Pensando o século XX (review)

July 23, 2017 | Autor: Jorge Felix | Categoria: Hannah Arendt, Historia Social, História, SEGUNDA GUERRA MUNDIAL, Tony Judt, SEGURIDADE SOCIAL
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Jornal Valor --- Página 4 da edição "02/07/2014 1a CAD D" ---- Impressa por GAvenia às 01/07/2014@17:09:56 Jornal Valor Econômico - CAD D - EU - 2/7/2014 (17:9) - Página 4- Cor: BLACKCYANMAGENTAYELLOW Enxerto

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Quarta-feira, 2 de julho de 2014

EU&CULTURA PESQUISA

Nova biblioteca da FEA traz acervo de Delfim

Ex-ministro da Fazenda doou sua coleção de 250 mil obras para a USP, que inaugura novo prédio de 5 mil metros quadrados Uma das mais impressionantes coleções particulares do Brasil, o acervo de 250 mil títulos do ex-ministro da Fazenda Antônio Delfim Netto vai se tornar público ao ser incorporado à nova biblioteca da Faculdade de Economia, Administração e Ciências Contábeis da Universidade de São Paulo (FEA-USP), inaugurada hoje. Ao todo, 430 mil obras comporão a maior biblioteca da área na América Latina. A modernização da biblioteca da FEA, que passa de 1.500 m2 para 5 mil m2, custou R$ 14,7 milhões, exigiu recursos públicos e privados e terá capacidade para atender mais de meio milhão de usuários por ano. A USP entrou com R$ 6,7 milhões e R$ 8 milhões vieram de doações — empresas, ex-alunos e funcionários. Por meio de incentivo fiscal, foi obtido dinheiro junto a grupos empresariais. Nas novas instalações estarão abrigadas as primeiras edições de “O Capital” (Karl Marx) e de “A Riqueza das Nações” (Adam Smith), em cópia fac-similar. São obras que integram uma coleção de grandes clássicos germânicos adquirida por Delfim Netto, de 86 anos e professor emérito da FEA-USP. O acervo traz ainda quase todas as 19 edições de “Introdução à Análise Econômica”, livro do Prêmio Nobel de Economia Paul Samuelson, e uma coleção definitiva da obra de John Stuart Mill. A FEA passa a ser, agora, a única no Brasil de posse desse tesouro.

ANA PAULA PAIVA/VALOR

Uma das questões-chave do acervo de Delfim é a constante atualização: cerca de 40 volumes por mês chegam às estantes. Na nova casa, será dada continuidade à metodologia de aquisição de novos títulos de sua coleção, iniciada há mais 70 anos, quando ele tinha 14 anos e começou a sua paixão pelos livros.

Novas instalações da Biblioteca da FEA-USP: acervo de 430 mil obras

REGIS FILHO/VALOR

Área externa da nova biblioteca da FEA: 5 mil metros quadrados (acima); coleção de livros do Prêmio Nobel Paul Samuelson (abaixo)

Biblioteca de Delfim, em Cotia (SP), doada para a USP (acima); primeiras edições de “O Capital” e “Riqueza das Nações” (ao lado, acima); compilação de artigos do economista

LIVRO

Tony Judt analisa as heranças do século XX para os dias atuais “Pensando o Século XX” Tony Judt e Timothy Snyder. Tradução: Otacílio Nunes. Editora: Objetiva. 440 págs., R$ 49,90 Jorge Felix Para o Valor, de São Paulo O século XXI começou com ataques terroristas, guerras, crise financeira e insatisfação popular capaz de mobilizar multidões por todo o globo ao dispor do potencial da internet. A instabilidade econômica, a vida incerta, o risco de desfiliação profissional, o individualismo e um nacionalismo revigorado em vários países justificam identificar os tempos atuais, na opinião do historiador inglês Tony Judt (1948-2010), como a “Era do Medo”. Sua constatação faz eco com Robert Castel e Zygmund Bauman, entre outros sociólogos contemporâneos.

