Pela Liberdade de Contar a Própria História: As Contribuições da Abordagem Pós-Colonialista para o Estudo das Relações Internacionais
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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA TEORIA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS II PROF. HENRIQUE ZEFERINO DE MENEZES Pela Liberdade de Contar a Própria História: As Contribuições da Abordagem PósColonialista para o Estudo das Relações Internacionais For the right of the individual to tell his own story: The contributions of the postcolonial approach to the study of International Relations Caio Ponce de Leon Ribeiro Freire Lucas Barbosa da Silva Resumo: O presente artigo visa elucidar algumas questões pontuais sobre a teoria póscolonialista, analisando desde sua formação enquanto teoria, até as suas implicações no campo de estudos das Relações Internacionais. Expõemse aqui diversos pontos de vistas de diversos autores de todo o globo que ora convergem, ora divergem quanto a teoria e ajudam a esboçar bem o caminho teórico que trilha o póscolonialismo. PalavrasChave: PósColonialismo; Quarto Debate; Orientalismo; Estudos Subalternos. Abstract: This article aims to elucidate some punctual questions about the postcolonialist theory, since its formation as a theory, till its implications in the field of International Relations studies. It is exposed here diverse standpoints of diverse authors from all over the world who sometimes converge and sometimes diverge of the theory and help to sketch the theoric path treaded by the postcolonialism. Keywords: Postcolonialism; Fourth debate; Orientalism; Subaltern studies. João Pessoa 2015
1. Introdução: Podese fugir dos padrões argumentativos nos estudos teóricos? Este artigo, com já exposto em seu resumo, visa a elucidação de certos pontos da teoria póscolonialista. Não somente no campo de estudos das Relações Internacionais, porque, como se há de ver no desenvolver do trabalho, é impossível, ou ao menos, muito desaconselhável, prender o póscolonialismo em apenas uma área de conhecimento, já que ela se encaixa nos mais diversos domínios científicos, desde a sociologia, à filosofia, aos estudos das terminologias, antropologia e até o mundo das Relações Internacionais. Procurase, de certa maneira, elencar os pontos que mostram a teoria póscolonialista enquanto um caminho teórico que tenta “desmarginalizar” certos assuntos, como os povos e culturas dos países dominados pelas grandes potências europeias do século XVI. Sem, contudo, encobertar totalmente todas as análises póscolonialistas que sejam feitas, tendo em mente que se pode usálas, também, para perpetuar o status quo eurocêntrico, em certos casos. 2. Surgimento e debates internos do póscolonialismo Antes de entrar nas discussões internas da corrente póscolonialista fazse necessária a prévia apresentação da corrente. Como surgiu e como desenvolveuse, não somente a teoria em si, como também as diversas vertentes que surgiram a partir dela. Como comenta Grovogui (2013) “eu uso o termo póscolonialismo para introduzir uma multiplicidade de perspectivas, tradições e abordagens a questões de identidade, cultura e poder” (GROVOGUI, 2013, p. 248, tradução nossa), podese observar que a teoria póscolonialista compreende uma ampla gama de visões e tem diversos pontos de surgimento. A diversidade que vem dos diferentes estudos que são associados ao póscolonialismo chegou a causar certas confusões no âmbito acadêmico, devido a essa grande variedade de divergências e convergências (GROVOGUI, 2013). Porém, o nome “póscolonialismo”, por mais sugestivo que seja, acaba por gerar uma outra dúvida: que período é abordado? Esse questionamento é levantado por Peter Childs e R. J. Patrick Williams (1997) no capítulo When is the postcolonial? em seu livro An Introduction to PostColonial Theory . Os autores expõe que sim, o nome pode dar uma ideia de que o tema abordado é o período após o tido “colonialismo”, porém, qual colonialismo? Diversos foram as colônias e impérios que se esfacelaram em períodos diferentes: o francês ou o britânico, em meados do