Património Cultural de Timor-Leste. As Uma Lulik do Distrito de Ainaro

May 18, 2017 | Autor: A. Fidalgo Castro | Categoria: Timor-Leste Studies, East Timor, Timor-Leste, House Societies
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Descrição do Produto

Patrimonio cultural de Timor-Leste

As uma lulih do distrito de Ainaro

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C O S M a l V f i DE AlNARO E AOS

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PRINC~PIOSBASICOS DA O R G A N I Z A ~SOCIAL ~ ~ ~ ~ A UMA ~ O '"LlK ~ E AL .,

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VlDA CERlMONlfi

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Cos~ov~sAo E UMA LULlK

0 passado e o futuro, os antepassados e as geraqces que virlo, os poderes sobrenaturais e os humanos, o mundo dos vivos e dos mortos, o inanimado e o animado, o dia e a noite, a luz e a escuridio s2o os componentes reiterados nos discursos e na narrativa tradicional timorense. A cosrnovislo local ordena-se numa fundarnentaqlo dualists, que se repite como disposislo articuladora em todas as estruturas sociais e culturais timorenses sobre a ideia da harrnonia: o equilibria entre todos os elementos concebidos em termos diddicos. Esta proposta global de entendimento da vida e da realidade estampa-se na ordenaqlo sociopolitica dos grupos humanos e explicita-se de maneira sintetizada e estilizada nos orgamentos da religilo tradicional, a religilo animista gentil, que celebra os seus rituais e cerirn6nias no cendrio privilegiado das urna lulik. Constitui, portanto, a fundamentaqlo da ordenaqlo cultural em que propomos o entendimento das casas sagradas como expressio da identidade de Ainaro. As casas sagradas ou uma lulik s2o bem mais que uma edificaqio formalmente simples alsada com os materiais pr6prios da ecologia local, segundo os saberes tradicionais da construg20 artesanal. As uma lulik d o a express20 materializada do grupo familiar ao que representam, constituem a natureza do culto animista da religiio tradicional como cendrio privilegiado da praxe ritual e das cerim6nias. AlCm disto condensam, no espaqo da sua estrutura arquitect6nica, o entendimento do mundo dos tirnorenses, os valores sociais que presidem a vida da comunidade e a ordenaqio cultural da realidade, exprimindo sinteticamente a conditlo da identidade timorense.' -: A religi2o tradicional gravita sobre a vinculaqio entre todas as entidades da Terra, . -. . .animadas e inanimadas, vivas e mortas, que procedern todas da mesrna origem . . ' : mitici, urn deus origindrio, o primeiro motor do mundo em sentido aristot~lico,~ . ,.'. ." que criou as deidades primigCnias, o pai Sol e a m i e Terra, origem de todos os ,,; .:.i+ demais. Desta maneira, a relaqlo entre os vivos e os mortos, os antepassados, .:.a T-, e a vincula~lo entre todos os seres hurnanos e os entes naturais e sobrenaturais .-::slo a base dum culto animista promovido sobre a propicia520 da fertilidade ' ncomo elemento constitutivo essential para a vida humana. Nesta disposi~io,a adorag50 produz-se no dmbito familiar, a uma lisan, entendida no ;entido da F o t g r d h #. Cem&&io fam$iar rra uma Mik tlinhagem extensa A que slo adscritas as pessoas por nascimento ou por Tau Udi. wco Maubtss~. ' -%-:?

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Fotagrafia 29. Raando aos antepassado5 no cemitbrio do suco Suro-Craic.

casamento, e da que tambem fazem parte os antecedentes e os ainda nfo nascidos, na reuniio dos diferentes niveis da realidade: o ultramundo e o mundo sensivel. Portanto, a uma lulik C o emblema da continuidade, entre todos os dmbitos da realidade e entre os diferentes tempos que estabelecem o continuum da existtncia. Este culto familiar C oficiado pelos especialistas em rituais tradicionais, lulik-na'in ou kuko, que pertencem a cada uma das uma lulik. N2o s6 executam os ritos no seu pr6prio meio senfo que em ocasides desempenham fungdes rituais para toda a comunidade, bem pela relevdncia da sua uma lulik na hierarquia social e religiosa, ou bem porque a essa casa particular Ihe corresponde exercer algumas cerim6nias especificas numa incipiente especializagfo proto-estatal. Quanto h pauta de celebrag20 destes rituais, o intercdmbio 6 o componente blsico, j l que se procuram a consolidagio e a representagfo do equilibrio. Por isso, fd-se-fo entregas reciprocas de diferentes elementos, como objectos sagrados, animais, alimentos, que em muitos casos ser2o consumidos colectivamente segundo uma ordem hierdrquica social e ritual, como parte da cerim6nia. No caso do intercdmbio com os espiritos, a entrega consiste no sacrificio ritual ou bem na simboliza~fodos mesmos em diferentes intermedilrios. A mljsica e a danga rituais e a oragio -keo em mambae e hamulak em tetun- sfo os instrumentos dessa execugio comunal, orquestrada pelos agentes cerimoniais litljrgicos tradicionais e os representantes das diferentes uma lulik. A oragfo tira a sua essCncia dos discursos e da narrativa oral, na voz daqueles possuidores do conhecimento privilegiados e o dom da orat6ria. 0 poder das palavras 6 a pedra angular do respeito e do prestigio na sociedade timorense, onde as fungdes pljblicas descansam nos senhores da palavra, os l i a - n a ~ i n . ~ AlCm disso, os seres humanos gragas h sua capacidade para falar t t m uma responsabilidade com os seres naturais e sobrenaturais que foram deixados sem voz no inicio dos tempos. Portanto, estes senhores da palavra t&m a capacidade de falar com e pelos mesmos e restituir mediante o sacrificio os dons com os que tCm favorecido os humanos no devir quotidian0 da vida terreal. Por isso, tambCm junto com a palavra, o mama t i outro elemento fundamental da oragio enquanto permite abrir a comunica~foentre os diferentes mundos. Mascar areca e betel faz parte indispenslvel da adoragfo ritual.

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A NATUREZA, A MORTE E A VIDA NA COSMOVISAO NA UMA LULlK

f w & q d a3d Cemrtbrio familiar na uma lulik iau Udi, suco Maubisse

Mrgrfir 31. Cemiterio familiarna bu Udi, suco Maubisse.

lulik

A promoglo da fertilidade e esta perspectiva da continuidade tomam corpo no respeito e a devoeo pela natureza. No meio natural reconhecemse pocos de igua, rios, iwores, grutas ou montanhas sagradas e os vinculos com a natureza sio incorporados no espago da uma lulik na representaslo da pedra e da madeira, elementos naturais reificados na praxe ritual como distintivos dessa relasio com o meio ambiente. A pedra e a madeira, [cones de devogio, foram entregues aos antepassados pelas deidades primigenias e constituem fonte de poder e representaglo da comunhlo de todos 0s seres. Por isso, os a;-to'os sintetizam nos espagos da representaQo social a pedra e a madeira, da mesma forma que os hali. A esta dualidade une-se a simetria do feminino e do masculine na representaglo das 6 ~ 0 t - mane e ~ e feto -homem e mulher- e do bee mane e bee feto (6gua homem e igua mulher) no entendimento do equilibrio do mundo que tambem inclui a simetria de homens e de mu~heres.~ Todos estes elementos slo simbolos da natu-reza e dos mljltiplos niveis da experiencia que transcendem a realidade humana. A contemplaglo metafisica da natureza complementa-se com a d e v o ~ l opelos antepassados, aos que se venera numa contiguidade consagrada entre os vivos e os mortos. Em sintese, a continuidade ontoldgica entre o mundo natural, humano e sobrenatural constitui um principio fundamental de entendimento da vida local. Temporariamente estabelece-se uma relaglo conceptual que incorpora, num entendimento circular, passado, presente e futuro, que se localiza na sacralizaglo de espasos naturais emblemiticos, como rios ou montanhas, essencia da permanencia, para alem da fugacidade da vida humana. Portanto, os espagos naturais sagrados sio caracterizados pela sua prdpria definigio lulik, enquanto lugares de devogio espiritual, mas tambCm pela relagio com os

antepassados, tanto os falecidos e recordados no relato familiar, como os miticos protagonistas das narragdes cosmogcinicas. Dois exemplos concretos ilustram esta dimenslo espacial e temporal da cosmovido: a reverCncia pelo Monte Ramelau e o Caminho dos Mortos.

0 Caminho de Balib6 ou Caminho dos Mortos C a senda percorrida pelas almas dos defuntos no seu pCriplo ao Ramelau antes do descanso definitivo. N l o h i um Linico caminho estabelecido, sen50 diferentes ramais que confluem na montanha sagrada. 0 s mortos n8o precisam uma rota fisica por isso se lhes descreve avan~andomesmo em veiculos motorizados por escarpadas montanhas B margem de qualquer tragado fixado pelos humanos. 0 s vivos podem v@-10se mesmo falar com eles, mas n l o lhes entregarlo bua-rnalu2 se Iho pedem, signo inequivoco de que estlo mortos. Igualmente, nada mais lhes dar as costas perdese qualquer sinal dos mesmos e desaparecem instantaneamente. Nas orag6es aos antepassados rezadas nas uma lulik os nomes dos lugares significativos que compBem este caminho ao Ramelau slo recitados como reconhecimento do trhsito, vinculando a espacialidade na Natureza com a temporalidade da vida e da morte.

A designagio Ramelau -termo que significa muitos montes- procede da 6poca do colonialismo portugues e faz referencia ao conjunto de montanhas que formam a serra. 0 nome traditional era Tatamailau -que reline as palavras antepassado, uir e monte-, cuja dificil tradug5o poderia significar "o primeiro de todos os av6sn ou "a montanha A que vlo todos os av6s". Nesta Liltima acepglo o monte considera-se um destino tempor6rio das almas dos mortos antes da sua partida definitiva a outro mundo (rai seluk). Nesta consideraglo 6 sobre o destino dos mortos, as suas almas (matebian ) peregrinam ao Ramelau enquanto esperam a celebrag50 da cerim6nia que finalmente separi-10s-6 do mundo dos vivos. Neste trdnsito passam do estado de matebian (almas de mortos), a bei'ala (antepassados), convertendo-se em antepassados. Enquanto slo mate-bian os mortos s5o recordados (hanoin'), continuam a ser uma referencia para os vivos, mas quando se convertem em bei'asa, contemplam-se como parte doutro mundo e considera-se tabu a pronlincia dos seus nomes como 8 invoca@o (fanun-matebian ) ao mundo dos vivos (temi), except0 em context0 ritual. '.. - * . . ; , : ,$; I;: * .;,i

FotosrPfia 32.Caminho dos mortos (matebian dalan) em Hatobui'icoj6 nos contrafortes do Ramelau.

PatrirnGnio cultural & Timor Leste ( As Urna Lulik no sfistrito de Ainaro

Outra das denorninagbes do Rarnelau faz refersncia 2 centralidade do rnesrno na cosmologia tirnorense. Denomina-se Rai Husar (urnbigo da terra). Urna das formas de cornpreender a orientas20 da terra na organizagio cognitiva tirnorense 6 a utilizac;io metonirnica de partes do corpo hurnano corno indicadores de localizaq20 geogrifica. Neste sentido, se o ernbigo hurnano faz referencia ao ponto central em uma localizaq20 (Traube, 1986:29), o Rarnelau corno rai husar 6 considerado o centro da terra. A sacralidade do Rarnelau encontra corn frequgncia express20 em prdticas quotidianas que se v i o perdendo pouco a pouco. Por exemplo, at6 faz relativarnente pouco tempo, algurnas pessoas quando carninhavam por carninhos desde os que se divisava a rnontanha sagrada, n2o algavarn a vista por rnedo a falecer ao achar que a sua conternplaqio irnplicava ser charnado ao rnundo dos rnortos. Ao aprofundar no significado desse devir e dessa convivencia de vivos e mortos na geografia vital, constata-se corno a vivCncia e a percepglo da rnorte conforrnarn a idiossincrasia da tradiq2o tirnorense. A rnorte n5o constitui urn elernento negativo nern ternido na formulas50 conceptual. Vida e rnorte sio duas caras da rnesma rnoeda no entendirnento circular do tempo que rnencionivarnos rnais acirna. A fertilidade outorgada pelos espiritos e a natureza requer a reincorporag20 dos seres hurnanos a estes principios bhsicos. E nesse sentido, o Rarnelau 6 a rnontanha sagrada por antonomisia, emblerna da origem e do final, da conex50 de todos os niveis do Cosmos. Se geograficamente C a rnontanha rnais alta de Tirnor, visivel desde longa distdncia e mesrno desde virios distritos para alCrn de Ainaro, ritualrnente 6 o principio e o firn, espago das deidades prirnigenias, destino de peregrinagces de vivos e mortos, essencia da ritualidade estilizada que representa a cosrnovisio local.

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c a ~ n h omr Mutm rm Cade Balibb, a seu pass p b manre BaliM, rn da aldeia Sariala(Maubissel.

