Periferização e homicídio: Estudo sobre a espacialização da violência no Município de Ananindeua/PA

July 25, 2017 | Autor: Clay Chagas | Categoria: Homicide, Crime, Cartografia, Violência, Homicidios, Urbano, Ananindeua, Belém, Urbano, Ananindeua, Belém
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Periferização e homicídio: Estudo sobre a espacialização da violência no Município de Ananindeua/PA Claudino Neves Dias1 Universidade Federal do Pará - [email protected] Clay Anderson Nunes Chagas2 Universidade Federal do Pará - [email protected]

INTRODUÇÃO

A periferia das cidades é cotidianamente confundida como sendo o “berço” de criminalidade nos espaços urbanos, isso porque a uma forte disseminação midiática que descreve o espaço urbano periférico dessa forma. O problema generalizado da violência que vem se atenuando e causando insegurança no município de Ananindeua, uma das principais cidades da metrópole paraense, faz com que venhamos discutir acerca dos fatores que levam a prática de homicídio neste município. Vários fatores chamam nossa atenção quando se trata de analisar as causas de homicídios, principalmente entre os jovens habitantes das periferias. Segundo Beato (2012) há vários estudos no campo das ciências sociais que dão ênfase ao fenômeno da distribuição espacial da criminalidade, destacando principalmente as áreas periféricas. A periferizaçãono espaço urbano segundo Fernandes (2012) gera um espraiamento das áreas de ocupações denominadas assentamentos precários, fato este que se direciona para as populações pobres. Essas áreas de assentamento são comumente conhecidas como invasões e são palcos das mais variadas formas dos acontecimentos de cunho violento.

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Graduando em Licenciatura e Bacharelado em Geografia pela Universidade Federal do Pará. 2 Professor Adjunto da Universidade Federal do Pará e da Universidade do Estado do Pará e coordenador do projeto de pesquisa.

Ananindeua faz parte desse cenário de violência que assola as cidades da Região Metropolitana de Belém, tendo como atores principais os jovens de baixa renda tanto como executores ou vítimas desses atos criminosos. Sendo assim, é do ponto de vista da geografia urbana que este artigo, propõe uma breve discussão sobre os fatores que levam a proliferação de homicídios no município de Ananindeua buscando compreender como o processo de periferização imbricado a segregação sócio-espacial se associa as práticas de homicídios nos bairros deste município.

UMA BREVE DEFINIÇÃO DE PERIFERIA URBANA O crescimento das ocupações nas áreas de expansão nas cidades da Região Metropolitana de Belém tem desencadeado um fenômeno de periferização. Identificar os espaços periféricos não apenas como suposta delimitação fronteiriça, mas também como espaços de identificação cultural de uma população que vive marginalizada em detrimento de um “modelo” de padrão sócioeconômico ideologicamente imposto, tem se tornado a base da análise espacial que surge em nosso interesse acadêmico em tentar compreender as relações sociais que são produzidas nesses ambientes. Nessa perspectiva, a relação que Milton Santos (2004) faz entre centro e periferia ao descrever os espaços que compõem uma metrópole como espaços luminosos definidos pela modernização expressando áreas ditas “evoluídas”, em contraste com espaços opacos, lugares de exclusão e rejeição da suposta modernidade (SANTOS, 1994. apud SOUZA, 2006), desperta a curiosidade em re-conhecer o que realmente define o centro e a periferia nas cidades. Com o crescimento populacional, atrelado diretamente à intensa imigração que a Região Metropolitana de Belém passou nas últimas décadas, associado a forte especulação imobiliária e rápida valorização do solo urbano, favoreceu o processo de periferização, esse fato encontrado no cotidiano citadino, acaba sendo entendido como “expansão das áreas suburbanas”. O município objeto de estudo desse artigo, Ananindeua faz parte da Região Metropolitana de Belém, diferente das metrópoles do Sul e Sudeste brasileiro não tem

seus espaços urbanos periféricos caracterizados por morros e favelas, as áreas de pobreza da Região Metropolitana de Belém pode ser definida na análise de Trindade Jr (1998) por baixadas inundáveis.Ananindeua foi a primeira cidade a fazer parte do espaço metropolitano de Belém, para Frattari; Souza (2010), esse município representa a área mais adensada da região contendo a segunda maior área conurbada(como mostra o mapa 1a seguir), tendo uma densidade demográfica de2.477,55 km², população de 493. 976 habitantes (IBGE, 2014),perdendo apenas para a Belém.

