PEQUENAS IGREJAS, GRANDES NEGÓCIOS (BANCADA EVANGÉLICA – A MAIS INTOLERANTE, INEXPRESSIVA E PROCESSADA BANCADA DO CONGRESSO NACIONAL)

June 15, 2017 | Autor: C. Pasqualini | Categoria: Direito Constitucional, Direitos Humanos, Direitos Fundamentais e Direitos Humanos
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PEQUENAS IGREJAS, GRANDES NEGÓCIOS (BANCADA EVANGÉLICA – A MAIS INTOLERANTE, INEXPRESSIVA E PROCESSADA BANCADA DO CONGRESSO NACIONAL) Cristianno Pasqualini da Rosa1

RESUMO: Embora a Constituição Federal de 1988 assegure (e imponha) o caráter laico do Estado, existem, inexplicavelmente, 70 membros no Congresso Nacional que foram eleitos se utilizando do fato de serem pastores, bispos ou representantes religiosos. Apesar de toda a discussão decorrente dessa situação, o enfoque aqui dado é à própria ‘bancada religiosa’, mais precisamente à inexpressividade e à ausência no Congresso Nacional, ao rápido aumento do patrimônio de seus membros, à intolerância com temas que estejam fora de seus ‘programas religiosos’ e à quantidade de processos a que respondem. Palavras-chave: bancada religiosa; estado laico; política; pastores.

INTRODUÇÃO Pastores evangélicos de diferentes partidos políticos formam, no Congresso Nacional, a chamada Frente Parlamentar Evangélica, mais comumente chamada de bancada evangélica. Isto não passaria de uma simples informação a respeito da composição do Congresso Nacional se o Brasil não fosse um Estado laico. Embora a presença de representantes religiosos no Congresso Nacional seja algo inaceitável, incompatível com o texto constitucional, ganhará destaque, neste trabalho, a atuação da dita bancada evangélica e a conduta de seus membros. A bancada religiosa comumente é noticiada por se unir contra assuntos como igualdade de gênero e de raça2, aborto, eutanásia e casamento homoafetivo, além de também ter se mostrado contrária à criminalização da discriminação contra homossexuais e dos castigos físicos impostos por pais aos filhos3. O grupo também tentou modificar as resoluções do Conselho Federal de Psicologia (CFP) que proíbem

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UFMS. Faculdade de Direito Professor Nelson Trad. Turma 2010/2. Artigo apresentado à disciplina “Monografia Jurídica I” em 05/12/2014. Orientador: Prof. Dr. André Puccinelli Júnior. 2 Folha de S. Paulo. Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2013/12/1380748-comissao-defeliciano-derruba-projetos-sobre-igualdade-de-genero-e-raca.shtml. Acesso em novembro de 2014. 3 IG: Último Segundo. Disponível em: http://ultimosegundo.ig.com.br/politica/2013-04-14/bancada-evangelicaage-para-barrar-mudancas-polemicas-no-codigo-penal.html. Acesso em novembro de 2014.