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Nesta convivCncia de vida e rnorte, os antepassados s2o reverenciados na urna lulik onde s60 representados sirnbolicarnente. Esta presenqa pode concretizar-se de duas rnaneiras principais. Em prirneiro lugar, mediante objectos de uso pessoal que os falecidos rnanejavam na sua vida quotidiana, corno o kohe ou recipiente para o ahu. Em segundo lugar, atraves da conservag20 e reverCncia das ossarnentas dos anirnais sacrificados nas cerirn6nias de cornemoragio que protagonizaram nos seus funerais. Cabegas e cornos de birfalos e de cabras s2o depositadas em espasos rituais na uma lulik durante o longo ciclo de celebragio funeriria, que pode cornpreender rnaiS de quinze anos, at6 que Se executarn

Patrim6nio cultural de Timor Leste I As Urna Lulik no distrito de Ainaro

todas as cerim6nias que acompanham ao falecido na sua viagem. Estas oferendas e representasaes tamb6m se utilizam subsidiariamente para personificar os ausentes, e salwaguardar ritualmente o seu vinculo corn a urna lisan (familia no sentido de linhagern) at6 a sua volta. 5 . ,;+:&q*

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0 SINCRi3ISMO COMO V/NCUW

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PASSADO E DE PRESENTE: A HISTORIU~~ODA

A devoslo pelos rnortos complementa-se com o prdprio enterro dos falecidos no perimetro tanto das casas sagradas como das pr6prias rnoradias. Este costume tern dado lugar, depois da converslo dos timorenses ao catolicismo, a convivencia . nas urna lulik dos elernentos da religilo animista corn cemiterios cristios numa atraente prltica de sincretismo. Este sincretismo estende-se tambern corn a construslo de diferentes edificios religiosos, como a Cruz Jovem, nas proximidades das urna lulik ou bern em diferentes localiza~8essagradas corno as montanhas de origem de algurnas casas sagradas. Em sentido oposto, muitos dos elementos reverenciados e particularmente significativos na tradi@o timorense m r f i r 34. Rio Bee Lulik (Agua sagrada), tCm passado a fazer parte do meio das igrejas cristis, como os ai-to'os presentes perto de seu nascirnento. na maioria dos ltrios eclesiais. Em consequencia, o sincretismo pode ser compreendido em termos da vincula@o do passado e do presente de Tirnor. Trata-se da historiza@o da tradisao tirnorense na incorporaszo das dindrnicas de evolu@o sociocultural, que transformam a realidade local e impregnam a expresslo dos novos elementos na ressignifica~lo dos simbolos que expressarn valores e realidades mudadas.

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Por isso, o sincretismo n l o 6 exclusivo da esfera religiosa senlo que tambern se incorporou no lmbito politico. Se as uma lulik slo ernblerna por excelgncia da identidade tirnorense no sentido da imersfo das pessoas no grupo social da familia e da linhagem, as novas circunstdncias sociopoliticas dotararn-nas de novos significados no entendimento da realidade estatal. A dramltica represslo indonesia, que se rnaterializou patrimonialrnente na queima de urna lulik como forrna de avariar o vinculo corn o passado da sociedade tirnorense, tern gerado uma nova expressividade das mesmas como ernblema de Timor-Leste como pais, para al6m da identifica~lodas mesrnas como emblerna familiar, de vinculo corn a natureza e corn os antepassados. Na constru@o do novo Estado dernocr8tic0, portanto, as

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re,

ografia 35. Monte Ramelau (Tatamailau).

casas sagradas simbolizam a nova liberdade, a democracia e a sustentagio da Independencia sobre a hist6ria e a tradigio. Por isso, os lideres e os partidos politicos tambCm utilizam o sincretismo politico, a fusio com a tradiglo, incorporando a arquitectura sagrada, como instrumento de comunicaglo e IegitimaGo politicas.

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UMA LULIK COMO

CENARIO

D M CERIM~NIAS

A cosmovisio timorense ordena-se sobre a ideia do equilibrio, entre o passado e o futuro, os antepassados e as geraqties que virlo, os poderes sobrenaturais e os humanos, o mundo dos vivos e dos mortos... Este equilibrio deve ser renovado, fortalecido e restaurado periodicamente no ciclo ritual. Por isso, a cosmovido timorense condensa-se na celebraglo colectiva de cerim6nias e dos rituais, que actualizam e interpretam os vinculos da comunidade e a sua comunhio com a natureza e com os antepassados. Ademais, as cerim6nias n i o s6 funcionam num plano espiritual de actualizagio de crengas sen20 que no dmbito sociopolitico representam e reproduzem a reciprocidade, a hierarquia e a estrutura social ... As uma lulik sio o centrrio privilegiado e obrigado destas celebragties como espago ritual essential. No plano temporal, as cerim6nias

funcionam como vinculo e como recordativo do passado, da hist6ria compartilhada, e da inerente relag50 dos vivos com os antepassados falecidos e as geraq6es futuras neste entendimento global do tempo e do devir da linhagem.

-3t-Dan$atradicionalenHatobui-

lice.

Desde um ponto de vista analitico podemos distinguir duas classes de cerim6nias bisicas: aquelas que se celebram periodicamente, seguindo uma pauta ritual ciclica, quer anual quer mais prolongada, e aquelas cerim6nias pontuais que tCm lugar em ocasi6es excepcionais motivadas pelas circunstbncias, como pode ser uma desgraqa causada por urn fen6meno climdtico ocasional. Neste ~jltimocaso, os especialistas rituais tradicionais (0s lulik-nain ou kuko) d o os responsdveis de determinar que elemento ou que circunstlncias tCm invalidado o equilibrio c6smico bisico, por exemplo, irritando os antepassados, e facilitarso a recuperagio da harmonia mediante os rituais adequados para os quais estipulario tanto os participantes, como o procedimento, seguindo as pautas da tradiqlo e a sua sabedoria. As cerim6nias ciclicas agrupam-se segundo dois principios fundamentais da ordena~ioda vida social: os ritos de passagem e as cerim6nias de produ~io.0 s ritos de passagem marcam a transig5o durn estado a outro na vida dos Seus

Mulherescom baba-dookparticipando de urna cerim6nia. Hatobuilico.

F o t o g r h 39. Santuario ou Bosok dos avbs ou ancestros Mamugum e Dausala. Arvores feto (prirneiro plano) e mane (fundo), mulher e homem.

protagonistas, ao ser a celebraglo do nascirnento, o casarnento e o funeral as As cerirn6nias de produqlo ordenam a sequCncia da cerim6nias f~ndamentais.~ actividade agropecudria, porque nestes processos n l o s6 estio implicados os meios de produqlo, senlo que na vinculaqlo cosrnovisiva com os espiritos do passado e a natureza -as raizes da sociedade tirnorense- estas outras esferas devern ser contempladas como elementos activos na fertilidade e no bem-estar humanos.

Esquctda. kt0g.A.40. Santuario ou Bosokdos avBs ou ancestros Mamugum e Dausala, dedicado a cerimonias de produ~2odo Sau Batar. Aldeia Boltana, suco Cassa. Arvore feto ou mulher (avb Dausala). Direita. Fotognfi. 41. Santuario ou Bosok dos avBs ou ancestros Mamugum e Dausala, dedicad0 a cerimonias de produc2o do Sau Batar. Alde~aBoltana, suco Cassa. Arvore mane ou hornem (avB Mamugum).

As cerim6nias podem envolver basicamente aos membros duma uma lulik, e os seus parentes relacionados na estrutura directa de parentesco derivada dos intercdrnbios matrimoniais, ou bern a vdrias uma lulik, quando se trata dum ritual que congrega a participaqlo de diferentes casas dum territ6rio. Neste segundo caso o ritual, como convenqfo estilizada p8e de manifesto a estrutura hierdrquica que ordena as diferentes uma lulik fundamentada na antiguidade, o poder sagrado e politico, e as responsabilidades rndtuas. Esta celebraglo colectiva tarnbCm p8e de manifesto a cooperaqlo entre linhagens e os direitos e as obrigaqees rnlituas. A celebraggo de cerim6nias enche de vida as casas sagradas e os seus meios, actualizando e reactivando em cada representaqlo as relagees que vincularn a comunidade.

Patrimbnio cultural d e Tirnor Leste I As U m a Lulik n o distrito d e Ainaro

Muitas das cerimdnias de produGo celebram-se, por isso, ou deveriam faze-lo num paradigma ideal -que n i o sempre se cumpre por circunst2ncias diversasde forma colectiva num trdnsito ritual para as uma lulik de origem. Outras cerim6nias de produglo oficiam-se individualmente, em cada uma das casas. E 2s vezes, nas cerim6nias de produGo celebradas em cada urna das casas sagradas requer-se a participaqio dum especialista ritual da comunidade, que exerce uma funqio exclusivamente atribuida a uma urna lulik para o bem-estar de toda a comunidade. As cerimdnias de produqio, em boa medida, actualizam e sirnbolizam a relaqio de interdependencia entre a vida das pessoas, a natureza e os antepassados, que se fundem com a mesma. Na rela@o fundacional os seres da terra sio os garantidores e os facilitadores da fertilidade e, portanto, do bem-estar dos humanos, ao oferecer os alimentos e 0s bens necesslrios para a sua sobrevivCncia. Em reciprocidade os humanos devem pedir permisdo e agradecer a sua generosidade 5queles que n l o tern voz restabelecendo o equilibrio primordial. Desta maneira, as cerim6nias de p r o d u ~ l obalizam o ciclo anual de

cultivo, desde a petiqlo das chuvas 2s permissBes para roqar e arar a terra, semear e mesrno consumir os bens produzidos. Urna das cerirn6nias mais significativas das celebradas nas uma lulik de Ainaro -igual que numa boa parte do pais- C o Sau ~atar," destacado pela importzncia da cultura do milho entre os cultivos do distrito. Tern como funqio levantar a proibiqio ritual de se alimentar do milho novo semeado, substituindo o apanhado no ano anterior. Considera-se que a ingestio prCvia do milho nio abengoado provoca desgraqas e mesmo a morte, ainda que o costume pragmltico 4 designar s6 uma pessoa em representaglo da casa -normalmente o cuidador da uma lulik ou da uma liras- que deve observar a proibigso at6 a celebraglo da cerimdnia, libertando os demais membros da familia desta obrigagio. A cerim6nia em si consiste em oferecer o milho novo ao rai-na'in para que o coma antes que as pessoas, de forma que se reconhece a divida corn

. FaogrnwSantuerio ou Bosok dos avds ou ancestros Mamugum e ~ausala.Arvoremaneou homem(avd~amugum).~etalhe altar de pedra. EMI). mogrh 43. Santuhrio ou ~~~~k dos avds ou ancestros Mamugum e ~ausala.~rvore feto ou mulher (avB Dausala). Detalhe.

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Fotegrafia 44. Cornarnentas rituais de bufalo (karau dikur) e cabrar lbibi dikud, sacrificados em cerim8nias.

aquele gragas a quem se obtCm alimentos. lgualmente sacrificam animais (frangos, cabras e porcos) que Ihe entregam como oferenda. Numa primeira fase, a comunidade em conjunto celebra a cerimbnia, oficiada por um ou vdrios kuko, naqueles lugares considerados sagrados para todos, pela sua relatao com os antepassados primigenios do lugar e que podem ser montanhas, 6rvores, rios... Uma vez se levantou a proibiglo neste lugar compartilhado, a cerim6nia do Sau Batar passa a se celebrar em cada uma das casas da comunidade, seguindo a ordem hier6rquica do lugar, de maior a menor relevincia. 0 kuko de cada uma das casas serd o encarregado de celebrar o Sau Batar nas respectivas uma lulik. FAM~LIA, RITUAL E ESTRUTURA SOCIAL

0 s principais ritos de passagem comemorados slo o nascimento, o casamento e a morte. Estes marcadores do ciclo vital dos humanos se solenizam em cerim6nias que fortalecem as relagaes entre as linhagens aparentadas por afinidade. Na composi~Zoespiritual timorense os trCs processos estzo indissociavelmente unidos, o nascimento 6 fruto do casamento, e este e os funerais slo duas caras da mesma moeda, as cerim6nias branca e preta de tributo A fertilidade. Na Fob&ie 45. Ossamentas rituais de porcos (fah~hasan) sacrificadosem cerimbnias. Uma lulik Koli Tara, Hatubuilico.

Fetografia 46. Sincretismo religioso. Ai-to'os no atrio da igreja de Maubisse.

primeira, a fertilidade 6 reclamada para os vivos, que conceberio geragdes futuras, "geraqio", e nos funerais devolve-se natureza o que Ihe 6 pr6prio e o falecido reintegra-se com os antecedentes naturais e antepassados. A ordenaslo da sociedade timorense gira em torno a dois principios estruturais. Por urna parte, as linhagens articuladas a partir das relaqbes de descendencia e por outra, as relagdes de afinidade estabelecidas entre estas linhagens na dualidade (diade) umane-fetosaa." A economia, a politica, a vida cerimonial, as hierarquias, a justiga ... radicam nestes dois fundamentos de organizagio social e ritual. Em Ainaro encontramos duas formas besicas de organizagio da adscrigio dos individuos a uma linhagem -nilinearidade matrilinear e patrili-near-, enquanto o vinculo de linhagens estabelece-se essencialmente a partir das relagdes forjadas no

casamento. 0 s mambae e kemak estio organizados po estrutura de parentesco patrilinear: os var6es sio adscri nascimento 2 linhagem dos seus antepassados vardes, en as mulheres nascem numa linhagem e incorporam-se a depois do casamento. Esta deslocagio das mulheres con vinculo bisico de relagio entre duas linhagens, a pa estabelecimento da relagio umane-fetosaa; umane 6 a lin da que sai a mulher e fetosaa, aquela 2 que se incorpo casamento. A relaglo entre estas duas linhagens nZo se li cerim6nia matrimonial senio que continua durante geragd bunak sio matrilineares pelo que a adscriqlo i linhagem por via materna. Por nascimento tanto homens como mu sio adscritos 2 linhagern da sua rnze e ambos permanece mesmo durante toda a sua vida, de maneira que os home

I er~rramna linhagem das suas esposas depois do casamento. A residencia do novo casal serd uxorilocal e os filhos do casal serio adscritos ifamilia da m5e.

