Poéticas do Processo : arte conceitual no museu. 1. ed. São Paulo: Iluminuras, 1999. 197p .

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Descrição do Produto

Cristina Freire

POETICAS DO PROCESSO Arte Conceitual no Museu

SICTIIÂRIA

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OOVERNO DO ESÍADO DE

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A/rre ljnir¡nid¡de

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Copyright@ 1999: Cristina Freire

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Copyright @ desta edição: Editora lluminuras Ltda. Capa: Fê sobre Paulo Bruscky, Confirmado: é Arte,1977 (carimbo e decalque s/ cartão-postal), Alfredo S. Portillos, Caixa com Sabões para Distintas C/asses Sociais, 1971 (caixa de madeira, sabões, nanquim e foto p/b s/ papel) e,Manuel Casimiro, ProieTo Porto de Nice, 1976 (diapositivos a cores, detalhe), modificados digitalmente.

Revisão:

APRESENTAÇAO E AGRADECTMENTOS, 13

ARTE CONCEITUAL NO MUSEU DE ARTE CONTEMPORÂNEA DA USP: UM PONTO DE PARTIDA, Arte Conceitual e o Conceito de Arte, 29

21

Rose Zuanetti

Composição: lluminuras ISBN: 85-7321-096-6

A concepção gráfica do miolo deste livro foi baseada na coleção Art&ldeas da Phaidon Press Limited, Londres.

ARTE CONCETTUAL E AS TNSTTTUTÇOES: UM ENQUADRAMENTO PARA ANALISE, 33 O valor da exibição, 35 Valor de exibição: a proveniência das obras, 37 Quando preservar é dar inteligibilidade, 40 O Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA) como moldura e modelo, 43 O museu - fórum e a equação arte e vida, 58

Apoio cultural: dialdata internet systems

ARTE CONCEITUAL NO ACERVO DO MAC-USB 73 Arte postal: comunicação marginal, 76 Outras publicações de artistas, 86 A instalaçäo e o espaço da exposição, 91 Fotografia: obra ou documento?, 95 Fotografia: performances, 103 Auto-retratos conceituais, 1 15 Catálogos e livros de artista, 122 O artista como crítico, 128 A arte sociológica: da prática à teoria, '130 O artista como curador, 155 Videoarte no MAC dos anos 70: breves apontamentos, 160 ARS BREVTS V\TA LONGA, CONSTDERAÇOES FtNAtS, 167 ANEXO

1 999 EDITORA ILUMINURAS LTDA. Rua Oscar Freire, 1233 - CEP 01426-001 - São Paulo - SP Tel.: (01 1)3068-9433 / Fax: (01 1)282-5317 E-mail: iluminur@ dialdata.com.br Site: http://www.iluminuras.com.br

Cronologia das exposições conceituais no MAC-USp - Anos 70,175 Biografias concisas, .l g1 Artistas do Acervo Conceitual do MAC-USB 1g9 Bibtiografia, 195

A mais alta sabedoria seria entender que todo fato é uma teoria. Goethe

No momento em que o critério da autenticidade deixa de aplicar-

se à produção artística, toda a função social da artà se transforma. Em vez de fundar-se no ritual, ela passa a fundar-se em outra práxis: a política. Walter Benjamin

Ninguém pode prever

o que acontecerá à

história.

Essencialmente o passado talvez ainda continue por ser explorado. Necessitamos ainda tantas forças retroativas. Nietszche

Marta lvlinuj¡n, Repolhos, 1977 [,4useu de Arte Contemporânea da USP Pedormance

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vestidas de branco e com um batde verde na cabeça, arrumam repothos num quadrado ,, , ., ,Y] ,,e |,so ênquanlo entoam ' / ll: uma cançäo que con¡uga arte com a natureza.,

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Marta Minuj¡n

O destino errático dos arquivos que guardam a coleção de arte Conceitual

no Museu de Arte Contemporânea da USP sempre me interessou. As transferências realizadas por diversas vezes, da biblioteca para corredores anódinos, me sugeriam que o problema dessa errância não se resumiria à falta de espaço físico para aquelas obras e documentos, mas à indefinição de seu lugar simbólico. lsto é, para enfrentar, em profundidade, as questões levantadas pela situação da arte Conceitual no museu, que não difere muito, como pudemos constatar, de outras instituições que mantêm esse tipo de acervo, seria necessário analisar os paradigmas com os quais o museu opera e que cristalizaram um lugar (ou não-lugar) simbólico para esse conjunto de obras.

