Passagem para o virtual

June 14, 2017 | Autor: Paulo Oliveira | Categoria: E-learning, Teaching of Foreign Languages, Teaching German As a Foreign Language
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OLIVEIRA, P.; WUCHERPFENIG, N. Passagem para o virtual: as novas mídias. In: Ruth Bohunovsky. (Org.). Ensinar alemão no Brasil: contextos e conteúdos. 1ed.Curitiba: Editora da Universidade Federal do Paraná, 2011, v. , p. 99-121.

Passagem para o virtual Paulo OLIVEIRA Norma WUCHERPFENNIG (CEL/Unicamp)1

Introdução Na transição dos anos 1980 para 1990, quando ter acesso a um computador ainda não era uma obviedade e a internet apenas começava a se popularizar, fazia sentido perguntar se o virtual teria algum papel a desempenhar no ensino de línguas. Afinal, o computador era um item restrito a determinadas camadas da população e a própria infraestrutura de apoio à internet não permitia grandes voos: linhas precárias com baixa velocidade de conexão, programas não intuitivos que demandavam a aprendizagem de uma série de comandos específicos, variando muito de um aplicativo ao outro, necessidade de conhecimento de programação por parte dos desenvolvedores etc. Hoje, o cenário é outro. A tecnologia do virtual está absolutamente integrada ao cotidiano das pessoas, onde quer que haja energia elétrica e sistemas de comunicação operantes, compondo desde o mais simples eletrodoméstico (algumas exceções à parte) até os onipresentes telefones celulares. O preço dos computadores abaixou sensivelmente e a perspectiva é de que, em breve, até mesmo as camadas menos privilegiadas da população tenham acesso a conexão de banda larga de modo menos restrito, seja em casa ou através da rede pública de educação. Em último caso, restam as lan houses que ainda são o ponto de acesso do pobre à virtualidade.2 Para as novas gerações, trabalhar no espaço virtual, usando comunicadores instantâneos, criando e mantendo blogs e páginas pessoais em redes de relacionamento, como o Orkut e o Facebook, é uma obviedade. Tudo isso é feito de modo intuitivo, havendo grande semelhança no funcionamento dos diferentes aplicativos e das ferramentas que eles disponibilizam. Em tese, não deveria haver maiores dificuldades para os professores de língua fazerem uso de recursos semelhantes na sua rotina profissional – devendo para isso primeiramente superar a resistência ao novo e à aparente dificuldade dos ambientes tecnológicos. 1

O presente trabalho insere-se na interface da atuação docente no Centro de Ensino de Línguas da Unicamp com a pesquisa realizada pelo Grupo de Trabalho do CNPq Ensino/Aprendizagem de Línguas e Virtualidade, do qual são membros os dois autores. Para facilitar a navegação pelos links, foi disponibilizada uma versão eletrônica (cf. http://www.unicamp.br/~celdaf/publica/pas_virtual.pdf). 2 Cf. http://www1.folha.uol.com.br/folha/pensata/gilbertodimenstein/ult508u659473.shtml

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Inovações técnicas costumam bipartir os educadores em dois grupos conflitantes: entusiastas (não raro acríticos) e céticos renitentes. O risco da primeira postura é não perceber que o novo, sobretudo no ambiente tecnológico, pode trazer no seu bojo uma série de restrições que acabam nos levando ao campo oposto, i.e. de volta a paradigmas de ensino que se acreditavam superados. O risco da segunda é não perceber que certas mudanças são inevitáveis, e que abrir-se a elas não implica necessariamente abandonar convicções didáticas mais amplas – que inclusive devem ser mantidas, a despeito de quaisquer alterações no contexto educacional, com os devidos ajustes. Muitas das críticas feitas às novas tecnologias dizem respeito as seus alegados efeitos perniciosos sobre a aprendizagem, notadamente a memória – postura essa que tem uma longuíssima tradição. Na Grécia antiga, por exemplo, Sócrates era contra a escrita, por acreditar que ela prejudicava a memória e a expressão do pensamento autêntico, levando a distorções como o discurso dos sofistas. Ironicamente, o que hoje conhecemos de sua obra só chegou até nós em função dos escritos de Platão, seu mais eminente discípulo. Muitos séculos mais tarde, por volta dos anos 1970, criticava-se o uso de calculadoras eletrônicas nas escolas com o argumento de que elas levariam os alunos a não mais aprender as operações básicas (ninguém mais saberia a tabuada). Hoje, não só a calculadora eletrônica está integrada à prática escolar e às atividades triviais da vida profissional, como em muitos casos foi substituída por programas de computador, como planilhas eletrônicas, para atividades mais complexas. No âmbito específico do ensino de línguas, o próprio uso de dicionários bilíngues foi tabu por um bom tempo – reflexo de um monolinguismo radical, derivado, é certo, do behaviorismo, mas mantido em grande medida na abordagem comunicativa. Tradução, então, nem pensar! Hoje, a tendência é incorporar ao ensino da língua o uso adequado de ferramentas de consulta, como gramáticas e dicionários (mono- ou bilíngues), enquanto componente fundamental do próprio programa pedagógico – que comporta inclusive alguma dose de tradução, em casos específicos, sobretudo em contextos de aprendizagem de língua estrangeira (como alemão no Brasil). Assim como no caso das ferramentas de consulta, o que está em jogo com as novas tecnologias e seus recursos eletrônicos não é se os aprendizes podem ou devem usálas, pois isso eles farão de todo modo, a despeito de qualquer orientação em contrário que as instituições de ensino possam dar. A questão real é como incorporar essas ferramentas ao ensino de línguas, de uma maneira efetiva e condizente com os pressupostos 2

metodológicos que se defende – sem com isso cair no extremo oposto, do elogio incondicional do novo, que certamente não é capaz de dar respostas adequadas a todas as questões pertinentes. Nesse contexto, é preciso considerar uma série de fatores, como: 1) a infraestrutura disponível – não só na instituição de ensino, como também nos espaços usados por professor e aluno; 2) o grau de familiaridade do professor com os recursos técnicos e sua disposição para aprender a lidar com eles; 3) a possibilidade de delegar tarefas ou, alternativamente, trabalhar de um modo que independa, em larga escala, da intervenção de terceiros. A exposição a seguir está organizada em torno desses fatores, e visa fornecer ao leitor um breve panorama das possibilidades e limitações das novas mídias nos diferentes casos, com um viés eminentemente prático. Não se pretende, portanto, elaborar grandes reflexões teóricas sobre o que é o virtual, ou quais são as especificidades do trabalho na interface do ensino de línguas com a virtualidade – tarefas que não cabem na presente publicação, por restrições de espaço, mas sobretudo pelo espírito da mesma. Isso não quer dizer que não haja teorias específicas para o virtual, nem que pensá-las não seja importante. Significa apenas que a intenção é outra: mostrar caminhos factíveis e produtivos para o profissional do ensino de línguas que queira agregar elementos virtuais à sua prática pedagógica.3

I.

