Platão e Foucault: interseções nas relações de poder

June 9, 2017 | Autor: M. Pessoa Porto | Categoria: Michel Foucault
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1º Encontro Internacional de Estudos Foucaultianos: Governamentalidade e Segurança João Pessoa/PB – 2014 GT 4: Interfaces teórico-filosóficas

PLATÃO E FOUCAULT: INTERSEÇÕES NAS RELAÇÕES DE PODER1 Maria Veralúcia Pessôa Porto2 Dr. Iraquitan de Oliveira Caminha3

Resumo: Este trabalho busca apresentar as possíveis interseções existentes no pensamento filosófico de Platão e Foucault a respeito das relações de poder. Partindo das análises de Foucault sobre a Carta VII de Platão, aula de 16 de fevereiro de 1983, em Governo de si e dos outros, tratamos de questões como: o jogo nomotético, a relação entre a filosofia e a política, a figura de Dionísio na história com o objetivo de demonstrar - respeitando as distâncias cronológica e sociocultural – a importância do ágon no desenvolvimento do érgon filosófico. Palavras-Chave: Foucault. Platão. Érgon. INTRODUÇÃO

O tema das relações de poder ultrapassa os limites do tempo e do espaço geográfico. Na história da humanidade, perpassando dos antigos aos contemporâneos, temos fatos e acontecimentos que possibilitam refletir sobre os elos da política e da condição humana em meio às relações de poder. Nesses fatos, há registros de situações que sustentam, bem como de outras que fragilizam o homem, seja na relação do indivíduo consigo mesmo ou nas relações sociais. Tais relações de poder permitem refletir sobre o quanto permanece presente no próprio indivíduo, como nas relações com o outro, a ideia grega de agón, e é nesta disputa agonística que se apresentam o jogo, a competição e a luta. É com este entendimento que, não obstante a distância cronológica, pleiteamos abordar as interseções da compreensão sobre as relações de poder em Platão e em Foucault. Considerando histórica e filosoficamente as construções teóricas dos dois pensadores, temos Foucault, que não emite prognóstico ou profecia para a sociedade, mas que, ao contestar seus diferentes aspectos de funcionamento, mostra suas fraquezas, seus limites e, com isso, apresenta ao homem a possibilidade de reconhecer que ele compõe e faz parte dessa 1

Trabalho preparado para sua apresentação no 1º Encontro Internacional de Estudos Foucaultianos: governamentalidade e segurança, organizado pelo Departamento de Ciências Sociais e pelo Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal da Paraíba. João Pessoa, 13 a 15 de maio de 2014. 2 Aluna do Programa de Doutorado Institucional em Filosofia da UFRN/UFPB/UFPE. Professora da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN. 3 Professor orientador Doutor em Filosofia pela Universidade Católica de Louvain-la-Neuve e Professor da Universidade Federal da Paraíba - UFPB.

cadeia de relações. De outro lado, temos Platão, aquele que ficou conhecido por toda a história da Filosofia e toda a tradição filosófica como o teórico das Ideias, como o filósofo que tecia construções metafísicas e perpetrava prognósticos, e com estes a previsão, presságios sobre como a comunidade humana deveria se constituir visando a alcançar uma perfeição ideal. Dessa forma, muitos o interpretam como o prospector de um idealismo sobre o indivíduo e sobre a sociedade ou, melhor dizendo, sobre o estatuto da política, expressos na conjectura da cidade ideal. Entre um pensador que se propunha nada preconizar, prognosticar ou idealizar e outro cuja tradição tudo preconizou, prognosticou e idealizou existem aproximações acerca da leitura do fenômeno da vida, das relações e das representações sociais e de poder que nos possibilitam uma leitura aproximativa, ainda que precária. Se por um lado temos nas representações sociais e, por toda a história da humanidade, fatos que nos colocam diante de dispositivos de poder úteis como mecanismos de controle, por outro lado, temos a força para reconhecer tais mecanismos e lutar contra eles. Mas observa Foucault que “[...] só podemos compreender e comunicar aos outros o que nós mesmos podemos fazer” (2011, p. 29). É nesta perspectiva que Foucault analisa a Carta VII de Platão. Sendo Platão um filósofo que idealizava e Foucault um filósofo que rejeitava qualquer tipo de prognóstico ou profecia para a sociedade, como seria possível pensar em qualquer tipo de interseção de relações de poder considerando estes dois filósofos? E mais, se para Foucault, só podemos compreender e comunicar aos outros o que nós mesmos podemos fazer, e Platão fora considerado como um idealista, um filósofo conceitual, como Foucault percebe em Platão aquele que pode compreender e comunicar seus conceitos aos outros? Sendo a cidade visada pelo pensador grego uma proposta ideal e, deste modo, não sendo a cidade real, seria possível a Platão transmitir algum elemento positivo ou útil acerca de tais concepções de governo ou constituições políticas? Aventando o que nos parece uma interseção inicial entre os dois filósofos, começaremos a propor um caminho que possibilita um entrecruzamento entre esses dois pensadores, a saber: o caminho da liberdade. Acerca da liberdade, Foucault nos fala, em Ditos e escritos II, que é preciso abraçar com força as relações causais e adentrar no espaço, por baixo da História, para entendê-la no que a rompe e a agita, bem como vigiar por trás da política sobre os aspectos que a limitam. Desse modo Foucault analisou o pensamento filosófico de Platão a partir da contextualização de alguns enunciados da Carta VII como a ideia do jogo nomotético que só