%qxa&n..R Pedra de sacriflcio ritual de anillla13r: ue ~ r d ~ ~ z ade @ oorhculos, chamada Maubisse, no conjunto de uma lulik Maubisse Maulako Sidau Lakoda, suco Maubisse. Inferior. FotogfafiaShctstbnromligm. iincretismo religiose. Cruz Maubisse.

ti-to'os em

Ainda que estes sgo os principios gerais de adscrigio a uma linhagem, em diferentes ocasiaes esta pauta 6 alterada. Desta maneira, 2s vezes celebram-se casamentos entre os bunak nos quais tanto a esposa como os descendentes s2o adscritos ilinhagem do pai, mediante um arranjo similar ao seguido pelos patrilineares. Ou bem, o serui~odo noiuo ou a cessio dos direitos de descendencia i linhagem da esposa invertem a regra dos mambae e os kemak.

indissociavelmente unidos num circulo aleg6rico da cosmovisio timorense. Na relagio ideal, o casamento n i o se celebra s6 entre dois membros das familias, senio que se repete numa pauta intergeracional na mesma ordem de reciprocidade. Para continuar, o modelo de intercdmbio generalizado que no seu momento explicava Levi-Strauss, o casamento preferencial ser6 com a prima cruzada matrilateral, a filha do irmio da mie, de maneira que as mulheres seguem o caminho tragado pelas mulheres da linhagem. Da mesma forma, o sentido inverso do caminho esti proibido porque nlo se pode reverter a relagio umanefetosaa.

0 casamento celebra-se mediante o barlake, que constitui o acordo e o intercdmbio de bens entre a familia da noiva (umane) e a familia do noivo (fetosaa). A cerim6nia matrimonial tem o seu reverso direct0 na celebragio dos funerais, de maneira que os rituais por antonomisia da vida e da morte, do dia e da noite, da luz e da escuridio, estio

0 barlake ordena-se em diferentes etapas nas que se relinem ambas familias. Sio necesdrias diferentes fases (tuku odamatan, bee manas ai tuka e o pr6prio barlake) nas que se trocam diferentes bens entre as familias de ambos contraentes, envolvendo mais ou menos parentes da familia extensa. A familia da noiva contribui com bens

F o t o p r f i 49. Sincretismo politico em Hatubuiiico.

fernininos como porcos ou arroz e a famflia do noivo, com bens masculines, como bljfalos ou cavalos. A entrega total de bens pode ser completada antes da convivgncia dos noivos ou demorar-se durante toda a sua vida, de maneira que se v l o contabilizando as entregas que tern lugar nas diferentes reunities cerirnoniais, particularmente em ocasiio dos funerais. Em tempos passados, finalmente quando tinha lugar a apresenta~loda prenda ou do barlake propriamente, umane e fetosaa reuniam-se na cerim6nia de intercbmbio. Dentro da casa congregavam-se os familiares directos e os portavozes encenando a transmisslo de bens, pessoas e direitos sucess6rios. Fora os demais parentes comem, dan~ame cantam durante toda a noite, que os c6njuges passam juntos pela primeira vez. Pela manhl, a saida do sol, a mulher vai com a sua nova familia a casa do marido, a sua nova residCncia e linhagem. A apresenta~loda esposa como membro da uma lulik de destino tem lugar posteriormente numa segunda cerim6nia.

A relaeo entre umane e fetosaa nlo 4 simCtrica senlo que umane, como familia de origem das mulheres, que slo criadoras de vida el portanto, principio da fertilidade, encontra-se numa posiqlo superior. Esta disposiqfo desigual tmduz-Se

~ o t o g 50. a ~ i - t o ' o sda uma lulik Ma, em suco Fatubessi.

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P. Kuko de Tartehi, depois de realizar oraculo.

nos direitos e deveres reciprocos. Desta maneira, n l o s6 fetosaa deve fazer uma contribuiqBo maior no barlake para compensar a deslocaqlo da mulher da sua casa de origem e a cesslo dos direitos de descendencia, senlo que as suas obrigaqces se mantCm em cada uma das cerimdnias compartilhadas. Fetosaa deve contribuir com bens em cada uma das mesmas e na praxe ritual sublinha-se a sua subordinaqBo. Assim, por exemplo, quando se inaugura uma nova uma lulik, s6 umane tem o direito de cortar o capim (palha) da ~oberta.'~ Como at6 que n i o se celebra este ritual a nova casa sagrada nZo se considera completada, fetosaa depende de umane para a consagraqlo deste ritual nuclear de fertilidade. A colaboraqlo umane-fetosaa volta ser particularmente substancial nos funerais para acompanhar o trdnsito dos falecidos ao outro mundo. N l o s6 participam os parentes directos do morto, senlo os umane originais da uma lulik, os mais antigos -da m5e da mle, e da mBe da m2e da mie- e os mais relevantes. Igualmente, apresentam-se os diferentes fetosaa, nos que se integraram as filhas da familia.

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Patrin6nio cultural de Timor Leste As Uma Lulik no distrito de Ainaro

Todos acodem para cornernorar a vida do defunto e participar na sua reintegrago corn os antepassados e com a natureza. Fundarnentalrnente celebram-se tres classes de cerim6nias funerdrias: o enterro propriarnente diio, o Kore Metan, celebrado no prirneiro aniversdrio e o ~ a k om i ate,'^ que conclui a viagern ao outro rnundo. Esta liltima cerim6nia celebra-se um tempo indeterminado a p b o enterro e normalmente reline-se a celebragio do trdnsito de vdrios falecidos, jd que o prescritivo sacrificio de animais e a necessdria participagio daqueles parentes rnais afastados, converte-a num gravoso cornpromisso.

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UMA WLIK COMO PRINC~PIODE IDENTIDADE

As urna lulik constituem o ponto focal do protocolo cerirnonial tirnorense. Neste espago privilegiado se explicitam as relag6es sociais e a concepqio sagrada da existencia. A uma lulik coloca os vinculos farniliares e a praxe ritual fortalece as relag6es dos rnernbros da cornunidade na estilizaglo das cerirn6nias. A reciprocidade que pauta a concepglo do equilibria favorece a cooperagio entre as pessoas e as farnilias, aparentadas pela estrutura essencial do barlake na dualidade assimhtrica de urnane e fetosaa. As uma lulik tarnbkrn representam a

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Fotograffr 52. Cesta ritual para o bua-malus (mama fatin) uma KufLj-Darufli, lice.

Patrim6nio cultural de Tirnor Leste 1 As Urna Lulik no distrito de Ainara

permanCncia e os laqos corn o passado e as mliltiplas dirnensdes da realidade, que incorporarn a natureza e o rnundo dos espiritos. Em todos estes sentidos, encarnam n i o s6 urna concepqio espiritual senio urna construqio social da realidade que segmenta e relaciona a diferentes grupos nurna cooperaqio produtiva imprescindivel para a sobreviv@nciada comunidade.

0 decorrer da hist6ria tarnbCm se deixou sentir na significaqzo das casas sagradas. 0 significado familiar, associado iurna lisan, estendeu-se ao entendimento duma nova nasio que engloba a todos os cidadios. A conversio ao catolicismo dotou

-- . Porta corn selos talha os na rnade~raI , teriormente destru~dos,na ma lullk Darlau, suco Nunurnogue Fundo altar e certrnonlas

p 62-63 Fotq

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54. Altar corn figuras muladas dos ,.......?ires ancestros na urna lullk DarH,I suco Nunurnogue

p, 6443. I

8.66

$tografia 55. Kuko e altar na urna

de novos sentidos os elernentos tradicionais numa leitura cristz dos antigos preceitos. A praxe ritual proporciona dimensties sagradas aos drnbitos em que se executa, de maneira que se reveste de cardcter lulik de maneira transitdria ou permanente aos espaqos de celebraqio, sejarn moradias ou drnbitos naturais. Mas o ancestral sentido da sacralidade tirnorense 6 entesourado nas urna lulik, que s i o reconstruidas no novo Estado corno emblemas duma identidade conservada com sofrirnento ao longo da histbria, expresdo da perseveranqa do povo de Tirnor.

i l ~ kLoko Meta

Entre as numerosas cerirnbnias desenvolvidas nas uma lulik, ocuparn um lugar de destaque aquelas cerimdnias relacionadas com a produgio agricola. 0 trabalho e os seus frutos devem ser ritualizados ciclicamente, renovando a afirrnagio da ordem e a coesio social e a cornunhio entre os rnembros de urna comunidade. Algurnas destas cerimbnias, presentes sob urna ou outra forma nas diferentes regides de Timor, com as suas diferengas e rnatizes locais, corn denorninagties dispares, sio as seguintes. Cerirn6nia Kero We/Udan. Realiza-se para evitar a chuva. A pessoa que celebra esta cerim6nia n i o pode beber dgua nern ser tocado pela dgua, nern mesmo se pode lavar. Unicarnente poderd comer milho fritado e cornidas secas e beber vinho. Se esta pessoa n i o seguir as regras, a chuva continuard a cair. Cerirn6nia Ke'e Be Liman/lrriga@o. Realiza-se quando se leva a cab0 a irrigagio do terreno. Mata-se um 6vido ou um porco corn cujo sangue se rega a terra que vai ser trabalhada. Cerirn6nia Fase Karau Ain. 0 objectivo desta cerim6nia 6 dar a conhecer A urna lisan o inicio da 6poca do arroz, e dar novo alento aos blifalos para viverern de rnaneira convencional e conseguir que tenharn rnuitas crian~as no futuro. Cerim6nia Fo Han Rai Lulik. Cerimdnia para aurnentar a fertilidade da terra. 0 Lia-na'in sustenta o figado de um porco, de urn 6vido e de um frango, enquanto o Lulik-na'in Ihe reza (harnulak) A terra para pedir "matak-malirin". Cerirn6nia Tara Bandu Boot. Matarn-se um blifalo, urna cabra e um porco pretos, cujo sangue esfregar-se-d em urn ram0 de nozes de areca (bua saren), que ficard pendurado em urn lugar ou planta que esteja elevado.

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Patrimonio cultural de Tirnor Leste I As Uma Lulik no distrito de Ainaro

semelhante n l o responde a urn linico sentido, pois estas construq6es adquirem significado dentro da 16gica particular da cosrnovido local, dado que n l o falarnos de urn patrirn6nio arquitect6nico mas, sobretudo, de bens culturais que tem urna dirnensio irnaterial, mais relevante do que os pr6prios aspectos formais.

A compreensio das urna lulik timorenses tem de considerar o devir hist6rico especifico do pais, em contacto corn os portugueses durante longo tempo. precis0 banir a ideia de que o tradicional 6 "ancestral" e que se trata de urn povo sern hist6ria, motivo pelo qua1 n l o teria relevancia nenhurna qualquer acontecirnentodos liltimos sCculos. N l o podernos pensar que o facto colonizador separado -holandCs/portugu@s-, a religilo, o tip0 de relaqlo entre autoridades locais e agentes colonizadores, a diferente influencia econ6rnica que uns e outros exerceram, etc., sejarn factores que n i o tenharn influido na construqlo diferencial da identidade. A integraqlo de sirnbolos portugueses na 16gica e nas urna lulik timorenses converte-se assim nurn elernento configurador especifico de urna histhria particular. No contacto com o exterior, qualquer sociedade interpreta desde os seus pr6prios c6digos culturais as rnudanqas ex6genas introduzidas pelo colonizador. lsto aconteceu na t r a d i ~ i o das casas sagradas. Sirva de exemplo a renovaqZo do relato cosmol6gico fundacional em que os portugueses forarn interpretados como o irrnlo rnenor que tinha partido no corneqo dos tempos com os bens simb6licos que representavam o poder A adrninistrativo, e voltavarn para se fazerem cargo das suas obrigaq6es. Esta representaqio simbdlica C cerimonialrnente interpretada e actualizada nos ritos celebrados na urna lulik. A presenGa de espadas e bengalas de cornando portugueses perfeitamente integrados corn os surik e rotas aut6ctones constitui urna evidencia material dessa hist6ria da comunidade, que se revalida como recurso identitirio. 0s objectos patrimoniais sio rnet6fora e sirnbolo desse passado partilhado.

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No Lrnbito da cultura timorense, as urna lulik constituern basicamente urna concepqio espiritual que se deve corporizar para tomar entidade presente e afirrnar a vigencia da urna lisan. As linhagens tern urna existCncia muito real, reafirrnada constanternente na praxe social, nos direitos e obriga~zesque vinculam As pessoas e regern questties t l o pragrniticas corno a residCncia, a obtenqzo de urn emprego ou as contribuiq8es de alirnentos e dinheiro. PorCm, os simbolos s l o construidos pelos seres humanos enraizados em elernentos materiais que os fazern presentes e funcionam como recordativo permanente dos significados condensados. Seguindo a proposta de Victor Turner (Turner, 1980), que diferencia um p61o material e um p61o ideol6gico nos sirnbolos, as estruturas arquitect6nicas nesta perspectiva de interpretaqio d i o corpo material A configuraqlo ideal. 0 s elernentos arquitect6nicos perrnitern a objectivaqio da mem6ria partilhada e da identidade sustentadora da linhagern. Sio o referente necess5rio e derivado da convivCncia e afirrnaqio do grupo social. Nesse sentido,

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F o t e m 57. Uma lulik Mirlau em processode destrui@o.

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falarnos de urn elernento patrimonial que C basicarnente irnaterial, apesar de oferecer urn aspecto tangivel. Dentro deste aspecto tangivel, devernos destacar os objectos rituais que d o guardados nas urna lulik na considera@o patrimonial destas construg6es. Se a pr6pria casa transrnite a imagem e a rnaterializa@o do devir da urna lisan, os objectos rituais convertern-se em autentica evidCncia fisica do vinculo corn o passado, a prova da descendCncia e a transmissgo dos antepassados, veiculada na utilizaqlo activa destes bens nas cerim6nias. A existencia destes objectos vai acornpanhada de urn relato rnitico das suas origens e de corno forarn legados e conservados nas casas sagradas. Entre os objectos entesourados destacarn as figuras das antigas divindades prirnigenias reverenciadas no espaFo sagrado. Em destaque tarnbCm a conservaqZo das ossarnentas dos anirnais sacrificados em honra dos falecidos.