Cenário minimalista Um dos pressupostos mais importantes da abordagem comunicativa, ainda hoje

plenamente válido, é de que o ensino de línguas deve voltar-se para o uso real, em situações reais. Em relação às novas mídias, isso significa tratá-las como o que elas são de fato: um componente fundamental do dia-a-dia, integrado às atividades corriqueiras. Na comunicação escrita, sobretudo aquela de caráter não pessoal, é hoje extremamente comum recorrer-se a modelos padronizados de texto, trazendo para o cotidiano, de modo explícito, aquilo que a linguística textual já investigava há um bom tempo, e que está documentado em obras de referência como a excelente compilação Profile Deutsch (GLABONIAT et. al., 2010; cf. Texte: Textsorten, Textmuster). A questão fundamental é: a linguagem opera com modelos, nos mais diferentes níveis, e mesmo variações que visem praticar ou fomentar a criatividade só poderão fazê-lo por referência a algum des3

Uma boa porta de entrada para os interessados em discussões mais teóricas é a página de links do projeto LingNet: http://www.lingnet.pro.br/pages/links.php

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ses paradigmas – assim como só é capaz de improvisar o músico (de jazz, por exemplo) que tiver domínio dos padrões. As novas mídias oferecem acesso rápido e eficaz a tais modelos. Dentre as ferramentas eletrônicas de uso cotidiano, provavelmente as mais úteis para o aprendiz de alemão são as gramáticas, os dicionários e os corretores ortográficos. Em relação a esses últimos, há uma certa tendência, no meio acadêmico, a enfatizar excessivamente suas limitações (os inevitáveis erros que cometem) e desprezar o que eles fazem de correto, e que podemos aprender com eles. Para aprendizes de nível básico (larga maioria no Brasil), o uso de um corretor eletrônico pode ser uma ferramenta de valor inestimável, pois lhes dá feedback imediato na hora de escrever e, mesmo quando essa indicação é falha, proporciona uma oportunidade de parar para refletir sobre o que está escrito, i.e. fazer revisão, algo que as novas gerações, acostumadas à linguagem híbrida e não normativa dos comunicadores instantâneos, costumam ignorar. Corretores ortográficos do alemão para os grandes pacotes de escritório, como MS Office, Open Office e BR Office, dos quais apenas o primeiro é pago, são fáceis de obter. Além disso, é possível valer-se dos recursos disponíveis online, como os add-ons do Mozilla Firefox e os corretores do Gmail e do Google Docs – todos gratuitos. Uma boa política é condicionar tarefas escritas ao formato eletrônico e exigir o uso de corretores ortográficos. Na própria avaliação das tarefas, as ferramentas de revisão dos pacotes de escritório, como as do MS Word, agilizam o trabalho do professor e destacam automaticamente seus acréscimos e correções.4 Como repositório universal, o que a internet hoje nos disponibiliza em termos de obras de referência é praticamente inesgotável. Nesse contexto, uma das principais tarefas do professor é filtrar e organizar os conteúdos, dando destaque aos itens que considerar mais produtivos para seus alunos (cf. HESS, 2001). Para aprendizes brasileiros, certamente o dicionário eletrônico DIC-Michaelis é uma das opções de entrada.5 Para aqueles que também dominem outras línguas, uma excelente alternativa é o LEO.6 Para aprendizes mais avançados, sugere-se o uso do e-Großwörterbuch DaF, da editora

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Não cabe aqui fornecer instruções detalhadas sobre o uso de cada uma dessas ferramentas – até porque elas são fornecidas em cada aplicativo, tendendo hoje a ser bastante transparentes e intuitivas. A autonomia para descobrir o como se faz com base na documentação disponível é um pré-requisito fundamental para aqueles que se propõem a trabalhar com o virtual. Sem isso, nada feito. 5 Versão online: http://michaelis.uol.com.br/ (apenas versão escolar, para o alemão). 6 http://dict.leo.org/esde?lang=es&lp=esde&search=

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Langenscheidt (versão em CD),7 que tem o excelente recurso da consulta rápida em janelas pop-up – também presente, de resto, na série LexifacePRO, da editora PONS (português infelizmente não disponível).8 De resto, os próprios sites voltados para o ensino de línguas costumam trazer coleções de referências adicionais. Dentre esses, destaquese o notável canoo.net,9 site alemão com dados, explicados em inglês e alemão, sobre gramática, construção de palavras, ortografia e muito mais – inclusive uma boa lista de dicionários online. Dos sites que disponibilizam material didático na forma de explicações e exercícios, um bom exemplo é o projeto austríaco vdeutsch, voltado para o público infanto-juvenil, mas certamente também útil para um público adulto.10 Num mix de endereços com características distintas, tomem-se como outros exemplos dignos de destaque a página suíça mittelschulvorbereitung.ch, com suas 900 Arbeitsblätter Deutsch;11 a seção de links do alemão DaF-Portal;12 o blog pessoal The Digital Nomad;13 o site pioneiro de Ralph Kinas (Programmlehrer no Chile);14 a magnífica Deutsche virtuelle Grammatik finlandesa (acessível em quatro idiomas, com excelentes explicações e atividades muito atrativas),15 dentre inúmeros outros endereços – muitos deles com links cruzados. Todas as referências e orientações acima podem ser passadas pelo professor a seus alunos de forma muito simples, até mesmo numa folha de papel, sem incursões pelo virtual. Com uma intervenção mínima, o professor pode organizar sua própria coleção, ou biblioteca de links (linkoteca), e disponibilizá-la a seus alunos numa página da internet (em provedores gratuitos, inclusive), ou mesmo num blog pessoal. Para tanto, basta organizar esses links nalgum redator de texto, como o próprio MS Word, salvar em formato html e disponibilizar o arquivo como página do site. Em alguns casos, será necessário usar um programa de transferência de arquivos como TELNET ou SSH para

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http://www.langenscheidt.de/katalog/titel_langenscheidt_egrosswoerterbuch_deutsch_als_fremdsprache_3244_380.html 8 http://corporate-solutions.pons.de/cs/nachschlagen/LexifacePro/teaser.html 9 http://www.canoo.net/services/Search/ueberblick/index.html?MenuId=Search 10 http://vdeutsch.eduhi.at/daf_tibs/inhalt.htm. Ao que tudo indica, a página será em breve atualizada, passando a chamar-se virtuelleschuledeutsch (cf. http://vdeutsch.eduhi.at). Acesso aos 29/01/2010. 11 http://www.mittelschulvorbereitung.ch/ 12 http://www.daf-portal.de/uebungen/index.php?viewCat=2 13 http://www.lernado.com/unterrichtsmaterialien/deutsch-als-fremdsprache/ (nesse blog, o leitor encontrará também interessantes discussões sobre alguns dos temas tratados no presente trabalho). Vide, por exemplo, o tratamento dado à perspectiva do professor ou aluno (cf. links em: http://www.lernado.com/). 14 http://www.ralf-kinas.de/index.html 15 http://donnerwetter.kielikeskus.helsinki.fi/DVG/