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que seus profissionais tratem como doença a homossexualidade4. O interesse pautado exclusivamente em dogmas religiosos, segrega ainda mais os homossexuais, apesar das resoluções do CFP estarem conforme a resolução de 1990 da Organização Mundial da Saúde (OMS), que retirou a homossexualidade da lista de distúrbios mentais. Não bastasse a intolerância a assuntos não aceitos pelas suas condutas e dogmas, os membros da bancada evangélica não têm a participação que se espera de representantes eleitos pelo povo no processo de elaboração de leis. Não houve, nas duas últimas legislaturas, ao menos um projeto de lei encabeçado por um parlamentar da bancada capaz de atender às necessidades da população ou de modificar a realidade do país. Além da inexpressividade de seus membros, 95% dos parlamentares evangélicos estão entre os mais faltosos5. Em contrapartida, a referida bancada tem presença marcante quando o propósito é barrar projetos de lei que não atendem às suas necessidades ou que fogem ao que seus representantes chamam de “vontade da família brasileira”, quais sejam, o casamento homoafetivo, criminalização da homofobia, aborto, entre outros. Embora preguem uma conduta moral irrepreensível, a verdade é um pouco diferente quando o assunto refere-se à vida particular de seus membros. Casos de pastores envolvidos com amantes foram fartamente noticiados pela mídia, apesar de pregarem que representam o núcleo da família brasileira. Também não faltam denúncias envolvendo pastores e desvios de dízimo para compras de mansões e carros de luxo e outras de forma de enriquecimento ilícito. Difícil não acreditar que o cargo político passou a ser um mero instrumento de promoção pessoal e uma forma de enriquecer rapidamente. Alheios a tudo isso, estão os fiéis. Pessoas nas quais se encaixa perfeitamente o sentido de fiel – “Que guarda fidelidade. Que cumpre aquilo a que se obriga”. São pessoas que, independente do que seus pastores façam, parecem ter construído a imagem de seus líderes de forma inatingível e inalterável. Não há denúncia ou escândalo que os faça perder a confiança, tampouco questionar essas condutas. Mistério? Nem tanto. Basta que se assista a uma ou a duas pregações e ali se revelará como essa confiança cega e doentia se manifesta. Embora inexpressivos e 4

Folha de S. Paulo. Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/poder/2013/07/1305310-lideres-da-bancadaevangelica-se-articulam-para-apresentar-novo-projeto-da-cura-gay.shtml. Acesso em novembro de 2014. 5 Câmara dos Deputados. Disponível em http://www2.camara.leg.br/deputados/pesquisa. Acesso em novembro de 2014

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intolerantes na função de legislar, os pastores sabem, como ninguém, controlar suas ovelhas.

1 A INTOLERÂNCIA “Índio nasce índio, não tem como mudar. Negro nasce negro, não tem como mudar. Mas quem nasce homossexual pode mudar. Até a palavra ‘homossexual’ deveria ser abolida do dicionário, já que se nasce homem ou mulher.” A declaração é do Deputado Federal Marco Feliciano (PSC/SP) e foi feita durante audiência pública, em novembro de 2012, que debatia a proibição aos psicólogos de proporem “tratamentos” para a “cura” da homossexualidade. Perante tal declaração, não é necessário discutir a opinião do “pastor”, tampouco suas tantas declarações preconceituosas e intolerantes a negros, índios e homossexuais durante sua polêmica passagem pela Comissão de Direitos Humanos. Seria irônico se não fosse trágico, mas Marco Feliciano ocupou o cargo de Presidente de tal Comissão. Não se pretende aqui generalizar ao ponto de se afirmar que todo religioso é intolerante. Mas não se pode negar que a intolerância nasce nos seios da cultura religiosa e se alastra com uma força cruel entre seus praticantes. As declarações que têm como objetivo ofender determinados grupos minoritários são de uma força brutal e, por mais ilógico que isso pareça, se protegem atrás de conceitos e ideais religiosos e usam como escudo as instituições religiosas – que deveriam acolher, ao invés de segregar. Segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral6, a bancada evangélica na Câmara conseguiu reeleger 53% de seus deputados. Do total de 69 deputados que compõem a bancada, segundo dados de setembro de 2014 da Frente Parlamentar da Família e Apoio à Vida, 37 se reelegeram. Deste total, 17 deputados partem para o terceiro mandato. Somados aos eleitos pela primeira vez, a bancada cresceu 14%, atingindo 70 representantes entre bispos, pastores e seguidores de igrejas. O aumento do número de parlamentares ligados a segmentos religiosos é preocupante quando se pensa que serão necessárias discussões e decisões a respeito de questões como aborto, discriminação racial, homossexualidade, menoridade penal, entre outras tão combatidas pelos religiosos e seus apoiadores. A preocupação torna-

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Divulga TSE. Disponível em http://divulga.tse.jus.br/oficial/index.html. Acesso em novembro de 2014.