pode ser percebido se analisado a partir da agonística do controle e da resistência, pois a partir da ideia de agón é possível analisar não apenas a constituição do poder, mas aquilo que também é imprescindível, a constituição de si, de modo a perceber o indivíduo face ao processo de assujeitamento e de liberdade, percepção que caracteriza a relação entre filosofia e política.

1. PLATÃO, O JOGO NOMOTÉTICO E A AGONÍSTICA DO CONTROLE E DA RESISTÊNCIA

Foucault nos sugere a partir da análise da Carta VII um Platão além das interpretações idealistas, mostrando que este filósofo desenvolvera uma espécie de jogo nomotético, no qual vivenciou a agonística do controle e da resistência, de modo que tudo o que a filosofia conceitual de Platão tem a dizer está necessariamente relacionado a este jogo. Para Foucault, mais do que qualquer outro, Platão fez uso deste recurso de forma que tal estratégia está presente em todos os diálogos e em vários momentos da República. Um exemplo são os mitos. Enquanto na leitura do livro X da República o que se observa de imediato é o desprezo, a desaprovação e a crítica severa às concepções míticas por parte de Platão, pode o leitor, ao invés de acolher tais fechamentos no que dizem respeito ao mito, pensar nos motivos e condições que geraram tais observações. Em suma, existe algo que caminha lado a lado com o mito: a realidade. Por sua vez, o mito permite indícios para interpretá-la. Platão observa que, exatamente por dizer o real por meio de enigmas, de forma fantástica ou alegórica, o mito deve ser interpretado de modo sério e com todas as precauções necessárias. Conforme Foucault, a concepção mítica que Platão emite é um excelente exemplo da expressão de um jogo mítico:

Uma pura e simples hipótese que sugiro a vocês: assim como Platão diz a propósito do mythos (do mito) que o mito não deve ser levado ao pé da letra e que, de certo modo, ele não é sério ou que se deve empregar toda a seriedade para interpretá-lo seriamente, será que se pode dizer a mesma coisa a propósito dos célebres textos das Leis ou da República, que foram frequentemente interpretados como a forma que Platão dá idealmente à cidade que ele gostaria que fosse real? Acaso a atividade de nomóteta, acaso o esquema legislativo e constitucional proposto pela República e pelas Leis não deveria, no fundo, no pensamento de Platão, ser tomado com tantas precauções quanto um mito? Acaso o que há de sério na filosofia não passa por outra parte? A atividade de nomóteta que Platão parece se atribuir nas Leis e na República não será um jogo? (FOUCAULT, 2010, p. 230-231)

Foucault, surpreendentemente, vai buscar o entendimento real da filosofia naquele filósofo que fora eternizado por toda a tradição filosófica como idealista. Na lição de 16 de fevereiro de 1983, proferida no College de France, publicada na obra Governo de si e dos outros, Foucault assevera que “[...] o real da filosofia na própria política, será outra coisa que não seja dar leis aos homens e propor a eles a forma impositiva dessa cidade ideal” (2010, p. 231). Deste modo, ele nos orienta que Platão não deve ser lido, mesmo em a República e nas Leis, na perspectiva de um tratado das leis ou da imposição de uma forma de governo ideal, posto que existe nesses textos todo um jogo que está presente nos diálogos, pois ao propor uma cidade ideal, ele aborda questões reais relativas à existência na cidade, isto é, para aquilo que de certa forma aponta para o aspecto realístico da filosofia, de sua inscrição no tratamento dos problemas do mundo real.

2. A RELAÇÃO ENTRE A FILOSOFIA E A POLÍTICA Assim, afirma Foucault que “[...] uma vez jogado esse jogo da cidade ideal, há que se recordar que a seriedade da filosofia está em outra parte” (2010, p. 232). Neste sentido, a seriedade da filosofia não consiste em dar leis aos homens ou mesmo lhes propor uma cidade ideal para viver, mas está nas práticas exercidas de si sobre si e o consequente exercício na vivência com os outros. Como então perceber isso em relação a Platão se ele sempre se recusou, ao menos em Atenas, ao exercício da atividade política? Há um fato que não passou despercebido ao olhar de Foucault: as viagens de Platão a Siracusa e todo o seu envolvimento com Díon e Dionísio. A Carta VII que Platão escreveu oferece não somente detalhes sobre sua segunda viagem, mas permite também compreender as práticas de si sobre si exercidas por Platão e, consequentemente, o realismo, o recurso à realidade presente em sua filosofia.

