Património Cultural - Do dizer ao fazer

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Jornal Roda-Viva (Arouca) Nº 321 12 De Novembro de 2015

Património Cultural – Do dizer ao fazer

Artigo jornalístico de opinião Coluna: Notas de Campo Colunista: Luís Miguel da Silva Alexandre

Há quatro anos atrás estava a iniciar um curso de ensino superior em Arqueologia e História, sendo que jamais imaginava que isso me levaria a uma batalha: Património VS Mundo. À medida que ia construindo o meu conhecimento durante os primeiros anos de universidade, fui adquirindo novas noções sobre “Património” e, por conseguinte, refletindo sobre a precariedade das condições a que está votado o património cultural arouquense, entregue a um completo abandono e esquecimento (à exceção do património geológico que, por razões óbvias, tem um futuro promissor). Enquanto as associações responsáveis (supostamente) pelo património cultural de Arouca estavam (ou estarão ainda?) em “descanso do pessoal”, sobressaía-se aquela que mudou o rumo e fez “história” em Arouca – Associação Geoparque Arouca. De “mão dada” com esta instituição, no início do presente ano 2015, idealizei um projeto para a educação, salvaguarda e valorização patrimonial – ARQ4ALL, Arqueologia para todos – em parceria com a Câmara Municipal de Arouca e Centro de Arqueologia de Arouca, e ainda com o apoio do Instituto de Arqueologia da Universidade de Coimbra e do Agrupamento de Escolas de Arouca, embora deva agradecimentos a outras tantas entidades. O projeto que terminou no mês passado, Outubro, e teve como premissa aproximar as pessoas não apenas da arqueologia, mas do património cultural em geral, atraiu participantes para dois workshops, duas visitas interpretadas, e uma jornada. Esta última compôs-se por uma outra visita e uma conferência de seu tema Arqueologia como contributo para o desenvolvimento, onde a mensagem ficou clara. A arqueologia não deve ser encarada como um entrave ao desenvolvimento, mas sim como um enriquecer intelectual e cultural, uma ciência social que nos permite entender a evolução do homem, da vida e do planeta. Uma ciência que, e cada vez mais nos dias que correm, deve ser olhada como uma guardiã com a missão de identificar, estudar, preservar e dinamizar o legado dos nossos antepassados, um património que vai desde o Dólmen da Portela da Anta, com cinco mil anos de história, até às Alminha do séc. XX que vemos ao fundo da rua. Este projeto intentou sublinhar a extrema importância de assinalar e avivar o património perante as entidades públicas e privadas e, ao mesmo tempo, criar junto da população um sentimento de pertença e responsabilidade sobre esta herança para que os nossos filhos e netos possam, um dia, entender como vivíamos ontem, usufruindo e admirando os mesmos monumentos que nos deslumbram hoje.

Jornal Roda-Viva (Arouca) Nº 321 12 De Novembro de 2015

Num concelho em permanente evolução, em cada estrada que se constrói e em cada caminho antigo que se alarga, poderá haver, ou mesmo o próprio caminho poderá ser um valor patrimonial eminente que se está a destruir num processo irreversível e que se tornará permanentemente irrecuperável. É aqui que nós, arqueólogos, apoiados pela lei, entramos com o dever de defender os interesses da população, das gerações vindouras e, essencialmente, do património. O concelho de Arouca, com o desenvolvimento que enfrenta, carece de uma atualização e conversão da Carta Arqueológica para uma Carta Patrimonial, onde identifique não apenas os sítios arqueológicos, mas todas as ocorrências patrimoniais, tenham elas relevância ou não, de forma a ficarem salvaguardadas pelo registo científico e técnico-descritivo; Políticas culturais e patrimoniais que promovam o acompanhamento arqueológico previsto na lei para estudos de impacto ambiental e obras públicas e/ou privadas em sítios sensíveis e com potencial patrimonial (não apenas o típico e usual sitio arqueológico); uma atualização do Plano Diretor Municipal; entre outras medidas como a simples elaboração de painéis descritivos e informativos para colocar no exterior dos monumentos da nossa Vila, de modo a que o visitante possa, sem grande esforço, compreender a relevância do que tem diante de si e um pouco da sua história. (Escusado será dizer que esse registo de pouco valerá se, quando terminado, não for produzido conhecimento, permanecendo apenas como “outro” relatório nos gabinetes da DGPC. É de extrema importância a publicação dos resultados e registos, assim como a sua dinamização). É necessário consciencializar os arouquenses que num território como o nosso Território Arouca UNESCO GEOPARK, temos responsabilidades acrescidas e devemos sentir orgulho pelas nossas raízes, pela nossa cultura, pelos nossos fenómenos geológicos únicos no mundo, pelos nossos sítios arqueológicos de características ímpares, pela nossa gastronomia, pelos fabulosos trilhos de serra que são hoje percursos pedestres, permitindo aos turistas que ouviram o tão exímio nome de Arouca nas bocas do mundo, irem conhecer as aldeias, agora classificadas e desabitadas, mas que outrora nos viram e ajudaram a crescer. Porém, a cada volta que dou, a cada esquina que passo, vejo um novo moinho a ruir, um novo caminho de serra a transformar-se em “estradão lavrado” (Cortegaça, Silveiras, Drave), enfim… um vasto número de atentados contra o nosso património, contra a memória dos nossos antepassados e contra a nossa cultura. Em forma de apelo, deixo o convite a todos para que se interessem mais pela história e cultura de Arouca, pelo nosso património e pelos nossos traços de ruralidade, pois num mundo que em cada dia que passa aumenta a globalização cultural, é imperativo preservar a essência que nos distingue, as particularidades do nosso território Arouca Geopark, pois não é uma classificação que faz um território, e sim o património e as pessoas que lá habitam.

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