Participação política no Brasil

July 10, 2017 | Autor: R. de Melo Florêncio | Categoria: Política Social, Brasil, Participação Política
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Participação política no Brasil

Ana Raphaela de M. Florêncio José Laudemiro Rodrigues da Costa Filho

A participação política é um tema muito falado nos últimos tempos, e para alavancar de vez essa questão um decreto foi aprovado pela presidência do Brasil, o decreto nº 8243/14 institui a Política Nacional de Participação Social (PNPS). O PNPS tem o objetivo de fortalecer e articular os mecanismos e as instancias democráticas de diálogo e a atuação conjunta entre a administração pública federal e a sociedade civil (Decreto 8243/2014 – art.1º). Para o monitoramento, formulação, execução e avaliação dos programas e políticas públicas, os 10 públicos possíveis são: sociedade civil, conselho de políticas públicas, conferência nacional, ouvidoria pública federal, mesa de diálogo, fórum interconselhos, audiências públicas, consultas públicas e ambiente virtual de participação social. O PNPS reconhece a participação social como um direito do cidadão e expressão da sua autonomia de modo direto. O decreto dará voz a todos os grupos minoritários, o respeito, solidariedade e cooperação às diversidades étnicas, raciais, culturais, de geração, origem, sexo, orientação sexual, religião, condição social, econômica ou de deficiência; essas vozes quando ouvidas constroem valores de cidadania e inclusão social. O acesso à informação também é uma plataforma de inclusão social, pois além da participação é necessário que seja uma participação qualitativa, ou seja, as informações de transparência pública tem que ser feita numa linguagem simples e objetiva, que seja entendida pelo público alvo. De acordo com Giacomo Sani (1909), o termo participação política é usado para designar uma variada série de atividades:

O ato do voto, a militância num partido político, a participação em manifestações, a contribuição para certa agremiação política, a discussão de acontecimentos políticos, a participação num comício ou numa reunião de seção, o apoio a um determinado candidato no decorrer da campanha eleitoral, a pressão exercida sobre um dirigente político, a difusão de informações políticas e por aí além (BOBBIO, MATTEUCCI e PASQUINO apud SANI, 1909, p. 898).

Bonifácio (2012) conclui que participação política pode ser entendida como “tomar parte de alguma atividade de natureza conflitiva e que envolva interações estratégicas”. Bonifácio (2012) cita que algumas das principais obras de ciências políticas seguem esse mesmo ramo de estudo, diferenciando apenas os tipo de atividades participativas e os objetivos vinculados às atividades. Como exemplo, Bonifácio (2012) cita Milbrath que considera como atividade participativa aquelas que envolvem processos e decisões eleitorais, afirma ainda que a tendência é que aqueles que se engajam em algum tipo de atividade participativa tendem a se engajar em outras, tomando assim um caráter unidimensional e cumulativo às atividades participativas. Enquanto Verba, Scholzman e Brady (2012) concordam que participação política é o canal por onde os cidadãos informam aos governos seus interesses e preferências, desse modo pressionam os governos a atenderem as demandas sociais. As atividades extrapolam as atividades citadas por Milbrath, que são atividades eleitorais, os autores se baseiam nas atuações de grupos de interesse dos Estados Unidos da América. A tese levantada é que a participação é desigual, com a efetividade das atividades sendo mais comum àqueles com maior poderio econômico (BONIFÁCIO, 2012, p.3-4). Huntington e Nelson (2012) por sua vez incorporam um elemento finalista das atividades relacionadas à participação política. Para eles a participação política é uma atividade realizada por cidadãos e com o objetivo de influenciar no processo de decisão do governo. Huntington e Nelson consideram várias atividades como de natureza participativa, mas, além disso, eles enfocam que o objetivo deve ser o de influenciar as decisões governamentais. Booth e Seligson partem da ideia que os estudos feitos sobre a participação política pelos cientistas sociais focam amplamente nas elites e violência. E o resultado desses estudos é uma imagem parcial e limitada das faces das atividades políticas dos cidadãos. Esses dois autores focam na participação política na América Latina e oferecem uma definição mais abrangente sobre participação política. Para eles participação política é um comportamento que influencia o sistema político, seja em âmbito nacional, regional ou local. Ao fim Booth e Seligson incluem comunicações sobre a política, problemas sociais e trabalho coletivo para resolver problemas não tratados pelos governos como atividades de participação política, o que vai além das atividades das elites (partidos, sindicatos), eleições e violência (golpes militares e revoluções)

citadas

pelas

(BONIFÁCIO, 2012, p.4-5).