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Estes objedos nZo s6 tern urn enorrne valor sirnb6lico e urn significado local no context0 da patrimonializa@o das urna lulik sengo que tarnbCrn derivarn em bens hist6ricos estirnados. Espadas (surik) de v6rios sCculos de antiguidade, bengalas de comando locais (rotas), esculturas e j6ias tradicionais (kaibauk, kelu, loku, rnorteen, belak.. .) s2o muito estimadas do ponto de vista do rnercado da arte international. De facto, as urna lulik timorenses tern sido durante anos object0 de urna dilatada espoliaqtio destinada ao rnercado negro de antiguidades e obras de arte. Diferentes pessoas e instituiqGes de potencias coloniais ou vizinhas, As vezes corn intenq6es crirninosas ou outras corn o objectivo de proteger estes objectos da destruiq50 e da guerra, tern transladado fora das fronteiras de Timor grande parte destes tesouros nacionais. por essa razz0 que a Secretaria de Estado de Cultura tem actualrnente posto em andamento uma politica de identificaqzo deste patrirn6nio em mlos estrangeiras para proceder A sua reclarna~fo.

TRANSFORMA~~ES SEMANTICAS: SOCIEDADE CONTEMPORANEA

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REINTERPRETACAO

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UMA LULlK NA

Ao analisarrnos o caricter patrimonial das casas sagradas n i o podernos esquecer que estamos a tratar de um patrirn6nio vivo e plenamente activo, significative em funqgo de urn conjunto de forrnulaq6es da realidade, da hist6ria e da farnilia. As urna lulik sgo expressgo de urn rnaneira de estar no rnundo, reafirrnada em cada interpreta~focolectiva do seu valor. Este frigil elemento irnaterial est6 vinculado intrinsecarnente corn os contextos sociais em que se produz, pelo que as transforrnaq6es na estrutura de parentesco e o entendirnento da realidade dos tirnorenses derivada da modernizaqio, dZo lugar a urna relevante alteraqio dos significados. A valoraqgo dos elernentos patrirnoniais sempre 4 urn exercicio cornpartilhado de negocia~io - social, mesrno at4 rnais marcado ainda ao falarrnos de elementos que jogarn at6 o de hoje urn papel destacado na articulaqio conternpordnea das identiddes locaik: ds esruros vestigios do

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Fotografia 58. Uma lulik Kolo Hunu em process' dedestrui@o.

passado, mas de bens contempordneos activos na ordenaq2o social vigente. Em consequCncia, na medida em que a familia tradicional for perdendo o seu sentido num Timor a cada vez mais urbano, e se for impondo uma vis2o mais restrita da familia nuclear, a uma lulik resignificar-se-6 como express50 do passado e da hist6ria da naqlo e desfigurar-se-6 como express20 material e espiritual da uma lisan. Dessarte, sem a familia tradicional as casas sagradas perdem o sentido que t&m transportado ao longo dos seculos em favor de novas concepqbes representativas.

0 patrim6nio cultural como simbolo flexivel, object0 de mliltiplas interpretaqbes, vincula o presente e o passado num exercicio de reflex50 e actualizas50 da tradiqlo 2 realidade actual. Portanto, os simbolos como as uma lulik expressam valores e realidades mutadas e s5o por isso reinter-pretadas. 0 pais contempordneo que se perfila como uma moderna democracia independente e uma sociedade cat6lica reconstr6i no actual process0 de modernizaqfo os significados das antigas casas sagradas da religiio gentil e de dmbito familiar. 0 catolicismo 6 apresentado pelos pr6prios timorenses como um referente identitdrio no quadro de um context0 regional mais amplo definido pel0 islamismo, o budismo e o hinduismo A no Smbito religioso. Produto de mais de trCs sCculos de contact0 com os portugueses, os timorenses definemse como um enclave latino e cat6lico no centro do Pacifico, singularizando uma idiossincrasia notavelmente diferente com respeito aos seus vizinhos. A integras20 de novas pr6ticas religiosas no pais n2o se fez no vazio, sen20 que a assirnilas50 foi imaginativamente construida com o apoio da tradiglo e da literatura oral. Igualmente, a lgreja Cat6lica tem sabido reconduzir sentimentos locais

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Fotoye PedaCosdas esculturas dasdos primeiros ancestros na uma lulik Darlau Hatubuilico.

Patrirndnio ullb~~ti de Tmor Leste I A5 Uma Ldik no distrito de Ainaro

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montanhas timorenses. Por uma parte, esta reconstrug20 garante a ligag2o da realidade politica e administrativa contempordnea com os firmes pilares da tradig20. Par outro lado, a conservagfo e activaggo patrimonial podem servir como instrumentos de desenvolvimento econ6mic0, fortalecendo as qualidades turisticas. As uma lulik como patrim6nio s2o por esta razfo passiveis de serem consideradas simultanearnente passado, presente e futuro da comunidade pois diferentes projectos econ6micos podem aproveitar o impulso da activagfo patrimonial abrindo um novo futuro.

@ ~ & a Wogrrfk . Q. Muralhas do perimelullkFads Data.

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air&b, F Q ~ ~0. ~ oratbrio ~ s traditional . ligad0 a urna lulik Bere Dato, no conjunto de Nunumoguelau. Hatubuilico.

A recuperagfo das construgdes organiza-se seguindo um protocolo estrito. Em primeiro lugar, a localiza@odeve ser exactamente a mesma que a origin6ria porque possui tambCm um caricter sagrado. Em segundo lugar, todo o grupo humano simbolizado na uma lulik deve participar no processo, quer fisicamente atravCs da pr6pria intervengfo no abate e na reuniio dos materiais -que s6 podem ser aqueles sancionados para a construg20 sagrada- quer atravCs da contribuig20 monetiria e em espCcie. Igualmente, devem participar todas as outras linhagens associadas por parentesco afim (umane e fetosaa), ou por vinculagbes comunitirias (maun-alin) A pr6pria construgfo deve seguir o procedimento fixado pelos idosos e sacerdotes gentis, que transmitem o saber dos antepassados. Por 6ltim0, h6 que .L

Fotogafh 6C Ferik e katbas com atavio cerimonial traditional en Hatubuilico.

Fotsgr.ft CS. RepresentaC50de seios femininos e de gravuras geometricos sobre a porta da uma lulik Mau Ulo. Hatubuilico.

assinalar que a ordern de reconstruqio n i o 6 arbitrhria mas que deve seguir urna disposiq50 hierhrquicada segrnentaeo, que distingue as uma lulik mais antigas e os irmios maiores (metgfora local para a preerninCncia ritual e social) nurna evidente espacializaqio da representaqio da ordem social. Indubitavelmente, a participaqio social 6 o instrumento imprescindivel para a reconstruqio pois como simbolo comunitirio por excelencia urna simples construqio de urna casa forrnalrnente semelhante as uma lulik mas sern seguir os requerirnentos da tradiqio invalidava o process0 e portanto o resultado. Urn exernplo significativo desta rejeiqio social 6 a reconstruqio de casas sagradas por diferentes colectivos estrangeiros sern envolvimento da cornunidade local que fracassaram porque nunca forarn

integradas na prhtica social dos vizinhos. Sio rapidamente abandonadas porque sio unicarnente urna recreaqio fisica que n i o incorpora nenhurn dos principios significativos que integram as uma lulik, sintetizados mais acima e que convertern estas casas a0 rnesrno tempo tanto em patrirn6nio material quanto irnaterial. 0 s bens patrimoniais sio urna constru@io colectiva da heranca e o passado da co-rnunidade numa recreaqgo viva dos vestigios rnateriais. Porem, os estritos criterios de reconstruqio que d i o sentido aos bens patrimoniais tarnbern permitem a flexivel interpretaqio dos signi-ficados sirnb6licos dos novos rnonurnentos. Contemporanearnente, a cornunidade participante estende-se para al6rn da farnilia representada

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na casa sagrada. Todos os vizinhos se sentem reconfortados na presenga das casas sagradas atraves desse vinculo com o passado nacional. As geraqdes anteriores veneradas sio todos os antepassados que tCm construido a dolorosa hist6ria da nova naqio, especialmente aqueles martirizados na ocupaqio. A uma lulik C um simbolo de todos, a ligaqio com a comunidade total e atraves da sua reivindicaqio da luta contra os indonesios cria uma representaq50 tangivel da nova democracia obtida com tanto sangue, que incarna o Estado contempordneo. A legitimag50 politica encontra na tradiqio urna ferramenta fundamental para a assirnilagio contempordnea dos valores democrhticos fundamentados na identidade nacional. A uma lulik, pertence a cada familia, mas todas as familias tCm a sua e C por esta razio que a casa sagrada C tambCm por extensio uma heranqa de todo o Timor. AS

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'2 UMA LULlK COMO PATRIM~NIO

MATERIAL E IMATERIAL

FotqatSa 66- Cer1rn6n'a funerarla do Hakol Mate em Ainam Atav~oscerlmonlals tradlc~onars

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Noutra ordem de coisas, a condigio de patrim6nio essencialmente imaterial das uma lulik dh lugar tambCm a uma contradiqio que se deve enfrentar nas dindmicas de conservagio destas construq6es. Formalmente, as casas sagradas d o arquitecturas efCmeras, que apenas duram uma geraqio. Depois desse lapso de tempo t@mde ser construidas de novo porque os materiais utilizados e as condiqdes meio ambientais produzem uma deterioragio destas casas. A construqio e reconstru@io permanente destes bens implica necessariamente a inovaglo e a reinvengio, pois nenhuma replica C um clone do object0 reproduzido, pelo que nos expde a um constante jog0 de permanencia e transformagio na patrimonializagio de bens culturais vivos para os cidadios desfrutarem. AlCm disso, tal e como expomos previarnente, os significados incorporados na materializaqso arquitect6nica ficam em constante 5 inovaqao por causa de alterag6es nos contextos sociais e da conceptualizaqio cornunitiria das identidades e da hist6ria representada. Em consequCncia, poderse-ia deduzir uma necessidade de valorizarmos pautas de patrimonializagio institutional deste patrim6nio que podemos definir como efCmero. A utilizaqio de materiais naturais basicamente vegetais e portanto, pereciveis, obriga a urn uma reconstruqio ciclica. No entanto, a a pela sua pr6pria consideraqio sagrada,

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Febgrafh 67. Adapta~Zoda tradisao a novos :mtextos igreja e constru@o tradicional anexa m~tandoas uma lulik, corn fungo de alojar ao A r e Em Ai-Tutu Rina (suco Mulo)

que imp6e a constryio seguindo as mesmas regras, materiais e estruturas para perpetuar a tradi~io. por isso que ainda sendo constry6es recriadas, na mesma r e p e t i ~ i oreside o seu carscter patrimonial. preciso reivindicarmos este patrim6nio material efkmero, como object0 de estudo e p r o t e c ~ i o ,num verdadeiro paralelismo com a categoria de arte efkmera de alguma etapa hist6rica da arte europeia.

FBtogfa& 68- Interfor da cljpula da casa Mo-ah1 no conjunto Mankat~Hali Laran. Maub~sse

Como reflexio mais abrangente sobre a permangncia fisica e a protec@o, podemos acrescentar que em certas ocasi6es as normas internacionais de patrimonializa@o, que priorizam monumentos edificados em pedra tgm como consequ5ncia secundiria uma certa marginago dos bens daqueles paises mais pobres, que n2o empregam materiais duradouros na sua arquitectura. A valora@o ocidental da permangncia, apoiada na pedra como fetiche supde a exclus2o de bens arquitect6nicos destes estados, porque normalmente s6 merecem a considera@o de bens catalogados como patrimdnio imaterial e patrim6nio natural com a excep~ioda protecs2o daqueles elementos prk-hist6ricos conservados, como os monumentos megaliticos ou as grutas e cavernas habitadas no passado. Consequentemente, gera-se uma verdadeira imagem de primitivismo, que invisibiliza o devir hist6rico destes povos porque sio apresentados com uma

Moprafh 69. Hati.'O haR d um das dwms que se consideram sagradas na hadi@o timorense.

imagem sem passado material. Com certa hiperbole podemos dizer que se constr6i uma imagem destas nag6es que passa directamente da pr6-hist6ria i modernidade contempordnea atravks de uma cultura imaterial et6rea que n l o deixa impressio. Paradoxalmente, a linica hist6ria conservada em muitas ocasiaes slo legados do passado colonial, pelo que se patrimonializa urn rnodelo ocidentalizado corn a preocupante consequCncia do desaparecimento dos modelos aut6ctones. A simplicidade arquitectdnican l o pode ser contemplada como critkrio em detriment0 da conservaq20 de urn passado material pr6prio.

A CONSERVA@O SUSTENTAVEL

DAS UMA LULlK NO QUADRO DO DESENVOLVIMENTO ECON~MICO

Numa contribuigiio aplicada devemos reflexionar acerca da activag2o das uma lulik como patrirn6nio cultural para a p r o m o q l o ~ qdgsenvolvimento econ6mico sustentdvel. .. .

Fatografia 70. Kattias corn surik lulik rodeado je ferik, em uma cerirnonia em Hatubuilico.

