baubérot e Milot (2011) intitulam seu livro de Laicidades
sem Fronteiras, pretendendo abarcar em sua análise países anglo-saxões. E
Kuru (2009) e Cady & Hurd (2010) são exemplos do procedimento inverso, como
são também os livros de Bowen (2007) e Scott (2007), que tratam da
laicidade francesa a partir do conceito de secularismo. Creio mesmo que
esse cruzamento de referências permitirá creditar o devido valor ao modo
pelo qual muitos países latino-americanos experimentam arranjos e regimes
de laicidade.
Ainda no plano terminológico, é interessante comentar o jogo de
correspondências entre as duas séries de categorias, uma ligada ao
secularismo, outra ligada à laicidade. Linguisticamente, faria sentido
pensar que a correspondência funcionaria nas seguintes formulações:
secularização :: laicização / secularidade :: laicidade / secularismo ::
laicismo / secular :: laico. Entretanto, ao leitor minimamente
familiarizado com a literatura pertinente, essas correspondências não se
sustentam. "Secular" e "secularismo" carregam uma densidade que não é
alcançada no mesmo grau por "laico" e "laicismo", o primeiro geralmente
usado como adjetivo dependente de "laicidade" e o segundo muitas vezes
entendido como apenas uma posição ideológica ou caricatura da "laicidade".
No outro extremo, podemos aceitar alguma identificação entre
"secularização" e "laicização" (ambos designam um processo), com a condição
de reconhecer que o primeiro desfruta de um estatuto sociológico
desconhecido pelo segundo, termo mais uma vez dependente de "laicidade".
Seu correspondente lingüístico, "secularidade", pelo menos por enquanto,
não despertou muito apelo e seu emprego parece estar atrelado ao prestígio
já arrebatado pelos outros elementos da série. Portanto, faz sentido
sustentar, com base no uso que a literatura realiza desses termos, a
correspondência conceitual entre secularismo e laicidade. Falta agora saber
como definir esse par conceitual.


2. Secularismo e laicidade como arranjos políticos
Façamos então a pergunta: com que definição de laicidade ou secularismo
podemos operar de modo sustentar, e mesmo estender ou aprofundar, o
empreendimento comparativo? Em outras palavras: que campos de pesquisa são
abertos por certas maneiras de considerar os temas da laicidade /
secularismo? Na referência ao termo corrente no debate em língua inglesa,
surge a inevitável questão sobre a relação entre secularismo e
secularização. Acabamos de ver que, se no caso da série lingüística
relacionada à "laicidade", este é o termo em torno do qual giram os demais,
no caso de "secularismo", as coisas são mais complicadas, sobretudo em
relação à "secularização". Passo logo a enunciar minha posição, que
procurarei detalhar em seguida: concordo com aqueles autores que propõem
uma distinção na aplicação dessas categorias, distinção que formulo em
termos de campos de questões. Refiro-me, mais especificamente, às idéias de
Baubérot e Milot (2011), que lamentam uma espécie de imperialismo
conceitual referido à noção de secularização; também à proposição de Bowen
(2010), que permite, por exemplo, circunscrever a pretensiosa obra de
Taylor (2010) ao conjunto de discussões sobre "processos que surgem na
história europeia moderna, ou no início dela, relativos ao lugar
[importância] da religião na sociedade" (p. 681). Em direção semelhante
trabalha a crítica de Mahmood (2010), quando lamenta que o mesmo livro de
Taylor "permanece indiferente a questões de secularismo político" (p. 293).
No esforço de precisar a distinção, estabeleçamos que a noção de
secularização levanta um debate sobre a importância da religião na
sociedade, podendo-se considerar muitas dimensões e variáveis: crenças,
práticas, instituições, espaços públicos – elas mesmas passíveis de muitos
desdobramentos. Herbert (2003) é um autor que, entre outros, contribui para
observarmos com mais clareza essa multiplicidade de planos e variáveis,
propondo uma distinção entre índices de vitalidade religiosa e de
significância social da religião. Em outra senda, Casanova (1994, 2011)
lança desafios que visam desvencilhar o conceito de qualquer teleologia. De
fato, uma das fragilidades da noção consiste em seu viés
epistemologicamente negativo – ou seja, pretende-se falar da religião desde
uma perspectiva de seu desaparecimento ou retraimento. A ideia da
pluralização dos níveis e variáveis de mensuração não deixa de colocar
questões constrangedoras, pois complexifica a avaliação sobre o avanço,
estabilização ou recuo da secularização. Seja como for – pois não tenho a
intenção de aprofundar as questões – a discussão que tem sua referência
nesse conceito revolve sempre em torno da importância da religião.
No caso do secularismo, seguindo o que sugere José Casanova (2011),
tratamos de "diferentes projetos estatais normativos-ideológicos, bem como
de diferentes quadros legais-constitucionais de separação entre Estado e
religião e de diferentes modelos de diferenciação de religião, ética,
moralidade e lei" (p. 66). Ou seja, agora o que está em discussão não é a
importância da religião, e sim as formas pelas quais o Estado se relaciona
com a "religião", no sentido de estabelecer um espaço para ela numa
sociedade, considerando o papel que diversos agentes sociais (incluindo os
"religiosos") jogam nos processos que correspondem a essas formas. Estamos
nos referindo, portanto, a arranjos políticos, cabendo precisar a maneira
de defini-los e de abordá-los. De todo modo, já está claro que secularismo
/ laicidade não designam apenas conjuntos de ideias ou posições
ideológicas. Desde o século XIX, ideias e posições apoiadas em ambas as
noções – e outras que se colocavam em campos adversários – foram formuladas
e sustentadas por diferentes agentes sociais, inclusive aqueles que
imprimiram rumos ao Estado. É imprescindível considerar os debates sociais
possibilitados por essas noções e outras com elas relacionadas (Kuru,
2010). Ao mesmo tempo, não se pode perder de vista sua vinculação com os
arranjos políticos que se constroem em diferentes períodos históricos, em
torno dos quais se associam Estado e sociedade, em formas variáveis e
heteróclitas. Deve-se ainda lembrar que todo e qualquer debate insere-se em
uma determinada configuração social, cujos elementos nunca se reduzem a
discursos.