século XX, o espanhol ou português no começo do século XIX ou mesmo a grande derrocada britânica com a independência dos EUA, no final do século XVIII. Sucintamente os autores afirmam: “então a resposta de alguém à pergunta “quando é o póscolonial?” é “agora”” (CHILDS & WILLIAMS, 1997, p. 2, tradução nossa), justamente o que condiz ao que é mais aceito pelos estudiosos do póscolonialismo, o período que compreende o desenvolvimento do conjunto inteiro dos impérios coloniais europeus, desde o século XVI até a atualidade, com enfoque especial no século XIX. Os autores frisam, em sua conclusão, que veem a corrente como um período histórico, mais precisamente como uma fase do imperialismo, e que seria melhor entendido como a
“globalização do capitalismo”, sem contudo limitála apenas a esses termos, afirmando que o póscolonialismo tem uma dimensão global, de certa maneira, assim como o fez Grovogui (CHILDS & WILLIAMS, 1997). Fechada a reflexão introdutória sobre “de quando se fala”, podese então passar às questões mais internas da corrente, como o que a compõe. Lazare Rukundwa e Andries Aarde (2007) apontam algumas justificativas para a formação da teoria póscolonialista: a humanitária com o ímpeto de traçar a origem do póscolonialismo pela história, mas a partir de um ponto de vista que o Ocidente teve dos eventos de antiescravismo e anticolonialismo , econômica o motivo das objeções econômicas que surgiram visavam apenas a salvaguardar os próprios interesses econômicos das nações industrializadas , política o lucro que advinha das colônias era apenas ilusório já que os custos para protegêlas eram muito grandes devido aos conflitos internacionais que geralmente ocorriam devido a elas mesmo e religiosa mesmo sendo acusada de conivência, a Igreja fez muitos sacrifícios pelas campanhas contra o escravismo e colonialismo. O póscolonialismo teria se desenvolvido, logo, a partir de uma filosofia anticolonial que é per si híbrida, juntando o passado ao presente e dando origem a uma nova visão das identidades sóciopolíticas. Desse modo, a teoria póscolonialista não dá ênfase às antigas culturas nativas, nem tampouco traz uma cultura totalmente nova, mas dá um resultado misto entre elas: “a cultura póscolonial é um fenômeno “inevitavelmente híbrido”” (ASHCROFT et al, 1989, apud RUKUNDWA & AARDE, 2007, p. 1187, tradução nossa) o que justifica a ampla gama de áreas acadêmicas as quais a teoria abarca e que já foram citados mais acima. Em síntese, os autores expõe que a teoria póscolonialista surgiu a partir das experiências coloniais vividas pelos povos que lutaram pela sua liberação ao redor do mundo, particularmente na África, Ásia e América Latina corroborando o que afirma Grovogui quando escreve: “o póscolonialismo tem muitos pontos de origem na África, Austrália, Ásia, América Latina” (GROVOGUI, 2013, p. 248, tradução nossa). Como já apontado, os teóricos póscolonialistas têm divergências entre si também pelo fato já dado da ampla gama de áreas acadêmicas que abrange. Ainda dentro desse ambiente antagônico, há quem confronte a ideia do mundo encontrarse numa era “póscolonial”, como Graham Huggan (1996), professor de Commonwealth e literaturas póscoloniais da Universidade de Harvard, afirma em The Neocolonialism of Postcolonialism: A Cautionary Note : “Vivemos numa era neocolonial, não póscolonial” (HUGGAN, 1996, p. 19). O autor aponta várias vezes em seu artigo como os estudos sobre póscolonialismo poderiam estar simplesmente perpetuando a visão eurocêntrica, que já domina o campo, dos estudos acadêmicos. Seja por meio de apenas divulgações em línguas europeias, marginalizando as demais línguas das colônias, ou mesmo por meio da exploração financeira de culturas alheias, usando suas histórias e populações: “Poderiam os estudos póscoloniais serem descritos, então, como inadvertidamente neocoloniais ou implicitamente exóticos em suas conclusões sobre culturas estrangeiras? Sim, até certo ponto, se eles são usados como turismo intelectual ou tentam capitalizarse na “alteridade” de povos e culturas marginalizados. (...) Os estudos póscoloniais, mesmo que sejam mais refinados teoricamente que seus