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se assustadora quando um dos maiores apoiadores da bancada religiosa, o deputado Jair Bolsonaro (PP/RJ), ao ser questionado sobre cotas raciais, responde: “Eu não entraria em um avião pilotado por um cotista, e nem aceitaria ser operado por um médico cotista”; ou ainda na presença de ativistas de direitos de movimentos negros, manda os manifestantes “voltarem ao zoológico”. A intolerância a que se refere aqui não reside apenas nas questões seculares do aborto e preconceito, por exemplo. Trata-se também da falta de tolerância às demais religiões, um fenômeno mundial e bastante antigo. Um exemplo clássico desta conduta foi a “Caça às Bruxas”, que teve seu início no século XV, período no qual a Igreja Católica perseguiu seitas e praticantes que contrariassem as condutas impostas na Bíblia. Essa intolerância se alastrou por todo o mundo e atualmente pode ser observada facilmente em nosso cotidiano. Recentemente, para que se ilustre a situação, uma localidade em Salvador, capital da Bahia, conhecida como Pedra de Xangô - local considerado sagrado pelos praticantes do Candomblé - vem sendo alvo de atos de vandalismo e de condutas de desrespeito e de intolerância religiosa. Outro exemplo que mostra a face da intolerância, de acordo com reportagem do Jornal Diário do Grande ABC: Espírita apanha de evangélicos por reclamar de barulho de culto Liderados por Isolina dos Santos, 60, cerca de dez evangélicos invadiram no domingo às 22h o apartamento de um pintor de 41 anos e lhe deram uma surra por ter reclamado do barulho do culto, no apartamento de baixo. A vítima teve deslocamento de clavícula. O ataque dos cristãos ocorreu em São André, na Grande São Paulo. Eles ficaram enfurecidos quando souberam que o pintor tinha se queixado das orações com a síndica e arrombaram a porta do vizinho, começando por quebrar os móveis com a alegação que o pintor estava endemoniado. A violência foi presenciada pela mulher do pintor — uma secretária de 39 anos — e pelas filhas do casal, uma de 4 anos, outra de 13 e a terceira de 19.A secretária disse que tinha um bom relacionamento com Isolina, para quem às vezes doava cesta básica e roupas. A amizade se rompeu há cerca de 7 anos, quando a evangélica soube que a vizinha era espírita. A mulher do pintor contou que, nos fins de semana, as pregações começavam com gritos logo pela manhã e se estendiam pela madrugada. Falou que se queixou várias vezes com a administração do condomínio, que nada fez. Ela disse que quando recebia visita em casa era acusada pela vizinha de promover encontro de macumba. Contou que o seu apartamento chegou a ser inspecionado por fiscais da habitação porque eles tinham sido avisados de que ali havia sacrifícios de animais. "Já chamei ela (Isolina) para conversar aqui na minha casa, mas ela disse que não aceita falar com gente da minha cor e religião", disse.7

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Diário do Grande ABC. Disponível em . Acesso em novembro de 2014.

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Há ainda, entre outros tantos, o exemplo dos13 alunos evangélicos do ensino médio da escola estadual Senador João Bosco Ramos de Lima, em Manaus, capital do Amazonas, que, no final de 2013, se negaram a defender o projeto interdisciplinar sobre a Preservação da Identidade Étnico-Cultural brasileira por “entenderem que o trabalho faria apologia ao satanismo e ao homossexualismo” e que a defesa de tal tema “contrariaria as crenças deles”. Por conta própria e orientados pelos pastores e pais, eles fizeram um projeto sobre as missões evangélicas na África, o que não foi aceito pela escola. Por conta disso, os alunos acamparam na frente da escola, protestando contra o trabalho sobre cultura afro-brasileira. De acordo com um dos professores da Escola, Raimundo Cardoso, “Eles também se recusaram a ler obras como O Guarany, Macunaíma, Casa Grande Senzala, dizendo que os livros falavam sobre homossexualismo”.8 Reforce-se que não há aqui a generalização de que isso é uma conduta de religiosos ou que apenas estes tem condutas discriminatórias. Porém, reforça-se também que a intolerância é praticada em grande parte das instituições religiosas e que, no mínimo, seria inocente afirmar que as declarações feitas por pastores e outros líderes religiosos não têm impacto sobre o comportamento de seus seguidores. Estes mesmos líderes se encontram agora como ‘representantes do povo’, com o poder de decidir questões importantes que, sem dúvida, terão grandes impactos no futuro de todos. Com qual pensamento seguem estes representantes para os debates que precedem a tomada destas decisões? Com a lembrança de que estamos em um estado laico, no qual a dignidade de todos deve ser preservada independente de credo, cor, orientação sexual ou eles partirão para uma ‘guerra’ de interesses religiosos na qual vencem aqueles que seguem seus dogmas e ditames?