Creio que as elaborações de Cady e Hurd (2010) também são pertinentes:
"Abordamos o secularismo com uma série de processos – constantemente em
mutação e em contestação – de definição e construção da religião no espaço
público. (...) Antes de considerar a secularização como resultante de uma
transferência de autoridade (subtraída) da religião, vários modos de
secularismo providenciam diferentes espaços para religião, esta entendida
como plural na forma e sempre internamente contestada" (p. 5-6). Não se
trata, evidentemente, de negar relações possíveis e até mesmo necessárias
entre secularismo e secularização; a diferença quanto ao argumento, por
exemplo, de que o secularismo é um aspecto ou um plano da secularização é
que, se aceitamos a dissociação conceitual, a relação será efetivada a
partir de campos de questões distintos, que produzem programas de pesquisa
também distintos. Talvez seja mais correto afirmar que, em sendo uma
dimensão da secularização, o secularismo precisa ser especificamente
acompanhado em seus efeitos, inclusive quando contrariam as expectativas da
secularização.
Os elementos colocados em jogo nessa discussão me permitem ainda elaborar
um comentário breve acerca de algumas interpretações correntes na
literatura que mobiliza os conceitos de secularização e de laicidade. Trata-
se, nesse caso, de um comentário mais específico, dirigido a autores quase
todos brasileiros. Farei referência a duas vertentes que podem ser
relacionadas ao peso da influência weberiana. Na primeira delas, pode-se
perceber essa influência – embora ela não seja necessariamente explícita –
na preocupação em se enfocar a intencionalidade dos atores sociais. Situam-
se nessa vertente as pesquisas de Esquivel sobre parlamentares
argentinos[6], de Lorea (2008b) sobre juízes brasileiros, de Oro (2011)
sobre os resultados de pesquisas de opinião pública. Embora essas pesquisas
estejam referidas ao tema da laicidade, seus esforços vão no sentido de
localizar a persistência de inspirações e motivações religiosas entre
atores sociais. Entendo, portanto, que realizam uma associação entre as
duas dimensões conceituais que são aqui distinguidas. Sem colocar em
questão a importância de pesquisas dessa natureza, e os resultados a que
chegam, destaco que minha inclinação pende mais na direção de compreender
as configurações societais que podem ser relacionadas com as noções de
laicidade / secularismo. Em outras palavras: insisto na possibilidade de
realizar analiticamente a distinção entre secularismo e secularização.
A outra vertente a que se pode associar um legado weberiano, nesse caso
explicitamente assumido, discute e aplica a ideia de desencantamento do
mundo. Na análise do campo religioso brasileiro, essa ideia inspirou
interpretações que enfatizam os impactos da diversidade de opções e da
lógica pluralista. Pierucci (1997, 2004) discorda da leitura que insiste em
ver na sociedade brasileira um cenário de dominância da religião e de
continuidade da tradição, mesmo reconhecendo que a diversificação
confessional privilegia o cristianismo. Prandi (1996) prefere enfatizar os
efeitos transformadores do aumento do trânsito dos indivíduos entre vários
pertencimentos e adesões religiosas. Mariano (2003) propõe uma análise
histórica, afirmando a importância da instauração de regras de direito que
garantiriam a vigência de uma lógica pluralista para o campo religioso. No
caso dessa vertente, o foco se concentra nas configurações societais,
terreno no qual ocorre no Brasil uma discussão sobre a caracterização e os
modos de pluralismo religioso, que também mobiliza autores com outras
preocupações teóricas (Birman, 2003; Burity, 2011; Montero, 2009;
Giumbelli, 2008). No caso daqueles que seguem a inspiração weberiana, o
conceito de secularização serve como referência básica, o que, a meu ver,
dificulta que aspectos ligados ao que conceituo como laicidade /
secularismo sejam mais devidamente explorados. A laicidade neles aparece
mais como um pressuposto político, e sua presença pode ser percebida em
certo mal-estar diante do protagonismo assumido pelas religiões na
sociedade brasileira. Minha preocupação, diante desse quadro, vai no
sentido de construir uma posição para a qual a laicidade surja como objeto
de estudo, preservando sua especificidade conceitual.


3. Aonde os modelos de secularismo / laicidade nos levam?
O estudo de Kuru (2009) nos oferece outra baliza para prosseguirmos no
esforço de definição conceitual. Ele se debruça sobre os casos dos Estados
Unidos, da França e da Turquia, mas parte de uma elaboração mais genérica,
que distingue diferentes modelos de Estado de acordo com sua relação com
igrejas e autoridades religiosas, gerando uma classificação que cobre 197
países do mundo. O primeiro é o Estado religioso, onde ocorre o controle
por autoridades religiosas dos processos legislativos e judiciários. O
segundo é o Estado que, não sendo teocrático, designa uma religião
estabelecida ou oficial. O terceiro é o Estado secular, que reune duas
condições: processos judiciários e legislativos fora do controle religioso
institucional e declaração constitucional (ou equivalente) de neutralidade
diante de religiões. O quarto é o Estado antirreligioso, derivado de
regimes que adotaram o ateísmo comunista. De acordo com a classificação do
autor, existiriam no mundo 12 Estados religiosos, 60 Estados com religião
estabelecida, 120 Estados seculares e apenas cinco Estados antirreligiosos.
Nessa construção conceitual, portanto, encontra-se largo campo para
empreender comparações entre Estados seculares, como o próprio livro
realiza considerando os casos, muito distintos, de Estados Unidos, França e
Turquia.
Constatar que o secularismo é uma realidade atualmente bastante
disseminada, entretanto, não significa ter encontrado o melhor modo de
abordá-la. Cabe problematizar esse modo bastante comum de definir o
secularismo e a laicidade, através de modelos ou princípios e de seus
elementos. Pois ela me parece ao mesmo tempo necessária e insuficiente.