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fazer o upload.16 Em muitos casos, no entanto, os próprios provedores incluem mecanismos com essa função. A página de material de apoio da Área de Alemão do CEL/Unicamp é um exemplo de linkoteca sintética, com uma lista de materiais de uso geral produzida conforme descrito acima.17 Os links foram disponibilizados pelo corpo docente, mas parte deles remete a sugestões feitas pelos próprios estudantes – cabendo ao professor selecionar as melhores opções e torná-las facilmente acessíveis aos alunos. Uma variante extremamente produtiva é o professor organizar os links segundo o programa de seu curso, filtrando aquilo que está na rede e dando dicas de trabalho. Tomemos como exemplo uma linkoteca associada à Unidade 23 de Blaue Blume, com destaque para o clássico tópico das Wechselpräpositionen.18 O leitor perceberá que muitos dos links fornecidos trazem seu material organizado em função de outros critérios, não raro até mesmo de outros materiais didáticos – o que não impede que eles sejam úteis para aprendizes que estejam lidando com os mesmos tópicos. De resto, uma certa variedade de links, respeitando-se os limites de quantidade que garantam uma visão do todo e inibam a dispersão, é certamente útil para atender à diversidade dos estilos de aprendizagem dos alunos, possibilitando que cada um escolha como material adicional aquilo que for mais produtivo, ou prazeroso, no seu caso específico. De modo geral, os alunos que se entusiasmam por um ou outro endereço mais rico em recursos, acabam voltando a ele de modo sistemático, para tratar também de outros tópicos. Ao fazer isso, dão um importante passo em direção à sua própria autonomia de aprendizagem, após o direcionamento inicial fornecido pelo professor. Essa é uma das grandes vantagens do trabalho no espaço virtual: praticamente qualquer um pode tornar-se autor, compartilhando daquilo que já está disponível na rede ou produzindo seus próprios materiais (e compartilhando-os com outros interessados). Nesse sentido, a internet configura-se certamente com um dos raros espaços utópicos da atualidade, e trabalhar nela com o espírito aberto é participar ativamente desse megaambiente colaborativo. Tudo isso de uma maneira relativamente simples e intuitiva, sem maiores custos ou complicações institucionais.

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Cf. opções disponíveis em http://terrabrasil.softonic.com/seccion/227/Telnet http://www.unicamp.br/~celdaf/mat-apoio.htm 18 http://www.unicamp.br/~celdaf/material_de_apoio/Linkoteca_BB_E23.htm 17

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II.

Cenário intermediário Um cenário ligeiramente mais complexo, mas ainda propício para a atuação do

professor de forma autônoma, sem dependência de maior apoio institucional, é aquele em que se assume plenamente a condição de autor de novos materiais didáticos, direcionados para os objetivos específicos do curso. As novas mídias oferecem muitas ferramentas que possibilitam elaborar tais materiais, seja para uso em sala de aula ou em ambientes virtuais – no caso, a página ou blog pessoal do professor. Apresentaremos a seguir alguns desses recursos, organizados de acordo com o tipo de uso e o grau de interação com a internet que possibilitam ou pressupõem. Para facilitar a preparação de materiais adicionais, as editoras disponibilizam recursos complementares em diversos formatos. Esses complementos em geral estão ligados diretamente ao conteúdo de um determinado livro didático. Antigamente os livros eram lançados junto com um manual do professor (Lehrerhandbuch), mas hoje em dia a tendência é disponibilizar materiais digitais que reúnem a função clássica (testes e exercícios prontos, com as respectivas respostas; listas de vocabulário; transcrições de áudios etc.) com ferramentas interativas (geradores de exercícios; materiais online). Um exemplo é o CD-ROM Unterrichtsvorbereitung interaktiv que complementa o livro didático studio d da Editora Cornelsen. Além de passível de aquisição separada, seu funcionamento está condicionado à disponibilidade do aplicativo MS Word no computador do usuário. Após a instalação das ferramentas, elas são integradas como atalhos (add-ins) na barra de ferramentas do próprio Word. O gerador de exercícios (Arbeitsblattgenerator) possui seis funções: misturador de letras, de palavras ou de frases; lacunas; palavras cruzadas; palavras em cadeia. Essas funções, porém, não se aplicam aos testes e exercícios prontos, que têm proteção contra alterações, senão apenas a textos de outras fontes e às listas de vocabulário que o CD disponibiliza. A intervenção do professor se dá através da seleção de trechos relevantes do texto a ser trabalhado, da definição dos intervalos “n” entre as lacunas (inseridas a cada enésima palavra – formato cloze), da escolha da classe de palavra (só verbos, preposições etc.) ou tipo de letras (só vogais/consoantes). A utilização de textos suplementares ao livro didático pode ser facilitada pela ferramenta de análise de textos (Textanalyse). Para usá-la, o professor deve colocar o texto a ser analisado em um documento vazio e definir o nível dos alunos em relação às unidades de studio d. Com isso, o programa marca, baseando-se no banco de dados do livro didático, as palavras introduzidas ou não até tal estágio. Esse recurso 7

pode ser integrado com o dicionário (Lexikon) que contém todas as palavras do livro em ordem alfabética com localização exata (unidade), exemplos de uso e informações gramaticais. Tal tipo de mídia se dirige, em primeiro lugar, a professores que trabalham com o livro didático em questão e que querem usar material adicional impresso em sala de aula. Porém, uma vez adquirido, o software pode ser usado também em outros contextos, mesmo tendo algumas restrições quanto à integração com outros materiais didáticos. Além dos softwares dedicados, existem programas genéricos, i.e. não ligados a um determinado material didático. O exemplo a ser aqui apresentado é o gerador de exercícios LingoFox.19 Para usá-lo, também é necessário adquirir uma licença que varia em função do perfil do usuário. Ele oferece funções muito semelhantes às do CD-ROM descrito acima, porém com mais possibilidades de criar diferentes tipos de exercícios (ortografia, pontuação, quebra-cabeças, múltipla escolha etc.). A interface de trabalho se parece bastante com a dos editores de texto comuns, o que facilita seu manuseio. Como vantagem em comparação com os programas dedicados, LingoFox integra listas de vocabulário de vários livros didáticos (Themen neu, Delfin, Blaue Blume, Die Suche, Moment Mal!, Sowieso) e do Zertifikat Deutsch. Além isso, existe a possibilidade de incorporar posteriormente listas de outros livros didáticos (Schritte, geni@l, Stufen, Passwort Deutsch, Themen aktuell, dentre outros),20 ou até mesmo alimentar o banco de dados com uma lista individual. Criado originalmente visando a geração de exercícios adicionais para serem impressos, posteriormente foi desenvolvida também uma ferramenta gratuita (para quem adquiriu o software) destinada a criar exercícios interativos em html ou Word, com correção automática e indicação das respostas certas. Essa ferramenta, no entanto, ainda não oferece suporte para todos os formatos de exercício. Com os softwares apresentados, o professor não dependerá do apoio de uma instituição nem de conhecimentos especializados de informática para criar materiais adicionais. Ele pode selecionar os conteúdos que julgar relevantes e configurar, dentro dos formatos pré-estabelecidos, uma série de diferentes exercícios. A confecção dos exercícios acontece de maneira intuitiva e eficiente, tendo, no entanto, limites no que diz res19 20

http://www.lingofox.de/ Lista completa disponível em: http://www.lingofox.de/index.php?page=neuebuecher&lan=de