análises

dos

autores

anteriormente

mencionadas

Sani (1909) fala de três formas ou níveis de participação política, a primeira ele menciona com o termo presença, que é a forma menos intensa e mais distante de participação política, essa forma se trata de comportamentos passivos, situações em que o indivíduo não contribui de modo pessoal. A segunda forma é designada pelo termo ativação, que é quando o sujeito desenvolve, dentro ou fora de uma organização política atividades que lhe foram confiadas por delegação permanente, ou que o próprio sujeito promove. A terceira forma é chamada de participação que é a contribuição direta ou indireta do indivíduo para uma decisão política. Na maioria das vezes a contribuição é indireta e se expressa na escolha do pessoal dirigente, que delegada por um determinado período de tempo analisa as alternativas e toma decisões que vinculem toda a sociedade. Para Sani (1909) a participação política só se pode dar em um número bastante reduzido de pessoas em sistemas políticos ou organismos que não tem caráter competitivo e que utilizam mecanismos eleitorais para diversos fins (BOBBIO, MATTEUCCI e PASQUINO apud SANI, 1909, p. 898-899). As diferentes definições de participação política refletem os díspares contextos sociais históricos e culturais que os autores viviam quando fizeram suas análises. A participação política de um povo varia de sociedade para sociedade, ela depende dos diferentes contextos institucionais, de mudanças populacionais e da cultura política. Uma cultura política pode determinar uma maior e melhor estrutura e demanda por participação política. No livro Poliarquia, Dahl demonstra o crescimento de sistemas democráticos no mundo, porém cada sistema adota diferentes elementos institucionais, como diferentes canais de participação política, diferentes formas de estimular a participação política ao cidadão. Kligemann e Fuchs analisam a evolução da participação dos cidadãos a partir desses elementos e concluem que o aumento da participação política é diretamente ligado à cultura política e as instituições de uma nação (CASTRO e REIS, 2012, p.21-22). Fazendo uma análise dos estudos e pesquisas feitos sobre a participação política no Brasil, se conclui que a partir do período de 2005 – primeiro governo Lula - o Brasil se encontra num momento de maior consolidação política e amadurecimento democrático, neste período também se constata a ampliação dos direitos dos cidadãos e aumento da participação política. Esta ampliação que é garantida na constituição

não

se deu apenas através do voto direto, mas também através de formas diretas formais, como mecanismos constitucionais de democracia direta: plebiscito, referendo e ação popular. Esse maior interesse dos cidadãos em maior participação política, além de a

cultura política ter evoluído resultou em diferentes aspectos da política brasileira, como o aumento da evolução do pertencimento e participação em instituições, por exemplo, maior interesse da instituição religiosa e étnica. O decreto é uma forma de validar as vozes dessas diferentes instituições no cenário político brasileiro (CASTRO e REIS, 2012, p. 23-25). Os fiéis defensores da política de participação democrática nos processos legislativos, que se enquadram nas teorias de Boa Ventura Santos, esses sustentam que o verdadeiro sentido da democracia foi encolhido apenas para a escolha de seu representante via processo eleitoral. Segundo Paulo Bonavides, o Brasil encontra-se em um processo de discordância com a atual democracia representativa dos governos, onde a sociedade civil tem uma pequena participação no processo criação e revisão de leis (BONAVIDES, 2005).

A presença direta do povo governante permanece, portanto, rudimentar, inferior, indefinida, mal delineada, pouco desenvolvida, um tanto programática, atropelada e subtraída em sua eficácia; por conseguinte, reflexo de uma realidade que melhor guardara o espírito da Constituição se porventura concretizasse com mais energia a força participativa do povo, qual flui pura e límpida do parágrafo único do art. 1º da Constituição (idem).

Tal necessidade de uma maior participação da sociedade civil na democracia está atrelada a criação do Decreto nº 8243/2014, intituindo assim a Política Nacional de Participação Social. Ainda, umas das principais críticas sobre o decreto não se baseia no fato do governo autorizar ou não uma política de participação em suas decisões, e sim de que há uma relação de complementação entre o procedimento e a participação civil, e de que quais grupos sociais deveriam fazer parte dessa política (PEREIRA, CARVALHO, 2008, p.53). Segundo Santos e Avritzer (2003), são dois os elementos que devem ser discutidos para pensarmos um modelo democrático participativo: o procedimentalismo e o papel dos movimentos societários na institucionalização da diversidade cultural (PEREIRA, CARVALHO, 2008, p.53-54).

Em seu segundo artigo, o Decreto nº8243/2014 considera sociedade civil como “cidadãos, coletivos, movimentos sociais, institucionalizados ou não institucionalizados, suas redes e organizações”. Ainda, Pereira e Carvalho reforçam o termo de equilibrio entre autorização do governo e a definição de democracia, com isso, discorre sobre a diversidade cultural entre os grupos que irá refletir nas opiniões a serem colocadas em pautas nesse processo participativo, ampliando assim o espaço político para a institucionalização das próprias diferenças entre os grupos participativos, assim, segundo os autores, a partir da inserção dessas novas demandas de pensamentos, haveria uma nova definição da cidadania, que por fim iria inserir na participação política os grupos que por motivos quaisquer eram excluidos do sistema político. Tendo como exemplo o novo modelo de democracia que se dá à novas experiências participativas e assim, a nova definição do termo democratização. Ou seja, é através da política de participação que se dá a entrada de grupos que anteriomente não tinham voz no sistema político (PEREIRA, CARVALHO, 2008, p.53). Ainda, o objetivo teórico dos autores Dagnino (2002) e Dagnino, Olvera e Panfi chi (2006) é enfatizar a discussão sobre a contrução de três instrumentos que devem, por obrigatoriedade, serem analisados, são eles: a concepção de hetorogeneidade da socidade civil, o conceito de projetos políticos, e as trajetórias históricas da sociedade civil e política (PEREIRA, CARVALHO, 2008, p.54). Dentre os três instrumentos citados, a relevância dos projetos políticos é de vital importância – por ser uma ação direta - tanto para a definição dos grupos legitimados quanto para a concretização desses grupos, uma vez que as características dos projetos políticos espelham além da heterogeneidde entre os grupos, os trajetos percorridos por eles até essa participação democrática. Ainda que a vontade legitimada dos cidadãos vincula-se ao direito e à democracia, transformando-os não apenas em espectadores das questões jurídicas e políticas, e sim passar a fazer parte do espaço de integração social (HAMEL, 2009).

