PERON, T.; FORATO, T.; GUERRA, A. LINHA DO TEMPO: CONTROVÉRSIA ENTRE A CONTEXTUALIZAÇÃO DE EPISÓDIOS HISTÓRICOS E A IMAGEM DA CONSTRUÇÃO LINEAR DA CIÊNCIA.. In: XIV Encontro de Pesquisadores em Ensino de Física -EPEF, 2012, Maresias. Atas do XIV EPEF (online). São Paulo: SBF, 2012. v. 1, p. 1-9.

October 6, 2017 | Autor: T. Cyrino de Mell... | Categoria: Historia da Ciência, Ensino de Física, Filmes
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XIV Encontro de Pesquisa em Ensino de Física – Maresias – 2012

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LINHA DO TEMPO: CONTROVÉRSIA ENTRE A CONTEXTUALIZAÇÃO DE EPISÓDIOS HISTÓRICOS E A IMAGEM DA CONSTRUÇÃO LINEAR DA CIÊNCIA. TIMELINE: CONTROVERSY BETWEEN HISTORICALPHILOSOPHICAL CONTEXT AND THE LINEAR IMAGE OF CONSTRUCTION OF SCIENCE. Thiago da Silva Peron1, Andréia Guerra2, Thaís Cyrino de Mello Forato3. 1

CEFET/ RJ, COLÉGIO MILITAR DE JUIZ DE FORA, [email protected] 2

CEFET/ RJ, [email protected]

3 UNIFESP – DIADEMA – SP, [email protected]

Resumo Apresentamos um recorte de uma pesquisa que analisa o desenvolvimento, implementação e aplicação de um projeto pedagógico para introduzir o estudo da Teoria da Relatividade Restrita (TRR) na primeira série do Ensino Médio, a partir de uma abordagem histórico-filosófica. Os conceitos de tempo, espaço foram contextualizados em diferentes episódios históricos, com o apoio de uma linha do tempo, incluindo pensadores dessas diferentes épocas e filmes comerciais sobre suas respectivas culturas. Tal abordagem foi utilizada com o objetivo tanto de potencializar a compreensão dos conceitos envolvidos, quanto para contribuir para uma visão crítica sobre a construção da ciência, visando uma formação cidadã e atualizada. A pesquisa visou avaliar se o uso da linha do tempo permitiria construir em sala de aula um espaço em que questões histórico-filosóficas fossem trabalhadas sem tornar a discussão superficial e sem ampliar em demasia o tempo destinado às aulas de física. Considerando que uma linha do tempo pode trazer à sala de aula um relato linear, onde acontecimentos científicos se somam a fatos já apresentados, queríamos verificar se a ferramenta construída possibilitaria a superação desse obstáculo. Os dados foram tomados a partir de uma perspectiva qualitativa, em que o contato entre pesquisador, aluno e saber se deu em seu ambiente natural, a sala de aula. A pesquisa mostra que o obstáculo citado pode ser superado se o professor explorar os filmes e a partir da ilustração e motivação gerada pelos mesmos aprofundar as questões históricas e conceituais, num ir e vir visual capaz de prender a atenção dos alunos e aprofundar o estudo desejado. Palavras-chave: História da ciência, filmes, ensino de Física. Abstract This paper presents the excerpts of a research which analysis the development, implementation and evaluation of a pedagogical project to introduce Theory of Relativity Restrict in secondary school (10th) from an historicalphilosophical approach. Believing that space, time and movement are important for the complete comprehension of this theory; we developed lessons to discuss these concepts in an historical-philosophical approach. The historical-philosophical

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approach was used to discuss the scientific content such as to put science in scrutiny, discussing the construct of science over time. All this part was based in a specific didactic tool: a timeline. This timeline is different from others: it makes references of commercial films to presents the events and personages of each period of time. And because of this, this research aimed to evaluate if this tool allowed the teaching of space and time concept in an historical-philosophical approach in deep, but without use much time. Considering that a line of time could bring to class a linear narrative, where facts are put together with others facts, we evaluated if this line of time could overcome this challenge. The data to answer the question of this research are obtained from a qualitative perspective. So the contact with research and students in their context became the principal data source. The research shows that the line of time could be a good tool if teacher discuss the films and from the illustration and motivation of these films he discusses deeply the historical and philosophical questions. Keywords: History of science, videos, teaching Physics.