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peito ao repertório possível, por tratar-se de geração automática com base em algoritmos – característica que não leva necessariamente ao foco pedagógico mais produtivo. Ou seja, o que se ganha em economia, quando o programa faz automaticamente grande parte do trabalho, perde-se parcialmente com a falta de um foco mais direcionado àquilo que o professor julga mais pertinente, com base nos objetivos que definiu para seus cursos, nas características e necessidades específicas de seus alunos etc. Um passo a mais rumo à integração de exercícios com a internet são programas voltados para a criação de exercícios interativos (que, no limite, também podem ser impressos para uma utilização mais tradicional), como o software de autoria Hot Potatoes,21 amplamente conhecido e utilizado no ensino de línguas, tendo sido desenvolvido por uma equipe da Universidade de Victoria, Canadá22 e passado a ser gratuito para qualquer finalidade em 2009, ainda que não seja um software de código aberto.23 Por ser compatível com os grandes sistemas operacionais, como Linux, Windows e Mac OS X, seu uso é bastante universal. Como no caso dos dois geradores de exercícios apresentados acima, o manuseio não pressupõe conhecimentos de programação. Os tipos de exercícios, todos fechados, são parecidos com os já apresentados (lacunas, palavras cruzadas, múltipla escolha, sopa de palavras, associação de colunas, resposta curta). Contudo, o Hot Potatoes oferece uma série de vantagens técnicas pelo seu caráter interativo, como p. ex. a integração de textos, figuras, áudios ou vídeos. Além disso, os exercícios podem ser facilmente integrados a plataformas e, em casos como o Moodle, ao respectivo sistema de notas (sobre plataformas vd. abaixo). Outro componente a ser destacado é o caráter formativo: o aluno interage com o exercício, recebe um feedback, pode pedir dicas que o levem à resposta correta e também repetir o exercício. Por não estarem vinculadas a nenhum material didático, tarefas em formato Hot Potatoes podem ser elaboradas em função dos objetivos de ensino/aprendizagem e das necessidades específicas dos alunos. Isso consome mais tempo na fase de elaboração dos conteúdos, mas leva o professor a um grau elevado de autonomia. Para serem usados com todos seus recursos,

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Cf. introdução básica e links para tutoriais no site do MEC (http://webeduc.mec.gov.br/webquest/). http://hotpot.uvic.ca/ 23 Por software gratuito entendem-se programas que não demandam pagamento para sua utilização. Uma variante desse conceito são programas liberados para utilização por um certo período, para os quais podese ou deve-se adquirir uma licença após a fase de testes (shareware). Já os programas de código aberto, ou colaborativos, são aqueles cuja estrutura interna pode ser modificada pelo usuário (expert). São esses últimos que constituem o cerne da cultura do software livre que se contrapõe ao mundo dos programas dedicados e muitas vezes restritivos das grandes corporações (os quais não raro só permitem essa ou aquela operação, só trabalham com tais e tais formatos etc.). 22

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os exercícios precisam ser acessíveis em formato eletrônico, normalmente via publicação na internet, fazendo-se portanto necessário o uso de um blog ou uma página web, como no cenário mais simples descrito acima, ou de uma plataforma de ensino/aprendizagem, como veremos na sequência. Para o trabalho com vocabulário, uma excelente alternativa é o site colaborativo WordChamp,24 cuja estrutura tem por base fichários eletrônicos (flash cards) em várias línguas. Além das listas já existentes, algumas delas geradas pelo próprio site, o usuário pode elaborar suas listas pessoais e disponibilizá-las na rede. Atualmente, o maior número de listas disponíveis no par português/alemão refere-se aos glossários das 54 Unidades de Blaue Blume, disponibilizados pela Área de Alemão do CEL/Unicamp.25 A elaboração dessas listas é simples, podendo ser feita diretamente online ou também offline, para posterior upload – usando um simples redator de texto. Nesse último caso, é importante que o arquivo seja gravado no formato só texto, usando codificação Unicode (UTF-8), para não perder os caracteres especiais na importação. Essa opção é aconselhável apenas quando já se tem listas de vocabulário prontas e não se quer digitar tudo novamente. Na elaboração de novas listas, a opção online é provavelmente mais amigável, sobretudo para quem tiver uma boa conexão de banda larga. No caso de palavras do vocabulário básico, o sistema as reconhece e cria automaticamente uma associação com um arquivo de som. O usuário pode também criar seus próprios arquivos de som e associá-los às diferentes palavras e expressões dos fichários, com um simples microfone ligado ao computador – como na comunicação por voz via rede usando Skype, MSN, Google Talk etc. As listas assim criadas ficam disponíveis para uma série de atividades, organizadas de modo semelhante ao das tradicionais fichas de vocabulário (Wortschatzkarteien) em papel cartão. O aprendiz pode então repassar: os significados, via tradução ou simples reconhecimento; a ortografia ou a compreensão oral, com um ditado; as formas verbais (havendo links de acesso às tabelas de conjugações dos verbos mais comuns) – além de outras variantes adicionais. Dentro de certos limites, os fichários podem ser baixados da rede como arquivo em mp3, para uso em telefone celular, por exemplo – um gadget que provavelmente não entusiasmará tanto assim os professores, mas tem chances razoáveis de agradar os alunos mais jovens. 24 25

http://www.wordchamp.com/lingua2/Splash.do http://www.wordchamp.com/lingua2/Search.do?str=Blaue_Blume_Brasilien (cf. aba Vocabulary lists).

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No mais, essas listas de vocabulário passam a compor a base de dados do site e são usadas, de forma complementar, pela ferramenta WebReader, que fornece um dicionário online com janelas pop-up para leitura nos mais diversos pares de línguas.26 O usuário cadastrado (gratuitamente) no site poderá não só agregar suas listas de vocabulário, como também editar as entradas de outros usuários, onde encontrar imprecisões e erros. Uma possibilidade adicional (e paga) é cadastrar-se como professor e usar o site para atividades direcionadas a grupos de alunos específicos. Nesse sentido, o site alinhase com a cultura do shareware: algumas de suas funções são gratuitas, outras são pagas. Para grupos de aprendizes a partir dos níveis intermediário ou básico avançado, já é viável trabalhar de modo produtivo com projetos de pesquisa na internet, dentro do conceito de Web Quest. Note-se que aqui a proposta de trabalho é mais aberta, e também mais exigente quanto aos conhecimentos de língua necessários, pois envolve uma série de atividades de planejamento, leitura e produção escrita. Por esse motivo, não surpreende que encontrem-se mais facilmente projetos dessa natureza vinculados a outros contextos instrucionais e elaborados na língua materna dos alunos, do que propriamente no ensino de línguas estrangeiras (LE), ou mesmo de segunda língua (L2). Uma boa introdução geral ao tema está disponível no já citado site do MEC,27 junto a informações e tutoriais sobre outras ferramentas úteis para a educação a distância também citadas neste trabalho (blog e Hot Potatoes). Outros tutoriais e exemplos de Web Quest, inclusive alguns voltados para o ensino de línguas, podem ser obtidos em site da Universidade de Pittsburgh.28 No ensino de alemão, o conceito tem sido explorado, dentre outros, por Ilpo Halonen, que comenta o tema e dá boas dicas na página dafnord.29 Para averiguar a que tipo de resultados chega-se com projetos dessa natureza, vale conferir o dossiê DaF 12 Russland, também disponível na rede.30 Por sua natureza, a Web Quest acaba por demandar dos aprendizes não só bons conhecimentos de língua, como também uma desenvoltura na internet semelhante àquela pressuposta para o professor neste cenário intermediário, parcialmente centrado em blogs e páginas pessoais. A utilização de plataformas eletrônicas de ensino/aprendizagem, configurando um cenário algo mais elaborado, pode reduzir o grau de exigência em conhecimentos técnicos por parte de todos os envolvidos, na medida em que as pró26