[...] é que dessa carta VII salta aos olhos que, se é verdade que a prova de realidade da filosofia é de fato esse procedimento que Platão ilustrou quando, chamado por Dion, foi se encontrar com aquele que exerce o poder político, se é que é mesmo essa a prova de realidade da filosofia, se é de fato aí e por aí que a filosofia escapa do perigo de não ser mais do que logos, se é por aí que ela alcança o érgon, essa prova da filosofia na política nos remete ao seguinte: o real da filosofia está na relação de si consigo. (FOUCAULT, 2010, p. 232)

Neste sentido, Foucault nos possibilita substituir a história do conhecimento da filosofia de Platão, repassada pela tradição, pela análise histórica das formas de veridicção dos fatos que Platão vivenciou em seu projeto filosófico. Isso nos permite, ao mesmo tempo, substituir as histórias das dominações em que as cidades antigas se encontravam, seja em Atenas com a Democracia, ou em Siracusa com a Monarquia, não tanto em função de concepções ideais, mas pelas formas das condições existentes à época. Deste modo, pode-se intentar voltar-se à busca da compreensão do próprio homem pela pragmática de si. É o que propõe Foucault utilizando como referência o pensamento de Platão. É exatamente na Carta VII que Platão nos apresenta esta possibilidade. Assim afirma Foucault: “E é, de fato, como articulação do problema do governo de si e do governo dos outros que a filosofia, aí, nesse texto, formula o que é seu érgon, ao mesmo tempo sua tarefa e sua realidade” (2010, p. 232-233). Para compreender a tarefa e a realidade da filosofia e em especial a de Platão, faz-se necessário retomar as questões políticas da época que motivaram o filósofo grego a realizar sua segunda viagem a Siracusa. Desse modo, percebe-se, como nos aponta Foucault, que para vivenciar seu projeto filosófico Platão seguiu o itinerário da pragmática de si, do voltar-se sobre si mesmo, algo que podemos constatar na revelação expressa por Platão na Carta VII, ao afirmar sobre si mesmo que: “Tinha o projeto de, no dia em que pudesse dispor de mim próprio, imediatamente intervir na política” (1971, p. 48). Neste sentido, para Platão desenvolver seu projeto e intervir na política, o convite para ir estar com Dionísio era a ocasião propícia para o desenvolvimento do érgon filosófico, visto que esse propósito era algo impossível em Atenas, principalmente para Platão naquele momento, devido às constantes manifestações de injustiças presentes na administração política da cidade, entre elas a morte de Sócrates. A decepção de Platão com sua cidade de origem e a péssima situação política em que Atenas se encontrava nos são apresentadas pelo próprio Platão na Carta VII, na qual ele afirma:

Entre outros, ao meu querido e velho amigo Sócrates, que não me canso de proclamar como o homem mais justo do seu tempo, quiseram associá-lo à tentativa de levar pela força, um cidadão a ser condenado à morte, isto com o objetivo, de por alguma forma, o comprometerem na sua política. Sócrates não obedeceu e preferiu expor-se aos maiores perigos, a tornar-se cúmplice de acções criminosas. Face a todas estas e a outras coisas do mesmo gênero, e de não menos importância, fiquei indignado afastei-me das misérias dessa época. (1971, p. 48-49)

Foucault observa que o impulso, o movimento ou o que conduziu Platão ao desenvolvimento do seu projeto – que, ao mesmo tempo em que se constitui pragmática de si, é constituição política – foi um determinado Kairós, uma ocasião específica. Mas mesmo a ocasião estava recheada de situações, contextos, vivências que se engendravam no complexo jogo nomotético. Um significado importante para Foucault é exatamente este: Platão, o próprio Platão, seguia agora para uma pragmática de si buscando a ordenação própria para si e para a cidade. E esta é a lei apropriada para o realismo em e da filosofia. Outro aspecto interessante referente ao Kairós se apresenta agora na outra parte que compõe este jogo: Dionísio, um jovem que aparentemente buscava dedicar sua vida à política. Conforme Foucault, a juventude de Dionísio, aquele que foi apresentado por Díon a Platão como alguém que desejava se dedicar à Filosofia para melhor governar a cidade, conduzia Platão a considerar essa um importante elemento da política: a fertilidade, i.é., a juventude, como algo apropriado ao exercício do político, não obstante na República (Lv VII, 537 d) Platão deixe claro que a maturidade é imprescindível na arte de bem governar, nas observações da Carta VII é imprescindível considerar que, para aprender a arte de bem governar, havia necessidade de se iniciar nesse processo desde jovem, e essa era a perspectiva de Platão em relação a Dionísio. Por último, como outros elementos relativos ao momento oportuno temos a legislação e as formas de governo existentes em Atenas, a Democracia, e em Siracusa, a Monarquia. Quanto à forma de governo, um aspecto do Kairós, Foucault, em o Governo de si e dos outros, afirma: “ao contrário do que ocorre numa democracia, em que é necessário persuadir muitos, em que é necessário persuadir a massa (o plêthos), aqui, no caso de uma monarquia, basta no fim das contas persuadir um só homem” (2010, p. 204)4. No que tange à legislação (as leis exteriores impostas à cidade), Platão afirma na Carta VII que:

[...] a legislação e a moralidade estavam corrompidas a tal ponto, que eu, inicialmente pleno de ardor para trabalhar a favor do bem público, considerando esta situação e vendo como tudo caminhava à deriva, acabei por ficar confuso. Não deixei, entretanto, de procurar nos acontecimentos e especialmente no regime político os possíveis indícios de melhoras, mas esperei sempre o bom momento para agir. (1971, p. 50)

A citação acima mostra algumas expressões importantes para compreender as interseções nas relações de poder em Platão e Foucault. Na pragmática de si, Platão nos mostra o ardor para trabalhar em favor do bem público, reconhecendo que nas cidades a 4

Ver Platão, Carta VII, p. 53.

história das dominações o atordoa e o confunde, deixando claro, porém, que resistirá a cada momento, procurará nos acontecimentos os possíveis indícios de melhoras e esperará o momento certo para agir, o que significa que neste constituir-se face ao processo agonístico está a permanente tensão presente na história do homem, apresentada tanto nas relações de poder como nas relações do próprio homem, que na condição de indivíduo é construtor da sua história. Ora, compreender a si mesmo e trabalhar em favor do outro, reconhecer na sua história fatos que o colocam diante dos dispositivos do poder, identificar os mecanismos de controle e, ao mesmo tempo, resistir, não de forma aguerrida, mas na luta sábia, i.é., com prudência, são exatamente estes os elementos presentes tanto na filosofia de Platão quanto de Foucault. Nas expressões filosóficas gregas, a Sophia (sabedoria) não se apresentava dissociada da Philia (amizade). Por isso mesmo, as questões que motivaram Platão a agarrar esse Kairós (ocasião) foram também os laços de amizade por Díon:

Nas minhas relações com Díon, que era ainda jovem, desenvolvendo-lhe as minhas opiniões sobre o que me parecia o melhor para os homens e, exortando-os a realizá-las, arrisquei-me a não me ter apercebido de que, de certa maneira, trabalhava inconscientemente para a queda da Tirania. Pois, Díon, muito aberto a todas as coisas, especialmente aos discursos que lhe fazia, compreendia-me admiravelmente, melhor que todos os jovens com quem jamais convivi. (PLATÃO, 1971, p. 51)

Era a relação essencial entre kairós e philia que conduzia Platão a trilhar o caminho pensado e, nesse percurso de realizar a si próprio, quiçá pudesse tornar a cidade melhor. Observemos que o caminho pensado não é o idealizado e estabelecido em um nível de abstração inatingível, mas a partir dos acontecimentos. É a investigação que Foucault aponta a partir dos motivos que conduziam Platão. [...] é a philía, a amizade que tem por Díon. O outro motivo – era precisamente nisso que tínhamos nos detido – é o fato de que se ele, Platão, recusasse a missão que Díon lhe propunha, se se recusasse a ir enfrentar a tarefa que lhe era assim apresentada, pois bem, teria a impressão de não ser, ele próprio, Platão, nada mais que logos, puro e simples discurso, quando ele tem de, ele quer pôr mãos ao érgon (isto é, à tarefa, à obra). (2010, p. 205)

Platão tem agora a possibilidade de colocar em prática a teoria, a possibilidade da concretização política da cidade “idealizada” na República e, ao mesmo tempo, realizar a si próprio. E é nesse jogo da trajetória do lógos (discurso pensado) ao érgon (atividade filosófica) que temos a aplicação do discurso.