Em primeiro lugar, C fundamental apoiarrnos urna politica de recuperaglo das uma lulik, completando um catdlogo pormenorizado das casas existentes e daquelas outras construgbes que tern que ser reconstruidas novamente. A documentaslo ajustada perrnitird avaliar o volume do conjunto patrimonial e arquivar a inforrnaglo necessdria para intervengbes futuras. 0 inventirio C imprescindivel para o conhecimento da pr6pria riqueza. Em segundo lugar, 6 precis0 irnplementar urna restauraglo e recuperag20 urgente da arquitectura tradicional, particularmente por causa da continuidade geracional na transmiss20 do conhecimento experiente. Numa sociedade como a tirnorense, subrnersa nurn process0 acelerado de rnodernizaglo, a protecgio do passado nlo se fundarnenta unicarnente na protecg20 dos seus vestigios, mas tarnbCrn na conserva@o dos antigos saberes, esse primordial patrirn6nio irnaterial. A extendo de novas prdticas construtivas, baseadas no cirnento, estlo a deixar em desuso tecnicas fradicionais, que 56 atraves da docurnentag20 e o ensino em escolas especializadas na restaurago patrimonial poderlo ser preservadas. Em terceiro lugar, deve-se fortalecer esta politica de recupera@ocom a restituiqlo daquelas pegas que tCm sido espoliadas do pais, sobretudo, para superar o

Patrlrn6nlo cultural d e T ~ m o Leste r 1 As U m a L u l ~ kn o dlstrlto d e Alnaro

paradox0 de alguns dos principais dadores do pais, promotores do desenvolvimento timorense, se neearem a devolver esses bens " patrimoniais que constituem uma excelente ferramenta de promogio econ6mica.

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Nesta linha, h i que par em destaque a efichcia do patrim6nio como instrumento de desenvolvimento econ6mico. A conservagio patrimonial para al6m de fortalecer a identidade nacional, cria uma via s6lida de promogio econ6mica e desenvolvimento a partir da activag i o de dois recursos: o patrim6nio cultural e o patrim6nio natural. Estes recursos constituem instrumentos especialmente eficientes na consolidagio de modelos turisticos n2o agressivos, responsdveis e respeitosos com as comunidades locais -turismo 6tico e sustenthvel- .

o w r l R o 72. Conjunto de uma lulik de Kufudarufu nos contrafortes do Ramelau em aldeia de Lebo-Lau (Hatubuilico). Pp.82-83. Fotogntk 73. Rio Sarai. Exemplo de patrimonio natural vinculado as uma lultk atraves .-; dos mitos e legendas que encarna.

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Patrirn6nio cultural de 5 m o r Leste I As Uma Lulik no distrito de Ainaro

TMDIClO NAL. PROBLEMAS CONCEPTUAIS: UMA LULIK, UMA LlRAS E UMA FUKUN Formal e estruturalmente a uma lulik n i o C muito diferente i s construgdes mais complexas da arquitectura tradicional domCstica, que com frequencia se conhecem como uma adat ("casa tradicional") e carecem de uma fungi0 lulik relevante. N i o C simples para o leigo diferenciar entre uma casa sagrada e o modelo socialmente considerado ideal de uma adat. Salvo por determinados detalhes formais, fungees e elementos simb6licos que Ihe outorgam o caricter univoco de casa sagrada, a estrutura da uma lulik C praticamente igual deste ideal de casa tradicional.

E certo que a arquitectura tradicional domCstica carente de um especial caricter lulik, adopta estruturas e formas tecnicamente mais ou menos complexas em

fungi0 de factores variados como a classe e o status social, as possibilidades econdmicas e de mobilizagio de forga de trabalho para a sua construgio, etc. lsto C, ao menos desde que existem depoimentos baseados em documentos hist6ricos fotogrificos, nZo existe um modelo Linico de construgio tradicional. Mas na sua manifestagio mais elaborada, aquela que requer maiores recursos e que ainda hoje se considera como o tipo ideal a que se quer aspirar, o modelo de uma adat ajusta-se ao mesmo padrio estrutural e formal que C utilizado na construgio das uma lulik, como podemos comprovar nas imagens. De facto, apesar de o conceit0 de uma adat em sentido amplo aludir a qualquer tipo de construgio tradicional (etimologicamente mesmo a uma lulik C uma adat), em sentido mais restringido o termo costuma aparecer referido Aquelas casas cuja estrutura morfoldgica e tect6nica 6 semelhante A das uma lulik, representando um ideal de construgio domestics tradicional. -Bem por falta de recursos, por valoragdes estbticas, por preferencias ou por -outros motivos, em ocasiees escolhe-se levantar casas que, ao serem ". - . . 12reconhecidas tambCm como tradicionais, oferecem uma estrutura e uma : diferente. Costumam ser mais modestas ou, ao menos, a sua . -.'~morfologia -- .C + j ,... .-,iconstrug80 implica uma menor mobilizagio de recursos. Como diziamos -.. ,.-:i:2$anteriormente, .-: -estas construg6es podem receber tambbm o qualificativo de uma . ;&adat, ainda que neste caso 6 um modelo menos complexo, substancialmente anterior e das uma lulik. Pelo geral, este outro modelo ajusta-se a .

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Patrim6nio cultural de T i m o r Leste I As Uma Lulik n o distrito de Ainaro

Supevior escpda. FQfOQRt/lJ I . Comparativa uma lulik e uma liras. Uma liras Dasi Koli (telhado a quatro aguas ou vertentes) Superior &web. Fatog& 78. Comparativa uma lulik e uma liras. Uma lulik Laku Dato (telhado a quago asuas ou vertentes)

Inferior espucfdar. W d J .Xi. Comparativa uma lulik e uma liras. Uma liras em vale de Maubisse (modelo de abobada ou telhado conic01

Inferior dreita.Fow+f W. t. Comparativa uma lulik e uma liras. Uma IulikTau Udi (modelo de abobada ou telhado conico)

sagrados herdados dos antepassados, 6 o lugar propicio para que o lulik-nain realize as suas oraq6es dirigidas aos antepassados nos mornentos irnportantes; o seu interior estrutura urn microcosmos espacial ausente nas demais construs6es, em torno de elementos como o ai-sara e o kabi'uda. 0 pr6prio fogio, no modelo dominante no Norte do distrito, apresenta sempre dois fogos em ambos extremos: um para uso quotidian0 e outro s6 para utilizagio ritual. At6 tempos relativamente recentes, a urna lulik caracterizava-se por decorar todos os seus pilares e vigas corn baixo-relevos gravados, normalmente com formas geometricas e ocasionalmente incluindo motivos figurativos; Actualmente, n i o todos os elementos de sustentasio s2o talhados, apesar de a tradiqzo se manter parcialmente. As esculturas, que representam os primeiros antepassados, constituem mais urn dos elementos diferenciadores da uma lulik, se bern que em tempos actuais, por rnotivos que em outro apartado se explicam, este tip0 de plistica esti em deadencia. 0 mesmo podemos dizer de determinados elernentos escult6ricos, como a representa~iode seios que fazem referencia 3 ideia de fertilidade. Alem destes e outros muitos factores de natureza funcional, alguns detalhes formais diferenciam tarnbCrn a uma lulik da uma adat comurn. Ainda que a casuistica 6 ampla, em alguns sucos o capim da uma lulik n i o se pode cortar na

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Patrim6nio cultural d e Timor Leste As Uma Lulik no distrito de Ainaro

sua parte'inferior para deixi-lo uniforme, mas sim se faz nas uma adat. Noutros corta-se deixando sempre um pequeno molho sem cortar; finalmente h i tambCm casos em que o capim se iguala como nas uma adat. Na constru@o das uma lulik a priori n i o C permitido utilizar cravo, pregos ou qualquer outro elemento moderno, o qua1 n i o sucede com a uma adat. As madeiras tambCm niio podem ser cortadas nem trabalhadas com ferramentas modernas -insistimos, do ponto de vista da norma cultural, pois na pritica podem-se chegar a utilizar sempre que se seguirem determinados procedimentos rituais-. Cada passo da construgio da urna lulik esti consagrado cerimonial e ritualmente, constituindo urna performance renovadora da tradisio, conservadora, dinamica e re-criativa das crensas. Nem mesmo para os pilares se pode utilizar qualquer tipo de brvore, mas s6 determinadas especies que t t m um significado e um valor simb6lico concretos; pelo contr6ri0, na construgio de urna uma adat, a eleiqio de tipo de irvore vem marcada exclusivamente pela economia do esforso e dos recursos.

Definitivamente, a urna lulik e o tipo complexo de uma adat nio sio diferentes quanto B estrutura arquitect6nica e ?I sua apartncia visual, e n l o sio f6ceis de diferenciar para o leigo. Mas do plano funcional, simb6lico-ritual e em certos detalhes formais, slo realidades arquitectdnicas diferentes.

A

UMA LULlK E 0 DESLOCAMENTO DAS SUAS FUNC~ESRlTUAlS COMO ESTRAT~GIA

CULTURAL DE

PERMANENCIA

E CONSERVAGO

No inicio da ocupaslo indonksia, a maior parte das uma lulik de Ainaro foram destruidas pelos invasores. Em tempos actuais unicamente urna pequena parte tem sido reconstruida e isto tem ocorrido nos ~lltimos8 ou lo anos. A construsio da urna lulik n2o s6 exige uma mobilizaqio de recursos e de f o r g de trabalho muito elevada. Na medida em que a uma ulik n i o existe como algo isolado mas sempre em relasio com outras casas vinculadas entre si atraves do complexo sistema de relasbes de parentesco, os c6digos culturais i m p e m uma estrita ordem de reconstrugio que ningukm pode ignorar sob risco de ocorrerem desgrasas: a '

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E q u d a . Fotog.tk 11. Uma liras Kufu em suco Fatubessi. Comparativa de casas tradicionais e modernas.

82. Casas camponesas. Exemplo de utiliza@o de materiais tradicionais e , modernos.

Oheb.

pr6pria ordem tem cardcter lulik e a sua violaglo envolve uma ofensa aos ancestrose aos vivos e uma ruptura do equilibrio e da convivCncia entre estes. Noutras palavras, a casa deve ser levantada quando Ihe corresponder na sequencia de reconstruglo daquelas casas relacionadas entre si, e n l o quando os seus membros arbitrariamente desejarern. Se a isto Ihe somarmos a necessidade da presenga dos parentes em determinadas sequCncias do processo de construqio -parentes que as vezes podem estar muito dispersos e longinquos uns de outros, mesmo no estrangeiro-, poderernos entender o dificil que o processo de reconstruglo das uma lulik C em Timor-Leste. 0 factor recursos junto com o factor c6digos culturais, convertem este processo em uma cornplexa e dificil realidade. Agora bem, se por um lado o conceit0 de uma lulik faz alusZo a uma entidade material -um tipo de construglo-, por outro lado estd para al6m da corporeidade material, em tanto se refere essencialmente a um sistema de ideias, a uma realidade intangivel e a uma cosmovido concreta. Todas estas dimens8es subsistem quer exista quer n i o a sua projecglo material ou tangivel em uma constrylo de madeira. Dai que a condiglo de patrimdnio imaterial seja estrutural na uma lulik, enquanto a condi~lode patrim6nio material tem cardcter subalterno do primeiro. Por este motivo, quando nio existe fisicamente a uma lulik -porque tenha sido destruida, queimada, etc. - , o complexo cerimonial e funcional segue activado e continua reproduzindo a performance ritual. Mas, de que maneira? Basicarnente, no distrito de Ainaro temos encontrado duas modalidades. A forma mais frequente C atravCs de uma casa normal que realiza as fung6es uma lulik prouisdria, que custodia os objectos sagrados e alberga a celebraglo das cerim6nias habituais. Pode ser a casa do lulik-na'in -0 mais frequente-, mas tambCm qualquer outra sempre que funcionalmente se sancione o seu cardcter provis6rio como centro lulik. Pode ser uma casa moderna ou uma casa tradicional. Pelo geral, a casa vivenda que faz de urna lulik provisbria, costuma estar na localizaglo original da casa que representa, ou pelo menos bem perto. A uma lulik constr6i-se sempre no mesmo e preciso lugar, at6 o ponto que, quando C destruida, o perimetro que ocupava nio pode ser destinado a outro uso. 0 ponto exacto de localizaglo C sempre o mesmo que em tempos dos ancestrose o lugar s6 pode ser alterado de forma justificada e por consenso entre os katuas (idosos), e levando a cab0 prirneiro uma cerim6nia para consultar com os ancestrose pedirlhes permisslo. Por este motivo, a casa normal que desempenha fung8es de uma lulik costuma estar bem perto da localizaglo original, ainda que as excepg8es sio abundantes ao nfo ser lulik em sentido estrito.

Fotogntk 83. U r n liras Hiut Lel, ern Mmf@l Hali Laran (Mauhisse).

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A segunda forma para resolver o problema da ausencia por destruicio da uma lulik, C atraves de uma especie de hospedagern provis6ria em outra urna lulik existente. Por isso nfo 6 estranho encontrarmos algumas casas sagradas que, alCm de representar a urna lisan prbpria, estio tambem a representar urna ou rnesmo at4 duas urna lulik que tern sido destruidas. Segundo o que temos visto > .;em Ainaro, o vinculo existente entre este estranho tip0 de h6spede e o anfitriio L. costuma ser de r e l a ~ i omaun-alin (maun= irmio maior, alin= irmio pequeno; refere-se a relaq6es especiais de fraternidade ou irrnandade entre linhagens que excluem o intercdmbio matrimonial). Em tais casos, a urna lulik n i o s6 alberga os objectos lulik prbprios, mas tambern os dos seus maun-alin.