Introdução Inovações conceituais e metodológicas de diferentes tipos tem sido objeto de inúmeras pesquisas no ensino de ciências. Destaca-se a relevância da introdução de novos conteúdos curriculares, bem como o uso de variados recursos didáticos e de novas metodologias na sala de aula. Dentre as inúmeras possibilidades de inovação, apresentamos os resultados de uma pesquisa em torno à introdução da Física Moderna (FM) a partir de uma abordagem histórico-filosófica, em que inovações conceituais e metodológicas atuaram sinergicamente, de forma a potencializar a aprendizagem de conteúdos de física e sobre a física. A inserção de temas de FM na educação básica é defendida há alguns anos por pesquisadores da área de ensino de ciências (ARRIASSECQ; GRECA, 2004; OSTERMANN, MOREIRA, 2001), buscando contribuir para a formação de um cidadão participativo em sua sociedade, em todos os possíveis campos, sejam políticos, culturais, filosóficos ou tecnológicos (TEDESCO, 2006). Atualmente, objetivando essa formação, além dos conteúdos da física do século XX, defende-se uma abordagem histórico-filosófica que privilegie a discussão do processo de construção dos conceitos científicos, relacionando a produção científica com outras áreas do conhecimento (MATTHEWS, 1995; MCCOMAS, 1998). Apesar das considerações anteriores, nas escolas brasileiras, a FM tem sido pouco estudada. Fora isso, em geral, esse ensino é descontextualizado histórica e filosoficamente. Algumas pesquisas em ensino de ciências apresentam resultados de inserções de FM na educação básica visando alterar a situação descrita (OLIVEIRA, VIANNA, GERBASSI, 2007; OSTERMANN, MOREIRA, 2000). Apesar disso, é importante desenvolver e avaliar novos trabalhos, para construir subsídios capazes de potencializar o desenvolvimento de práticas pedagógicas que contribuam para um ensino de FM mais contextualizado. Essas considerações levaram-nos a desenvolver uma proposta pedagógica para o estudo do movimento, no primeiro ano do Ensino Médio (EM), introduzindo, a

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partir de uma abordagem histórico-filosófica, elementos da FM. O objetivo foi apresentar a Teoria da Relatividade Restrita (TRR) considerando as mudanças propostas por ela, acerca das concepções de tempo e espaço (JAMMER, 2010). A TRR proposta por Einstein sugere mudanças consideráveis nas concepções acerca de espaço e tempo, rompendo o absolutismo de ambos. Entretanto, apesar de reconsiderar conceitos estudados na mecânica, a TRR origina-se de problemas encontrados no eletromagnetismo (GALISON, 2005), na óptica (PIETROCOLA, 1993) e na questão prática de detectar o éter luminífero em fins do século XIX (STACHEL, 2005). Dessa forma, ao buscarmos uma compreensão mais integral da TRR, foi importante desenvolver esse estudo numa abordagem histórico-filosófica capaz de trazer à sala de aula discussões sobre como o tempo e o espaço foram entendidos ao longo da história e quais mudanças foram trazidas no século XX. Nesse caminho, um problema se colocou: como abordar questões histórico-filosóficas em torno às mudanças relacionadas aos conceitos de tempo e espaço sem tornar a discussão superficial e sem extrapolar o tempo destinado1 as aulas de Física previstas para o primeiro ano do EM? Um dos dezessete obstáculos identificados por Forato (2009, vol. 1, p. 97119), na transposição didática da história da ciência para o ambiente da escola básica, volta-se para os desafios em se conciliar “extensão versus profundidade”. Em oposição aos relatos muito superficiais, às grandes sínteses e às reconstruções lineares, a historiografia atual prescreve a compreensão de eventos históricos em seu contexto sociocultural, portanto, mediante abordagens bem delimitadas temporalmente e/ou tematicamente (KRAGH, 1987). Nosso desafio era responder à questão central dessa pesquisa sem incorrer nos erros apontados. Para superar o desafio, desenvolvemos um projeto pedagógico baseando-nos numa linha do tempo que ilustra diversos contextos sócio-históricos do desenvolvimento da ciência desde 1300 a.C até o final do século XX, utilizando filmes comerciais.2 Dessa forma, o presente artigo busca avaliar o uso e a adaptação dessa ferramenta para potencializar o ensino e a discussão das mudanças relacionadas aos conceitos de tempo e espaço absolutos. Por limites de espaço, destacamos a implementação da proposta, inserindo apenas alguns exemplos de dados obtidos. Localização temporal de episódios históricos