3. DIONÍSIO E A AGITAÇÃO DA HISTÓRIA

Foucault nos convida a adentrar no espaço, por baixo da história, para entendê-la no que a rompe e a agita, e vigiar por trás da política sobre os aspectos que a limitam, os quais são, ao mesmo tempo, práticas de conhecimento pelas quais todos os modos de conhecimento devem coabitar. Isto nos coloca na presença da realidade tal como ela é: não uma situação idealizada nem tão somente o fruto de contradições que nos são oferecidas, mas exatamente o jogo que se apresenta entre as concepções conceituais e a prática vivenciada. Conforme Foucault, considerando a intervenção de Platão junto a Dionísio, a pragmática de si é apresentada não somente no desejo, mas no corpo político movido pelo logói de se tornar érgon. Deste modo, Platão é movido por uma obrigação interna que é a própria tarefa da filosofia. Nesta tarefa, ele se depara com os outros com os quais compõe a realidade social. Na cidade, têm-se os prágmata, e com eles o comércio, as negociações, as atividades diárias para manutenção dos negócios e as dificuldades oriundas de tais atividades. Tais critérios também são identificados nos indivíduos em sua singularidade, daí a necessidade de exercícios constantes:

Pois bem, são os negócios, as atividades, as dificuldades, as práticas, os exercícios, todas as formas práticas nas quais é necessário exercitar-se e aplicar-se, e por causa das quais é necessário se dar um grande trabalho, e que dão efetivamente um grande trabalho. (FOUCAULT, 2010, p. 217)

Aí se apresentava a primeira e grande dificuldade de Platão: Dionísio, monarca por Estatuto e por herança, ainda que jovem, já desenvolvia uma tirania. Estaria este disposto a se doar neste grande trabalho? Platão apresenta o cenário político em que se encontrava trazendo-nos a informação na Carta II de que o pai de Dionísio

[...] tinha conquistado na Sicília um grande número de cidades importantes devastadas pelos bárbaros. Mas, depois, de as ter reconstruído, não conseguiu instalar em cada uma delas um governo seguro, confiado a amigos escolhidos por ele, quer entre estrangeiros de diversas origens, quer entre os seus irmãos que ele próprio havia educado, porque eram mais novos, e a quem de simples particulares, fez chefes, e, de pobres, homens prodigiosos e ricos. De nenhum deles pode tornar, apesar dos seus esforços, um associado ao seu poder, nem pela persuasão, nem pela instrução, nem pelos seus favores ou pela afeição da família. Nisso mostrou-se sete vezes inferior a Dario, que confiando em pessoas que não eram nem seus irmãos, nem educados por ele, mas unicamente aliados na sua vitória sobre o eunuco medo, dividiu o seu reino em sete partes, cada uma delas maior que toda a

Sicília, e encontrou neles colaboradores fiéis que nem lhes criaram nenhuma dificuldade, nem as suscitaram entre si. (1971, p. 59)

Fustel de Coulanges, em A cidade antiga, no capítulo em que aborda os tiranos populares, afirma que “Os tiranos, só enquanto satisfaziam as ambições da multidão e alimentavam as suas paixões, podiam manter-se no poder” (1987, p. 350). E ainda acrescenta:

[...] os tiranos que, nos séculos IV e III, governaram em todas as urbes gregas só reinaram lisonjeando o que havia de pior na multidão e suprimindo violentamente todo o homem que, por nascimento, riqueza ou mérito, lhes fosse superior. O seu poder era ilimitado [...] (1987, p. 350)

Conforme Platão, o pai de Dionísio havia reunido toda a Sicília em uma só cidade e, em não confiando em ninguém, teve grandes dificuldades no exercício do poder. A escassez de amigos lhe impedia de ter partidários e assessores fiéis. Deste modo, na existência do kairós, mas na falta da philia associada à sophia, todo o governo é inseguro e se apresentará diante de grandes dificuldades. Na interpretação da Carta VII, Foucault nos apresenta o jogo político e neste cenário identifica três círculos que o envolvem – o primeiro é o círculo da escuta: “[...] a filosofia só será um discurso, só será real se for escutada” (FOUCAULT, 2010, p. 223), o segundo é o círculo do trabalho de si sobre si como o real da filosofia: “[...] o discurso filosófico só será real se acompanhado, sustentado e exercido como uma prática, e através de uma série de práticas” (id., ibid.), e o terceiro é o círculo do conhecimento. Os dois primeiros círculos pareciam impossíveis de se constituir no trabalho político de Dionísio, pois o que a realidade apresentava era exatamente o contrário: Dionísio não escutava ninguém e nem mesmo a si próprio. Neste sentido, a Filosofia também não se constituía, pois

[...] a filosofia não pode se falar a si só, a filosofia não pode se propor como violência, a filosofia não pode aparecer como a tábua das leis, a filosofia não pode ser escrita e circular como o escrito que cairia em todas as mãos ou em quaisquer mãos. (FOUCAULT, 2010, p. 215)

