Parecer do Conselho Editorial - Revista Brasileira de História (14/07/2014)

Share Embed


Descrição do Produto

Rio de Janeiro, 14 de julho de 2014

A José Eudes A. B. Gomes

Cc: Thaís Nívea de Lima e Fonseca

Em razão da denúncia de plágio apresentada por V. S. contra Thaís Nívea de
Lima e Fonseca, o Conselho Editorial da Revista Brasileira de História
constituiu, ao final de maio de 2014, uma comissão composta por cinco dos
seus integrantes, a fim de examinar a documentação e as informações
apresentadas pelas partes. Cabe ressaltar que diversos conselheiros que
mantém ou já mantiveram qualquer tipo de relação pessoal ou profissional
com as partes envolvidas declaram-se impedidos de integrar a comissão.

Após analisar os dados relativos ao processo de submissão do artigo de
Thaís Fonseca e as alegações apresentadas por José Eudes Gomes, a comissão
produziu o seguinte parecer:

"Parecer da Comissão:

1. Informações relativas ao processo de submissão do artigo em questão:
Ao contrário do que foi publicado na Revista Brasileira de História
66, a data correta de submissão do artigo de Thaís Fonseca é
28 de fevereiro de 2013, não 13 de agosto de 2013. Lamentamos
profundamente esse conflito de informação, que se deve a um problema
de comunicação durante a mudança na gestão da revista. Em julho de
2014, pouco depois de o atual editor ter assumido a função na Revista,
este solicitou à assistente editorial um levantamento de pendências, e
a data de conclusão deste levantamento (13 de agosto de 2013) foi
registrada equivocadamente com data de submissão do artigo. A data
correta somente pode ser verificada a partir do exame de mensagens
antigas arquivadas em um computador utilizado pela assistente
editorial (que não trabalha mais na ANPUH), após o mesmo ser remetido
por Sedex para o Rio de Janeiro, onde reside o atual editor.
Registramos aqui a informação correta por considerá-la relevante ao
esclarecimento dos fatos, já que o autor da denúncia alega que teria
havido uma apropriação indevida do seu trabalho durante o processo de
organização de um Simpósio Temático ocorrido em julho de 2013 no
âmbito do XXVII Simpósio Nacional de História. Como o prazo de
inscrição e envio da primeira versão dos textos das comunicações para
os Simpósios Temáticos estendeu-se 01º de janeiro a 31 de março de
2013, não nos é possível afirmar se a data de submissão do artigo de
Thaís Nívea de Lima e Fonseca à Revista Brasileira de História é
anterior ou posterior ao envio do texto de José Eudes Gomes à
coordenação do Simpósio Temático. Consideramos, entretanto, ser nosso
dever registrar e assumir a responsabilidade pelo erro, e entendemos
que o acesso à informação correta é do interesse de ambas as partes.
Talvez, ao confrontar essa informação com os seus registros pessoais
sobre o processo de organização do Simpósio Temático, as partes possam
chegar a resultados mais conclusivos no que diz respeito a verificar
se Thaís Nívea de Lima e Fonseca teve de fato acesso ao texto da
comunicação de José Eudes Gomes antes de apresentar seu artigo à
Revista Brasileira de História. Considerando, portanto, que os dados
sobre o processo de submissão não são conclusivos, partimos para a
análise do teor das acusações no que diz respeito às alegadas
semelhanças entre os dois trabalhos.

2. José Eudes Gomes alega que a autora do artigo em questão apropriou-se
de sua produção intelectual, sem referenciar seu texto. Para sustentar
tal alegação, argumenta que houve, por parte de Thais Fonseca "a
transcrição de numerosos trechos" e a "apropriação indevida de
objetivos, hipóteses, ideias, análises e de todas as principais
conclusões defendidas no [seu] trabalho" (conforme documento Denúncia
de Plágio, p. 2). Como evidência das transcrições e da apropriação que
identificou, José Eudes Gomes compara fragmentos dos dois textos,
destacando as semelhanças existentes entre eles. Tais semelhanças,
entretanto, não configuram plágio e, no nosso entendimento, ocorrem
por que:

- Ambos os autores empregaram palavras e frases que são comuns
em determinados procedimentos de construção textual, como a
apresentação de objetivos e das abordagens realizadas. É o caso
dos termos "explorando"; "explorar"; "discutir"; "reconstituir"-
"recompor", destacados por José Eudes Gomes no item 1 do rol de
comparações que apresenta. O mesmo ocorre com o emprego de
expressões como "ações conhecidas como reformas pombalinas da
educação" (item 4), absolutamente correntes em escritos sobre o
tema (o programa de busca Google mostrou aproximadamente 37.200
resultados para os termos indicados). Ambos os autores
escreveram textos desenvolvendo problemática correlata: o papel
das Câmaras na administração do ensino régio na América
Portuguesa. É compreensível que haja semelhança na maneira de
anunciar os objetivos do texto. É importante considerar que a
Thaís Fonseca estuda a temática nesta perspectiva desde, pelo
menos, 2010, quando publicou O ensino régio na Capitania de
Minas Gerais (Belo Horizonte: Autêntica, 2010. v. 1. 106p).

- Outras semelhanças decorrem do emprego de termos coevos e/ou
empregados nas fontes. Cumpre assinalar que uma das várias
fontes utilizadas pela Profª. Thais Fonseca na construção do seu
argumento é utilizada também por José Eudes Gomes em seu texto.
A fonte é de fácil acesso, disponível na rede mundial de
computadores (Arquivo Histórico Ultramarino. AHU-ACL-N-Ceara,
n. 657. Disponível em: www.cmd.unb.br. ) e a ela os dois
pesquisadores tiveram acesso. Tendo desenvolvido seus textos a
partir de problemática correlata, os autores convergiram na
identificação das possibilidades apresentadas pelas fontes. Cabe
assinalar que Thais Fonseca apresenta uma gama maior de
possibilidades interpretativas e utiliza de um corpus documental
bem mais amplo que o explorado por José Eudes Gomes em seu
texto. (itens 3, 5 e 6))

- Decorrem da interpretação e/ou citação (literal ou não) da
fonte que utilizaram (itens 8, 11, 12, 13, 14, 15 e, 17, 18, 19,
20, 21 e 22). Embora haja convergência da análise, Thais Fonseca
teve acesso à fonte e é absolutamente legítima a utilização que
dela fez em seu artigo.


3. Sobre os procedimentos utilizados por José Eudes Gomes para confrontar
os dois escritos, temos ainda algumas considerações a fazer.

- Em relação ao item 7, observamos que, apesar de os fragmentos
apresentados por José Eudes Gomes sugerirem uma semelhança na
avaliação realizada pelos dois autores sobre as possibilidades
das fontes às quais se referem, cada um deles remete a aspectos
distintos e apresenta percepção diversa em relação a elas. José
Eudes Gomes está se referindo às fontes relativas à "província
do Ceará Grande" (contexto espacial que analisa em seu escrito)
e sobre elas diz que são "exíguas". Thaís Fonseca, sem a
limitação espacial definida por Gomes, está registrando que a
documentação é mais farta do que se julgou até então e que
apresentam muitas possibilidades analíticas, se tratada em
perspectiva renovada. Uma confrontação dos períodos completos
mostra as diferenças entre os textos. Registra José Eudes Gomes:
"Bastante intrigantes, tais denúncias mostram-se particularmente
interessantes em virtude da exiguidade de fontes relativas à
instrução pública na capitania do Ceará Grande (p. 1)". Registra
Thais Fonseca: "O investimento mais cuidadoso na documentação,
nos dois lados do Atlântico, vem demonstrando que, não só ela é
mais farta do que se julgava – considerando-se outras
perspectivas analíticas fora dos tradicionais limites da
história político-administrativa – como também permite adentrar
as experiências individuais e coletivas dos sujeitos que foram
direta ou indiretamente afetados pelas reformas em seus
cotidianos" (p. 230). A própria autora, como indica em nota de
seu artigo, já havia observado estas possibilidades empíricas em
escritos anteriores: Letras, ofícios e bons costumes:
civilidade, ordem e sociabilidades na América portuguesa. Belo
Horizonte: Autêntica, 2009; O ensino régio na Capitania de Minas
Gerais. Belo Horizonte: Autêntica, 2010.