Primeiro, é preciso dizer em que sentido o recurso analítico a modelos tem
implicações que, no meu entender, seria melhor evitar. Opto por uma
formulação geral, que em seguida ilustrarei com dois exemplos. Princípios
ou modelos que invocam "separação", "autonomia", "neutralidade", "liberdade
de consciência" ou "liberdade religiosa" são adotados para indicar
definições de laicidade /secularismo de uma maneira que lhes imputa a
condição de critérios. Quando isso ocorre, arriscamo-nos a forjar dois
tipos de dificuldades, ambas provavelmente incontornáveis. A primeira delas
tem a ver com a operacionalidade dos princípios. Como transformar, por
exemplo, "liberdade" em algo empírico e como garantir que esteja vinculado
à laicidade? Ou estamos falando apenas de uma declaração formal, o que
restringiria a análise a um plano jurídico? Outro risco é a utilização dos
modelos de maneira normativa, envolvendo, nesse caso, alguma forma de
avaliação ou mensuração de se e quanto haveria de separação, neutralidade,
liberdade, etc nas normas e práticas de determinado país. Isso propicia
afirmações do tipo: tal país é menos laico ou secular do que declara.
O sociólogo mexicano Roberto Blancarte tem se destacado na publicação de
textos e na disseminação de idéias que envolvem uma interessante elaboração
do conceito de laicidade. Para ele, a laicidade não se traduz
necessariamente na separação Estado-Igrejas e não deve ser confundida com
formas de sacralização do poder por meio de cerimônias cívicas. Melhor
defini-la como "um regime social de convivência, cujas instituições
políticas estão legitimadas principalmente pela soberania popular e já não
mais por elementos religiosos" (2008b, p. 19). Nessa formulação, o que
estabelece a laicidade, portanto, é a capacidade de um arranjo político de
evitar que "elementos religiosos" mantenham poder. Quando tal não acontece,
o autor aponta "erros" (p. 28 e 29) que servem de alerta para um bom
entendimento da noção. Nota-se aí, claramente, um uso normativo do
conceito. Mas o que prefiro destacar é a ausência de uma tentativa de
caracterizar não mais o que a laicidade deve evitar, mas como para isso ela
deve se constituir ou funcionar. Ao longo do mesmo texto, termos como
"povo", "interesse público" e "liberdades" são associados à laicidade, que
lhes serviria de garantia. Mas o que é esse "povo", o que estipula um
"interesse público", de que "liberdades" se trata, para além do princípio
que limita o poder dos "elementos religiosos"?
Merecem também um comentário as elaborações contidas no livro de Baubérot
e Milot (2011). Assim como Blancarte, Baubérot e Milot nos ajudam a traçar
a distinção conceitual entre secularização e laicidade e sustentam que esta
ocorra fora de um regime separacionista. Eles defendem que tanto a
separação formal entre Estado e igrejas, quanto a neutralidade estatal
devem ser consideradas como instrumentos para a consecução de dois fins
primordiais: a igualdade entre convicções religiosas e a liberdade de
consciência. Reencontramos aqui a opção por princípios para a definição da
laicidade e a mesma dificuldade de operacionalizá-los no plano empírico. O
que Baubérot e Milot constroem com esses princípios são seis tipos ideais,
que correspondem a modelos de laicidade, que se misturam em situações
históricas específicas, gerando tensões e mudanças de rumo, ou que sofrem
transformações por conta de arranjos e acomodações. Observa-se assim que a
laicidade é definida por princípios e pela sua articulação variável, o que
os torna suficientes para a consideração de problemas empíricos. Defenderei
adiante que modelos e princípios não possuem essa capacidade heurística,
tornando-se preferível que nos refiramos a configurações que envolvem
elementos de outra ordem e em outros planos.
Isso não impede que se considere a referência a modelos e princípios algo
necessário. Trata-se de precisar em que sentido. A saber: como declarações
assumidas nos ordenamentos jurídicos e em procedimentos legais de
determinados países. Por essa via, categorias como "separação",
"autonomia", "neutralidade" e "liberdade" funcionam como pistas para a
identificação de configurações de secularismo. Servem ainda como
indicadores de como modelos e princípios forjados na Europa dos séculos
XVIII e XIX foram sendo adotados em muitos outros países desde então e até
hoje. Na verdade, muitas vezes, sem o dizer, as definições que pretendem
operar com modelos e princípios como se fossem critérios de avaliação ou
mensuração estão referidas às elaborações cuja genealogia remete exatamente
aos ideais modernos europeus. No que proponho, trata-se então de partir
dessa localização e rastrear as pistas da disseminação de seus resultados.
Isso recoloca a vinculação – concebida na forma de problematização – entre
secularismo e modernidade, sem nos jogar necessariamente no campo
conceitual e analítico da secularização.
Duas observações sobre esse procedimento de definição. Primeiro, a ideia
de configurações de secularismo permite uma utilização ainda menos restrita
que a dos modelos propostos por Kuru (2009). Nela, os Estados seculares são
delimitados, de um lado, pelos Estados com religião estabelecida e, de
outro, pelos Estados irreligiosos. Exemplos de Estados com religião
estabelecida: Reino Unido, Grécia, Finlândia, Polônia, na Europa;
Argentina, Paraguai e Colômbia na América Latina. Agora a pergunta: o fato
de países como Reino Unido e Argentina oficializarem determinadas religiões
significa que não adotam outros princípios relacionados ao secularismo?
Difícil responder que sim. No caso dos países em que as religiões são
desfavorecidas em virtude da promoção do ateísmo, não se pode negar o
vínculo que tal política tem com os ideais europeus modernos. Ou seja, o
ateísmo como política de Estado pode ser visto como uma modalidade de
secularismo (designada como "autoritária" por Baubérot e Milot, 2011).
Finalmente, mesmo muitos Estados religiosos – teocráticos – adotaram tal
modelo em reação, e portanto em diálogo, com princípios secularistas, como
deixa clara a história do Irã e de tantos outros países nas regiões do
Oriente Médio e do norte da África. Em suma, praticamente todos os países
poderiam ser incluídos em nossa busca por pistas de configurações de
secularismo, o que não significa que não haja entre eles diferenças,
profundas muitas vezes.