2 A INEXPRESSIVIDADE Resultado direto da proliferação das igrejas ditas evangélicas no Brasil, os deputados pastores reforçaram sua trajetória política durante o processo de redemocratização, a partir de 1988 e, em 2003, criaram a Frente Parlamentar Evangélica – FPE (agrega deputados e senadores), apelidada de bancada evangélica,

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Pragmatismo político. Disponível em . Acesso em novembro de 2014.

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que representa hoje algo em torno de 14% do total de deputados, percentual bem menor que os mais de 22% de brasileiros que se declararam evangélicos no último Censo. Em 2013, a eleição do Deputado pastor Marcos Feliciano para a presidência da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal colocou a bancada no foco midiático e provocou as mais antagônicas reações: de um lado os evangélicos comemoravam com estardalhaço os acordos que permitiram a eleição; do outro ou dos outros lados, seja entre os próprios membros da Casa, seja nas entidades de direitos civis, todos apreensivos com o que se prenunciava para o mandato – intolerância, polêmica, homofobia, racismo. Enfim, nada que se parecesse minimamente com defesa de direitos humanos e respeito às diferenças, o que ganhou maior evidência por conta das desastrosas opiniões do eleito. Composta atualmente por pastores e fiéis de diferentes denominações religiosas - especialmente pentecostais e neopentecostais - era de se esperar que a FPE atuasse de forma compacta. No entanto, exceto em questões muito específicas, a articulação da bancada é praticamente nula, com os parlamentares agindo e votando muito mais de acordo com suas crenças religiosas do que com as diretrizes dos partidos aos quais se vinculam. De acordo com o Deputado e pastor Roberto de Lucena9 (PV-SP), a bancada da FPE se articulou em torno de uma votação apenas 2 vezes, ambas envolvendo bebidas alcoólicas: a lei contra motoristas alcoolizados e a emenda que mantinha a proibição de venda dessas bebidas em estádios, durante a Copa. As duas votações aconteceram em 2012. Com relação à filiação partidária, hoje, na Câmara, o maior grupo dentro da bancada é formado por deputados eleitos pelo PSC – dos 12 deputados eleitos pelo partido, 11 integram a FPE. O segundo maior grupo é o dos deputados do PRB, vinculado diretamente à Igreja Universal do Reino de Deus. Em termos de avaliação da atuação parlamentar, segundo dados do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar – DIAP10, 95% dos deputados da bancada estão entre os mais faltosos da Câmara e 87% entre os mais inexpressivos. Ainda segundo o DIAP, na lista dos 100 “cabeças do Congresso” (61

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FOLHA DE SÃO PAULO. Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/poder/2013/05/1284979-articulacao-dabancada-evangelica-na-camara-e-praticamente-nula.shtml. Acesso em novembro de 2014. 10 DIAP. Disponível em http://www.diap.org.br/. Acesso em novembro de 2014.

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deputados e 39 senadores) apenas 4 fazem parte da bancada evangélica: os deputados Eduardo Cunha (PMDB-RJ), Anthony Garotinho (PR-RJ), Lincoln Portela (PR-MG) e o senador Walter Pinheiro (PT-BA). Também não há, não obstante o tamanho da bancada (se fosse um partido, seria o 3º maior da Câmara), nenhum projeto de lei de grande relevância nacional proposto pelos deputados da FPE, mais conhecidos pelos discursos recheados de passagens bíblicas e de intransigência preconceituosa, do que pela propositura de relevância. Mesmo assim, não há que se desconsiderar o papel que podem desempenhar em votações importantes, especialmente aqueles sobre temas polêmicos como aborto, união civil homoafetiva e adoção por casais gays, direitos esses contestados violentamente pela maioria dos membros da FPE, que se aliam ao lobby católico no Congresso para retardar e impedir o trâmite de projetos dessa natureza.

