Pastoral e internet: novas relações com o tempo, o espaço e a realidade

June 28, 2017 | Autor: Moisés Sbardelotto | Categoria: Teologia, Teología, Igreja Católica, Catolicismo, Pastoral, Ministerio Pastoral, Internet, Ministerio Pastoral, Internet
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PASTORAL ENovasINTERNET relações com o tempo,

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o espaço e a realidade

A

internet, hoje, não é um mero “instrumento” de comunicação. Diversos pensadores apontam que a rede de redes é um “ambiente social”, que perpassa todo o nosso dia a dia. E “a comunidade eclesial é incentivada a fazer-se efetivamente presente na internet, já que grande parte da vida social se desenrola mediada pelas tecnologias digitais”, afirma o Diretório para a Comunicação da Igreja no Brasil (DCIB n. 189). Entre as atividades realizadas em computadores, tablets, celulares e outras mídias digitais, cada pessoa e a sociedade em geral passam a desenvolver novas formas de pensar, de experimentar e de viver o mundo. Assim como com o livro, o jornal, o rádio, o cinema, a TV, a internet hoje permite que as pessoas possam se comunicar e se relacionar de novas formas: reduzindo tempos e encurtando espaços, as redes digitais levam a transformar a relação tradicional das pessoas com elas mesmas, com os outros e com o mundo. Gera-se assim um novo O Mensageiro de Santo Antônio

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“ambiente existencial”, “antropológico” e também “eclesial”. Como destaca o Diretório, “as comunidades em redes digitais complementam e fortalecem as comunidades presenciais. Isso exige uma renovada capacidade de dialogar com as pessoas e entender o seu modo de se relacionar, participar e colaborar na construção do mundo, a partir da sua presença nas diferentes mídias” (DCIB n. 183). A pastoral digital, portanto, não diz respeito apenas à missão que a Igreja pode desenvolver “na” rede, mas também a outra forma de pensar a pastoral em geral, articulando-a também “com” a rede. É o chamado a enfrentar o desafio de pensar formas inovadoras de desenvolver a ação pastoral no ambiente digital, mas também a repensar práticas tradicionais na pastoral local a partir das “formas e valores positivos” construídos pela cultura digital. Por isso, é importante tomar consciência das mudanças trazidas pela cultura digital, os desafios por ela apresentados

à cultura eclesial tradicional e, assim, (re)pensar saídas criativas para empreender uma pastoral digital que responda aos “sinais dos tempos” com os quais a Igreja se depara hoje. Nova relação com o tempo e o espaço Os tempos e os períodos tradicionais da vida cotidiana – e também da vida de fé e da ação pastoral – mudam fortemente a partir da experiência digital. Agora, um encontro social pode ser feito a qualquer hora do dia e em qualquer lugar, independentemente dos horários e da localização dos demais interlocutores. O sistema digital encarrega-se de mediar essa interação. Os processos lentos e vagarosos do crescimento humano, espiritual e religioso – períodos, etapas, graus – vão sendo agora substituídos por uma “lógica da velocidade absoluta”, marcada pela expectativa de onitemporalidade (informações disponíveis a qualquer momento) e de

imediaticidade (tudo agora, já). Potencializa-se ainda a realização de múltiplas tarefas simultâneas, o chamado multitasking, nas atividades humanas individuais ou em grupo, gerando uma policronicidade do tempo (vários tempos em um só). Por outro lado, há um deslocamento “espacial” da experiência humana: um evento ocorrido do outro lado do mundo pode ser agora assistido e vivenciado no conforto da própria casa, ou mesmo onde quer que a pessoa interessada se encontre. Instaura-se, assim, uma “lógica da condensação espacial”. Gera-se uma nova forma de presença: uma telepresença, possibilitada pelas mediações das tecnologias. Mas a essência dessa nova modalidade de presença é a não presença, a antipresença: “não é necessário que a pessoa esteja lá fisicamente para estar lá digitalmente”. Assim, também entra em xeque a noção de “participação”: o que significa, de fato, participar? Como consequência, tem-se o aprofundamento de um processo de ubiquização. Ou seja, conectados à internet, podemos fazer inúmeras ações onde quer que estejamos e em qualquer momento do dia – inclusive em movimento. A ubiquização (do latim ubique, ‘em/por tudo’) diz respeito ao salto para uma maior compressão espaço-temporal possibilitada pela conexão de todas as redes digitais. Assim, não apenas as informações, mas também cada um de nós e “todos nós” estamos acessíveis em toda a parte e em qualquer instante, cruzando fronteiras culturais locais, regionais, nacionais e internacionais. Com a evolução dos aparelhos de comunicação móveis (celulares, tablets, entre outros), que não dependem de uma conexão fixa à rede, as próprias noções de “aqui e agora” passam por novas reconfigurações. É a chamada “mobilidade”: mobilidade digital, graças às inovações nas tecnologias da comunicação, somadas e articuladas também com uma maior mobilidade física, graças aos avanços do transporte e da logística humanos. O desafio, nesse panorama, é como construir comunidades fortes, bem relacionadas, que mantenham relações significativas ao longo do tempo. Os dispositivos digitais permitem a interação, a conexão e o compartilhamento da experiência e da vivência pessoal e social independentemente da presença ou da proximidade daqueles que interagem, que