A segunda observação visa evitar um mal-entendido. Admitir que a Europa
ocidental – e como derivação dela, os Estados Unidos – tenha servido de
referência histórica quando consideramos de modelos e princípios não
significa conceder-lhe privilégio epistemológico, nem sequer pressupor que
as experiências históricas em outras regiões do mundo não levantem inúmeras
especificidades. Ao manter a referência européia, o que se preserva é a
possibilidade de constatar a presença de fios que perpassam configurações
de secularismo muito diversas. E o que se ganha é exatamente a
possibilidade de considerar a Europa e os Estados Unidos como casos em um
quadro amplo de comparações. Europa e Estados Unidos são assim mantidos
nesse quadro não mais como paradigmas conceituais, e sim como casos
privilegiados para se perceber como o secularismo efetivamente funciona nas
situações nas quais foi originalmente elaborado. A pesquisa de outras
situações e de outros países oferece a vantagem de providenciar novos
pontos de vista para se observar as metrópoles secularistas, notando-se que
a configuração dessas metrópoles jamais se desvincula de relações com suas
periferias, inclusive no momento da formulação de princípios e modelos
secularistas (Van der Veer, 2001; Velho, 2007).


4. Dispositivos para regulação do religioso
No esforço de avançar na caracterização de configurações de secularismo,
visando ir além do plano dos modelos e princípios, sugiro um procedimento
que passo a descrever e defender. O caminho mais óbvio para tal
caracterização pareceria ser a problematização do secular, na medida em que
essa noção fundamentaria a de secularismo ou adjetivaria declarações
oficiais. O problema, no segundo caso, é que não são muitas as normas que
utilizam essa definição, o que recolocaria o risco de restringir as
situações sob escrutínio. A primeira formulação baseia-se na idéia de que
secular e religioso formam uma díade necessária, de tal modo que
compreender as formas de existência do religioso nas sociedades que
aderiram à modernidade, ou que dela participam de modos diversos,
implicaria em também acompanhar as formas de produção do secular.
Curiosamente, no momento em que muitos dedicam-se a entender "variedades de
secularismo", em que outros (como Blancarte) lamentam que ainda não
tenhamos atingido a secularidade, alguns (a exemplo de Habermas) já
preferem falar em pós-secular – o que traz o risco desnecessário de
transformar a discussão sobre secularismo e laicidade em uma avaliação
sobre momentos civilizacionais.
De todo modo, há um impulso mais geral na literatura vinculado à
necessidade de problematização do secular enquanto princípio social e
categoria epistêmica, em uma crítica às visões que o consideram uma espécie
de condição padrão da humanidade, à espera de que haja uma depuração pela
separação com o religioso. Estou de acordo com essa necessidade e sua
associação com uma compreensão crítica da modernidade (Asad, 2003). Mas ela
pode acarretar uma espécie de sobredimensionamento do que seja esse
secular. Pois se podemos concordar que o secular – assim como secularidade
e secularismo – envolvem, na sua própria definição, sempre a noção de
religião (Calhoun, Juergensmeyer e VanAntwerpen, 2011, p. 5), a recíproca
não é necessária. Ou seja, definir algo como "não religioso" não significa
que se esteja automaticamente pressupondo a noção de "secular". "Não
religioso" pode corresponder a "político", "econômico", "civil",
"associativo", "assistencial", "cultural" ou quaisquer outros domínios ou
categorias, e não me parece que possamos compreender essas várias
demarcações como formas coordenadas de desenvolvimento de algo conceituado
como secular.
Aposto que uma alternativa melhor é providenciada pelas categorias
religião, religioso e outras delas derivadas ou com elas associadas. O que
sugiro é que consideremos as ocorrências e as referências a tais categorias
como pistas mais adequadas para compreender configurações de secularismo.
Primeiro, porque as referências e ocorrências a "religião" e "religioso"
são maiores e mais disseminadas do que as relativas a "secular", garantindo
que a extensão do campo de pesquisa seja alcançada. Sustento ainda que essa
alternativa preserva a associação com o projeto de problematização da
modernidade, muito mais evidente quando se parte da noção de secular. Para
afirmar isso, apoio-me em elaborações (Asad, 1993; Masuzawa, 2005;
Dubuisson, 1998) que mostram como a categoria "religião", no sentido de um
gênero definido por doutrinas e práticas que comportam muitas espécies, é
forjada a partir de formulações e processos históricos que remetem à Europa
posterior ao século XVI. A disseminação contemporânea generalizada dessa
categoria é contemplada pelo que Beyer (2003) e Casanova (2011) designam,
respectivamente, como um sistema mundial de religiões e uma realidade
discursiva global. Portanto, a própria objetificação de algo designado como
religião é um indicador de modernidade, permitindo problematizar as
operações que projetam tal objetificação para o passado.
Proponho conceituar as formas pelas quais os Estados e sociedades
modernos lidam com o "religioso" enquanto modos de regulação. Em outras
palavras, considerando situações nas quais se constata adesão a modelos e
princípios secularistas, podemos localizar, em torno das ocorrências e
referências normativas à "religião" e ao "religioso" (e categorias
associadas), dispositivos e mecanismos variados, os quais, na sua
conjunção, propiciam uma caracterização de configurações de secularismo.
Apresso-me em observar que o conceito de regulação não está necessariamente
associado com práticas ou atitudes de domesticação, controle ou mesmo
governança da religião – posição que tende a assumir Bowen (2010). Isso
ocorre mais frequentemente do que se espera quando se parte de alguma
definição abstrata de secularismo. Mas há situações em que a regulação do
religioso opera-se indiretamente, pelas conseqüências derivadas de
normatizações em outras esferas sociais; ou em que o religioso carece de
definições explícitas e intervenções diretas; ou mesmo em que a referência
ao religioso vem atrelada ao estabelecimento de discriminações positivas,
que podem ser genéricas ou dirigidas a determinadas confissões. Outros
procedimentos a evitar são a vinculação da idéia de regulação apenas às
minorias religiosas (Richardson, 2004) ou apenas a algum período específico
da configuração de secularismo (Willaime, 2011). O propósito do conceito é
abarcar o conjunto dos mecanismos e dispositivos que atingem os vários
grupos religiosos nas suas transformações ao longo de um regime
secularista, remetendo para planos de análise que não são contemplados por
modelos e princípios – daí sua insuficiência enquanto instrumentos
heurísticos.