http://www.wordchamp.com/lingua2/Reader.do http://webeduc.mec.gov.br/webquest/ 28 http://www.polyglot.pitt.edu/workshops/techfall03/webquests.html 29 http://daf.eduprojects.net/daf12/index.php?action[]=IBrowsing::gotoFolder%28139%29 30 http://daf.eduprojects.net/daf12/index.php?action[]=IBrowsing::gotoFolder(1367) 27

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prias plataformas oferecem vários recursos que podem ser usados na realização de projetos desse tipo, ou de outros mais simples, de foco mais reduzido. Ou seja: tudo aquilo que pode ser feito dentro do conceito de Web Quest, sem o uso de plataformas, pode também ser feito dentro delas, ou de modo integrado a elas. Por outro lado, o acesso a esses recursos pressupõe a existência de uma plataforma instalada em um provedor, com equipe técnica de apoio, medidas de segurança etc. Nesses casos, haverá quase necessariamente um maior comprometimento institucional ou, no mínimo, alguns custos envolvidos, como veremos a seguir.

III.

Cenário avançado Plataformas eletrônicas são ambientes virtuais que reúnem várias funções: dife-

rentes formatos de apresentação de conteúdos (tipos de exercícios, suporte para upload de arquivos ou links etc.), ferramentas de comunicação (chat, fórum etc.), opções de administração (conteúdos, usuários, estrutura, calendário etc.). Num uso mais restrito, as plataformas podem servir de complemento às aulas presenciais, através de exercícios extras ou material de apoio. Outras modalidades, que fazem um uso mais intenso das inúmeras opções que os ambientes virtuais oferecem, são o blended learning (combinação de partes presenciais e virtuais) e os cursos propriamente a distância. Nesses casos, o uso da plataforma constitui uma parte obrigatória do curso, ou melhor, o suporte que possibilita sua realização em moldes compatíveis com o estado da arte no espaço virtual.31 Apresentamos a seguir uma breve visão de algumas plataformas de ensino/aprendizagem, escolhidas por sua relevância no contexto atual.32 Assim como no caso dos softwares de autoria de exercícios descritos acima, existem, por um lado, plataformas dedicadas, ligadas a materiais didáticos específicos, em geral pagas. Elas são fechadas e “cheias”, i.e. disponibilizam conteúdos prontos; a intervenção do professor, 31

Com isso, quer-se dizer que hoje já não faz o menor sentido basear cursos a distância ou semipresenciais, ou mesmo componentes não presenciais sistemáticos de cursos mais tradicionais, em ferramentas como e-mail, comunicadores eletrônicos comerciais ou listas de discussão – algo que talvez ocorresse ao professor iniciante no espaço virtual (em se tratando de comunicação esporádica e assistemática, ferramentas como o e-mail continuam, é claro, a ser parte do dia-a-dia). Tendo em vista as vantagens oferecidas pelas plataformas eletrônicas e sua relativa acessibilidade, é certamente anacrônico valer-se de recursos como os citados acima de forma dispersa, sem um elemento unificador – sobretudo se isso for feito num contexto institucional. As plataformas eletrônicas são exatamente esse elemento unificador, ao disponibilizarem num só lugar todas essas ferramentas, e muito mais, num ambiente controlado. 32 Para uma introdução geral ao conceito, incluindo listagem com outras alternativas, cf. verbete na Wikipédia e links lá disponíveis (http://en.wikipedia.org/wiki/Learning_management_system).

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se houver, restringe-se a administrar as ferramentas de comunicação e os logs dos usuários – além de corrigir as tarefas, função não raro atribuída a tutores, i.e. auxiliares de ensino com menor autonomia. Por outro lado, existem plataformas “vazias” que oferecem as ferramentas e funções, mas vêm sem conteúdos, cabendo ao professorplanejador desenvolver materiais didáticos para alimentar o ambiente. Diferencia-se aqui entre plataformas gratuitas e pagas. Um bom exemplo de plataformas fechadas no contexto do ensino de alemão é o portal Deutsch-Uni Online – DUO,33 desenvolvido na Alemanha por uma equipe da Ludwigs-Maximilian-Universität de Munique e do TestDaF-Institut de Hagen. Destinada tanto a grupos quanto a alunos individuais, seus custos variam de acordo com o número de licenças adquiridas. O público-alvo são estudantes que pretendem se preparar para uma estadia numa universidade alemã. Para tal fim, o ambiente contém vários módulos, desde o nível básico até a linguagem técnica de várias áreas de conhecimento, e um curso de leitura. Há tutores e uma equipe de apoio técnico para acompanhar os usuários. Com exceção dos níveis básicos (A1, A2), os módulos não dependem de outros materiais didáticos nem de aulas presenciais. O nível básico, porém, orienta-se pelo livro didático Schritte International, seguindo a progressão temática e didática do mesmo; dificilmente poderá ser usado com outros materiais (cf. OLIVEIRA, WUCHERPFENNIG & VETTER, 2008). O uso de plataformas fechadas recomenda-se principalmente para instituições que tenham convênios com o respectivo proprietário do software. Dependendo das necessidades de uma instituição, ela pode até mesmo criar um ambiente próprio específico, como é o caso de Read in Web,34 um curso de inglês instrumental desenvolvido por docentes da Unicamp, usado sem custos para o público interno, mas que faculta também o acesso de usuários externos via extensão universitária, com cobrança de taxa. O desenvolvimento de uma plataforma própria pressupõe um grande aparato institucional, com verba condizente, e depende de modo fundamental de uma equipe técnica responsável por sua implantação. Uma filosofia diferente dos ambientes fechados têm as plataformas de ensino/aprendizagem genéricas, como Moodle, TelEduc e Sakai. Nesses casos, mesmo instituições que não participaram do desenvolvimento das plataformas podem usá-las de 33 34