predecessores (...) está fadado a sofrer as consequências de suas ambições intelectuais, que surgem largamente de seus emergente, porém ainda periférico, status dentro do framework institucional da acadêmia ocidental (euroamericana).” (HUGGAN, 1996, p. 21, tradução nossa)
Há de se lembrar aqui que Grovogui (2013) já escrevia que, nos meios metropolitanos, os racionalistas, humanistas e outros cosmopolitanos, tiveram acesso a um vasto acervo de conhecimento global e, ainda, contaram com todos os instrumentos científicos disponíveis à época, para estudálos a fundo da maneira que bem entendessem, ao mesmo tempo que, para quaisquer nativos, esse conhecimento, quando podia ser alcançado, era absurdamente menos rico em relação àquele que se tinha acesso na metrópole. É fato que a teoria póscolonial foca nos estudos de identidades e culturas dos povos colonizados, como bem aponta o próprio Grovogui (2013) que discorre sobre essa ideia, principalmente ligada aos estudos no mundo anglófono, e que introduz a obra Orientalism de Edward Said (1987) expondo vários casos de relações EuropaÁfrica (ou OcidenteÁfrica, se incluiremse aqui os EUA), em especial os fatos que acarretaram na derrocada do líder líbio Muammar alGaddafi. A partir do que escrevem Harry Oldmeadow e Huston Smith (2004) podese aqui dissertar brevemente os objetivos de Said em sua obra. O autor, primeiramente, interessouse na percepção e subjugação do mundo islâmico do Oriente Médio por parte do “ocidente”, sua tese ultrapassou apenas essa análise e passou, posteriormente, a englobar toda a influência europeia sobre o continente asiático como um todo. Escreve, logo, que os intelectuais ocidentais teriam criado um “oriente” que seria sua fábrica de “ficções ideológicas” para fazer a contraposição com sua realidade europeia e não só legitimála, como também pôla num patamar mais avançado tanto político como socialmente: “O orientalismo é um “conhecimento colonizado” que gera uma série de dicotomias esteriotipadas entre um “ocidente” racional, democrático, humanístico, criativo, dinâmico, progressivo e “masculino” e um “oriente” irracional, despótico, opressor, atrasado, passivo, estagnado e “feminino”. Em termos psicológicos, essa representação ideologicamente carregada do oriente pode ser vista como o reprimido “outro” do ocidente.” (OLDMEADOW & SMITH, 2004, p. 8, tradução nossa)
Vêse, pois, que essa ascensão do debate orientalista no campo de estudos do póscolonialismo pôs em questão o universalismo eurocêntrico que pairava, e que paira até a atualidade, não só os estudos, mas também quase que a integridade dos discursos que tomam o póscolonialismo como lente teórica. Podese sugerir, de certa forma, que o uso do orientalismo, como força balanceadora da visão eurocêntrica, seria uma solução para o uso da teoria póscolonialista de maneira “depreciativa” apenas usando as culturas alheias para alto promoverse e capitalizarse , como foi apontado por Huggan, já citado. O orientalismo teria, logo, um importante papel de “equilibrador” da balança teórica póscolonialista. Não somente o orientalismo enquadra o eurocentrismo, íntrinseco às análises póscolonialistas, como também o fazem outras correntes teóricas como o marxismo, por exemplo. São, entretanto, teorias que surgem num universo à parte daquele póscolonialista,
diferentemente do orientalismo que surge no seio da corrente. Analisarseão, a seguir, essas demais correntes que criticam o póscolonialismo a partir de uma perspectiva exterior. 