O conceito de obras de arte (seriam afinal obras?) e seu sistema correspondente de validação institucional, questões estas trazidas desde o dadaísmo, mais especialmente através dos ready-mades de Marcel Duchamp, säo as premissas históricas básicas do que será Fernando Cocchiarale, 1-2-3,

sd Folografia de Ana Vitória Mussi, plb s/ papel

discutido aqui. Há, sem dúvida, diferenças entre o que se convencionou chamar arte conceitual nos Estados Unidos e na Europa e são também múltiplos os desdobramentos e peculiaridades da produção de orientação conceitualista na América Latina, especialmente no Brasill. Apesar de considerarmos tais discussões bastante significativas, ao partirmos para o estudo de um acervo muito específico, tomamos como eixo fundamental de reflexäo náo uma genealogia ou história da arte conceitual, delimitada entre as décadas de 60 e 70, que tem Joseph Kosuth, Sol LeWitt ou os integrantes do grupo inglês Art&Language entre outros, como paradigmas nem tampouco a exegese dos usos deste termo. Como bem observou a crítica norte-americana Lucy Lippard, nos anos 1970 haveria tantas definições de arte conceitual quantos fossem os artistas conceituais. Neste panorama de ideários, às vezes colidentes, foi o percurso do trabalho cotidiano junto ao acervo do MAC-USP que nos fez optar por privilegiar a análise da relação, conflitante e bastante atual, entre a produçäo artística conceitual e a lógica do museu.

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de obras numa determinada época. Optamos, então, por utilizar a denominação arte Conceitual em seu significado mais amplo, no contexto do acervo analisado neste livro. Para avançar nesta direção, depois de feita a ressalva necessária, tomamos como elementos operantes algumas características deste conjunto particular de obras bem como as questões resultantes da dinâmica de sua inclusão/ exclusão dentro de certo paradigma museológico. Poéticas do Processo. Arte Conceitual no Museu não tem a pretensão de mapear a produção de arte Conceitual em São paulo, tampouco no Brasil nos anos 70. Trabalhos e artistas'fundamentais nesse universo não são incluídos aqui, uma vez que tomamos como ponto de partida apenas aspectos de uma coleção muito específica de obras: os

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atuais como o da relação, nesse caso bastante ambígua, entre

inteligibilidade. lsto significa, no contexto do museu, atribuir-lhes valor

e legitimidade.

A linha tênue que distingue documentos de obras torna-se

freqüentemente, e não por acaso, o foco central de atenção.

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de obras, capazes de lançar pistas, sugerir interpretaçöes que

favorecessem a compreensão do todo. Procedendo assim, nos afastamos, deliberadamente, da pretensão de abarcar a totalidade de artistas ou de obras.

A atenção aos conflitos, aos conteúdos reprimidos pelas narrativas

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Nesse sentido, não privilegiamos a lista de artistas. Apenas ao entender a coleção de arte Conceitual do Museu de Arte Contemporânea da USP como um bloco único, foi possível delimitar aspectos e conjuntos

No Capítulo Irés apresentamos alguns aspectos da arte Conceitual da coleção do MAC-USP. As questões levantadas, obviamente, não

de esboçar uma interpretação dessas obras, favorecendo sua Ø Ø

do MAC-USP ou, em alguns casos, que foram expostas no museu nos anos 70.

trabalhos pertencentes ao Museu de Arte Contemporânea da USp, especialmente aqueles ali expostos nos anos 70 e que formam, atualmente, o núcleo da sua coleção conceitual. hegemônicas nos dá parâmetros necessários para avançar no sentido

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Assim, o formato de livro pareceu-nos ideal. Optamos por incluir imagens de obras, quase que exclusivamente pertencentes à coleção

No Capítulo Um definimos, portanto, como nosso ponto de partida a coleção de arte Conceitual do Museu de Arte Contemporânea da USp. No atrito entre o eterno e o etéreo, entre o aurático e o banal, entre o museu-templo e o museu-fórum, avançamos pela via da arte conceitual

e suas inerentes ambigüidades na compreensão do sistema da arte, dos trabalhos, do universo de idéias daquela década e que, em suas ressonâncias, podemos reconhecer também nas poéticas contem-

porâneas.

inv institucional, ou seja, o de exposição. Analisa necessariamente, lança No Capítulo Dois

timação situação

implica, museus

cuja narrativa se torna, em determinado momento, hegemônica e universal. o exemplo analisado nesse caso é o Museu de Arte Moderna

esgotam todas as interpretações a serem suscitadas por esse conjunto de obras. Como veremos, a arte Conceitual traz à tona temas bastante documento e obra. Tal ambigüidade é significativa e reaparece sobretudo através das fotografias da coleção conceitual.