Para Judt, a compreensão deste presente e qualquer possibilidade de delinear o futuro com alguma precisão depende de nossa capacidade de desvendar a história intelectual e a ética dos pensadores. Vivemos um período de batalha entre democracia e fascismo? Esquerda versus direita? Quem foram os vencedores do século passado e como essa vitória invadiu o século XXI? Por muitos anos essas questões inquietaram Judt e alimentaram a vontade de escrever um livro sobre a trajetória do pensamento das décadas anteriores. Sua intenção era fazer um balanço das responsabilidades, contribuições, dissimulações e falhas de uma geração cujas ideias moldaram e dominaram o século. Foi uma geração que atingiu a maturidade intelectual ou acadêmica quando Hitler chegou ao poder e foi atraída

para o turbilhão político e histórico. Uma geração que teve que tomar partido. Vítima da esclerose lateral amiotrófica que o matou aos 62 anos, Judt foi impossibilitado de escrever o livro que um dia imaginou sobre seu principal tema de estudo. Mas, com a ajuda do professor Timothy Snyder, por meio de conversas gravadas, conseguiu deixar este “Pensando o Século XX”. Provocado por seu entrevistador, ele parece estar numa conversa num café falando sobre temas amenos, porém, a cada observação sua, a inquietação abate a harmonia das convicções moldadas por uma história que nos foi ensinada. O que importa é que “compreendamos os riscos de entender errado, em vez de nos dedicarmos com entusiasmo ao negócio de entender direito”. Judt lembra que os custos da História são sempre

atribuídos a outros e, muitas vezes, a outro tempo e outro lugar. Ao repassar o pensamento do século, Judt revê sua própria biografia e construção intelectual. Esse balanço ganha sabor nos relatos de seus contatos com os próprios analisados, formuladores do pensamento do século XX. Eric Hobsbawm é personagem constante, assim como Leszek Kolakowski. Suas reflexões particulares sobre temas como “a banalidade do mal”, de Hannah Arendt, ou o “liberalismo do medo”, de Judith Shklar, surgem com insights de um historiador capaz de legar o inesgotável “Pós-Guerra”. Judt revisita seu passado marxista e descobre: “Sempre fora o Karl Marx analítico, o comentarista político e não o prognosticador revolucionário, que mais me atraíra”. Por outro lado, acredita que “o colapso da social-

democracia como modelo, como ideia, como narrativa grandiosa, na esteira do desaparecimento do comunismo, é não só infeliz mas injusto. É também uma má notícia para os liberais, uma vez que tudo o que pode ser dito contra as maneiras sociais-democratas de conceber os assuntos públicos também pode ser dito contra os liberais”. Em resumo, a grande questão ética do século teria sido escolhas certas, mas que de forma implícita envolveram rejeitar outras opções cujas virtudes fora um erro negar por puro capricho ideológico. Palavras de um Judt que, no fim da vida, definiu-se como “pluralista”. Em seu julgamento da virada do século, Judt conclui que os grandes vencedores do século XX foram os liberais do século XIX. Seus sucessores criaram o Estado de bem-estar social. De-

mocracia, alta tributação e intervencionismo permitiram garantir a coesão social sem recorrer à violência ou à repressão. “Seríamos tolos se abandonássemos de forma descuidada essa herança”, diz. Fomos. No século XX, as “sociedades superprivatizadas” prevaleceram e colonizaram grande parte do pensamento até a crise de 2008. Ele prevê: “A escolha que enfrentamos na próxima geração [...] é a política de coesão social em torno de propósitos coletivos contra a erosão da sociedade pela política do medo”. Judt alerta que a “exploração demagógica do medo” seduziu os eleitores americanos por oito anos, durante o governo Bush, com a ilusão de que o país pudesse se transformar em um condomínio fechado para o mundo. Esse seria o risco da democracia do século XXI e o desafio para aqueles que se propõem a pensar.

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