3. Contribuições para o estudo das Relações Internacionais O estudo da política internacional sempre esteve estritamente ligado à realidade política internacional. As RI surgem como disciplina logo depois da Primeira Guerra Mundial com o claro objetivo de evitar que outra guerra com semelhantes proporções tornasse a acontecer. A nova realidade internacional, marcada pelas significativas mudanças ocorridas ao longo do século XX, a saber, a nova divisão do trabalho, a transnacionalização da produção e do consumo, a fragmentação e disseminação das culturas e o consequente multiculturalismo, a diluição das fronteiras, entre outras coisas, chamam a atenção para a necessidade de abordagens que transcendam as teorias tradicionais, voltadas à resolução de problemas pontuais. Neste contexto, ganham espaço na disciplina as teorias críticas, que no geral se propõem a investigar a partir da análise histórica as causas estruturais dos problemas da sociedade internacional, refletindo soluções que vão de encontro às suas raízes, em vez de buscar panaceias infalíveis para seus aspectos superficiais. Em 1966, Martin Wight escreve seu artigo com título provocativo Why is there no international theory. O autor é bastante pessimista em relação às RI enquanto campo investigativo, pois carece, segundo ele, de um aporte filosófico clássico para conferirlhe independência acadêmica, levando seus pesquisadores a tomarem como base teóricos gerais da ciência política e sociologia, entre outras áreas. Faltaria também um sistema conceitual capaz de fornecer uma explicação unificada do fenômeno internacional. Num contexto bem mais recente, quando a ainda jovem ciência da guerra/paz já goza de um status mais firme e já é capaz de participar de um diálogo mais efetivo com outras áreas do conhecimento humano, Cynthia Weber escreve, parafraseando Wight seu Why is there no queer international theory , em que atenta para o fato de que o espaço longamente almejado pelo feminismo nas RI, que ainda não foi plenamente conquistado, está ainda bastante fechado a perspectivas como os estudos queer, que buscam analisar as relações sociais em termos de orientação sexual e identidade de gênero e os processos de normatização comportamental relacionados a essa temática. Argumentase que não há uma teoria “gay” das relações internacionais por falta de interesse dos acadêmicos em pesquisar tais questões. Weber responde que apesar da quantidade expressiva de submissões de artigos na área para paineis da ISA e das importantes publicações dos últimos 20 anos analisando especificamente esse assunto. A dificuldade em encontrar espaço na disciplina se dá porque… “O código disciplinador das RI classifica vários tipos de teorias como falhas. Este código que aspira, mas não chega a ser a própria disciplina em si [...] claro, muda à medida em que se alteram as forças sociais, culturais, econômicas e políticas. Em qualquer particular momento histórico da disciplina, os acadêmicos adquirem naturalmente um tipo de conhecimento de trabalho do código disciplinador das RI, que contem uma série de padrões que regulam, controlam e normalizam a “conduta da conduta” (FOUCAULT, 1994) no procedimento acadêmico. Embora hajam variações nacionais e institucionais na medida em que esses padrões são aceitos, é exigido da maioria dos acadêmicos das relações internacionais que justifiquem seu trabalho com base em tais padrões, em algum ponto de suas carreiras.” (WEBER, 2015, tradução nossa)
Se usando do mesmo argumento Barry Buzan e Amitav Acharya se perguntam “ Why is there no nonWestern theory?”. Os estudos póscoloniais são estudos de fronteiras: entre disciplinas; entre grupos nacionais e étnicos; entre os incluídos e os excluídos (NOGUEIRA, MESSARI). As Relações Internacional, embora sejam um campo bastante vasto e multidisciplinar, ainda é falho de agregar em suas análises os saberes chamados de subalternos, subjulgados. A seguir, fazse um breve diálogo entre o póscolonialismo e outras correntes das RI. O Realismo Clássico trabalha sobre a premissa do estado de natureza hobbesiano aplicado à realidade internacional. O Estado protagonista das relações no sistema internacional, que é anárquico, deve buscar acima de qualquer coisa, por sobrevivência. O foco do realismo está na soberania, poder militar e interesse nacional. Com base em autores clássicos como Hobbes, Tucídides e Maquiavel, afirma que a política internacional está alicerçada sobre a natureza do homem, fator permanente da condição humana. Para o neorrealismo, os estados buscam poder por causa da estrutura internacional anárquica, não apenas pela natureza humana sedenta de poder. Ambos os tipos de realismo