Deve-se, assim, distinguir essa abordagem do enfoque mais comum referido
pelo tema das relações entre Estado e religiões (Robbins e Robertson, 1987;
Huaco, 2008). Tal enfoque é geralmente dominado por tipologias que não dão
conta das variedades de alternativas que estão fora tanto de regimes de
oficialização de alguma confissão religiosa, quanto de regimes que
desenvolvem formas evidentes de controle das instituições e manifestações
religiosas. Mesmo quando pretendem dar conta de tais variedades, fazem-no
de forma a se restringir analiticamente a normas de primeira grandeza, como
é o caso das leis constitucionais. O conceito de regulação do religioso
envolve, de sua parte, uma aproximação molecular, capaz de evidenciar
dispositivos e práticas nem sempre formais, nem sempre articulados
diretamente por aparatos estatais. Também não é suficiente uma apreciação
genérica e panorâmica das configurações do campo religioso. Certamente as
transformações, de vários tipos, que atravessam esse campo são elementos
fundamentais para a compreensão dos modos de regulação religiosa. Mas é
preciso ir além: acompanhar as formas e os canais pelos quais se efetiva a
relação entre agentes religiosos, enfocados em sua especificidade
(confessional e funcional), e os espaços sociais, tais como são
historicamente constituídos em uma dada situação.


5. Breves exemplos
Com o objetivo de ilustrar a abordagem aqui proposta, trabalharei com a
situação de alguns países. Não se trata propriamente de produzir análises
sobre eles, mas de apontar os focos que ganham destaque quando se opera com
a noção de regulação do religioso. Começarei pela França, o que se
justifica pela posição que esse país adquire no debate acerca da laicidade,
como exemplo ou mesmo modelo de uma separação estrita e sistemática entre
Estado e religião e de radicalização da tendência de privatização da
religião na sociedade. Problematizar essa imagem é importante para a idéia
de laicidades comparadas. Além disso, conheço razoavelmente a situação
francesa, seja por pesquisa direta, seja pelo acompanhamento de parte da
exuberante bibliografia sobre o tema. Em seguida, comento alguns aspectos
da realidade de três países latino-americanos: Uruguai, México e Brasil.
Enquanto no caso dos dois primeiros, arrisco-me – com a ajuda de algumas
leituras – em terrenos que não domino, no caso do último procuro resumir
algumas ideias que são resultado de investimentos diretos de pesquisa, meus
e de colegas. Propositalmente, trata-se de situações diversas entre si. Se
sua aproximação for convincente, aceitando-se que ela tenha sido resultado
de uma mesma abordagem, penso que terei conseguido levar adiante as
provocações formuladas anteriormente.
Em relação à França, a idéia de que se pode caracterizá-la por um modelo
separacionista tem sido colocada em questão por diversos comentaristas
(Baubérot e Milot 2011; Willaime 2010; Portier 2010). Basta lembrar que a
lei que proíbe o uso de "signos religiosos ostensivos" nas escolas públicas
surgiu de um relatório que inclui sugestões que vão em sentido bem diverso:
a criação de uma "escola nacional de estudos islâmicos", a habilitação de
capelães muçulmanos em instituições coletivas em regime de internato, a
adequação de estabelecimentos públicos para atender exigências religiosas
em matéria de alimentação e rituais funerários, a inclusão de mais dois
feriados no calendário nacional (correspondentes a datas sagradas no
judaísmo e no islamismo). De fato, a ação do Estado francês nas últimas
décadas – período no qual se consolida a presença muçulmana – adquire
frente ao islã uma feição domesticadora, equilibrando medidas restritivas
com medidas de reconhecimento. Para os comentaristas mencionados, trata-se
de uma outra fase na laicidade francesa, caracterizada pela atenuação do
modelo separacionista por meio da adoção simultânea de outros modelos
("reconhecimento", "integração", "diálogo", "colaboração"). Vê-se aí um
exemplo de como opera a análise calcada em modelos.
Prefiro, com a ajuda de outros comentaristas (Bowen, 2007; Asad, 2006;
Jansen, 2006; Scott, 2007), pensar que essa maneira não é a mais adequada
para entender a laicidade francesa. Costuma-se associar o modelo
separacionista a uma lei de 1905, ela mesma a culminância de uma série de
medidas que durante a III República encerraram um regime de oficialização
de quatro cultos específicos. Ocorre que essa mesma "lei de separação"
criou uma figura jurídica nova no Direito francês, denominada association
cultuelle (associação de culto). Tratava-se de um tipo específico de
associação, com regras de operação mais extensas do que as das associações
genéricas, incluindo a proibição de recebimento de recursos estatais.
Embora os coletivos religiosos não tenham sido obrigados a se enquadrar
todos nessa figura jurídica, ela pode ser vista como uma das formas pelas
quais o Estado francês procurou atribuir um lugar delimitado para a
religião na sociedade. É muito interessante, ainda, que essa figura das
associações de culto tenha se tornado um dos canais pelos quais se
estabeleceram relações positivas entre Estado e religiões na França. O fato
delas exigirem regras de operação mais rigorosas, compensado com algumas
prerrogativas no campo fiscal, por exemplo, as converteu em mecanismo
valioso no momento em que o Estado francês pretendeu combater as assim
chamadas "seitas". Foi pesquisando a reação às "seitas" na França que pude
compreender uma série de dispositivos e de processos de regulação do
religioso. A luta de alguns dos grupos considerados "seitas" apontou para
os vários canais administrativos e jurídicos pelos quais passa o
reconhecimento de uma associação de culto. Essa dispersão é compensada pela
existência de um aparato estatal específico para acompanhar as medidas
dirigidas às associações de culto, denominado Bureau Central des Cultes (o
qual integra o organograma do Ministério do Interior) (Giumbelli, 2002).