3 OS PROCESSOS Se figurar como alvo de processos e/ou investigações propiciasse visibilidade e poder, a bancada evangélica, defensora da moral, da ética e dos bons costumes em alto e bom som nos plenários e nos cultos realizados toda quinta-feira na Câmara Federal, certamente seria a mais expressiva no Congresso hoje. Na prática, a realidade é outra - na matéria "Vinde a mim os eleitores", de 23 de março de 201311, a revista Veja publicou: A bancada evangélica também não foge à regra do Congresso Nacional quando o assunto são denúncias de corrupção. Há acusados de corrupção, peculato (desvio praticado por servidor público), crime eleitoral, uso de documento falso, lavagem de dinheiro e estelionato. Há até um condenado a prisão que pode ir para a cadeia em breve, que tem pena de treze anos e quatro meses a cumprir.

As informações obtidas através do site Transparência Brasil dão conta de que mais da metade dos parlamentares da bancada evangélica são alvos de processos judiciais na Justiça Eleitoral e no Supremo Tribunal Federal por crimes como peculato, improbidade administrativa, sonegação de impostos, formação de quadrilha ou bando, 11

Disponível em http://veja.abril.com.br/noticia/brasil/a-forca-dos-evangelicos-no-congresso. Acesso em novembro de 2014.

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abuso de poder econômico além de terem recebido reprovação na prestação de contas nos respectivos Tribunais de Contas e Tribunais Regionais Eleitorais de seus estados de origem. No entanto, isso não parecer perturbar os fiéis eleitores nem a própria Frente Parlamentar Evangélica. Um exemplo bastante significativo pode ser visto quando analisados os líderes da bancada em 2013: João Campos (PSDB-GO), Anthony Garotinho (PR-RJ), Eduardo Cunha (PMDB-RJ), Lincoln Portela (PR-MG) e o Senador Magno Malta (PR-ES). Todos com processos, alguns com listas bastante extensas. Todos reeleitos, exceto o senador, cujo mandato vai até 2018. A ‘lista’ de processos de Anthony Garotinho exemplifica a situação12: - É alvo de inquéritos que apuram crimes eleitorais: STF – Inquérito 2601/2007, STF – inquérito 2704/2008, TRF-2 (Seção Judiciária do Rio de Janeiro – Processo nº 2008.51.01.8153972 – É réu em ação penal referente à máfia dos caça-níqueis e movida pelo Ministério Público Federal por lavagem de dinheiro, formação de quadrilha, corrupção e crimes contra a administração pública. Chegou a ser condenado a dois anos meio de prisão. A pena foi convertida em prestação de serviços e suspensão de direitos. É alvo de ações de improbidade administrativa: TJ-RJ Comarca de Nova Iguaçu – processo 0026769-53.2005.8.19.0038, TJ-RJ Comarca de São Fidelis – processo º 0000249-07.2011.8.19.0051, TJ-RJ Comarca do Rio de Janeiro – processo 0050419-80.2004.8.19.0001, TJ-RJ Comarca de Campos dos Goytacazes – processo 001172964.2009.8.19.0014, TJ-RJ Comarca do Rio de Janeiro – processo 0040380-19.2007.8.19.0001, TJ-RJ Comarca do Rio de Janeiro – processo 0040412-24.2007.8.19.0001, TJ-RJ Comarca do Rio de Janeiro – processo 0039456-08.2007.8.19.0001, TJ-RJ Comarca do Rio de Janeiro – processo 0064717-67.2010.8.19.0001, TJ-RJ Comarca do Rio de Janeiro – processo 0183480-95.2008.8.19.0001, TRE-RJ – processo 764689.2008.619.3802 - Em ação judicial eleitoral, foi condenado por abuso de poder econômico e uso indevido de veículo de comunicação social. A Justiça decretou inelegibilidade.