giram em torno do conceito de anarquia, e da procura egoísta pela maximização dos próprios privilégios. O poder no realismo aparece como um conceito desagregado (militar, econômico, político), instrumental e um fim em si mesmo. Além disso, o realismo ignora as maneiras pelas quais o poder é produzido e o papel da ideologia, cultura, entre outras coisas, no processo de constituição do poder e das práticas nas relações internacionais. A crítica do póscolonialismo à Escola Inglesa é à lógica do funcionamento dos Estados nacionais. Para obter os resultados esperados, na comunidade internacional, é necessário possuir um status político que o torne apto ao diálogo. Nesta comunidade nascida da Paz de Westfália, a condição de Estado não advém somente da vontade do que a aspira, mas da disposição da comunidade de aceitálo como tal. Assim, uma formação social que não dispõe das condições para ser considerado um Estado (território, nação e poder de fogo capaz de intimidar alguns a rejeitála) terá negada sua existência política e a possibilidade de lograr por visibilidade no cenário internacional. A crítica ao Liberalismo é à pretensa aplicabilidade universal de seus princípios centrais, como o mercado e o individualismo, e ainda outros termos como cidadania, democracia e justiça, construídos a partir de uma perspectiva europeia. O livro de Duncan Ivison, Postcolonial Liberalism se propõe a responder a esses questionamentos. Para o marxismo, o poder é um fator característico da economia capitalista, e é ao mesmo a causa e uma consequência das relações entre ricos e pobres, centro e metrópole, desenvolvido e subdesenvolvido. Embora a perspectiva marxista esteja claramente ligada a qualquer abordagem crítica, que se proponha a questionar as relações de poder focalizando o indivíduo, percebese na obra de Karl Marx uma forte influência da maneira de pensar denunciada pela abordagem póscolonialista. Marx, convicto crítico do regime colonial inglês, afirmou que mesmo destruindo a Ásia, só graças ao poderio inglês aquela região poderia almejar uma verdadeira revolução social no futuro, pois cria ser o imperalismo uma condição necessária para o desenvolvimento capitalista que por sua vez conduziria cedo ou tarde à revolução. “Ora, por mais revoltante que deva ser para o sentimento humano, testemunhar essas miríades de organizações laboriosas, patriarcais e inofensivas sendo desorganizadas e dissolvidas nas suas unidades, arremessadas num mar de sofrimentos, e seus membros individuais perdendo ao mesmo tempo a sua antiga forma de civilização e seu meio hereditário de subsistência, não devemos esquecer que essas comunidades de vila idílica, por mais inofensivas que possam parecer, sempre foram o fundamento sólido do despotismo oriental, que elas reprimiram a mente humana dentro da menor esfera possível,
tornandoa o instrumento submisso da superstição, escravizandoa a regras tradicionais, privandoa de todas as energias grandiosas e históricas. A Inglaterra, é verdade, ao causar uma revolução social no Hindustão, foi impulsionada apenas pelos interesses mais vis, e foi estúpida na sua maneira de impôlos. Mas essa não é a questão. A questão é: a humanidade pode cumprir o seu destino sem uma revolução fundamental no estado social da Ásia?". (Karl Marx, British Rule in India, 1853)
O marxismo e o póscolonialismo, ambos pensam a ideologia de maneira negativa. Na perspectiva marxista, ideologias como o capitalismo, o patriotismo, religião, entre outras coisas, levam os homens a tomarem decisões políticas e econômicas que são na maioria das vezes repressivas. O póscolonialismo reflete sobre como países ocidentais, controlados por suas ideologias em relação a certos povos, raças, línguas, etc, reprimem outras nações. Essas ideologias são o racismo, orientalismo, eurocentrismo, etc. A principal divergência está no fato de que o marxismo está mais preocupado com os produtos econômicos e políticos da ideologia, e o póscolonialismo com os aspectos culturais e psicológicos da colonialidade. Apesar das grandes possibilidades de associar essas duas perspectivas Marx, que