Passemos ao Uruguai, país que incorpora em seu imaginário a identificação
com a laicidade, como a França, mas – e isso deveria interessar a todos os
estudiosos no tema – com resultados mais acentuados, em certos aspectos. De
fato, a partir de 1859, uma conjunção de correntes políticas efetivou,
dentro de condições propícias e face a uma estrutura eclesiástica débil,
uma série de ataques à Igreja Católica, culminando com a consagração da
separação na segunda década do século XX (Guigou, 2006; Costa, 1997). Pode-
se destacar, como ocorreu no caso francês, a escola pública como campo
privilegiado de ação, tanto pela retirada de símbolos e pela supressão de
todo ensino e prática religiosos, quanto pela transmissão de referências
substitutivas, que visavam fundar a cidadania em bases alternativas às
religiosas. Isso se reflete no calendário oficial, que troca por outras as
denominações católicas. Reflete-se ainda em outro plano, o dos
pertencimentos religiosos. Dentro da América Latina, o Uruguai desponta
como o país onde ocorre o menor índice de católicos – entre 47% e 51%, a
depender das fontes (Kan, 2011, p. 79-80); onde os assim declarados ateus e
agnósticos, cujos números são insignificantes ou mesmo deixam de ser
registrados em outros países, atingem, em vários momentos dos últimos cem
anos, entre 15% e 18% da população (Costa, 2003, p. 165).
Em suma, a laicidade uruguaia parece ter sido mais sistemática e mais
secularizante do que sua inspiradora. Isso não impediu que a Igreja
Católica mantivesse algum papel no campo associativo e educacional, nem que
reclamasse algum protagonismo político no período de redemocratização (após
1985). É preciso considerar o crescimento de outras expressões religiosas,
sobretudo outras igrejas cristãs, cujos adeptos atingem em torno de 11% da
população na primeira década do século XXI. As religiões afro também se
apresentam como uma novidade no cenário uruguaio. As ruas e praças públicas
foram transformadas em cenário onde se manifestam as presenças e disputas
do campo religioso. Em Montevidéo, instalaram-se monumentos, um referido ao
catolicismo, outro à religião afro (Caetano, s/d); por sua parte, algumas
igrejas evangélicas pentecostais ocupam com seus templos espaços
privilegiados, assim como promovem programas religiosos em meios de
comunicação de massa (Guigou, 2006) – algo sem correspondente na França.
Enquanto os monumentos de referências católicas e afros apontam para uma
transformação do imaginário de nacionalidade, a presença dos evangélicos
com seus templos e programas televisivos serve para revelar a ausência de
mecanismos voltados para sua inibição. Fica a hipótese: a laicidade
uruguaia parece ter sido forjada para desmantelar o catolicismo em suas
formas tradicionais sem ao mesmo tempo proporcionar os instrumentos para
lidar com religiões com outras características.
O México, por sua vez, apresenta situação bem diferente, embora também
seja um país no qual a laicidade tenha adquirido forte significado. Para
começar, a história das relações entre Estado e Igreja Católica em terras
mexicanas é muito mais acidentada. Depois de oscilações no período entre a
independência e o início do século XX, a Constituição de 1917 consagra um
regime hostil: não reconhecimento jurídico das igrejas, proibição de
possuírem bens, limitações ao culto fora dos templos, exclusão da política
(Blancarte, 2008b, p. 24). Em 1992, começa a vigorar outro marco normativo,
consolidado por uma lei específica. A aplicação dessa lei cabe à Direção
Geral de Associações Religiosas, aparato estatal que administra os
procedimentos para registro constitutivo das associações religiosas e
organiza os dados sobre o número de associações, ministros e associados,
além de reunir toda a legislação pertinente ao seu funcionamento. Isso
inclui questões fiscais, sobre as quais existem normas detalhadas e
circunscritas; procedimentos para autorização de manifestações fora dos
templos e de exibição de programas em meios de comunicação; e ainda
diretivas para a resolução de conflitos e penalização de responsáveis.[7]
Nota-se como a laicidade mexicana envolve mecanismos e dispositivos que
cercam preocupações que inexistem no quadro uruguaio e que parecem ter uma
aplicação mais estrita do que o correspondente francês.
Ao contrário do Uruguai e da França, o México é um país no qual a
religiosidade ocupa espaço privilegiado na sociedade. Seria interessante
que nos estendêssemos sobre essa convivência, que ocorreu na maior parte do
século XX, entre um regime severo no seu anticlericalismo – que impedia,
por exemplo, que os sacerdotes usassem a vestimenta religiosa fora dos
templos – e uma sociedade marcada por expressões religiosas, ligadas, de
formas muito diversas, ao catolicismo. Posso apenas, no entanto, chamar
atenção para um aspecto. Como em outras situações, o México apresenta,
ainda que menos acentuadamente, um quadro de diversificação religiosa (Kan,
2011; de la Torre e Zuñiga, 2007). Até 1990, quase 90% da população se
identificava como católica; atualmente, esse número está entre 78% e 83%, a
depender das fontes de dados; em alguns estados, o índice de católicos é
significativamente menor. As adesões a outras igrejas cristãs são da ordem
de 7,5% da população. Assim, o total da população cristã alcançaria entre
84% e 90%. É interessante contrastar essa estatística com aquelas
oferecidas pelo aparato estatal que registra o número de associações
religiosas: orientais (17), judaicas (10), cristãs (7645), islâmicas (2),
novas expressões (4).[8] Ou seja, as associações cristãs representam 99,6%
do universo. Isso sugere que a forma pela qual o Estado mexicano regula a
religião tem um efeito que sobredimensiona e privilegia certas expressões e
modos de organização.
O Brasil, finalmente, nos apresenta ainda outro quadro.[9] Em termos de
visibilidade e presença da religiosidade, ele se aproxima mais do México do
que de Uruguai – ressalvadas as transformações que nesse aspecto ocorrem no
último país – e França – onde a importância do islã não se traduz, por
exemplo, na ereção de espaços monumentais. Seria impossível elencar todas
as esferas em que se nota a atuação religiosa: mídia, política, assistência
social, saúde e educação, manifestações públicas, indústria cultural... Do
lado estatal, contudo, não temos nada parecido com o arranjo mexicano e
mesmo francês. Não existe um aparato com a função de acompanhar a
constituição dos coletivos religiosos, embora em certas épocas algumas
manifestações tenham sofrido com proibições e controles. Tampouco existe
uma figura jurídica consolidada que, no direito civil, corresponda
especificamente aos coletivos religiosos. Nesse aspecto, o Brasil se
assemelha ao Uruguai. Mas com a importante diferença de que, no primeiro, o
programa de laicização, também formulado a partir da segunda metade do
século XIX, foi aplicado com menos rigor. Daí notarmos, mesmo em meio a
contestações, a oficialização de datas religiosas, a proliferação de
símbolos católicos em recintos públicos e a permanência do ensino religioso
nas escolas públicas.