Dos 16 deputados Ficha Suja (já condenados) divulgados pelo site Transparência Brasil em fevereiro deste ano, 04 (25%) compunham a FPE. Destes, 02 foram reeleitos, sendo um deles Eduardo Cunha que, inclusive, trabalha para se eleger Presidente da Câmara Federal, em 2015. Nem sempre foi assim, no primeiro grande impacto investigativo que atingiu a bancada evangélica como um todo, o “escândalo dos sanguessugas” (fraude na

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SUL21. Disponível em http://www.sul21.com.br/jornal/bancada-religiosa-a-mais-ausente-inexpressiva-eprocessada/. Acesso em novembro de 2014.

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venda de ambulâncias durante o 1º governo de Fernando Henrique Cardoso), apenas 15 dos 60 deputados daquela legislatura se reelegeram. Anteriormente, o envolvimento do Bispo Rodrigues em várias denúncias e que provocou sua renúncia já havia provocado fissuras na aura de moralidade da FPE. Atualmente, 36 deputados da bancada evangélica (04 do sexo feminino), distribuídos entre 12 partidos e 11 denominações religiosas enfrentam processos e investigações em várias instâncias jurídicas pelo país afora. A grande maioria se prepara para mais uma posse em fevereiro de 2015.

4 O PATRIMÔNIO “De rolex de ouro no pulso e cabelos implantados, o pastor Malafaia recebeu “Veja” na sede de sua igreja”. Durante a conversa, entrou em detalhes: “O implante custou 20 mil reais”, “fiz com o mesmo médico do Zé Dirceu e do [senador] Agripino”. Este é um trecho da reportagem da revista Veja, de 06 de junho de 2012 13, com o pastor Silas Malafaia, na qual, entre outros assuntos, o pastor diz ser muito diferente do bispo Edir Macedo e afirma que o Brasil não é um país homofóbico e que os ativistas gays estão apenas de olho nos cofres públicos. Poucos meses após a matéria da Revista Veja, a publicação norte-americana Forbes fez, em janeiro de 2013, um levantamento do patrimônio dos principais líderes evangélicos no Brasil 14. Silas Malafaia estava entre os 5 mais ricos, mais especificamente na terceira posição, com um patrimônio estimado em 300 milhões de reais; atrás do bispo Edir Macedo (R$ 1,9 bilhão) e de Valdemiro Santiago (R$ 440 milhões), mas a frente de RR Soares (R$ 250 milhões) e de Estevam Hernades Filho e sua esposa, Sônia Hernandes (R$ 130 milhões). De acordo com a publicação, o pastor Malafaia “é o defensor de uma lei que poderia classificar o homossexualismo como uma doença” e “o pastor é uma figura proeminente no Twitter, onde tem mais de 440 mil seguidores”. Ainda de acordo com a Forbes, “Malafaia lançou uma campanha chamada o ‘Clube de Um Milhão de Almas’, que pretende levantar 1 bilhão de reais para sua igreja, a fim de criar uma rede de televisão global, para 137 países”. Ao tomar conhecimento da publicação da

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Veja. Disponível em http://veja.abril.com.br/blog/ricardo-setti/politica-cia/pastor-silas-malafaia-a-distanciaque-me-separa-de-um-edir-macedo-vai-do-brasil-a-china/. Acesso em novembro de 2014. 14 Forbes. Disponível em: http://www.forbes.com/sites/andersonantunes/2013/01/17/the-richest-pastors-inbrazil/. Acesso em novembro de 2014.