Dentre as imagens distorcidas sobre a construção da ciência está a visão acumulativa e de crescimento linear do conhecimento científico (Gil-PEREZ et al., 2001). Tal concepção, em geral, desconsidera crises, debates, controvérsias e rupturas na construção da ciência. Mediante uma concepção historiográfica atual da história das ciências, um modo de problematizar concepções deformadas seria o estudo de episódios históricos bem delimitados, abordando as inter-relações entre ciência, tecnologia e sociedade na construção da ciência. Ressaltar o processo coletivo de sua construção, destacando questões científicas e extra cientificas,

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O tempo didático é muito significativo em nosso contexto de pesquisa, por tratar-se de um colégio militar, onde a programação das aulas deve ser meticulosamente seguida semanalmente, permitindo que estudantes transferidos não sejam prejudicados. 2 Forato, 2009, vol 1, p. 78–85; vol. 2, p. 25-36 e 112-117. A linha está disponível em: http://www.nupic.fe.usp.br/Projetos%20e%20Materiais/o-eter-a-luz-e-a-natureza-da-ciencia

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explicitando rupturas conceituais e metodológicas pode contribuir para a formação crítica de estudantes (MARTINS, 2006). Surge, entretanto, um desafio: quando se apresenta episódios históricos isolados, os estudantes costumam demonstrar dificuldades para compreender sua localização temporal na história. A proposta da linha do tempo surgiu da necessidade de um enfoque contextualizado para o registro dos eventos históricos no tempo de forma a relacionar o desenvolvimento do pensamento científico com aspectos sociais da mesma época. Assim, pensadores de diversos campos do saber, e de diferentes civilizações, foram dispostos ao longo da linha do tempo. Cada época foi ilustrada por filmes comerciais que permitem ao professor realizar a contextualização do conteúdo científico, como exemplificado na seção IV deste trabalho. A diversidade de campos do conhecimento e culturas busca permitir a conexão entre aspectos da ciência e seu entorno cultural. O registro linear de fatos históricos não deve implicar, necessariamente, que a interpretação histórica deva ser descontextualizada e acrítica. Metodologia de pesquisa