Fskrgrrtla 14. Urna to'os em Nunumoguelau

Esta polivalCncia ou flexibilidade cultural permitiu, entre outras coisas, a sobrevivCncia da tradisio ap6s a destruiqZo sistCmica das urna lulik levada a cab0 pelos indonesios, em um context0 de persegui~goe represslo cultural. Muitas uma lulik estio a comeqar a ser reconstruidas30 anos a p b a sua destrui@io, facto que resulta factivel graqas a estes rnecanismos de conserva@o da tradicio em tempos dificeis. F a t w a t t 6.Uma to'os nas ladeiras dos rnon-

Fotog.fie 16. Exemplo de uma liras (Marobo I-Uomlw).

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UMAL l W VS UMA WLlK

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Em ocasi6es acontece que determinadas cerim6nias que devem ser realizadas na uma lulik, n i o se podem levar a cabo devido B distdncia ou 2s dificuldades para transladarse ou reunir toda a familia. Em tais circunstincias, algurnas uma adat podern ser sancionadas como competentes para a realizagio destas cerirnbnias, passando a ser cenirios de algumas funq6es lulik. Mesmo podem chegar a albergar objectos de caricter sagrado e a rnostrarem uma disposigio espacial interna semelhante B da uma lulik. Diacronicarnente, apds urn amplo period0 de tempo, a pr6pria e inevitivel dinirnica de segmenta~iocelular das linhagens, pode chegar a converter estas casas em novas uma lulik pr6prias e independentes. Qual 6 o termo para denominar estas outras casas que observam esta especificidade?

como curral de blifalos (karau nia luhan) bem como curral , . de cabras (bibi nia luhan). A ideia de curral sugere propriedade e vinculagio, mas tambCm sustento. 0 significado da reciprocidade mambae -e o mesmo ocorre no resto de Timor- aplicado neste caso, envolve que a casa raiz protege e se preocupa da casa subajterna, mas esta tambem serve de apoio e sustento B primeira. A pr6pria metifora de liras (asas) C a representagio de um corpo do qua1 nascern umas asas e corn que h i uma relagio de simbiose e de interdependencia permanente. Em qualquer - , caso, a rnetifora uma liras parece estar vinculada a uma ', . relagio vertical e hierirquica dentro da mesma urna lisan, entre a casa matriz e aquelas outras que tern saido da mesma.

UMAFUKUN VS UMA WLIK. O U T WMETAFORAS.

Uma rnaior confuszo existe com o termo urna fukun (fukun= ramo, atar, atado, unido). Em ocasi6es temos encontrado esta denominagio para fazer referencia Bs casas que tarnbCm desempenham fung6es cerimoniais subalternas. Mas o mais frequente 6 utilizar o termo em contextos n i o necessariamente referidos B vida cerimonial e sim B ligagio estrutural -em rela@o ao parentesco- entre casas normais da rnesma uma lisan, vinculadas por relag6es de ascendencia e descendencia directas. lsto 6, qualquer casa C uma liras e ao rnesrno tempo uma fukun da sua uma lulik matriz, e adernais uma fukun daquela uma firas de que ai&c~men@-~rocedea a $ u e r & ~ q u e r e W g m m F Neste caso a metiifora urna fukun implica urn significado de r e l a ~ i omais horizontal ou menos hieriirquica que a metatora umaT\ras.

A pragmitica linguistica resulta confusa e pouco univoca neste caso. Pelo geral costuma-se utilizar o termo uma liras (liras= asas), como rnetifora que descreve a relagio entre a casa que desempenha determinadas funs8es cerimoniais e rituais e a casa lulik matriz. No entanto, em muitos dos casos o termo tambkm se emprega para outras casas que carecem desta funcionalidade lulik subalterna. Formalmente e em sentido muito amplo, qualquer casa de uma mesma uma lisan nio deixa de ser uma liras da uma lulik raiz. tradicionais isentas de

funcionalidade

rebe~eniehe .;J\nthafa~ eThTe pa~p.3. \a

pagrnsxa linguistica mambae, as metiforas em torno h ideia de vinculo G o frequentes. Por exemplo, resutta comum apresentar as casas Bs que se qualificam de uma liras, como "currais" de animais da casa raiz ou uma lulik prbpria: bem

A(6m dos termos uma liras e uma fukun, sio recorrentes outros dois tipos de metiforas para referenciar de que tipo de casa se fala -tanto em sentido material como

imaterial- e das rela$es enwe 2 ,.. rnesrnas. Por urn lado estio as:.';.. recreagces rnetaf6ricas baseadas ern< : terrnos de parentesco. Desta forrna ' algurnas casas de origern denominam-,:* se casas mie/pai (inan/amam) outambem idosa/idoso (uma ferik ho katlias), enquanto as suas derivadas sio tratadas corno filhos (oan). Por outra parte, outro tipo de metiforas. aludem elernentos nucleares da cosmovisio mambae. Como assinala" . Elisabeth Traube (Traube, 1986: 6 8 ) ' '7 sZo habituais rnetiforas botdnicas em :I que a uma lulik 6 referida corno um tronco ou corno uma raiz de uma irvore (hun) e as suas casas derivadas I sio designadas rarnos (sanak) do rnesmo. Tambem se utilizarn outras vezes metiforas antropom6rficas em que a casa de origem seria a cabeca, ulun, e as suas derivadas as extremidades, ain (Traube, 1986: 69). Definitivamente, em terrnos forrnais, enquanto constru@es arquitect6nicas, n i o devemos ver as uma lulik corno urn tipo de casa que constitue um padrio linico e diferente a outras casas construidas de rnaneira tradicional. Como estrutura material, a urna lulik deve ser contextualizada neste cenirio global de arquitectura tradicional. Serio sobretudo os cornponentes sirnb6licos e funcionais, junto com alguns detalhes forrnais, que outorgarn a uma casa a sua condi~iode uma lulik. Supekx. Fotogdh 17. Uma liras Coli Gatal em suco Foho Ai-Lico (Hatu-Udo). Centm. F o t m U.Uma liras Loko Meta, na Ldeira do Kabalake (~atubuilic;).

%p116. Supmior. F e w a h19.Uma adat perto do conjunto Manu Sae.

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hbkw h;rkrbrEx M o g r a h OR Urna iiras Pertai.

[email protected] M t a . m a t h 9l. Urna liras Kufu em suco Maubisse. F&@ 9& %q&m Futogrslh 92. Uma adat na estrada a Turiskai.

RSg. %(L h t r o . Fetegdm 93. Uma knua em Hatubuilico.

%& gbL iaWm ktogrrRs 94. Exemplos de uma liras e uma adat. 97. Fbtognilr 95. Uma liras perto da colina Luha Fere.

WegNtk 96. Arquitetura tradicional. Exemplosde uma adat em Maubisse. Comparativa de @del=

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CAP~TULO12

B MUNDO DOS OBJECTOS OBJECTOSRlTUAlS NO ESPACO RITUAL

No complexo e pequeno microcosmos que forma a urna lulik, urna das constantes adjectivas que contribuern isacralizaclo do espaco 6 a presenqa de objectos que se consideram lulik ou que tCm ao menos urna manifesta conotag2o ritual. Fazem parte da vida cerimonial, adquirindo urn especial protagonismo pelos seus significados. Um objecto pode converter-se em lulik atraves de trCs processos. Em primeiro lugar quando 6 o resultado duma heranga ou transmiss20 dos ancestros. Neste caso, enquanto simbolo que vincula o mundo dos antepassados com o mundo dos vivos, reconhece-se-lhe a qualidade de portadora ou facilitadora de propriedades espirituais que transcenden a realidade fisica. Consequentemente, o objecto adquire urna instrumentalidade ritual, j i seja quotidiana ou ocasional. Em segundo lugar, um objecto passa a ser lul~kquando a sua obtenslo, por elaboragio, compra ou intercimbio ritual, estl destinada a usos de tip0 ritual. Em terceiro lugar, quando se reconhece ou descobre ao objecto urna qualidade lulik ou sobrenatural especifica, como pode ser o caso de algumas pedras. Evidentemente temos de entender a condi~iolulik dos objectos desde a escala que marca um continuum cujos p6los d o os valores mlximos do sagrado e do profano. 0 tip0 de objectos de que falamos est2o logicamente mais perto do prirneiro dos pdlos, o que nio quer dizer que todos tenham o mesmo valor desde o ponto de vista do sagrado e do conceit0 do tabu. 0 denominador comum dos objectos mencionados neste capitulo 6 sua natureza ritual, o que os diferen~ade qualquer outro com um claro valor profano.

m Katuas com belak e morteen

Muitos destes objectos slo reliquias familiares que se guardam dentro da pr6pria urna lulik e que slo objecto de venerago por rnotivos diversos, ainda que costurna ter como leitmotiv recorrente o facto de ter pertencido a urn antepassado, tal como menciondvamos. Tambim se consideram objectos com idiossincrasia especifica, aos que se outorga urn nome prdprio que nlo deve ser pronunciado em contextos quotidianos profanos. Muitas vezes a sua origem reSulta mit~cae faz parte dos episddios de historias e lendas categorizadas como o caminho dos objectos (Traube, 1986: 75). No estudo realizado, entre este tipo de objectos considerados sagrados ( s a s h lulik) existe urna grande variedade. H i os que

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resultam muito frequentes e comuns: surik, belak, Outros, entre tanto, aparecem associados a uma lulik de maneira mais ocasional e resultam mais espe ou particulares (algumas vestimentas, panos, em oc alguma katana' ,algum b a h 2etc.). Outros objectos slo obtidos mediante intercdmbios ri no context0 de cerimbnias de muito diverso tipo, sen derivados do barlake um dos exemplos mais ilustmtiv exemplo, determinados tais). Aparecem tambCm objectos que slo .utilizados actualmente em cont cerimoniais e que no passado eram meros ute domCsticos da vida quotidiana; C o caso de algumas CCI e recipientes de coco ou de bambu, usados como talh como louga pelos antecessores. Tal como apontivam comeso, estes objectos comuns adquirem valor cerimonial enquanto slo uma heranga dos predec Em ocasiaes identificam a pessoa e simboli representam-na, como C o caso do kohe. Estamos a um recipiente tradicional de bambu no que se guar que se utiliza para realizar a mistura com a noz de arB folha de betele do "mama". Actualmente costuma sub se por frascos e recipientes modernos. 0 kohe serve considerar presente (sura)a uma pessoa em algum dos funeririos, atraves de uma metonimia em que se iden o object0 com o proprietirio que o usou em vida. A variedade de objectos que se podem encontrar vinc AS uma lulik, pode ser ordenada em uma taxonomia bbica seguindo dois critCrios classificat6rios verticais terceiro critCrio transversal. Em primeiro lugar o grata normalizaglo social dos objectos como entidades lulik; 6, aqueles que recorrentemente slo apresentados c sagrados. Costumam ter um uso social muito vis~ cerim6nias. Em segundo lugar, estariam aqueles ou natureza particular, especificos de uma uma lulik e que geral, t@mum valor de reliquias enquanto pertencen antecessores. Geralmente o seu uso ritual C socia menos visivel que os anteriores e com frequ@nciali a um espa~o-tempoprivado, com excep~6escomo ser determinadas vestimentas e outros objectos a usados em pliblico em contextos cerimoniais. Final esta taxonomia elementar poderiamos completi-la criterio transversal de gCnero, em fun@o dos objec se associam ao masculine, ao feminino ou indistintamente a ambos. A mostra que oferecemos incide sobretudo na prl classe de objectos rituais; isto 6 , aqueles que socialmente mais normalizados: Surik

k a espada timorense. Existem grande veriedade de es em Timor, fruto do contact0 dos timorenses co

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d 3ll. Tambor " pekencente A familia zo Sr. Alarico Dos Reis (Tais Metan). h t f d x kt@ 31AMulheres em cerem6nia em Hatubuilico, com tala e baba-dook

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PatrimClnio cultural de T ~ m o Leste r I As Uma Lul~kno d ~ s t r ~de t o Ainaro

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culturas ao longo do tempo. As espadas mais encontramos slo do tipo malaio, mas tambCm portuguesas da Cpoca colonial e katanas que os deixaram na sua passagem durante a II Guerra M Actualmente continuam fabricando-se novas es zonas rurais, object0 de venda a turistas. An indonbia, as abundantes espadas custodiadas sagrados nas uma lulik, muitas de uma alrt considerhvel, constituiam um tesouro de valor patrimonial incalcul6vel. 0s indonhsios nlo 56 quei uma lulik, senlo que previamente as submetem expoliaqio e a uma pilhagem sisttlmicas. 0s i roubaram todos os bens que tinham valor de merca eles as espadas antigas que mais tarde seriam ve mercado negro international de bens hist6rico-art tempos actuais muitas pessoas tCm fabricado rep daquelas que foram roubadas petos indonbios. u masculine e slo custodiadas zelosamente dentro lulik. Cada surik recebe um nome pr6prio como se fo pessoa. 0 seu nome nlo pode ser pronunciado sa contextos cerimoniaise por parte da pessoa a quem a reconhece como competente para o fazer, normalm lulik-na'in. 0 surik tem especial valor lulik, frequentemente associa-se ao antecessor funda linhagem. Rota A rota 6 uma bengala de comando associado ao (ukun) tradicional. Desconhecemos se em dpoca his empregava j6 a rota como simbolo de governo, hipbtese, podemos considerar a rota como um empr cultural, fruto do contact0 corn os portu generalizando-se o seu us0 como elemento sim passado colonial. Efectivamente, muitas das rota uma lulik se veneran nlo deixam de ser bengalas colonial, distribuidas pelos portugueses como sf comando. A express20 fahe rota (repartir comummente utilizada para fazer refergncia B name liurais por parte do govern0 portugu&sno passado.

S8pcria.F M q d a 3l3. Manu-fulun Cmbn htqrrtk 314. Manu-fulun, baba-

Diman

dook e belak.