http://www.deutsch-uni.com/ http://readinweb.iel.unicamp.br/

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modo gratuito. Por outro lado, salvo uso experimental com certas restrições, elas dificilmente se prestam à utilização autônoma pelo professor, pois há necessidade de toda uma infraestrutura técnica, envolvendo um servidor de porte compatível e com estrutura de segurança adequada, backups periódicos, proteção contra queda de energia, política de segurança, capacidade de gerenciamento para acesso simultâneo de um grande número de usuários etc. No limite, o professor que também for expert em informática e tiver à sua disposição uma sólida estrutura computacional, poderá, em alguns casos, até mesmo criar seu próprio provedor, em pequena escala. Mas isso certamente é antes a excessão do que a regra. Outra característica dessas plataformas genéricas é que elas são vazias e multiuso – apenas fornecem um espaço virtual a ser editado e preenchido pelo professorplanejador, segundo as necessidades e os objetivos do curso, usando as ferramentas mais adequadas para isso, dentro do leque de opções existentes. Esse ganho de autonomia implica um domínio das ferramentas do ambiente ou a disposição do professor a adquiri-lo de modo gradativo. Tratam-se aqui mais de conhecimentos processuais, sobre como operar com determinadas ferramentas, do que de conhecimentos técnicos de informática propriamente dita. Para quem não conta com amparo institucional na parte de infraestrutura e apoio técnico, mas mesmo assim não quer abrir mão da autonomia sobre os conteúdos e a administração do ambiente, uma alternativa interessante seria usar uma plataforma com estrutura vazia que possibilite a contratação de uma área individual, mesmo que paga (de modo semelhante ao uso pago no site WordChamp, mencionado acima). Isso é possível com o ambiente Blackboard,35 associado à Microsoft, utilizado sobretudo por grandes usuários institucionais, mas ainda existe a possibilidade de contratação individual.36 Historicamente, o Blackboard é um desenvolvimento ulterior da plataforma WebCT,37 sistema pioneiro que se destacava pela riqueza de recursos, mas por outro lado exigia bastante do usuário em termos técnicos. Nos primórdios, o WebCT funcio35

http://www.blackboard.com/Teaching-Learning/Overview.aspx Para usuários brasileiros, os custos envolvidos (US $ 495,00 por ano) certamente diminuem a atratividade da oferta (cf. http://coursesites.blackboard.com). De todo modo, resta a possibilidade de fazer um teste gratuito, por 30 dias, para aqueles que simplesmente desejam explorar as possibilidades do sistema. Quem quiser evitar custos, pode montar um “pacote” usando várias ferramentas gratuitas disponíveis na internet, solução certamente mais trabalhosa, mas talvez interessante como estudo exploratório (dicas em: 36

http://www.bestuniversities.com/blog/2009/how-to-create-your-own-online-course-100-tools-guides-and-resources/). 37

http://en.wikipedia.org/wiki/WebCT

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nava praticamente como um shareware em instituições públicas de ensino, das quais não era cobrada taxa de utilização. Após algum tempo, no entanto, seu uso passava a ser condicionado ao pagamento de licenças – de custo não necessariamente acessível. A conjunção desses dois fatores, a saber, exigência de muito conhecimento técnico por parte do usuário e elevadas taxas de uso, acabou levando muitas instituições e grupos de usuários ao desenvolvimento de softwares alternativos. Um desses programas é o TelEduc,38 desenvolvido na Unicamp segundo a filosofia do software livre e gratuito. Por sua facilidade de uso, o TelEduc logo ganhou um grande número de usuários, tanto no Brasil como na comunidade internacional. Outra característica dessa plataforma é seu forte embasamento numa concepção construtivista de ensino/aprendizagem, motivo pelo qual as ferramentas disponibilizadas sempre tiveram como foco principal formas abertas e colaborativas de atuação. Um bom exemplo desse tipo de ferramenta é o portfólio de grupo, destinado à execução e avaliação de tarefas coletivas. Por outro lado, a falta de um bom conjunto de ferramentas para o trabalho com formas fechadas acabou por inibir a utilização do TelEduc por um número significativo de usuários, notadamente aqueles de áreas mais focadas nos conteúdos – mas também no próprio ensino de línguas, quando já se conheciam os benefícios (e as limitações) de atividades como aquelas desenvolvidas com o Hot Potatoes, para ficarmos com um exemplo já citado neste trabalho. Outra dificuldade foi a morosidade nas atualizações, feitas sobretudo por uma pequena equipe de técnicos (notadamente estagiários) da Unicamp, apesar do caráter declarado de software open source do programa. Atualmente, destacam-se também outras duas plataformas com características ligeiramente diversas. Uma delas é o ambiente Tidia-Ae,39 projeto desenvolvido no Brasil com apoio da FAPESP, a partir de uma iniciativa internacional mais ampla, vinculada ao projeto Sakai40 – cujo site postou comentário com link para um longo estudo comparativo com o Blackboard (MOYNIHAN, 2009). Num certo sentido, pode-se afirmar que os projetos Tidia-Ae/Sakai têm características híbridas: por um lado, são gratuitos e open source; por outro, seu desenvolvimento está fortemente vinculado a instituições de ensino e pesquisa de grande renome e fundações de fomento. Tendo isso em vista, seu uso é mais plausível em contextos institucionais como o das universidades que patroci38

http://www.teleduc.org.br/ http://tidia-ae.incubadora.fapesp.br/portal/ 40 www.sakaiproject.org 39

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nam seu desenvolvimento – caso notório das universidades públicas paulistas: USP, Unesp e Unicamp. A outra alternativa aqui em destaque é a plataforma Moodle,41 desenvolvida originalmente na Austrália por Martin Dougiamas, um administrador do ambiente WebCT não satisfeito com a as características do software proprietário.42 Neste caso específico, estamos diante de um programa que é não só open source, como também radicalmente colaborativo, na melhor tradição da cultura do software livre. O Moodle conta hoje com milhares de desenvolvedores voluntários espalhados pelo mundo afora, sendo bastante disseminado também no Brasil e nos países de língua alemã. Além disso, há uma versão institucional, mais fechada, usada pela Open University, da Inglaterra, cujos novos recursos são sistematicamente disponibilizados, após algum tempo, para a versão aberta do programa. Um importante diferencial do Moodle é que, além de disponibilizar um amplo leque de ferramentas internas, possibilita também grande integração com ferramentas externas, de modo que o usuário pode explorar os pontos fortes de cada programa e usálos segundo suas próprias necessidades – contornando em parte as limitações de cada programa isolado. Aliado às constantes atualizações, esse alto grau de interação garante à plataforma um visual bastante alinhado com as tendências da internet, deixando o usuário muito à vontade para interagir no sistema de forma semelhante ao que faz com os novos aplicativos da Web 2.0. Um bom exemplo desse tipo de comunicação é a possibilidade de utilizar tarefas criadas no Hot Potatoes, conforme já aludido mais acima. Isso pode ser feito através de um módulo específico para o Hot Potatoes, com integração ao sistema de avaliação (ainda que com algumas restrições de natureza técnica). Mas há também a possibilidade de importar as atividades Hot Potatoes (e de inúmeros outros formatos) para utilização dentro da ferramenta Quiz, nativa do sistema (que recebeu a tradução, infeliz, de Questionário; melhor é a tradução para o alemão: Test). Dentro de um Quiz, as possibilidades de feedback ao aprendiz são ainda mais elaboradas do que no Hot Potatoes, com grau equivalente de integração de recursos multimídia, além de um notável editor interno que possibilita a combinação de vários tipos de atividades numa mesma tarefa, exigindo para isso o domínio de alguns (mas não muitos) comandos, ou códigos específi41 42

http://moodle.org/ Cf. Wikipédia (http://en.wikipedia.org/wiki/Moodle).