Este recorte da pesquisa tem como objetivo pedagógico a aprendizagem dos conceitos de tempo e espaço absolutos, mediante uma concepção de ciência como construção socio-histórica. Buscou-se analisar o processo de interação dos alunos com os conteúdos propostos, avaliando se o uso da linha do tempo pôde contribuir para o entendimento dos conceitos físicos envolvidos e para a compreensão de rupturas na construção do conhecimento. A metodologia para a coleta e análise dos dados buscou a coerência entre as hipóteses que alicerçam as questões de pesquisa e seus objetivos (CARVALHO, 2006, p. 13). Assim, para avaliar o projeto, foi desenvolvida uma pesquisa qualitativa (ERICSON, 1984) em que anotações do diário do professor foram confrontadas com registros em vídeo e áudio realizados em todas as aulas. O professor que aplicou o projeto era integrante do grupo que o desenvolveu, assim, semanalmente a equipe do projeto se reunia para discutir os registros do diário, áudio e vídeo de forma a avaliar o que fora feito e direcionar as aulas seguintes. Como o professor já vinha trabalhando na escola há 6 anos, os detalhes necessários para a colocação das câmeras de vídeo, para a gravação as aulas, eram bem conhecidos. Os alunos foram informados que os registros coletados visavam trazer dados para a pesquisa desenvolvida e, assim, reorientar o planejamento prévio do curso. Foram coletadas as autorizações pertinentes junto à direção da escola, bem como aos responsáveis pelos alunos. A análise dos dados procurou enfocar tanto o processo de ensino e aprendizagem, quanto o produto final (CARVALHO, 2006), e voltou-se para os processos de interação ocorridos entre professor e alunos ao longo de todas as aulas. Buscamos avaliar de que modo a fala dos alunos incorporava os conceitos científicos e metacientífcos pretendidos. Seguindo as características da metodologia qualitativa o contato entre pesquisador e aluno em seu ambiente natural foi a fonte dos dados, onde buscamos interpretar o processo de interação entre sujeitos e conhecimento, tendo o vídeo e as notas de campo como principais instrumentos de coleta (CARVALHO, 2006, ERICKSON, 1984). O projeto foi aplicado a 148 alunos distribuídos em cinco turmas do primeiro ano do Ensino Médio de uma escola brasileira da rede pública de ensino.

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Aplicação da Linha do Tempo

Iniciamos o curso com a apresentação integral da linha do tempo aos alunos, destacando diferentes culturas e civilizações que contribuíram para a construção do conhecimento sobre a natureza. Enfatizamos diferentes momentos históricos, lembrando que cada época possuía métodos peculiares para o estudo dos fenômenos naturais. Em seguida, retornamos aos personagens selecionados. O primeiro filósofo a merecer destaque foi Aristóteles (IV a.C). A contextualização do filósofo partiu da discussão de cenas selecionadas do filme 300 (Snyder, 2006). O cenário do filme explana satisfatoriamente os costumes e divisões políticas do século III a.C. O filme atenta-nos para a importância dos filósofos nas decisões políticas e expõe a divisão social e política que havia na Grécia na época de Aristóteles. Apesar de não o exibirmos integralmente, a contextualização realizada a partir de algumas cenas foi muito rica, pois sua discussão foi complementada com falas dos alunos que o haviam assistido. A partir daí, exploramos a definição de Aristóteles para “espaço” como pertencente à categoria de quantidade, sendo uma quantidade contínua. O espaço seria a soma de todos os lugares ocupados pelos corpos, e “lugar”, a “parte do espaço cujos limites coincidem com o corpo que o ocupa” (JAMMER, 2010, p. 40). Essa discussão, que durou uma aula (50 minutos) e explorou o uso de imagens, foi complementada pelo destaque à cosmologia aristotélica. Discutimos a diferença entre mundo sublunar e supralunar, assim como movimento natural e violento. Para Aristóteles o movimento só podia ser inferido em relação a um segundo corpo e a conceituação do tempo confunde-se com a de movimento, a mudança de lugar em determinado intervalo de tempo. Destacou-se, ainda, que ele não relacionou diretamente medidas de tempo ao estudo do movimento, esta relação não era uma questão pertinente à sua época. (JAMMER, 2010). Nas duas aulas seguintes destacou-se o recorte do século II d.C, período em que Cláudio Ptolomeu, geometrizou a cosmologia aristotélica e a fundamentou de forma que foi apropriada na Idade Média. Comparando a concepção de mundo de Aristóteles com o enfoque dado por Ptolomeu enfatizamos mudanças e rupturas problematizando, assim, a visão de um progresso linear na ciência. Terminada essa discussão, destacamos o encontro da cultura dos povos de língua árabe com os da Europa nos séculos XI e XII. Nesse encontro, escritos de Aristóteles traduzidos e acrescidos de comentários dos povos de língua árabe retornam à Europa e são traduzidos para o latim pelos monges católicos, incorporando-se, assim, na doutrina da Igreja (BENOIT, MICHEAU, 1996). Para discutir essa questão, trabalhamos a linha do tempo explorando o filme O Nome da Rosa (Annoud, 1986), cuja história desenvolve-se dentro de um mosteiro católico do século XIII. Selecionamos algumas cenas que destacam o isolamento dos monges e, consequentemente, do saber. Para discutir as divergências dentro da própria Igreja diversas cenas foram selecionadas e apresentadas aos alunos. Por exemplo, a cena na qual o personagem central esconde seus aparelhos de observação astronômica do Abade foi confrontada com outra que mostra o trabalho dos copistas. Outro filme do qual extraímos fragmentos nesse momento foi 1492 – A conquista do Paraíso (Scott, 1992). O cenário é a Espanha do século XV. Exploramos seu contexto histórico ressaltando o uso das técnicas usadas nas caravelas, o desenvolvimento da ciência durante a Idade Média e as novas técnicas de transporte, agricultura e construção civil de fins da Idade Média. (BAYERL, 2008).