No Brasil, também se discutem os alcances e limites da diversidade
religiosa (Camurça, 2006; Pierucci, 2004). Estou entre aqueles que enxergam
importantes transformações no campo religioso, que se expressam, ainda que
refratadas pelas condições que interferem na declaração de pertencimento,
nas estatísticas. Além do decréscimo católico e do incremento evangélico,
que lembram o quadro de outros países latino-americanos, é significativo,
por ser talvez singular, o contingente de "espíritas" (em torno de 2%) –
sobretudo quando lembramos que ele abriga uma parte de afro-religiosos e
evidencia uma opção freqüentada por não poucos entre os que se dizem
"católicos". Isso aponta para um modo de organização da diversidade
religiosa distinto do encontrado em outros países. Há também transformações
recentes no tratamento jurídico das religiões. A Igreja Católica optou pela
negociação de um Acordo com o Estado, algo inédito na história brasileira,
cujas implicações são ainda incertas. As religiões afro-brasileiras vêm
sendo contempladas, diretamente ou não, por políticas de promoção da
igualdade racial e por ações de valorização do patrimônio cultural. E os
evangélicos conquistaram o papel de maior protagonismo no cenário recente.
Pode-se destacar a mobilização que resultou na introdução, no texto que
reformou o Código Civil (2002), da "organização religiosa" como figura
jurídica distinta das associações; e também, como resposta ao Acordo com a
Igreja Católica, a proposição, no Congresso Nacional, de um projeto que
ficou conhecido como "Lei Geral das Religiões". Enquanto acompanhamos os
resultados dessas ações, indagamos: isso reitera as características
heteróclitas da laicidade brasileira ou representa uma mudança em direção à
constituição de mecanismos e dispositivos mais específicos no campo da
regulação do religioso?


6. Um projeto possível
Os breves comentários anteriores têm menos o objetivo de apresentar
conclusões e mais a intenção de apontar pistas que indiquem possíveis
caminhos de pesquisa e discussão. França, Uruguai, México e Brasil são
países que, como outros, adotaram ao longo do século XIX e início do século
XX o princípio da separação entre Estado e religião e abraçaram, de algum
modo, os ideais de liberdade e igualdade para as religiões. Espero ter
reunido elementos suficientes para demonstrar como essa adoção – no plano
dos modelos – vem associada à constituição de mecanismos e dispositivos
variados quando se considera as formas pelas quais se planeja que o Estado
e a sociedade se relacionem com o que é historicamente definido como
religioso. Sugiro que a laicidade ou o secularismo sejam estudados como a
resultante da conjunção desses dispositivos e processos de regulação do
religioso. Entre alguns deles, pode haver coordenação e convergência; entre
outros, dispersão e divergência. É preciso então considerar, nesse
empreendimento, modelos, princípios e dispositivos. Embora os comentários
acima tenham focado em normas e aparatos estatais, a regulação do religioso
envolve sempre agentes sociais variados. Um exemplo: quando procurei
entender a questão das "seitas" na França, tive que inserir as reações
estatais em um circuito que articula iniciativas civis – como o são as
associações anti-seitas – e abordagens midiáticas – que convertem a
categoria "seita" em algo amplamente compartilhado em seus sentidos
negativos.
Não é o momento para se traçar um plano sistemático que vise apontar os
focos de uma pesquisa baseada na idéia de regulação do religioso. Mas penso
que se poderia aproveitar a oportunidade – e o que vimos sobre quatro
países – para tentar um esboço. Surgem então como pertinentes a reunião de
dados e a elaboração de análises sobre os seguintes pontos:
a) Regime jurídico dos coletivos religiosos (constituição de
personalidade jurídica e capacidades civis) e aparatos estatais nele
envolvidos, compreendendo questões no domínio fiscal e normas
referidas a setores como educação, saúde, assistência social,
patrimônio histórico e políticas culturais, política partidária, meios
de comunicação de massa.
b) Presença das religiões em espaços públicos, desde logradouros até
recintos estatais, passando por instituições de diversos tipos; aqui
adquire importância o acompanhamento da existência de "símbolos
religiosos", de seu uso, apropriação e circulação, dos embates a seu
propósito.
c) Formas de configuração e concepção da diversidade religiosa, que
envolvem tanto os modos de comportamento das forças religiosas, quanto
os instrumentos e resultantes de sua representação (incluindo
estatísticas, oficiais ou não).
Merece ainda menção um ponto. Em vários países latino-americanos, a
questão da laicidade vem sendo levantada a propósito de temas que envolvem
a legitimação de novos campos de experimentação científica (como as
pesquisas utilizando as chamadas "células-tronco") e reivindicações
atreladas aos assim denominados "direitos sexuais e reprodutivos"
(capacidades civis de pessoas em arranjos homossexuais, reconsideração da
criminalização do aborto, enfrentamento da homofobia, etc). Lideranças e
representantes religiosos assumem frequentemente posições conservadoras.
Considerando-se a abordagem aqui proposta, uma feição se destaca. Os atores
religiosos muitas vezes procuram mobilizar argumentos que negam ser
religiosos, enquanto seus opositores esforçam-se por mostrar as forças
religiosas que explicam a ausência ou leniência dos avanços (Luna, 2010;
Ranquetat, 2010). Por essa razão, penso que tais embates devem merecer um
tratamento específico visando a compreensão dos argumentos em jogo e da sua
resultante jurídica e social. Isso, com certeza, não impede que sejam
considerados como parte dos conflitos e controvérsias que caracterizam a
participação de agentes sociais variados nas configurações de laicidade /
secularismo.