recorre quase absolutamente à literatura ocidental e considera seu sistema dogmático como universalmente aplicável, tal como fazem os defensores das abordagens tradicionais, o faz ser apontado por muitos como eurocêntrico. A teoria crítica está ancorada no marxismo, especialmente na ideia de que é preciso “não apenas compreender o mundo, mas transformálo”. É universalista, como outras teorias progressistas, mas procura compreender individualmente cada situação. Ao contrário do marxismo tradicional e do liberalismo, por exemplo, não oferece visões concretas de um futuro ideal, mas posicionase contra o exclusivismo e a favor da emancipação. O Construtivismo, que emergiu nos últimos 25 anos como crítica ao debate neoneo e sua falta de ênfase nas normas e ideias que movimentam a politica internacional. Segundo essa perspectiva, as características de um estado, bem como seus objetivos por normas, regras e ideias. Tem em comum com o póscolonialismo a crítica à anarquia e busca dos próprios interesses, do realismo, e o individualismo e materialismo da perspectiva liberal. Nos Estudos de Segurança, a abordagem póscolonial vem trazer uma discussão sobre “experiências de vários, como migração, escravidão, supressão, resistência, diferença, raça, gênero e o lugar de um entre os outros” (Power, 2013). Além disso, é um lugar comum o fato de que o termo segurança é frequentemente usado para justificar medidas que almejam, não necessariamente a proteção da população, mas muitas vezes a limitação das liberdades individuais. O discurso do medo se baseia na ideia do “Outro”, expressa por Said em seu Orientalismo. E o outro é o islâmico, radical, que desconhece os princípios morais do Ocidente liberal. A abordagem póscolonialista permite então uma análise mais profunda das reais fontes de ameaça, livre de preconceitos e juízos de valor. 4. Considerações Finais Em suma, o póscolonialismo traz às Relações Internacionais a possibilidade de buscar soluções para os problemas do cenário internacional através de uma análise que não se limita a anarquia, o interesse nacional, ou qualquer outra verdade fixa. Raríssimos conflitos entre nações, ou mesmo intranacionais não envolvem em, alguma instância, as questões tratadas pelo póscolonialismo. Nestas primeiras duas décadas do século, o choque entre a civilização ocidental e oriental (islâmica, especialmente) e o consequente discurso enviesado contruído em torno da ameaça do “Outro”, fazem esta abordagem claramente necessária para o estudo das Relações Internacionais.
Referências Bibliográficas ACHARYA, Amitav; SMITH, Steve. NonWestern International Relations Theory: Perspectives on and Beyond Asia ACHARYA, Amitav; BUZAN, Barry. Why is there no nonWestern international theory? In: ACHARYA, Amitav; BUZAN, Barry. NonWestern International Relations Theory, Routledgle, 2010 CHILDS, Peter; WILLIAMS, R. J. Patrick. Introduction: Points of departure. In: ______. An Introduction to PostColonial Theory. Londres: Prentice Hall, 1997. p. 125. Disponível em: . Acesso em: 05 dez. 2015. GROVOGUI, Siba N.. Postcolonialism. In: DUNNE, Tim; KURKI, Milja; SMITH, Steve. International Relations Theories: Discipline and Diversity. Oxford: Oxford University Press, 2013. p. 247265. HOLLIS, Martin; SMITH, Steve. Explaining and Understanding International Relations (Oxford: Oxford University Press, 1991), Introduction. NOGUEIRA, J. P; MESSARI, N. Teoria das Relações Internacionais, Elsevier, 2005 OLDMEADOW, Harry; SMITH, Huston. The Debate about “Orientalism”. In: ______. Journeys East: 20th Century Western Encounters with Eastern Religious Traditions. Bloomington: World Wisdom, 2004. p. 319. Disponível em: . Acesso em: 05 dez. 2015. RUKUNDWA, Lazare S; VAN AARDE, Andries G. The formation of postcolonial theory. Hts , Pretoria, v. 3, n. 63, p.11711194, 2007. Disponível em: . Acesso em: 05 dez. 2015. SAID, Edwad. Orientalismo. Companhia de Bolso, 2007 WEBER, Cynthia. Why is there no queer international theory? . Forthcoming in European Journal of International Relations, março de 2015.
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