comunicação. Sempre se pensou o receptor não precisam estar juntos “aqui e agora”, no (o leitor, o ouvinte, o telespectador) como mesmo local e no mesmo momento. Entra em xeque também a noção de “presença”: o que alguém “apassivado”, que meramente “engoé “estar presente” hoje, com as mediações lia” o que as grandes mídias lhe ofereciam. tecnológicas que vão além do tempo e do Hoje, percebe-se que não é bem assim. Tamespaço? Assim, a experiência e a prática bém somos “ativos” na nossa relação com as pastorais passam por uma “fragmentação, mídias (inclusive com o livro ou o jornal). A desterritorialização, aceleração”. E a missão, novidade, hoje, é a instantaneidade e a punesse sentido, a missão também precisa reblicização cada vez maiores desses processos. ver a sua “mentalidade pastoral”, para que Essa autonomização também se entrenão se torne uma vivência laça com a “participação”, “distante”, no espaço, e um processo em que cada “anacrônica”, no tempo, pessoa detém um maior “Como discípulos poder midiático nas mãos, em relação à realidade das e missionários mesmo que a grande mídia pessoas deste novo século. de Jesus Cristo, de massa continue detendo faz-se necessário um espaço significativo; Nova relação mas, para as novas geracom a realidade contribuir, ções, as grandes empresas nas redes sociais de comunicação não são A pastoral no ambiente digitais, nem as únicas a deter uma digital também possui uma para a dignificação “voz social”, nem as mais “realidade material” totalimportantes. Portanto, mente própria: informações da pessoa, a pastoral deve levar em numéricas, de dígitos e dacom criatividade consideração esse trabalho dos que podem ser alterados, humilde, como uma em conjunto (co-labor), deletados, recombinados de forma de ‘trabalhar as operações em conjunto acordo com a vontade do (co-operação) no ambiente sistema ou do usuário, à la junto com digital. Em termos pastocarte. Manifestam-se aí duas os demais cidadãos rais, isso significa que a lógicas centrais: uma “lógica e instituições missão deve passar por uma do banco de dados”, em que para o bem do reconfiguração. A partir das os conteúdos são reunidos redes digitais, cada pessoa em uma coleção que pode ser humano’” “reconstrói” o próprio munser buscada, encontrada, do, dá novos sentidos a ele, acessada e pesquisada em um muitas vezes, construindo conhecimentos instante. E, por outro lado, há uma lógica da e relações de sentido que vão além daquilo seleção, em que o usuário é convidado a coque o bispo, o padre, o religioso o agente construir sua experiência de mundo a partir de um clicar de botões, do acionamento de de pastoral leigo preveem ou dominam. A links, elegendo os conteúdos de seu interesimprevisibilidade e a indeterminação passe. A internet, contudo, não “substitui” os sam a fazer parte do horizonte da pastoral. suportes materiais e simbólicos das práticas Por isso, “como discípulos e missionários pastorais tradicionais (centros de pastoral, de Jesus Cristo, faz-se necessário contribuir, livros, encontros presenciais...), mas gera nonas redes sociais digitais, para a dignificação da pessoa, com criatividade humilde, como vos modos de formar e se informar, com novos uma forma de ‘trabalhar junto com os demais recursos e práticas. Em vez de uma lógica da cidadãos e instituições para o bem do ser substituição, a pastoral, hoje, se depara com humano’” (DCIB n. 182). uma “lógica da complexificação”. Como consequência, cada pessoa pode se tornar produtora, criadora, compositora, Moisés Sbardelotto montadora, apresentadora, difusora dos próprios produtos em rede, graças ao maior Jornalista, autor do livro E o verbo se fez bit: a comunicação acesso e facilidade de uso das tecnologias e a experiência religiosas na digitais. Tal processo diz respeito à emaninternet (Santuário) cipação do chamado “polo receptor” da O Mensageiro de Santo Antônio Outubro d e 2 0 1 5

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