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A exibição e discussão das cenas selecionadas foram feitas em paralelo às ilustrações e destaques trazidos pela linha do tempo, entre os séculos XV e XVI em duas aulas. Utilizamos esse recorte para discutir que o conceito de espaço começou a sofrer mudanças mais significativas em relação à proposta aristotélica neste período (JAMMER, 2010). Discutimos, então, o modelo heliocêntrico de Copérnico e o fato de que Galileu Galilei, ao defender esse modelo, se defrontou com novos problemas físicos: como explicar a não percepção do movimento da Terra? Como explicar a queda dos corpos sem o uso da Física aristotélica? (GALILEI, 2004). Com base nisso, enfatizamos que na busca destas respostas, Galileu agregou contribuições relevantes ao estudo dos movimentos e apresentamos o movimento uniforme e uniformemente acelerado (GALILEI, 1935). Destacamos, ainda, que seu enfoque refutou a ideia antiga e medieval de um mundo separado em duas regiões, terrestre e celeste, com características e leis operacionais distintas. Ademais, se as experiências terrestres não permitiam estabelecer a rotação da Terra, tampouco provavam sua imobilidade (NASCIMENTO, 1990). Desse modo, exploramos os conceitos, pensadores e o contexto dado pelos filmes na linha do tempo para destacar que cada época e cada povo incorporam valores e concepções próprios à sua cultura. Em outra aula, Newton e sua obra Princípios Matemáticos da Filosofia Natural (1687) foram apresentados. A definição de espaço absoluto e espaço relativo aparecem nessa obra para distinguir movimento verdadeiro de movimento relativo. Para Newton, o movimento verdadeiro, ou absoluto, se daria em relação à sua definição de espaço absoluto (JAMMER, 2010). Discutimos os trabalhos de Galileu e Newton fazendo o recorte para a questão do tempo, destacando que para o primeiro, o tempo é uma medida importante para descrever os movimentos. Para Newton, a questão do tempo aparece com uma definição relacionada a algo “absoluto, verdadeiro e matemático, [que] flui sempre igual por si mesmo e sua natureza, sem relação com qualquer coisa externa” (NEWTON, 1952). Para ilustrar a importância da mecânica newtoniana que, pela sua precisão e completude, fundamentou inúmeros saberes posteriores, incluindo os métodos para a física teórica e experimental, voltamos à linha do tempo. Destacamos o filme Lutero (Till, 2002), discutindo a situação política e religiosa na qual nascera Isaac Newton. Com vistas a permitir ao aluno compreender melhor o contexto sóciocultural da Europa do século XVII, expusemos e discutimos cenas selecionadas do filme Moça com brinco de pérola (Webber, 2003). Exploramos, a partir do filme, as novas técnicas e a valorização dada à experimentação na Inglaterra e Holanda do século XVII. Considerações Finais