E uma langa comprida, com a ponta metilica, usada em sacrificios rituai animais, principalmente blifalos. Utiliza-se em cerim6nias como o hakoi ma Hiura

E de urn tip0 local de vela. TambCm denominada lilin metan (vela negr considerada oriunda de Timor e de fabricasgo tradicional, frente A lilin mutin , branca) de origem forlneo -malaee adquirida nos mercados locais. -.- , fabricar a vela negra utiliza-se a cavidade oca de um bambu recheando-a de abelha. Considera-se que em determinadas uma lulik, bem como - - ,,. cera algumas cerim6nias como o toli mate, 6 prescritivo a utilizaglo da hiura, se . - :if tabu uma utilizaglo de velas brancas. .

-

liu 6 urn arnuleto guardado corno object0 sagrado em rnuitas casas. Tinha urn so protector perante perigos e associarn-se-lhe vdrios poderes. Hi rnuitos tipos & biru. Alguns s2o outorgados por casas de linhagens que na antiguidade tinharn m s associadas b guerra e actualrnente se chamam uma panlima (em lingua irlonksia) ou seguranqa (em lingua portuguesa). Adernais, h6 outros tipos de W que tCm origern natural (por exemplo aqueles que aparecem em lugares em tern caido um raio). S2o objectos que antigarnente se utilizavarn como h t o s para ir A guerra e actualrnente se usarn a rnodo de protecgBo em geral. DQ-se que deterrninados biru salvaguardarn o seu portador de ser ferido de bala m s a tama) ou rnesrno por arrna branca. 0 leque de objectos que se crrsiderarn biru C arnplisirna.

ern tarnbor de grandes dimensties que s6 os homens podern utilizar. 0 seu uso crtii restringido b celebraggo de cerirn6nias, como podem ser o kore metan. Com W n c i a podernos encontrd-lo pendurado no tecto do espap inferior da casa m dentro da rnesrna. 0 titir pode ser de duplo parche ou de parche (Inico. Este

Esqunrb. Fsltogofb314 Belak. Crntra ktowfh 317. Belak.

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Fot-n.

Be,ak,

iiltimo costuma ser de rnaiores dimensijes, apresentando a parte inferio~ que perrnite gerar uma sonoridade muito diferente 2~ dos titir de duplo Baba-dook Tratase de um pequeno tambor de uso principalrnente feminino. instrumento tradicional de percussao fabricado corn madeira e pele, ger de cabra. Usa-se em deterrninadas cerim6nias e em comitivas de recep autoridades (por exemplo, & habitual o seu uso nos tebedai, ghnero cornposto por dois rnotivos ritmicos repetidos alternadarnenteacompan n%opor danfa). As suas proporfties d o variiveis, ainda que os mais corn uns 12 e 14 tentimetros de largo na sua parte superior e ao redo centimetros de alto.

I

Tala Instrumento musical tradicional de uso principalmentefeminino consisten@ disco met6lico percutido corn uma baqueta. I!um pequeno gong que se junto corn os babadook nos mesmos contextos que estes.

Coroa tradicional geralmente moldada em forrna de lua nascente em h Pode ter outros enfeites a acompanharern a forma de referhcia bdsi alguma estrela. Costurna estar ligado com o poder politico em sentido a era parte da vestirnenta masculina tradicional. Kelu

Bracelete de pulso de prata. I!urn object0 do qua1 existern variantes ma& fernininas. Pode ter forma ptana ou incluir urna pequena c6pSula inc funciona corno guizo. 0 kelu far parte da vestirnenta traditional tanto como de mulheres. urn tipo de j6ia que pode ser utilizada quotidianam de contextos rituais, especialmente aquela de tip0 plano e sem guizo. .

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I! urn bracelete de antebrafo realizado com metais preciosos. Consis llmina metilica em forma de cilindro aberto, de uns 19 centimetros de de pouca grossura. Pelo geral o loku esti gravado com motivos geom faz parte da vestimenta tradicional masculina.

intercdmbios ceremoniais, como object0 ou veiculo para a prhtica da reciprocidade ritual. E o caso do barlake, no process0 de negociaqlo matrimonial. Mas tambCm C um elemento presente noutros ritos de passagem: no nascimento e na morte. Tradicionalmente, os recCm nascidos eram envolvidos em um tais "para comeqar a viagem terrestre da ~ i d a "No . ~ momento da morte utilizava-se como mortalha para o enterro. Ainda actualmente, na cerim6nia do hahoi mate se coloca um tais sobre o corpo do bljfalo moribund0 que representa o espirito do morto, e noutro tais se recolhe respeitosamenteo ljltimo hhlito do animal para o depositar na uma lulik. Poucos objectos como o tais resultam t l o polissCmicos nos seus significados rituais. Simbolo da vida e da morte, do estatuto e hierarquia sociais, da identidade da uma lisan e do territbrio, da heranqa dos antecessores, simbolo da mulher mas tambCm de umane no seu conjunto, significado da amizade, respeito, agradecimiento e gratidlo e expresslo da reciprocidade, axioma cultural do povo tirnorense.

327. Kaibauk

F0togrdl.r *Us.

Kelu, modelo 1.

Fstfbgdb 331-333. Kelu, modelo 2.

Plg. 231. Supmet Fdognfi.3% Rim, tambor e diversor suris e rotas, sobre tais Iiurai'

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Pbp. 231. InfeIio(ccn(r0. Wwpfh UE.Suri. R4g. 231. lnferia dinitg antigo.

337. Suri

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As Urna L i r l ~ kno d~stritode Ainarc

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E M MADEIRA Tanto no exterior -ern rnuitos dos elementos estruturais da casa sagrada - corno no seu interior, sfo frequentes as rnanifestagties artisticas relacionadas corn a talha de madeira. A maior parte consistern em representagties de forrnas geornCtricas gravadas sobre a madeira, configurando rnotivos ornamentais em alguns lugares da casa corno pilares, traves e portas. Cada urna lulik utiliza urn tip0 de decoragzo especifica, que serve de elemento identificador. Em outros casos, falarnos de baixo-relevos ou rnesmo de alto-relevos corn forrnas antroporn6rficas ou zoom6rficas. A rnais significativa 6 a talha de duas figuras antropom6rficas, urn hornern e urna rnulher, que representam as duas divindades da religi2o tradicional: a M i e Terra (Inan-Rai) e o Pai Sol (Amam-Loron). Actualrnente, a adoragiio destas figuras continua corno urna pritica fervorosa mas privada, pelo que sfo poucas as casas que d i o a conhecer a sua existencia no interior. Estes conjunto de elementos artisticos aponta para a existgncia de urna elaborada e rica plistica desenvolvida no passado e que se foi perdendo corn o passo do tempo.

342. Loko Meta. Representar30 dos primeiros ancestros.

Muitas destas representagties forarn destruidas, principalrnente, por causa da demoliqio em massa de casas, consequencia da invasiio indonCsia em Cpocas relativarnente recentes . No actual process0 de reconstrugiio das urna lulik no distrito de Ainaro, a presenq deste tipo de representaqties viu-se rninirnizada. Elernentos escult6ricos antes caracteristicos das uma lulik, corno a representag20 de seios -sirnbolo da fertilidade- e de figuras antroporn6rficas, tern desaparecido em urna grande parte das novas casas levantadas. Como hip6tese explicativa, podernos considerar a vertiginosa rnudanga cultural a que tern sido submetida a sociedade tirnorense, pelo contact0 prirneiro corn os portugueses e mais tarde pela invaszo indonbia. Mas tarnbCrn C urna rnudanga provocada em boa rnedida pela converdo ao catolicismo. Dita rnudanga concretiza-se em rnultidio de aspectos, mas interessa-nos assinalar dois que afectarn a este tipo de representagtiese rnanifestagties artisticas. Em primeiro lugar, a transformagio do

343. Representa~aode seios nas vigas de Mirlau.

significado cultural do pudor, da forma de entender o mesmo. Em segundo lugar, o temor a que se associem estas representaqces i religiio pagi ou gentil, face ao cristianismo. Apesar de Timor-Leste ser um pais de abrumadora maioria catblica, na praxe social mantem-se um sincretismo religioso onde sobrevivem rnuitos ritos e crengas da religiio tradicional. E um exercicio que tem lugar discretamente, sem que seja rnostrado publicarnente em toda a sua extensio, e portanto praticado dentro de umas margens mais ou menos consentidas pela Igreja. Portanto, consideramos que estes factores tCm limitado este tip0 de representaqces escultbricas, pois em grande medida, sio divindades pagis que celebram a fertilidade e que se representarn nuas, o que bate com os valores inculcados por todos estes componentes ex6genos de aculturaqio. 0s elementos mais caracteristicos da talha em rnadeira que sinteticamente apresentamos sio os seguintes: Esculturas antropombrficas. Numas poucas uma lulik encontramos relevos antropom6rficos realizados sobre a madeira, que comummente se associa com

FotogrIfk 344. Leo Naru. RepresentaGo dos primeiros ancestros.

Patrimbnio cultural de Timor Leste I As Uma Lulik n o distrito de Ainaro

Fat-

345 346. Leo Naru. RepresentagCodos primeiros ancestros.

a interpretagzo de a casa que as abriga se considerar extremamente sagrada. Estes relevos aparecem tanto nas paredes do exterior da casa, em ambos lados da porta do frontal da casa, como no interior desta, na parede esquerda interior da fachada da casa, lavrados sobre as pranchas de madeira destas. Neste ljltirno caso, esse lugar considera-se o espago mais sagrado da casa. Estas duas figuras antropom6rficas representam um homem e uma mulher que simbolizam os deuses da religizo tradicional: lnan / A m a m (mie / pai), o Sol e a Terra. Seios. Outro dos elernentos que em ocasi6es nos encontramos nas uma lulik, 6 a representagio de seios fernininos em portas e traves interiores. No caso das traves interiores tCm sido denominadas por alguns informantes como ai-sussa (de ai, madeira, e sussun, leite materna ou seios).

Ulo.

I I Gravuras e esculturas zoombrficas. Em algurnas urna lulik encontrarnos sobre as paredes formas de anirnais gravadas corno crocodilos ou pdssaros. Existem tarnbern gravuras de anirnais em outros elernentos da casa corno as portas, ou mesmo figuras corn volume noutras corno o uma kakuluk (tais corno pdssaros...). Na actualidade tambern 4 comurn encontrarmos rnuitas casas onde se talhou sobre algurnas das suas partes o norne dos antepassados, ou da pr6pria casa ou mesrno a sua data de construgZo. Este tip0 de gravura 6

fruto do contact0 da sociedade tradicional tirnorense, que era dgrafa, corn os seus colonizadores. Formas geomttricas abstractas. Slo destas forrnas que habitualrnente encontrarnos urn rnaior nlimero nas casas. SZo gravuras que podemos encontrar

.

nas paredes, portas, suri rnanu, pilares.. a que as pessoas denominarn makerek,

kU(Cafia349. Representac20 de seios em um tanque de pilar em Fad Locar.

Ilustr*

14. Representas20 de seios em um tanque de pilar em Mau-Ulo. Desenho.

Patrirndnio cultural de Timor Leste ( As Uma Lulik no distrito de Ainaro

Fbtegrfl. 358. Darlau. Detalhe da varanaa.

L n W .FotFotop.11.35). Darlau. Detalle do uma kakuluk.

RLQ 243. Sqmim. Foto(prffr UQ.Lia Nai. Odamatan feto (porta mulher). Detalhe. Nai. Odamatan mane @orta homem). Detalhe.

MQ243. c a m f i t * . wog.tl.3 Nai. Odamatan mane (porta homem). Detalhe. Plg. 243, lnkm aqucrb.F a t w g d a 363. Lia Nai. Detalhe varanda. Cocodrilo.

L 2 z AU P .

1 &6!

A nossa viszo das urna lulik situa o ser h u m a n ~no epicentro. 0 patrim6nio cultural, material ou irnaterial, jamais pode obviar aquilo que tem de mais irnportante, as pessoas, isto 6, os actores e protagonistas da vida quotidiana. Sem a gente, o patrirn6nio cultural carece de sentido e se converte nurna entidade rnorta, inanimada, descontextualizada. Por isso tentarnos ir para alCrn do rnundo das simples forrnas arquitect6nicas e dos objectos. Ternos situado a uma lulik no seu context0 natural e cultural, no rnundo do significado desde o qua1 deve ser pensado o patrirn6nio cultural para nfo incorrer na banalidade. Temos referenciado a casa sagrada desde as coordenadas cosmovisivas atravCs das quais expressa trascendencia espiritual, metaforizando o cordzo umbilical entre passado, presente e futuro, sendo reflex0 da rnesma essencia do povo de Tirnor. Por esta razio, desejamos oferecer como epilog0 um poema visual formado por rostos e pessoas na sua quotidianidade. Devemos entender que representarn sirnbolicamente a todas as dernais pessoas de Ainaro. N5o quisemos apresentar os nornes das pessoas, nem referenciar os lugares concretos de onde sio, ou as urna lulik as que pertencern; rnesrno ternos optado por suprimir os pCs de foto nas imagens. lntencionalrnente ornitimos esta informado p o r q ~ ~ ~ c a c h u r n h d a r pessoas est6 a representar a todas as outras de Ainaro, dai que nfo quisCssemos individualiza-las com referencias concretas. ---------

Este rnosaico visual p6e o acento na lirica das expressces, procurando captar o rnais profundo da atrnosfera hurnana, os anseios, as esperangas ou desesperangas, os desejos e frustragijes, o drama, os sonhos, as saudades.. . a vida em si mesma. Temos irnaginado encontrar em cada rosto a poesia da vida, a identidade dentro da diferenga, um fragment0 da essCncia da existencia humana, uma aproximagzo ao trascendente. ldosos e idosas, meninos e meninas, homens e mulheres, o lulik-na'in e lia-na'in junto a pessoas sem urna posigio relevante, todas elas representarn o leque humano da urna lulik.

htririnf6nio culturd $e Tirnor Leste I ks Vine Lulik no distrita de-Ainaro Todas as fotografias t-&msido tornadas nos meios das uma lulik ou em contextos relacionados com estas. E a nossa pequena homenagern atraves da qua1 expressamos a nossa gratid5o e o nosso mais profundo respeito as gentes de Ainaro.