A arte Conceitual influenciou também a noção corrente de publicação de arte no período. Não apenas os livros de artista, meio bastante freqüente naquele momento, mas também outras formas de edições podem ser melhor analisadas à luz das proposições Conceituais. As novas formas de efetivação das propostas artísticas ganham canais de circulaçäo alternativos, como a arte postal que também se vale de outros meios de reprodução, entre os quais, o xerox e o off-set. Os papéis do artista e do público passam por novas definições. A atitude

passiva do último é questionada e a atividade do artista, não raro, funde-se com a do crítico, com a do curador e até mesmo, em certos projetos, com a do pesquisador em Ciências Sociais. Observamos que

o conflito entre conceber o museu como espaço de sacralização ou como pólo de experimentação se torna evidente, quando lembramos que a videoarte foi realizada precursoramente no MAC-USP, mas hoje, dos vÍdeos pioneiros, poucos ficaram no museu, e essa ausência, mais uma vez, reflete as conseqüências de uma práxis museológica a ser revista, especialmente frente às proposições que vêm se valendo de outros suportes já há várias décadas.

de Nova York (MoMA) que forja modelos e valores a serem (consciente

ou inconscientemente) repetidos por instituições análogas.

O problema da inteligibilidade, inerente à arte contemporânea, está exponenciado nessa produção. Mais do que exibi-la na forma tradicional de um catálogo de obras, seria necessário favorecer sua inteligibilidade. A efetiva e plena possibilidade de ver, nesse caso, é uma decorrência da possibilidade de entender as propostas dos artistas.

o-suporte da Fapesp se deu de várias formas. Através da concessão uo AuxÍlio à Pesquisa, foi possível adquirir o equipamento necessário para

o cumprimento das vária.

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da investigação, como a

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rearizaçáo de fotografias das obras e posterior digitarização

das imagens. Por outro lado, no plano teórico, ã.ìirrl" recebido através de encorajadores pareceres ao rongo oa vigeÁ;iä " Auxírio são aqui também dignos de registro e agradecimentõ.

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de obras desse acervo, a co operação dessa equipe foi de suma importância.

Quanto às atividades técnicas,

desdobramento naturar desejáver de qualquer trabalho de pesquisa realizado junto ao u"ãiuo de um museu, foi fundamentar mais uma vez o apoio da Fapesp atiãves da concessão

de duas borsas de capacitação Técnica'q;ätê; garantdo,

como desdobramento da investigação teórica, um cu¡oaão especÍfico dirigido na área de documentaçã,o/catalosação e conservação/

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A pubricaçäo do livro contou. com o apoio da Lei de rncentivo à curtura da secretaria da curtura do Estado o'e sao prr¡" aincl. o incentivo e interesse do atuar diretor do MAC-use proi. rã¡ìãira coerho, assim como o da equipe da Editora.ttuminuras,-para 9r1...............i0a0o a efetivação dessa publicaÇão são também dignos de nota- ' -

São Paulo, primavera de 1999.

De modo especiar, agradeço ao prof. warter Zanini pero

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estímuro a esse trabarho que se deu na troca de idéias sobre arte e museus, mas, sobretudo, pero testemunho exemprar de sua v¡oa-åeo¡caoa à arte no Brasil.

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Agradeeo ainda a todos aqueres art¡stas que participaram

diretamente oo trabärho, fornecendo-mã-inirmações sobre sua obra e reratando experiências. Rs convàiså. .ån.tunt"s com Regina sirveira e Gabrier Borba, pero profundo com o MAC-usp daqueres anos e

pera contínua proximidaoe "nuålu-änto coà o museu atuar, foram fundamentais. Embora as entrevistas não tenham sido o .ãnii"r da pesquisa, eras, sem dúvida, nos auxiriaram na "i*o de compreensão

e do contexto de sua rearização. Jurio praza,

Regina Vater (via internet)

obras do acervo

Ártri'g""i",

pauro Bruscky,

e Krzysztof wodiczká 1", úr"u"

passagem pero país) também foram extremamente generosos ao nos fornecer informações sobre as obras e as referênc"ia" J" ¿po.". pero correio, artistas que pudemos localizar, nos enviaram materäl significativo, são etes: Ben V3u!er, Dick Higgins, IVtanuet C".¡._", jãrier Marin, Anna Banana, Luis camnitzer, Cãrros pazgs, *r* crárr, Ërieoerite pezord, Howardena pindet, Dov or-Ner, Rafaer vo"t"ri 1tiir..,o äe wort voster), Endre Tót, Mirosrav Krivar, Antoni Munradas, wùiiå" críticos franceses pierre Restany, Jean-Marc poinsàt tär"n, arém dos e vartha wirson do Frankrin Furnace de Nova voit, que pude visitar graças ao apoio da Fundação Vitae

Agradeço ainda pesquisa Ma que na cond de pesquisa

investigação.

revantamentobibriográfico, napesquisasobreart¡stas e obras e no exi usrivo rrabarho técñico oá aiglãriJ"óää das imasens

