Philip Roth e a desilusão

June 14, 2017 | Autor: Luciano Mattuella | Categoria: Psychoanalysis, Psychoanalysis And Literature, Philip Roth, Psicanálise
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Philip Roth e a Desilusão

Luciano Mattuella

O escritor americano Philip Roth é, certamente, um dos grandes porta-vozes do mal estar da contemporaneidade. Junto a figuras como J.M. Coetzee, Raymond Carver e Richard Ford, Roth é expoente entre aqueles escritores que detêm o talento único de traduzir em palavras a atmosfera de paranóia, terror e medo que tomou conta do mundo nas últimas décadas, especialmente após os atentados de 11 de setembro. O que Philip Roth diagnostica em suas obras - como em Pastoral Americana, livro que lhe rendeu o Prêmio Pulitzer em 1997 - é justamente a sensação de desilusão do homem atual com relação àquilo que passado pôde lhe transmitir de experiência para dar conta de suas angústias. Como pode um passado tingido pelo matiz da guerra e da violência servir como referência para uma ação que procure a construção de um futuro? Já em 1933 (ano, aliás, de nascimento de Philip Roth), o filósofo e ensaísta alemão Walter Benjamin havia alertado, em seu conhecido artigo Experiência e Pobreza, para este enfraquecimento da relação entre o homem e sua história, para a impossibilidade de o passado ser entendido como uma herança que lance luzes sobre o presente. Philip Roth leva magistralmente adiante este tese, mostrando como a cultura americana produz ou homens alienados (os patriotas republicanos, defensores dos “bons costumes”) ou homens desiludidos como Nathan Zuckerman, célebre, e um tanto autobiográfico, personagem de diversos livros de Roth. Zuckerman, aliás, que se alia a David Kepesh - outro personagem importante, central, por exemplo, em O Professor de Desejo - como depositário de outro dos temas recorrentes em Philip Roth: a senescência, essa inexorável e irrecuperável passagem do tempo. O tempo como uma força devastadora, como o cronos a devorar todos os filhos um tempo, enfim, que não aponta para uma possibilidade de futuro, para a perpetuação e a transmissão de uma herança, mas tão-somente o passar da vida e a fragilização do corpo rumo ao silêncio da morte. Assim, a idéia de desilusão também assume, nas obras de Philip Roth, esta fachada de resignação à insuficiência do tempo vivido: somos todos

projetos fadados a nunca nos realizarmos por completo. Afinal, como pode um homem que nada herda deixar algo de permanente para aqueles que virão depois dele? Talvez não seja por acaso que vários dos personagens de Roth não tenham filhos: não conseguiram, a bem da verdade, nem mesmo tornarem-se, ele próprios, filhos da cultura - uma cultura cuja inocuidade insistem em explicitar, especialmente no campo político, da ação coletiva. Paradoxalmente, e para a sorte de todos nós, seus leitores, Philip Roth procura justamente na potência na escrita a possibilidade de denunciar as arestas mal-acabadas de um mundo desiludido. A palavra como um último recurso para que não nos reste meramente o papel de animais agonizantes.

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