Evidentemente, o programa aqui esboçado não se pretende inaugural. Se
aponta para temas e focos de pesquisas ainda por fazer, também reconhece
que é preciso reunir e sistematizar os trabalhos já realizados – parte
deles presente nas referências bibliográficas deste texto. A discordância
em relação a marcos e abordagens analíticos não constitui qualquer
obstáculo para colaborações empíricas e debates construtivos baseados em
interesses comuns. O mais importante, creio eu, é conseguirmos consolidar
laicidade e secularismo como objetos centrais para a compreensão das
configurações e dinâmicas que envolvem a religião. Enunciar isso a partir
da América Latina não é sem conseqüências. Pois se trata de ao mesmo tempo
conquistar lugar – como objeto – dentro de empreendimentos comparativos que
são virtualmente globais, e de afirmar – enquanto sujeito – a construção de
uma perspectiva que se pretende também geral. Penso que tais apostas são
apontamentos para um projeto possível, capaz de produzir não apenas mais
conhecimento, mas também de levantar pistas para refletirmos e intervirmos
sobre os destinos de nossas vidas. Laicidade e secularismo possuem
inerentemente essa condição, que podemos chamar de política – e nisso
parece que todos entramos em acordo.


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Reconnaissance et de Dialogue", Montreal, Actes du Symposium
International sur L'interculturalisme. www.symposium-
interculturalisme.com, acesso em 05.02.2012.



Resumo
O objetivo deste texto é estabelecer uma posição tendo em consideração
debates acerca dos temas da laicidade e do secularismo, aqui tomados como
equivalentes. Trata-se de temas que vêm recebendo um investimento
significativo em período recente e o texto se constrói por meio de
comentários sobre parte dessa bibliografia. A relação entre os conceitos de
secularismo e secularização é parte dessa construção. O texto prossegue
tentando apontar os níveis que compõem a análise do tema e sugere uma
estratégia para a caracterização do que denomino configurações de
secularismo, estratégia que depende da noção de regulação do religioso. Ao
final, os procedimentos defendidos são ilustrados pela abordagem da
laicidade francesa e alguns aspectos da laicidade em três países latino-
americanos. A pretensão maior dessas elaborações é estabelecer bases para
um empreendimento comparativo da laicidade na América Latina.
Palavras-chave: laicidade, regulação do religioso, espaço publico,
modernidade

To research secularism, search the religious
Abstract
The aim of this paper is to establish a position in view of debates around
issues of laicidad and secularism, here taken as equivalent. These are
topics that have received significant investment in recent years and the
text is constructed by commenting on some of this literature. The
relationship between the concepts of secularism and secularization is part
of this construction. The text continues trying to point out the levels
comprised in the analysis of the subject and suggests a strategy for the
characterization of what I call configurations of secularism, a strategy
that depends on the notion of religious regulation. At the end, the
procedures are illustrated by the analysis of French laïcité and of some
aspects of secularism in three Latin American countries. The largest claim
of these elaborations is laying a foundation for an enterprise of
comparative research of secularism in Latin America.
Keywords: secularism, religious regulation, public space, modernity


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[1] Versão modificada e estendida de texto apresentado na mesa-redonda
"Laicidades Comparadas", XVI Jornadas sobre Alternativas Religiosas na
América Latina, Punta Del Este, 2011. Uma versão anterior foi discutida em
sessão do Núcleo de Estudos da Religião, a cujos participantes agradeço os
comentários. Agradeço também aos alunos da disciplina "Símbolos, rituais e
ideologias" (Religião e Espaço Público), oferecida no segundo semestre de
2011 no Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da UFRGS, na qual
ideias aqui desenvolvidas puderam ser discutidas.
[2] Professor do Departamento de Antropologia e do Programa de Pós-
Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal do Rio Grande do
Sul, pesquisador do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico, Brasil).
[3] Devemos ainda incluir, notando sua menor amplitude em relação aos
demais títulos, a coletânea organizada por Lorea (2008a), com predomínio de
autores brasileiros, e o número temático organizado por Mariano (2011), com
autores franceses e latinoamericanos. Chamo ainda atenção para os trabalhos
de Oro (2008; Oro e Ureta, 2007), antropólogo que se debateu mais
diretamente com o tema.
[4] Cito como exemplo de referência digital, que articula e divulga
pesquisas e eventos, o blog "The Immanent Frame", criado em 2007 como um
projeto do Social Science Research Council, instituição sediada em Nova
York que mantém atualmente um programa sobre "Religião e a Esfera Pública".
Ver: http://www.ssrc.org/programs/the-immanent-frame-blog/, acesso em
16.01.2012.
[5] Agradeço a Alejandro Frigerio por ter levantado esse ponto no debate
durante a mesa "Laicidades Comparadas", referindo-se a dois entendimentos:
na laicidade, a separação entre esfera pública e religião é proposta pelo
Estado; no secularismo, a mesma separação desponta como exigência da
sociedade civil.
[6] Apresentação na Mesa "Laicidades Comparadas" e divulgação em
http://www.pagina12.com.ar/diario/elpais/1-185463-2012-01-14.html, acesso
em 27.01.2012. Os trabalhos de Esquivel (por exemplo, 2008) são
incontornáveis para a compreensão da atuação social e política da Igreja
Católica, incluindo as relações recíprocas com o Estado.
[7] Essa descrição está baseada na consulta ao site da Direção Geral de
Associações Religiosas, órgão subordinado à Secretaria de Governo da
Administração Pública Federal;
http://www.asociacionesreligiosas.gob.mx/es/AsociacionesReligiosas/, acesso
em 20.01.2012.
[8]
http://www.asociacionesreligiosas.gob.mx/es/AsociacionesReligiosas/Numeralia
, acesso em 20.01.2012.
[9] Evidentemente, são muitos os trabalhos que ajudam a compor tal
quadro. Para evitar uma enumeração longa, restrinjo-me à indicação de dois
de meus textos (Giumbelli, 2008, 2011), remetendo o leitor às demais
referências que constam de sua bibliografia.
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