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cos. Tais comandos, como ocorre no caso de todas outras ferramentas do ambiente, são explicados em arquivos de ajuda internos e tutoriais externos disponíveis em vários idiomas. Para atividades mais abertas, a serem realizadas de modo colaborativo dentro de uma abordagem construtivista, o Moodle também conta com um bom leque de opções integradas ao sistema, além, claro, das inúmeras possibilidades de criar links para recursos externos. Dentre essas ferramentas, destaquem-se os diferentes tipos de fóruns e o Wiki, que a partir da distribuição 2.0 usa o mesmo mecanismo básico de edição colaborativa da Wikipédia. Outra inovação importante da nova versão do Wiki no Moodle é sua plena integração ao sistema de avaliação, de modo que, a partir da distribuição 2.0, não é mais necessário criar um registro de atividade offline, recurso usado para integrar à avaliação quaisquer formas de trabalho não previstas internamente no sistema. Com essas condições, fica extremamente facilitado o gerenciamento de projetos de pesquisa na internet, dentro do conceito de Web Quest mencionado mais acima, ou mesmo variantes mais pontuais, associadas a tópicos específicos do curso. Além de fornecer todas as ferramentas necessárias para formatação do texto final, com inclusão de links e/ou arquivos multimídia, o Wiki mantém um histórico das atualizações, o que permite ao professor acompanhar de perto o que foi feito por cada aprendiz. Desse modo, podem ser encaminhadas também orientações individualizadas, quando isso for o caso, e inibe-se um pouco a tendência a que alguns alunos façam a maior parte do trabalho e os outros se aproveitem disso para melhorar sua própria nota – algo que, infelizmente, não é de todo raro em contextos instrucionais. Outro ponto fortíssimo do Moodle é seu mecanismo de registro das atividades no ambiente, ao qual está integrado o sistema de avaliação. Os dados registrados no Moodle permitem um acompanhamento detalhado da forma como as atividades foram feitas, possibilitando uma avaliação também qualitativa, não só do desempenho dos alunos, como ainda das próprias atividades propostas – suas falhas, seus pontos fracos e fortes etc. O professor pode usar mecanismos internos para fazer o cálculo das notas, criando diferentes categorias e mesmo funções matemáticas mais complexas, se quiser, podendo ainda exportar os dados para uma planilha externa e depois importá-los de volta. Esses resultados podem ser visualizados pelo professor de diferentes maneiras, com a possibilidade de se programar também a visualização pelos alunos. À medida em que 17

os alunos têm acesso aos critérios de avaliação usados no curso, assim como a seus resultados pessoais (parciais e totais), fica mais evidente quais foram seus pontos fortes e fracos ao longo do processo. Isso facilita o encaminhamento de medidas direcionadas, como a retomada de tópicos específicos, o reforço para aspectos que apresentam deficiências etc. – seja por parte do professor ou do próprio aprendiz, de forma autônoma. O trabalho com plataformas multiuso possibilita também a migração de conteúdos de um sistema para outros, com os devidos ajustes, referentes às ferramentas utilizadas. Tomemos como exemplo desse tipo de migração o curso aberto Alemão com Blaue Blume, desenvolvido originalmente na plataforma TelEduc (cf. OLIVEIRA, 2007, 2008) e depois migrado para a plataforma Moodle (cf. OLIVEIRA, 2007; s.d.).43 Aberto a visitantes sem cadastro e a aprendizes já cadastrados no ambiente, esses cursos, organizados de modo paralelo às disciplinas de alemão do catálogo da graduação na Unicamp, dão uma boa ideia do que se pode fazer no ambiente virtual, integrando vários recursos a uma plataforma de ensino/aprendizagem. Parte significativa dos exemplos citados ao longo deste trabalho estão disponíveis nesses cursos, além de inúmeros outros.44 Para as instituições que optarem pela disponibilização de plataformas de ensino/aprendizagem a seu corpo docente, um outro grande diferencial é a possibilidade de integrar as plataformas a seu sistema acadêmico, com os dados de cursos e alunos matriculados. Com isso, o professor não precisa cadastrar seus alunos, bastando disponibilizar o curso em questão para o acesso dos alunos. Na Unicamp, isso até recentemente só era possível com uma versão institucional do TelEduc. A tendência, no entanto, em todas as universidades públicas paulistas, é adotar uma política multiplataforma, que faculte ao próprio professor a escolha da plataforma que julgar mais apropriada para seus objetivos e metodologia de trabalho. No bojo dessa nova política multiplataforma, a escolha da Área de Alemão do CEL/Unicamp foi claramente pelo Moodle – mas nada impede que seus docentes optem individualmente por outras plataformas. Para quem não tem esse tipo de vínculo institucional, a boa notícia é que é possível hospedar cursos avulsos em provedores gratuitos do Moodle, com algumas limita43

Cogitou-se também uma migração para o sistema Tidia-Ae, descartada quando se percebeu que não haveria ganhos em relação ao Moodle, pelo contrário: no atual estágio, perder-se-ia muito em relação à possibilidade de interação com ferramentas externas, e mesmo algumas características técnicas, como suporte ao uso de caracteres especiais – algo fundamental no ensino de línguas estrangeiras. 44 Para acesso como visitante ou cadastramento como novo usuário, cf. provedor de Ensino a Distância da Unicamp (http://moodle.ead.unicamp.br/course/category.php?id=5).

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ções.45 A hospedagem paga, por sua vez, tem preços bem mais atrativos para o usuário individual que o Blackboard, citado acima, e mesmo para instituições com maior demanda os custos não são proibitivos.46 Na medida em que o Moodle se consolida como a grande alternativa no universo do software livre, a tendência é que surjam cada vez mais provedores gratuitos, ou de custo acessível. Uma outra possibilidade a ser explorada pelos professores de alemão seria buscar o apoio de suas associações, regionais ou nacional (ABRAPA), para viabilizar o acesso a esse tipo de recurso – quiçá mesmo com o apoio de parceiros internacionais.47 No início, o amplo leque de possibilidades pode até assustar um pouco. Para superar essa barreira inicial, aconselha-se o uso dos muitos tutoriais disponíveis online, acessíveis através de links nas ferramentas específicas do ambiente, ou sistematizados em sites de apoio.48