Deste modo, restava a Dionísio o terceiro círculo, o do conhecimento, o qual ele soube aproveitar e administrar com todas as suas forças, por exemplo: iniciou o tirano por escrever um tratado com Leis, mathémata, para reger a cidade, mas Platão sugere exatamente o

contrário: não existe lei ou qualquer tipo de fórmula fixa e pronta para o conhecimento, devendo este se produzir em si e por si. Para tanto, é preciso ir além das mathématas: As mathématas são, claro, conhecimentos, mas também são as próprias fórmulas do conhecimento. São ao mesmo tempo o conhecimento em seu conteúdo e a maneira como esse conhecimento é dado em matemas, isto é, em fórmulas que podem provir da máthesis, isto é, do aprendizado de uma fórmula dada pelo mestre, escutada pelo discípulo, aprendida de cor pelo discípulo, e que se toma assim seu conhecimento. (FOUCAULT, 2010, p. 225)

Assim como Platão, Foucault observa que a filosofia não possui fórmulas e só é possível cultivá-la por synousía (é o ser com, é a reunião, é a conjunção). Significa então que o terceiro círculo, o do conhecimento, também é impossível de efetivação, considerando que para Dionísio não há no conhecimento a coabitação com a prática ou seu exercício, fazendo interagirem conhecimento e realidade. Afirma Foucault que “[...] quem deve se submeter à prova da filosofia deve "viver com", deve, empreguemos a palavra, "coabitar" com ela [...]” (FOUCAULT, 2010, p. 225). Assim, no jogo político que se apresenta neste cenário, embora Dionísio tenha o poder, é em Platão que Foucault percebe o filosófico do jogo que se encontra nas relações de poder. É com Platão que os três círculos (da escuta, do trabalho de si sobre si e do conhecimento) apresentam a filosofia mais autêntica e, consequentemente, mais real. Em Platão, os três círculos do jogo político aparecem coabitando, lutando, jogando ou metamorfoseando-se:

Que aquele que filosofa tenha de coabitar com ela, é o que vai constituir a própria prática da filosofia e sua realidade. Synousía: coabitação. Syzên: viver com. E, diz Platão, é à força dessa synousía, à força desse syzên que vai se produzir o quê? Pois bem, a luz vai se acender na alma, mais ou menos como uma luz ("phôs") se acende (a tradução diz "um lampejo"), isto é, como uma lamparina se acende quando é aproximada do fogo. (FOUCAULT, 2010, p. 225-226)

Somente por meio da alma se deve determinar não a natureza das coisas, mas as condições que possibilitam seu conhecimento real. A relação entre a alma e as coisas consiste nesta coabitação, a partir do momento em que a luz, essa chama, vai ter de alimentar a si mesma com seu combustível para dirigir-se ao mundo, às coisas.

Nesta interpretação de Platão, a filosofia se acende na alma e é alimentada pela própria alma e, nessa coabitação, ela é vida, é ânima. No diálogo Teeteto5, Platão trata do conhecimento. Neste diálogo, Sócrates estabelece que a estrutura do conhecimento como episteme principia com as noções comuns – conceitos gerais e categorias, que não devemos à afecção dos sentidos, mas à própria atividade da alma. Entretanto, ele admite que (189 e) há “discursos que a alma mantém consigo mesmo acerca do que ela examina”. Na fala de Sócrates: Seria absurdo [...] se uma quantidade enorme de sensações estivessem apinhadas dentro de nós como num cavalo de pau, sem se relacionarem com uma única ideia, ou seja, a alma ou como te aprouver denominá-la, ponto de convergência delas todas, por meio da qual, usada como instrumento, percebemos todo o sensível. (PLATÃO, 2001, p. 99)6

Nos mostra Platão que não é no conhecimento de fora, na lei escrita, nas condições exteriores, no uso do poder que o jogo de quem está à frente do governo se efetiva como autêntico, mas é na relação consigo, no trabalho de si sobre si, no trabalho sobre si mesmo, como faz Platão e Foucault o reconhece: “Aquilo em que a filosofia encontra seu real é a prática da filosofia, entendida como conjunto das práticas pelas quais o sujeito tem relação consigo mesmo, se elabora a si mesmo, trabalha sobre si” (FOUCAULT, 2010, p. 221). De todo modo, considerando Dionísio e a agitação da história que o circunda, vemos Platão com seu projeto, que em busca de realização e aplicação, demonstra suas angústias, e com elas a necessidade de resistência para indícios de melhoras:

Não deixei [...] de procurar nos acontecimentos e especialmente no regime político os possíveis indícios de melhoras, mas esperei sempre o bom momento para agir. Acabei por compreender que todos os Estados atuais são mal governados, pois sua legislação é praticamente incurável sem enérgicos preparativos coincidindo com felizes circunstâncias. Fui então irresistivelmente conduzido a louvar a verdadeira filosofia e a proclamar que somente à luz se pode reconhecer onde está a justiça na vida pública e privada. Portanto, os males não cessarão para os humanos antes que a raça dos puros e autênticos filósofos chegue ao poder, ou antes que os chefes das