(...) segundo Habermas é “uma vontade legítima, que resulta de uma autolegislação presumivelmente racional de cidadãos politicamente autônomos” (2003, v. I, p. 54). Habermas vê o processo legislativo como meio de integração social, pelo fato de que é dado espaço a todos os cidadãos – mulheres, negros, minorias raciais, trabalhadores – para que, através dos direitos de comunicação e participação

política, tornem-se politicamente autônomos, podendo então discutir, na esfera pública, os seus problemas e as suas necessidades(idem).

Por fim, Boaventura de Sousa Santos descreve três teses para robustecer as políticas da democracia participativa. A primeira seria com o objetivo de fortalecer a diversidade da democracia, implicando em reconhecer que não há motivos nem razões para a democracia assumir uma só forma, uma forma geral. Pelo contrário, a diversidade de culturas e experiências moldam o sentido da deliberação pública ampliada e participação densa da sociedade civil. Ainda, como elemento de fundamental importância considera-se, o aprofundamento dos fatos sociais nos quais o sistema político deixa de lado as decisões que cunho normal para sentenciar em favor das instâncias de participação. A segunda tese aplica-se no Fortalecimento da Articulação contra-hegemônica entre o local e o global, pois as novas experiências democráticas precisam do apoio fundamental de atores democráticos nos quais a democracia é considerada fraca, ao mesmo tempo onde esperiências bem sucedidadas podem mostrar alternativas ao modelo hegemônico, assim, a passagem do âmbio localpara o âmbio mundial é de fundamental importanciapara fortalecer os ideais políticos e sociais de uma democracia participativa. Por fim, a ampliação do experimentalismo democrático, percebe-se que as experiencias bem sucedidas originaram-se de gramáticas sociais novas que abacaram o formato da participação de forma experimental, assim, e que esse fator é necessário para a formação e a aceitação de uma cultura pluraliada e destribuida de forma que a democracia participativa possa se multiplicar, mesmo que em forma experimental, em todas as direções (SANTOS, 2002, p.77-78). Conclui-se então que as três teses propostas por Boaventura a fim de fortalecer as futuras bases da democracia participativa tornam-se mais viáveis com a aprovação do Decreto 8.243/2014, fazendo com que os grupos e minorias possam compartilhar de um mesmo valor e mesma voz no que abrange o processo legislativo e político. Ainda, torna-se de fundamental importância a presença de distintas culturas, abrindo-se assim um grande leque de opiniões em um mesmo lugar, que derivam de fatores culturais e históricos. Ainda, no que diz respeito aos grupos sociais, o decreto afirma qua sção englobados até os não institucionalizados assim, a minoria que anteriormente não tinha voz será beneficiada com representantes nesses casos. As variadas vozes e demandas influenciarão as decisões do governo, os governantes por sua vez decidirão por aquilo

que serja de maior serventia para a população em geral, que por fim beneficiará até as minorias. Aquilo que Barber (1984) chama de violação dos próprios valores da democria é visto por Young (2006) como uma oportunidade de representação dos indivíduos e grupos na vida pública.

REFERÊNCIAS

BOBBIO, Norberto; MATEUCCI, Nicola e PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política. Vol.II. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1909.

BONAVIDES,

Paulo.

Palestra

transcrita.

Disponível

em:

. Acesso em: 26 de jul. de 2014.

BONIFÁCIO, Robert. A participação política no Brasil. Em Debate. Belo Horizonte, v.4, n.6, p. 34-45, 2012.

CASTRO, H. C. de O. de e REIS, F. T. Participação política no Brasil no século XXI: mudança e continuidades. Revista de Ciência Política: teoria e pesquisa. Brasília, v. 21, n. 2, p. 20-33, jul/dez. 2012.

CARVALHO, Ernani; PEREIRA, Marcus Abílio. Boaventura de Sousa Santos: por uma nova gramática do político e do social. Revista Lua Nova. São Paulo, v. 73, p. 45-58, 2008.

HAMEL, Márcio Renan. Movimentos sociais e democracia participativa. Disponível em: < http://www.espacoacademico.com.br/095/95hamel.html>. Acesso em: 27 de jul. 2014. YOUNG, Isis Marion. Representação Política, Identidade e Minorias. Revista Lua Nova. São Paulo, v. 67, p. 139-190, 2006.

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