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Forbes e da associação da fé a um negócio lucrativo no Brasil, Silas Malafaia saiu em sua defesa, alegando que seu patrimônio era de 6 e não 300 milhões de reais, conforme afirmou a publicação. As declarações foram dadas à coluna de Mônica Bergamo15, da Folha de S. Paulo: “Vivo de renda voluntária. Eles me prejudicaram. (O fiel) vê aquilo e pensa, ‘Ih, não vou (dar o dízimo), tá me roubando”. O relato a respeito do patrimônio do pastor e Deputado Federal Silas Malafaia é apenas um de tantos casos que rodearam a mídia e a opinião pública a respeito não do patrimônio em si, mas da forma como tais liderem religiosos o construíram. A proliferação de igrejas nos últimos anos associada ao rápido ‘crescimento’ do patrimônio de seus líderes leva à inevitável associação do uso da religião como meio lucrativo no Brasil. Denúncias e investigações a respeito não faltam. Em fevereiro de 2012, a polícia investigava 16 denúncias de que o dízimo da Assembleia de Deus da Serra - Sede (dona de um faturamento mensal de mais de R$ 110 mil) estaria sendo desviado para a conta de seus pastores. Além disto, as denúncias indicavam o enriquecimento ilícito do presidente da igreja, o também pastor Délio Nascimento, cujo patrimônio ultrapassava os R$ 6 milhões. Em março do mesmo ano, o Ministério Público Federal instaurou procedimento para investigar 17 o líder da Igreja Mundial do Poder de Deus, Valdemiro Santiago, suspeito de enriquecimento ilícito e de fraude contra o sistema financeiro. De acordo com as denúncias, o líder religioso teria usado dinheiro de sua igreja para comprar fazendas e cabeças de gado no município de Santo Antônio do Leverger, em Mato Grosso. Juntas, as fazendas formam uma propriedade de mais de 26 mil hectares. A área equivale a 13,4 mil estádios do Maracanã. Somando gado, terras e benfeitorias feitas no local, o investimento total de Valdemiro chega a R$ 50 milhões. Em novembro de 2013, mais um18 de tantos casos que ilustram a situação narrada: após a denúncia de 51 fiéis, o pastor Paulo Sérgio Dutra de Moraes e mais cinco pessoas da cúpula da Assembleia, incluindo a mulher, Maria Lúcia, e o atual presidente e ex tesoureiro, Lucas Martins, estão sendo investigados em inquérito 15

Folha de S. Paulo. Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrada/89814-monica-bergamo.shtml. Acesso em novembro de 2014. 16 Globo. Gazeta Online. Disponível em http://gazetaonline.globo.com/_conteudo/2012/02 /noticias/agazeta/dia_a_dia/1125922-assembleia-de-deus-dizimo-vai-parar-na-conta-de-pastores.html. Acesso em novembro de 2014. 17 R7Notícias. Disponível em http://noticias.r7.com/brasil/noticias/ministerio-publico-investiga-lider-da-igrejamundial-20120320.html. Acesso em novembro de 2014. 18 Diário Web. Disponível em http://www.diarioweb.com.br/novoportal/noticias/cidades/160422,, Pastor+salta+de+um+Fiat+147+para+cinco+BMWs.aspx. Acesso em novembro de 2014.

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policial pelos crimes de apropriação indébita, sonegação fiscal, estelionato e enriquecimento ilícito. A polícia e o Ministério Público afirmam que o patrimônio obtido pelo pastor Paulo Sérgio é fruto de desvios das doações dos fiéis da igreja. O fundamento para tal acusação baseia-se na comparação entre o patrimônio de Paulo Sérgio em 1999, ano em que assumiu a direção da Assembleia - um carro Fiat 147 e uma casa humilde no residencial Gabriel Hernanes, periferia da cidade - e o adquirido até hoje – cinco automóveis BMW, todos de luxo, quatro deles zero quilômetro, dois imóveis em bairros nobres de Catanduva, incluindo uma mansão que ocupa cinco terrenos, avaliada em R$ 1,5 milhão. Embora não seja alvo de investigação sobre seu enriquecimento, o Deputado Federal Marco Feliciano tem um patrimônio a ser invejado19. Patrimônio este que, de acordo com o próprio Feliciano, tem origem no dinheiro que recebe de palestras, cujo valor é ‘variável’. Sem entrar em grandes detalhes sobre tais palestras ou mesmo os valores cobrados por elas, alega que a casa em que vive vale R$ 60 mil reais. Na verdade, a mansão é construída em um terreno de 600 metros quadrados e teve a garagem redimensionada para os três carros de luxo da família. Apenas um deles, uma BMW, vale, pelo menos, R$ 35 mil a mais que o valor declarado da mansão. O curioso é que ao lado da mansão de Feliciano funciona, em uma casa bem simples, uma clínica de estética, avaliada em R$ 65 mil. Infelizmente, esta é uma realidade presente em boa parte dos templos religiosos no Brasil. Milhares de pessoas se amontoam dentro de construções luxuosas onde pastores cantam, dançam, pulam e prometem a solução das mazelas de seus fiéis. Em troca do dízimo, claro. Dízimo cobrado, por muitas vezes, na base da pressão psicológica e de expedientes de enojar qualquer um que não esteja sobre a dissimulação sedutora dos pastores. Em um vídeo20 de uma de suas pregações, o pastor Marco Feliciano chega a pedir a senha do cartão de um dos fiéis. Não cabe aqui o julgamento do destino que os fiéis dão ao seu dinheiro, nem no que acreditam ou deixam de acreditar, mas é necessário que se reflita sobre o comportamento selvagem dos líderes destas igrejas quando o assunto é o dízimo. Enquanto as pessoas se apegam à fé para minimizar as dores de seus sofrimentos, pastores desfilam em carros importados; enquanto o dízimo é pago com um dinheiro que