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Embora nesta obra específica Teeteto apresente três possibilidades de definições para o conhecimento: 1ª) Conhecer não é mais do que as percepções sensoriais (derivada da tese de Protágoras (151 e); 2ª) Conhecer é ter uma opinião verdadeira sobre algo (187b) e, 3ª) Conhecer é a opinião verdadeira acompanhada da razão. (201 d). Nenhuma delas diz o que é o conhecimento, exatamente, por apresentar uma espécie de divagação, desvio de rumo, foco ou coabitação com a própria realidade ou mesmo alguma espécie de subterfúgio. Muito próximo a digressão do conhecimento que Foucault vai nos apresentar a partir da análise da Carta VII quando as formas do conhecimento não expressam a realidade, são usadas na maioria das vezes para romper a continuidade do discurso; a incapacidade de interpretar e entender um discurso; ou uma mudança intencionada da realidade. 6 Ver Teeteto, 184d.

cidades, por uma divina graça, se não ponham a filosofar verdadeiramente. (PLATÃO, 1971, p. 50)

É neste aspecto que Foucault retoma o pensamento de Platão e apresenta, na obra Governo de si e dos outros, a necessidade de uma compreensão de si na dimensão do esclarecimento e do jogo que acompanha todo o seu processo de subjetivação. Platão nos adverte que o homem, na forma como foi instituído socialmente, prefere que a escrita, os que estão no governo ou na administração da cidade, ou mesmo os sábios e os preceptores lhe revelem o entendimento sobre o mundo, sobre as coisas e sobre si mesmo, conduta tão forte que se revela não somente na dimensão intelectual, mas em todas as práticas e vivências. Deste modo, neste tipo de sociedade na qual reina a comodidade, não é preciso o esforço de se construir, de modo que o que está instituído como verdade ou o que está posto vai determinar o indivíduo. O homem se encontra entre a aceitação das determinações postas para serem seguidas e a possibilidade da crítica a este modo de vida e de sua consequente superação. É neste aspecto que temos em Foucault a significação mais potente do pensamento de Platão – em uma perspectiva de interpretação afastada daquela dos intelectuais e intérpretes de Platão até então –, e foi esse valor que orientou de modo bastante significativo Foucault. Vejamos o que ele nos diz sobre isto na obra Governo de Si e dos Outros:

Pois bem, entre essas duas possibilidades, entre esses dois temas (o de uma história das mentalidades e o de uma história das representações), o que procurei fazer foi uma história do pensamento. E por "pensamento" queria dizer uma análise do que se poderia chamar de focos de experiência, nos quais se articulam uns sobre os outros: primeiro, as formas de um saber possível; segundo, as matrizes normativas de comportamento para os indivíduos; e enfim os modos de existência virtuais para sujeitos possíveis. (FOUCAULT, 2010, p. 4)

Sobre o cenário intelectual de Foucault, temos em Conversações sem complexos com um filósofo que analisa as “Estruturas do Poder”, entrevista de 10 de outubro de 1978, Ditos e Escritos IV, que: - O que procuro fazer – e que sempre procurei fazer desde meu primeiro livro verdadeiro, História da Loucura na Idade Clássica – é contestar, através de um trabalho de intelectual, diferentes aspectos da sociedade, mostrando suas fraquezas e seus limites. Contudo, meus livros não são proféticos e tampouco um apelo às armas. Eu ficaria extremamente irritado se eles pudessem ser vistos sob essa luz. O objetivo a que eles se propõem é o de explicar, do modo mais explícito [...], essas zonas da cultura burguesa e

essas instituições que influem diretamente nas atividades e nos pensamentos cotidianos do homem. (FOUCAULT, 2012, p. 299)7

Ora, se Platão revela na Carta VII a atividade política e a necessária interseção do logos junto ao érgon, temos algo muito próximo do que fez o próprio Foucault, posto que em muitas de suas obras ele deixa claro que seguiu o mesmo roteiro ou cenário de sua primeira e verdadeira obra, História da loucura, pois o que sempre objetivou fora mostrar as fraquezas e limites ou as relações de poder no indivíduo e na sociedade, e a partir destes elementos, i.é. do reconhecimento dos mecanismos, desenvolver o érgon filosófico.