- Além de não evidenciar plágio, a comparação realizada por
Gomes é absolutamente imprópria, pois, ao transcrever os textos,
os fragmenta, alterando-os significativamente e forjando uma
semelhança que não existe de fato entre eles.

4. As mesmas considerações sobre a impropriedade de transcrições
fragmentadas fazemos em relação ao item 9 do rol de comparações feitas
por José Eudes. Gomes. Também aqui, ao destacar dos textos termos
semelhantes, Gomes forja igualdade que não se configura de fato. Os
termos "(...) ainda pouco explorados pela historiografia" (que Gomes
fragmenta a partir de seu próprio texto) e "ainda não
satisfatoriamente estudado pela historiografia" (que Gomes fragmenta a
partir do texto de Fonseca) estão inseridos em comentários
absolutamente distintos. Fonseca, ao se referir à incipiência da
historiografia da educação, remete-se à pouca atenção que esta deu ao
poder que as Câmaras na América e seus oficiais adquiriram ao mediar
as relações entre os professores régios e o Estado português (p. 243
do artigo publicado). Gomes, em seu texto, considera que "pouco
explorados pela historiografia" foram "o investimento na
escolarização" feito por homens pobres livres e o significado que pode
ter adquirido, qual seja, o de ter sido "um importante instrumento de
mobilidade social" (p. 9 do manuscrito de Gomes). Cada um dos autores
está se referindo, portanto, a aspectos distintos da produção
historiográfica.



5. Também no item 10 ocorrem procedimentos inadequados de comparação. O
fragmento que José Eudes A. B. Gomes destaca de seu texto e os que
destaca do artigo de Thaís Fonseca expressam conclusões sobre
aspectos diversos das práticas instrucionais do contexto abordado.
Basta tomá-los em sua integridade para verificar a distinção entre
ambos. Gomes, na passagem destacada, está se referindo à atuação das
populações locais, que, por pagarem o imposto (subsídio literário),
reivindicavam aulas e escolas régias e que demandavam professores para
as mesmas escolas; diz, portanto, da relação de dependência entre os
professores régios e as populações locais. Fonseca, no fragmento
destacado, refere-se à atuação da Coroa, que, além de responder às
demandas das populações locais, procurava controlar a atuação dos
professores régios; portanto, a autora em seu artigo indica que a
Coroa procurava restringir a interferência das populações locais,
apontada por Gomes.

6. Neste mesmo item das comparações, Gomes acusa a Profª Thais Fonseca de
não referenciar, no trecho destacado, a produção de Luiz Eduardo
Menezes de Oliveira, que ele agrega à análise que faz em seu texto.
Entretanto, depois de fazer considerações sobre a atuação das
populações locais em relação às práticas de instrução, retomando um
escrito de Oliveira, Gomes reforça seu argumento retomando a produção
de Fonseca (Letras, ofícios e bons costumes: civilidade, ordem e
sociabilidades na América portuguesa. Belo Horizonte: Autêntica,
2009), anterior à do autor por ele mencionado (OLIVEIRA, Luiz Eduardo
(org.). A legislação pombalina sobre o ensino de línguas: suas
implicações na educação brasileira (1757-1827). Maceió: Edufal, 2010).



Tendo em vista as considerações apresentadas,

CONSIDERAMOS IMPROCEDENTE a denúncia de plágio apresentada por José Eudes
Gomes."

Considerando o parecer elaborado pela comissão, entendemos que não procede
a alegação de violação da cláusula de originalidade da produção intelectual
por parte de Thaís Nívea de Lima e Fonseca, razão pela qual a Revista
Brasileira de História manterá o mesmo publicado na sua edição 66,
disponível online via SCIELO e no website da ANPUH.

Alexandre Fortes, editor da Revista Brasileira de História.
Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.