A localização e contextualização de episódios históricos na linha do tempo foi um caminho encontrado para trabalhar, nas aulas introdutórias à TRR, as discussões em torno aos conceitos de tempo e espaço ao longo da história, visando abordar os conceitos de espaço e tempo absolutos. Como ressaltamos na introdução, o limite de espaço nos fez optar em intensificar a descrição do processo em detrimento da descrição dos dados obtidos. Apesar disso, é importante ressaltar que os dados obtidos pelo diário do professor, vídeo e áudio nos mostraram que a participação dos alunos durante a exibição das cenas dos filmes e das imagens

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vinculadas à linha do tempo foi intensa, permitindo ao professor aprofundar as discussões históricas previamente planejadas. Os alunos que mostravam interesse com a resolução de problemas matemáticos, nas primeiras aulas, manifestaram insatisfação ao perceberem o teor da aula. Em contrapartida, os alunos desinteressados no estudo de ciências exatas mostraram satisfação ao perceberem como seria a aula. Alguns deles, após as aulas, afirmaram que estas aulas permitiram-lhes estudar mais a Física, pois compreenderam melhor o que lhes está sendo ensinado. “Achava que as pessoas tiraram as coisas do nada, mas a gente viu que tem um contexto histórico que explica porque o cara pensou aquilo tudo” – Citação de um aluno sobre as aulas. Essa visão de ciência historicamente contextualizada, configurada através da linha do tempo, permitiu ao professor trabalhar com os conceitos de espaço e tempo da mesma maneira, ou seja, estudar estes conceitos, suas mudanças ou evoluções no transcorrer da história. Um problema encontrado nas aulas de ciências em que discussões histórico-filosóficas estão sendo desenvolvidas é a dificuldade de manter a atenção de alguns alunos, ao menos em se manter a concentração em todo decorrer da aula. A utilização da linha do tempo, das imagens e dos filmes a ela associados provocou um dinamismo nas aulas, colaborou para manter a atenção dos alunos, até mesmo daqueles cujos interesses concentram-se nas equações e suas aplicações durante a discussão histórica encaminhada pelo professor. Perguntas e comentários durante a apresentação dos filmes permitiram trazer questões sobre o processo de construção da ciência no momento em que as respostas eram discutidas com os alunos: “Professor, este filme é antes ou depois de Galileu? Não foi Galileu que começou com a experiência?” – Pergunta após cenas de O Nome da Rosa, a partir da qual foi discutido os antecedentes de Galileu, questionando a imagem do cientista isolado. “Tem pouco filme na Idade Média, por quê?” – Pergunta realizada durante exposição da linha do tempo e utilizada para discutir a visão histórica equivocada do período conhecido como “Idade das Trevas”. “Por isso Newton não foi queimado?” – comentário sobre o filme Lutero, um aluno referiu-se à perda de poder da Igreja Católica na Inglaterra. Os registros das discussões travadas em sala mostram que no decorrer das aulas as questões levantadas pelos alunos e o entendimento dos assuntos tratados iam tornando-se mais complexos. Apesar disso, consideramos que a linha do tempo pode trazer à sala de aula um relato linear, onde acontecimentos científicos se somam a fatos já apresentados. A presente pesquisa mostra que esse obstáculo pode ser superado se o professor explorar os filmes indicados, e ainda outros, e a partir da ilustração e motivação gerada pelas cenas dos filmes, aprofundar as questões históricas e conceituais desejadas, num ir e vir visual capaz de prender a atenção dos alunos, e, assim, permitir aprofundar o estudo desejado. Referências ANNAUD, JEAN-JACQUES. O Nome da Rosa. Alemanha / França/ Itália,1986.

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