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CAP~TULOI' A TERRA DE AINARO E A SUA GENTE. APROXIMACAO GEOGRAFICA, SOCIAL, ECONOMICA E HISTORICA 1.A costa norte possui 6guas mais tranquilas do que a costa sul. 0s timorenses referem-se ao mar do norte como "mar mulher", tasi feto, e ao mar do sul como "mar homem", tasi mane. Esta denominac50 emic 6 utilizada para referenciar um e outro mar, mas tambem e empregue como referente de orienta@o norte e sul. De igual modo, os termos loromono e lorosae 580, A margem de outros significados, marcadores espaciais de orientaglo oeste e leste, utilizados habitualmente na praxe linguistica para localizar e referenciar lugares.

2. Fonte: Ministbio de Finayas, Direc5.30 Nacional de Estatistica. The 2007 Timor-Leste S u ~ e of y Living Standards, "Table 1.4 - Main occupation by rural and urban areas and by district, according to gender (% of population 12 years and older). Source: 2007 TLSLS". En: http:lldne.mof.gov.tl1TLSLSIStatisticalData1l -Demcgraphics/Main%20TablesltablelA.htm, consultado 25-1-1 0. 3. Fonte: Ministerio de Finanps, Direcclo Nacional de Estatlstica. Tabelas Prioridade ba Distritu Ainaro. "Ainaro: Umakain privadu sira nebe iha relasaun ho aihan sira neb6 hakiak no ema sira iha umakain sira ne'e". Pag. 91. Dili, 2008 4. Para os dados quantitativos referidos a agricultura e cria@o de gado, seguimos a fonte do Ministerio de Finan~as,Direc@o Nacional de Estatlstica (Tabelas Prioridade ba Distritu Ainaro. "Ainaro: Umakain privadu sira neb6 iha relasaun ho ai-han sira nebe hakiak no ema sira iha umakain sira ne'e" e "Tabela 8.4, Ainaro: Umakain privadu sira neb4 iha relasaun ho balada hakiak sira nebe iha no ndmeru ema no montante balada hakiak iha umakain sira ne'e", pg. 90 e 91 respectivamente. Dili. 2008).

5. Fonte: Ministerio de Finanps, Direccio Nacional de Estatistica. l h e 2007 Timor-Leste Survey of Living Standards: "Population structure by rural and urban areas and by district, according to gender and age groups (% of population)", Source: 2001 TLSS and 2007 TLSLS. Dados de 2007. Dili, 2008. Em h~:/ldne.mof.gov.tI~LSLSIStatidicalDal~DemcgraphicslMain%2OTables/tablel .I.htm, consultado em 25-1-1 0.

6. Fonte: Ministerio de Finan~as,Direc580 Nacional de Estatlstica. The 2007 Timor-Leste Survey of Living Standards: "Mother tongue by rural and urban areas and by district, according to gender (% of population)", Source: 2001 TLSS and 2007 TLSLS. Dados de 2007. Dili, 2009. En http:lldne.mof.gov.tI/TLSLSIStatisticalDataI1 ~DemographrcslMain%2OTables/tablel.2.htm,consultado em 25-1-1 0. 7. Fonte: Ministerio de hnanqas, Direcclo Nacional de Estatistica. The 2007 Tirnor-Leste S u ~ e of y Living Standards: "Main languages spoken by rural and urban areas and by district, accord~ngto gender (% of population)", em http:lldne.mof.gov.tlITLSLSIStatisti~aIDatal1~Demographi~~IMain%2OTabIesItablel.3.htm, consultado em 25-1-10.

Patrirn6nio cultural de Tirnor Leste I As Uma Lulik n o distrito de Ainaro

8. Em relago com a guerra de Manufahi, seguimos como fontes Msicas os trabalhos de Geoffrey Cunn (1999): Timor Loro Sae: 500 years, e de Fraeric Durand (2006): East Timor, A Country at the Crossroadof Asla and the Pacific. 9. Um imposto, que ainda permanece na memoria colectiva timorense, era charnado de rai-teen, consistente na entrega de uma parte da colheita aos liurai pelos camponeses. 10. Seguimos como fonte neste apartado, a AADD, 2007: Em Comemora@o do Centendrio da Vila de Suro-Ainaro, 1907-2007. Cademeta editada em fotocopia pela Comissao Organizadora do Centendrio da Vila de Ainaro. Dili, 2007.

11, Ibidem

C A P ~ U L O2 , INTRODUCWO As ESTRUTURAS COSMOVISIVAS DE AINARO E AOS PR~NC~PIOS BASICOS DA ORGANIZACAO SOCIAL TRADICIONAL. A UMA LULlK E A VIDA CERlMONlAL 1 Ver em James J. Fox (Ed.) (2006): Inside Austronesian Houses Perspectives on Domestic Designs for Living, a aposi@o e interpretago das diferentes casas sagradas da regib

2Esta base cosmovisiva, ap6s a conversao ao catolicismo, e integrada na identifica~aodeste primeiro ser, motor ou divindade primigbnia,corn Maromak, Deus crist3o. P6r isso a transi@o ao catolicismo foi aaumida corn facilidade, ainda que t a m b h deu origem a urn sincretismo socialmente muito activo. De facto, muitos timorenses argumentam que eles eram catolicos antes de o saberem e de conhecerem formalmente a religiao catolica. 3A denominaGo em tetun de cerimonia e halo lia (fazer palavra).

4 Par refergncias na lenda bee mane-feto e em fatuk bosok chamado de Dausala Mamugum

5 Bua maluss8o a cal (ahu), a areca e o betel utilizados no mama. 6 0 nome em mambae e maet smakan. David Hicks na sua obra Tetum Ghosts and Kin. FeRiIity and Gender in East Timor (Hicks, 20041, diferencia matebian de mate klamar e considera que mate klamar G o as almas dos mortos durante o primeiro ano depois de falecerem; ap6s esse period0 converterem-se em matebian.

7 Traube, 1986,

4 Fanun-matebian quer dizer literalmente "despertar os antecessores". INBo descobrimos a existencia de ritos de puberdade no passado, como acontece noutras sociedades da reglo, como no caso dos Sawo e latmul de Nova Guine. 10 Em augncia do verbete no dicionario do INL, seguimos a grafia do diciondrio de Luis Costa (Costa, 2000).

I t Apesar de Luis Costa utilizar a grafia festosan ao igual que a maior parte de autores estrangeiros, o Disiondriu NasionAl ba Tetun Ofisidl, do INL, estabelece como verbete correct0 fetosaa. Dado o caracter oficial da normaliza~aolinguistica estabeledda pelo INL, respeitamosa sua pauta no nosso texto. 12 Por isso fetosaa e receptor de matak-malirin ("cru-frio") na cerimonia de inauguragao da casa, baseada numa bgngao que protege contra os males dota de fertilidade e prosperidade o seu receptor. Neste sentido, e geralmente o grupo dador de esposas ou umane quem entrega matak-malirin ao grupo receptor ou fetosaa. Ver uma explicaglo mais pormenorizada no capitulo 10.

13 0s nornes destas cerimbnias sao referidas atraves do seu nome genenco em tetun. Nas diferentes comunidades podem receber outra denominaGo especifica.

Patrirn6nio cultural de Timor Leste I As Uma Lulik no distrito d e Ainaro

CAP~TULO5 AS UMA LULlK DE AINARO E 0 CONTEXT0 DA SUA L O C A L I Z A ~ ~NO O ESPACO 1 Nas actuais disputas e debates sobre a propriedade da terra, um dos factores a ter muito em linha de conta e a condiclo rai- na'in e la'o-rai. Nio restam dhvidas de que a presenca de urna urna lul~ke um tev riMrio, 6 um factor de IegitirnaGona defesa ou reivindicacso de direitos sobre a terra em frente a outros.

2 Ainda que esta montanha se situa actualmente em Liquiga, a organizaglo politica hist6rica nio necessariamente se corresponde com a actual.

CAP~TULO6 OS AGRUPAMENTOS OU CONJUNTOS DE UMA LULlK 1 Segundo os infonnantes, KoliTara era urna casa cuja funs20 consistia em "guardar o lulik do Kabalake", mas tambem "uma casa da guerra" ,onde se recebia biru, amulet0 de protecq3o para o combate.

1 Barros (1975: 4) sustenta que o nivel inferior se denomina leu-sua, o nivel midio fad'lala (que significa casa-dentro, segundo este autor) e o superior tete-lau. 0 seu estudo, levado a cab0 entre 1966 e 1969, baseia-se t i o s6 no conhecimento de dois uma lulik mambae, lozalizadas na aldeia deTuri-Sai, sobre a montanha de Bessilau, a medio caminho entre Aileu e Dili: Fad-Culau (cam-casuarina) e Fad-Hulcai (casalua), orgindrias ambas do contraforte do Ramelau.

CAP~TULO8 ESTRUTURAS DE SUSTENTAC~O 1 Nalgumas urna lulik, por exemplo em Mau Ulo, em lugar de um pilar central unico aparecem dois pilares gemeos. Normalmente isto tem aver com a altura e o volume da abobada.

2 Resulta significativo que Blei Hito Blei Lelo se situa em urna zona de transiglo entre modelos, dai quiqd o seu eclecticismo arquitect6nico.

1 Utilizamos como fonte para a classificaqlo cientifica das plantas a Friday (2005).

CAP~TULOlo A ORGANIZACAO DO ESPACO E A SEMWNTICA ESPACIAL DA UMA LULlK 1 0 facto de diferenciar planos de realidade sagradolprofano, naturallsobrenatural,como sugere a Dra. Pena Castro, 6 uma heranca da filosofia grega e, por tanto, faz parte da tradiqso europeia. Generalizar a dualidade a todas as culturas implica universalizar um camp semantico europeu e, portanto, local e particular.

2 Da mesma maneira, na constru~iodas casas modernas, em aparencia muito diferentes as casas tradicionais, reproduz-seo mesmo esquema semlntico que caracteriza a varanda e o interior destas tiltimas. 0 lako tete ancestral encontra a sua continuidade no moderno pdrtico da casa de cimento, enauanto o interior m a n t h o carhcter deespaso intransponivelpara o alheio. Estamos a falar do tradic~onaladaptad0 ao moderno e do moderno ao tradicional, seguindo urna mesma 16g1cacultural e um mesmo padrao semlntico.

CAP~TULO11 OS ELEMENTOS ADJECTIVOS NAS UMA LULlK 1 Enes Paxoal (1967:47). TamEm Timor-LesteAgricultural Rehabilitation, Economic Growth, and Natural Resources Management Project. Forestry and Agroforestry Trees for East Timor, December 2005,em http:llwww.ctahr.hawaii.edulforestry#ata~morlforestryAgroforestryTrees2.xls, consultado o 3 de Fevereiro de 2010

Patrim6nio cultural de Timor Leste 1 As Urna Lulik n o distrito de Ainaro

Z A mesma ide~a6 exprimida por Traube, para quem esta drvore e urn ponto de referkncia que permite marcar os llmites do reclnto duma casa ou dum conjunto de casas (Traube, 1986: 161): 'As the conceptual center of space, the altar 1s symbolically linked to the surrounding temples and to the sacred trees which mark the periphery of the v~llage.The connection is established through the altar post, which "tilts up" to the house post shrine (keora) and to the banyan trees. Sacred rocks "tilt up" to the tree'.

3 Enes Pascoal (1967:48): "Era nos gondBes da aldeia que, de prefer@ncia,os agud'in penduravarnas cabgas decepadas aos inimigos. Eu proprio vi, ha meses, em Hatu-Meu-Tei-aldeia da circunscri@o administrativa de Ermera- alguns desses velhos trofeus no tronco durn grande gondlo." 4 Barros, 1975:30.

5 tste elemento recebe muitos nomes em funglo das moitas variantes das distintas linguas deTimor. Em mambae: boska (Traube, 19861591, haut-laun (em suco Fatubessi), meska (em suco Maulau), natar (em suco Nunumoge).Em lingua bunak bossok-bul(Barros, 1975:13). Em lingua tetun fatuk-hun (Barros, 1975.13). Tamben Mgus (Enes Pascoal, 1967:91). 6 Esta crenp esta presente, por exemplo, entre os bunak de Ainaro. Fonte: Nuno Bianco de Araujo, con-

versa pessoal. 7 Por influkncia da lgreja catolica, em Timor-Leste utiliza-se o termo gentil para fazer m e n ~ l oas crenps, cultos, prdticas, etc., da religizo tradicional.

1. Katana e o nome que se Ihe da em tetum aos facbes, utilizada como ferramenta camponesa

2.0 baliu e um rnachado fabricado de forma tradicional. 3. Rosalia Madeira Soares.

AUTORES E CREDITOS TEXT0 Luis GBrate Castro: capitulos I, 4, 5 e 7 Albero Fidalgo Castro: capitulos 8, g , l l , 12 e 13 Maria Jesbs Pena Castro: capitulos 2, 3, 6 e lo Equipa: ApresentagBo e capitulo 14 ILUSTRAC~ES Elena Tognoli

FOTOGRAFIAS E: Rafael Estevez Saavedra T: Nelson Turkel P: David Palaz6n G: Luis Girate Castro

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