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Pragmatismo Político. Disponível em http://www.pragmatismopolitico.com.br/2013/03/mansao-pastormarco-feliciano-60-mil.html. Acesso em novembro de 2014. 20 https://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=35bnmSimN9Y#!

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certamente faltará para quem doa, pastores adquirem mansões luxuosas. Nas palavras do bispo Edir Macedo: “É necessário dar o que não se pode dar. O dinheiro que se guarda na poupança para um sonho futuro, esse dinheiro é que tem importância, porque o que é dado por não fazer falta não tem valor para o fiel e muito menos para Deus”21. Utilizando dessa estratégia as igrejas afirmam que para firmar o ‘contrato’ com Deus são necessários o pagamento do dízimo e a realização de ofertas como forma de provar a fé. Quanto maior a manifestação da fé por meio da oferta, maior a benção recebida. Ou seja, quanto mais se dá, mais se recebe.

CONSIDERAÇÕES FINAIS A intolerância religiosa não é um mal dos tempos atuais nem mazela brasileira, mas, certamente, a posição das igrejas pentecostais e neopentecostais (que surgem da noite para o dia, com nomes cada vez mais elaborados, como o Ministério Profético Koinonya de Adoração ou a Igreja Remanescente Dualista dos Primogênitos, ambas em São Paulo) contribuem para cenas e situações que remetem às mostradas em países envolvidos em guerras religiosas, a exemplo das que ocorrem no Oriente Médio. Aqui são pastores que destroem imagens de santos católicos em programas de televisão, provocando sequências de vandalismo nas igrejas, sem consideração alguma ao preceito constitucional de “liberdade religiosa”. São “irmãs” que agem como os antigos inquisidores na busca do pecado alheio, são desmandos de toda ordem por ações que não se enquadram nos dogmas da igreja ou nas “determinações” do pastor e que vão desde o modo de vestir até a recusa em seguir o currículo escolar nacionalmente definido. Está se criando uma cultura religiosa do toma lá, dá cá, alimentada por propagandas muito bem elaboradas, nas quais pessoas das mais diversas áreas contam histórias de superação, quase milagrosas, em que saíram de situações difíceis e hoje mostram suas casas, carros, empresas, sucesso, encerrando sempre pela mesma frase “Eu sou a Universal”. Na imaginação de quem assiste, a mensagem subliminar insiste: esse é o caminho. Se eles conseguiram, eu também consigo. 21

MARIANO, Ricardo in GALLO, Fernanda V. A Teologia da Prosperidade na Igreja Universal do Reino de Deus. Disponível em http://www.uel.br/grupo-pesquisa/gepal/anais_ivsimp/gt2/3_FernandaGallo.pdf. Acesso em novembro de 2014.

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O marketing religioso é um poderoso aliado das igrejas evangélicas, o que sem dúvida contribui não só para o aumento dos fiéis, mas também para o surgimento de novas e estranhas denominações, alavancadas pelo desejo de, um dia, alcançar a glória celestial e, enquanto esse dia não chega, conquistar uma boa situação financeira com o crescimento do rebanho. A bancada evangélica agradece.

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