Considerações finais Como foi dito no início deste trabalho, a passagem para o virtual é algo inerente ao ambiente permeado pela tecnologia do mundo globalizado de hoje. Que os aprendizes lancem mão de recursos eletrônicos, é uma mera questão de tempo, onde isso ainda não tiver ocorrido. Que os professores façam o mesmo, é talvez uma questão de geração – ou de mudança de atitude dos menos jovens. Procuramos mostrar neste trabalho que o virtual se põe a nosso dispor em níveis de comprometimento muito diversos, indo da simples coleta de links interessantes ao trabalho com plataformas eletrônicas de ensino/aprendizagem – que no futuro certamente farão parte do instrumental pedagógico de qualquer instituição de ensino que se preze. Cabe ao profissional de ensino de línguas avaliar o estágio em que se encontra, no tocante à disponibilidade de recursos técnicos, financeiros e institucionais, assim como o grau de comprometimento que pretende atingir. Com base nesses critérios, não

45

Para contornar limitações de espaço, uma boa política é colocar arquivos mais pesados, como som e multimídia, em repositórios externos, remetendo a eles através de links na plataforma. Cf. alguns provedores gratuitos, separados por ponto e vírgula (“;”): www.maiseduc.com.br; http://ninehub.com/; http://moodlelivre.com.br/ninehub/; http://www.educacaonanet.com.br/professores/; http://br-linux.org/linux/dreamhost-hospedagem-barata-e-de-qualidade-com-dominio-gratis 46 O site http://hostingbug.net, por exemplo, oferece planos individuais a partir de 25 euros anuais com 1GB de espaço. 47 Recomenda-se que sejam feitos back-ups regulares. Eles podem ser reutilizados em outros cursos, restaurados em outros servidores, ou mesmo no próprio computador do usuário, para navegação offline. 48 Uma boa opção é cadastrar-se no Moodle Brasil: http://www.moodlebrasil.net/moodle/index.php

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será difícil encontrar o caminho mais adequado na sua passagem para o virtual. Esperamos que o breve roteiro aqui apresentado seja útil nesse percurso.

Referências bibliográficas

GLABONIAT, Manuela, MÜLLER, Martin, RUSCH, Paul, SCHMITZ, Helen, WERTENSCHLAG, Lukas. Profile Deutsch. Munique: Langenscheidt, 2010. (Banco de dados interativo em CD. Cf. página da editora, acessada aos 06/02/2010: http://www.langenscheidt.de/katalog/titel_profile_deutsch_2894_0.html) HESS, Hans Werner. “Online Learning Systems as Mediation between Cyberspace and Learner: Why (and how) teachers (and not primarily students) should become „autonomous‟”. In: German as a foreign language 1/2001. (Disponível em http://www.gfl-journal.de/1-2001/hess.html, acesso em 28/01/2010) MOYNIHAN, Brian Frederick. Finding the Pulse: An Analysis of the Learning Management System Needs Assessment. Chapel Hill: University of North Carolina, 2009. (Dissertação de mestrado. Disponível em PDF no endereço: http://brianmoynihan.com/files/Moynihan-Sakai_Thesis.pdf (acesso: 04/02/2010). OLIVEIRA, Paulo. Minicurso: Aprendizagem Autônoma e Ensino Colaborativo de Alemão. Anais do II Colóquio de Estudos Germânicos "Mito e magia". Araraquara: UNESP, 2007 (CD-ROM, p. 33 e seguintes; minicurso ministrado aos 17/10/2006) . Integrando recursos e demandas com o Moodle. (Palestra proferida no Centro de Computação da Unicamp, aos 05/09/2007. Vídeo online disponível no endereço:. http://www.cameraweb.unicamp.br/acervo/2007.html; acesso em 09/02/2010) . Comunicação: Blaue Blume mit TelEduc: Blended Learning und Vernetzung. Anais do VI Congresso Brasileiro e I Congresso Latino-americano de Professores de Alemão [São Paulo: USP, 2006]. São Paulo: ABRAPA, 2008. (CD-ROM). . Graus de Interação no Espaço Físico/Virtual. In SOTO, Ucy, MAYRINK, Mônica Ferreira e GROGOLIN, Isadora Valencise: Linguagem, educação e virtualidade – Experiências e reflexões. São Paulo: Cultura Acadêmica. (Publicação Digital; ISBN 978-85-7983-017-4; no prelo) OLIVEIRA, Paulo, WUCHERPFENNIG, Norma, VETTER, Anisha. Alemão para universitários: formas híbridas. Cadernos de Letras (UFRJ), v. 24, p. 59-84, 2008. (Cf. http://www.letras.ufrj.br/anglo_germanicas/cadernos/numeros/0X2008/textos/cl24082008panoan.pdf para versão eletrônica; acesso aos 07/02/2010)

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Resumo: Fornecemos aqui um breve panorama do uso das novas mídias no ensino de línguas, num contexto em que os recursos virtuais incorporam-se cada vez mais à prática profissional e à vida privada num mundo globalizado. Vislumbram-se três cenários, com base em diversas situações de trabalho e exigências técnicas, relativas ao profissional de ensino de línguas e ao contexto institucional em que atua. Partindo de recursos úteis em sites da internet (dicionários e gramáticas online etc.), apresentamos também alguns programas para produção de material complementar, chegando por fim às plataformas eletrônicas de ensino/aprendizagem. Palavras-chave: ensino de línguas; virtualidade; ferramentas eletrônicas; plataformas de ensino/aprendizagem Abstract: We present here a brief overview of how to use new media in language teaching, in a context where virtual resources are increasingly incorporated into professional practice and private life of a globalised world. Three scenarios are sketched out, on the basis of different work situations and technical requirements, concerning as well the teaching professional as the institutional context in which he or she operates. Starting with useful resources on Internet sites (online dictionaries, grammars, etc.), we also discuss authoring software for complementary material production and finish with a glance at course management systems. Key-words: language teaching; virtuallity; electronic tools; learning management systems Biodata Paulo S. X. de Oliveira é docente de alemão no Centro de Ensino de Línguas da Unicamp desde 1988, onde foi Diretor Associado (1990-92) e Diretor (2000-2004). Presidiu a ABRAPA (1993-97) e gerenciou a revista projekt (1994-98). Com graduação e mestrado em Neolatinas e Germânicas pela Universidade de Göttingen (Alemanha, 1984), doutorou-se em Linguística Aplicada (Tradução) pela Unicamp (1999) e fez estágio pós-doutoral em Filosofia da Linguagem na Universidade de Graz (Áustria, 2005). Desde 1987, atua também como tradutor e intérprete, sobretudo nas humanidades. Pesquisa e publica regularmente com foco em: ensino de línguas – autonomia do aprendiz e ensino a distância; tradução e interpretação; filosofia da linguagem. Norma Wucherpfennig estudou de 1998 a 2004 na Universidade de Leipzig (Alemanha), onde obteve o título de Magistra Artium em Alemão como Língua Estrangeira e Pedagogia de Adultos. Trabalha desde setembro de 2007 como docente de alemão no Centro de Ensino de Línguas da Unicamp. Áreas de interesse: Didática do Alemão como Língua estrangeira, Formas de Aprendizagem Autônoma e Aquisição de Vocabulário e Avaliação.

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