Em nossos estudos e leituras sobre a violência nas cidades observamos que os municípios com maior concentração populacional são as que apresentam também os maiores números de homicídios. Em suas pesquisas sobre a violência na capital de Minas Gerais Andrade; Marinho (2013)mostram que em uma década a população da capital cresceu 12,1% e que o índice de homicídios acompanhou o “crescimento da cidade” e da população, isso aponta que a concentração populacional esta diretamente relaciona com o aumento do índice de crime. No caso da Região Metropolitana de Belém, a taxa de homicídios registrados nos últimos três anos pela Secretaria Adjunta de Inteligência e Análise Criminal – SIAC/SEGUP revelam que há umagrande diferença entre o número de ocorrências espalhadas pelos diferentes municípios da RMB, no entanto, há uma concentração nas áreas de periferização das cidades paraenses, com destaque para as cidades que compõem a Região Metropolitana de Belém. Quando se analisa acontecimentos entre as cidades mais afastadas com aquelas mais próximas da metrópole, no caso de Ananindeua, constata-se que existe umgrande número de ocorrências nos últimos anos. Nas áreas com maior concentração há maior sensação de insegurança, ocasionando danos ao conjunto social, como mostra Frattari; Souza (2010, p. 1), ao dizerem que: Embora a criminalidade urbana esteja relacionada a um sentimento de insegurança generalizado que marca a vivência dos habitantes das cidades, redefinindo as práticas e o modo de vida dos cidadãos, é notório que ela não se distribui de forma homogênea por todo o território.

Nessa perspectiva observa-se uma sucessão de crimes e delitos direcionados aos espaços periféricos ou áreas de ocupação espontânea em Ananindeua,onde se observa a existência deinúmeros fatores que geram a prática de crimes. Entretanto,Beato (2012) afirma que o tráfico de drogas associado aos interesses econômicos gerados pelo mercado de entorpecente, faz com que a periferia seja vista como o palco dos homicídios produzidos nas cidades. Ananindeua é considerada um dos municípios mais violentos da Região Metropolitana de Belém, isso faz desse município um dos principais palcos de investigação espacial da violência na RMB. Em nossa discussão encontramos a necessidade de mostrar a espacialização dos fenômenos, tal situação requer a utilização das geotecnologias. Para que venhamos a ter uma leitura cartográfica dos fatos, utilizamos programas de geo-processamentoQGIS e ARQGIS,onde produzimos mapas em Quernel mostrando a espacialização dos homicídios em diferentes bairros. Neste sentido, busca-se compreender a realidade urbanalocal e fazer um comparativo entre os diferentesbairros que compõe a malha urbana do município de Ananindeuacomo mostra o mapa 2. URBANIZAÇÃO E HOMÍCIDIO Ao falarmos em urbanização não devemos nos remeter apenas aquelas idéias de que o espaço urbano deve ser visto como um conjunto articulado de obras e monumentos que estão inseridos nas cidades para viabilizar o fluxo, ideia bastante criticada por Lefebvre (2011). Para Corrêa (1989) o urbano é mais que isso seria um conjunto de relações sociais. A população de baixa renda em sua grande maioria padece das mínimas condições de planejamento urbano, morando em áreas precárias com alto índice de pobreza e baixo nível de seguridade, Ananindeua apresenta em seu entorno espaços dessa natureza, na definição de Corrêa (1986, p. 74) “Esta e a periferia dos pobres, do "povão", do trem de subúrbio e horas desperdiçadas no transporte, da autoconstrução e do sobre-trabalho, das favelas que agora ali aparecem, dos assaltos e do "esquadrão da morte", da falta de esgotos e de vias, calcadas, escolas e hospitais”

Cotidianamente vemos uma disseminação das mídias mostrando pessoas morrendo nas cidades devido ao crescimento da violência urbana, entretanto, uma reflexão deve se fazer presente, não podemos cair no erro característico do senso comum de associar todo e qualquer ato criminoso a população de baixa renda sendo que, atos violentos estão presentes em todas as classes sociais, contudo, estudos mostram que a ocorrência de homicídios ou crime contra a pessoa (BEATO, 2012), transcende com mais frequência nos subúrbios e/ou regiões periféricas onde ocorre uma “guerra” pelo território entre traficantes que disputam áreas de controle. Conforme é demonstrado no mapa abaixo. As áreas de concentração de homicídios no município de Ananindeua estão concentradas em bairros onde predominam precárias condições sociais e onde ainda contam com baixa rede de infraestrutura, equipamentos e serviços urbanos essenciais para população mais pobre. E ainda mais, são espaços de disputa pelo controle do tráfico de drogas, são pontos de venda e consumo dos mais variados entorpecentes.