CONCLUSÃO

O trabalho ou a atividade filosófica não é o opróbio ou qualquer espécie de situação que leve ao vexame, nem mesmo é a situação cômoda da espera de que as coisas aconteça m, mas é o que edifica e possibilita projetos que conduzem a escolhas de caminhos a serem percorridos tanto ao nível do homem como indivíduo quanto do homem em sociedade no exercício da atividade política. Parece-nos que Platão nos legou em sua prática política a possibilidade de perceber que nas relações de poder existe o jogo, e com ele a agonística do controle e da resistência. E se por um lado nos é apresentado o uso indevido e de forma inapropriada da filosofia por Dionísio, que chegou mesmo a escrever um tratado de filosofia sem sequer ter passado da primeira lição, por outro lado, temos Platão, que se utiliza destes meios para apresentar o érgon filosófico. O meio utilizado por Platão e bem interpretado por Foucault é o caminho da liberdade. Temos nesse sentido a retomada da ideia grega de agón no sentido de perceber o quanto permanecem presentes no indivíduo e nas relações com o outro o jogo, a competição e a luta. A partir da ideia de agón, é possível analisar não apenas a constituição do poder, mas aquilo que também é imprescindível: a constituição de si, de modo a perceber o indivíduo face ao processo de assujeitamento e de liberdade. Nesta constituição face ao processo agonístico, temos a permanente tensão presente na história do homem, a qual se apresenta tanto nas relações de poder como nas relações do próprio homem, o qual, na condição de indivíduo, é construtor de sua história. A postura de Platão apresenta não somente o intuito de reabilitar a Filosofia, mas ao 7

FOUCAULT, Michel. Ditos e Escritos IV, São Paulo: Forense, 2012, p. 299.

mesmo tempo assume a defesa do érgon filosófico contra a tirania. Para tanto, ao invés de propor um projeto ideal, Platão resolve especular, investigar as ações de Dionísio e propor a partir da situação o real da filosofia, processo que pode ser considerado uma tipo de “maiêutica” socrática ou de movimento socrático de retorno a si mesmo, tendo a partir daí a preocupação de conhecer os próprios limites e forças. O agir de Platão, esse processo que o filósofo percorre em sua busca pelas condições de possibilidade do conhecer e do agir, é o exemplo do que Foucault denomina “subjetivação”, trabalho pelo qual o sujeito constitui a si mesmo, por isso ele afirma que a escolha é uma das condições primeiras para a prática filosófica. É neste sentido que Platão e Foucault possuem interseções, isto é, elementos que se intercruzam no que diz respeito às relações de poder. Vivem a filosofia. Trilham um caminho, escolhem um percurso e assumem o compromisso de trilhá-lo. A aplicação da Filosofia está no vínculo com a vida, Platão viveu a filosofia, Foucault também viveu e, neste sentido, “se é filósofo até nas ações cotidianas” (FOUCAULT, 2010, p. 219). Deste modo, esta concepção de Foucault, aliada às condições de Platão: boa memória, capacidade de guardar fatos na memória; raciocinar em uma situação, contexto, acontecimento; aprender e aplicar esta aprendizagem na tomada de boas decisões são o caminho para o real da Filosofia. Gostaria ainda de citar um trecho da Carta II de Platão: “Na Grécia, não somos uns desconhecidos, e a nossa ligação não foi um segredo para ninguém. E podes ficar certo de que até no futuro ela será recordada, seja qual for o número de pessoas que dela ouvirem falar, como relação importante e profunda” (1971, p. 16). Foucault foi, portanto, aquele que soube na contemporaneidade explorar o antevisto por Platão e retomar tais vivências a fim de refletir sobre temas que, na concepção de Platão, são atemporais. Acerca disso, podemos ler em Platão: “A sabedoria e o poder tendem, naturalmente, a unir-se: eternamente se perseguem, se procuram, se juntam; por isso os homens gostam de se lhes referir ou ouvir referir nas conversas privadas e nos poemas” (PLATÃO, 1971, p. 16). Por fim, considerando Platão e Foucault e as interseções nas relações de poder, concluímos com algumas possíveis afirmações: primeiramente a de que o logos é importante, mas se ficar no âmbito somente da teoria ele se torna inválido; a segunda é a de que é necessário ir ao érgon e buscar suas devidas associações com o lógos; a terceira é a constatação de que conhecer o caminho é diferente de trilhá-lo, mas, por outro lado, é impossível trilhá-lo sem conhecê-lo.

REFERÊNCIAS

COULANGES, Fustel de. A cidade antiga. Tradução de Fernando de Aguiar. São Paulo: Martins Fontes, 1987. FOUCAULT, Michel. O governo de si e dos outros: curso no College de France (1982-1983). Tradução de Eduardo Brandão. São Paulo: Martins Fontes, 2010. __________. Dits et écrits I I (1976-1988). Paris: Gallimard, 2012. __________. Gênese e estrutura da antropologia de Kant. Tradução de Márcio Alves da Fonseca e Salma Tannus Muchail. São Paulo: Edições Loyola, 2011. PLATÃO. Carta VII. Tradução de Conceição Gomes da Silva e Maria Adozinda Melo. Lisboa: Editorial Estampa, 1971. __________ Carta II. Tradução de Conceição Gomes da Silva e Maria Adozinda Melo. Lisboa: Editorial Estampa, 1971. __________ Teeteto. Tradução de Carlos Alberto Nunes, Belém: EDUFPA, 2001.

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