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Para Beatos (2012), no entanto, o tráfico de drogas é apenas mais um fator responsável pela elevação das taxas de homicídios nas cidades brasileiras, contudo este elemento não pode ser visto como um fator isolado já que vários fatores contribuem para a ocorrência de homicídios nas cidades tal como a falta de emprego e políticas públicas que organizem o espaço de moradia da população pobre.São nas áreas periféricas das cidades que se corporificam os crimes violentos em detrimento da própria pobreza, como descreve Santos (1993, p. 10): A cidade em si, como relação social e como materialidade, torna-se criadora de pobreza, tanto pelo modelo socioeconômico, de que é o suporte, como por sua estrutura física, que faz dos habitantes das periferias (e dos cortiços)

pessoas ainda mais pobres. A pobreza não é apenas o fato do modelo socioeconômico vigente, mas, também, do modelo espacial.

Assim, entendemos que o fenômeno da urbanização e a falta de planejamento esta associada ao crescimento dos homicídios em Ananindeua, sobre este processo Beato (2012, p. 70)afirma que:“A rigor, poderíamos dizer que os crimes violentos são fenômenos urbanos associados a processos de desorganização nos grandes centros urbanos, nos quais os mecanismos de controle de deterioraram”. A deterioração dos mecanismos de controle apontados pelo autor não se trata apenas dos meios de repressão e punição (cadeias, centros de recuperação de menores entre outros), mas devemos atentar para a forma de educar e socializar o indivíduo perante a sociedade, principalmente no acesso a uma boa educação e interação social para jovens que vivem em áreas periféricas. É necessário compreender que a satisfação das necessidades humanas, dos pobres como quaisquer seres humanos, incluem também a liberdade, a participação na sociedade e o acesso à cultura.

CONSIDERAÇÕES FINAIS Nosso objetivo neste trabalho procurou entender a distribuição espacial dos homicídios junto ao processo de periferização característico na cidade de Ananindeua, que compõem a Região Metropolitana de Belém.A discussão referente à espacialização da violência nos espaços periféricos referente ao município de Ananindeua exige uma análise a cerca da urbanização e de sua composição territorial para os diferentes tipos de classe sociais que habitam e modelam os lugares do município, ao tratarmos de atos criminosos como homicídio cotidianamente identificados nas áreas urbanas. Foi pensando na identificação destes fatores que este artigo propõe uma breve discussão sobre os fatores que levam a proliferação de homicídios no município de Ananindeua buscando relacionar através de análise empírica, ausência de políticas públicas direcionadas não para a repressão dos indivíduos, mas sim políticas que contribuam para a socialização e habitação com dignidade para a coletividade dos indivíduos.

REFERÊNCIAS ANDRADE, Luciana Teixeira de.MARINHO, Marco Antônio Couto. Organização social do território e violência letal na Região Metropolitana de Belo Horizonte: o balanço de uma década: BEATO,Claudio. Crime e cidades. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 2012. CORRÊA, Roberto Lobato. Periferia Urbana:Geosul N° 2, 1986. ________.O Espaço Urbano. São Paulo: Editora Ática S.A, 1989. FERNANDES,José Clodoaldo M. L. Assentamentos precários e dispersão urbana: ocaso da Região Metropolitana de Belém. 2012. FITZ, Paulo Roberto. Goprocessamento sem complicação. São Paulo: Oficina de Textos, 2008. FRATTARI,Najla Franco. SOUZA, Dalva Maria Borges de Lima Dias de. Análise Descritiva da Mortalidade por Homicídio na Região Metropolitana de Belém: Seminário Nacional: Governança Urbana e Desenvolvimento Metropolitano. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. 2010. LEFEBVRE, Henri. A produção do espaço. Trad. Doralice Barros Pereira e Sérgio Martins (do original: La production de l’espace. 4e éd. Paris: ÉditionsAnthropos, 2000). Primeira versão: início - fev.2006. SANTOS, Milton. Urbanização Brasileira. São Paulo: EDUSP, 2008. TRINDADE JR, Saint-Clair Cordeiro da.A cidade dispersa: os novos espaços de assentamentos em Belém e a reestruturação metropolitana. Belém, 1993. Tese (Doutorado em Geografia) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, 1998.

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