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Letícia Parente,

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tempo? Relativizando qualquer generalismo, sabemos que há muitas "histórias"

da arte Conceitual. Para iniciarmos nossa narrativa, é necessário ar de onde falamos. E, nesse caso, nosso ponto de m museu, mais especificamente o Museu de Arte da Universidade de São Paulo (MAC-USP). Assim,

materializados", que o museu guarda. O conjunto privilegiado para análise

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foi aquele procedente das exposições conceituais ocorridas no MACUSP nos anos 70, especialmente entre 1974 e 19771, exposições estas muito significativas para a arte Conceitual no Brasil. Como observa o crítico inglês Tony Godfrey2 no livro Conceptual Art, "a história da arte Conceitual não é uma história pontuada por indivíduos geniais, mas por algumas exposições que marcaram época". Se no plano internacional as

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exposições lnformation, realizada em Nova York em 1970,

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Attitudes become Form, na Suíça em 1g6g, entre outras, são fundamentais; no Brasil, especialménte em São paulo, no MAC-USP, nos anos 70, as exposições Prospectiva e Poéticas Visuais têm lugar de destaque inconteste.

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toda obra do museu) são "vestígios", nada invisíveis ou "des-

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rotagonistas da história não apenas as intangíveis idéias bstratos perseguidos pelos artistas do período, mas os testemunhos, os documentos e as obras que nessa condição (como

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tivamente sobre os modos de experiência estética. G C Argan

A arte Conceitual compõe um trecho significativo da história da arte contemporânea. No entanto, falar da história da arte contemporânea é alualizar um paradoxo. Como ser "história" e "contemporânea" a um só

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e pensamento da arte, e influirá posi-

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ainda

considerar que a experiência estética é a única capaz de garantir uma experiência individual livre e reativa com o mundo, e realizar essa experiência com os meios de seu sistema, a arte já não se fará com o pincel ou a argila, mas enquanto memór¡a

provenientes de exposições t"mporânea (JACs), marco Para lista e brasileira realizadas desde outros oriundos da exposição /n-

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parle da coleção conceitual do MACComunicabité (1982), também fazem detidamente aqui pelo recorte adotado. analisados serão não mas USB

antes e depois desse período em galerias e outros museus do Brasil (especialmente o MAM do Rio de Janeiro), com a participação de muitos artistas significativos para a arte Conceitual e contemporânea no Brasil, não referidos aqui pois seus trabalhos não pertencem ao nosso acervo

É fato que seria muito difícil reconstituir em exposiçoes no museu o espírito daqueles difíceis e agitados anos 70. No entanto, as idéias e motivações daquele tempo permanecem latentes nos documentos e

de arte Conceitual.

Vale lembrar, como já observou o prof. Zanini, que o eixo dos acontecimentos da vanguarda artística nacional desloca-se para São Paulo a partir dos anos 1971-1972, e tal fato não se explicaria apenas

obras. Nesse caso o próprio museu testemunha e documenta uma época

e de "fundo" passa à "figura", dentro da análise que empreendemos.

pelo enriquecimento de seu mercado, mas também por outras situações de vivência e de entendimento da arte que se delineavam na Paulicéiaa.

Por outro lado, muitas outras propostas realizadas naquele perÍodo não são citadas, pois nenhum registro foi encontrado. Nada que pudesse

dar uma pista para que montássemos esse quebra-cabeça com o qual nos deparamos. O volume de obras e o número de artistas é imenso. Falamos aqui de mais de 500 artistas e cerca de 2.000 itens entre documentos e obras a serem analisados. O volume, de fato, pode levar à paralisia, assim a opção foi realizar um recorte (não o único, mas o inicial), escolhendo apenas alguns artistas e obras para que o desafio

Artistas montandexposiÇa.

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Arte

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1972 Arquivo

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fosse enfrentado. A escolha de nomes ou dos trabalhos não tem a pretensão de ser exaustiva, mas apenas aponta questões referentes a aspectos da produção artística correspondente à década de 70.

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O grande número de participantes nessas exposições já indica que

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operamos num terreno onde a figura do artista ganha contornos menos

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A expressão "MAC do Zanini", como se referem os artistas e colaboradores

Das exposições Prospectiva 74 e Poéticas Visuais, realizadas três anos depois, em 1977, provém a maior parte dos trabalhos que apresentamos aqur.

É bom frisar que várias outras importantes exposições foram realizadas

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Lembramos que naquele momento o MAC-USP se configurava como um dos poucos locais onde os experimentos envolvendo, não raro, as imposturas em relação à noção instituída de arte eram aceitos. O espaço sagrado do museu foi mesmo transformado em loteamento para acolher as criações indlviduais e coletivas. O júri foi eliminado e o tradicional prêmio foi transformado em verba de pesquisa, Mas, afinal, quem eram

como sinônimo do espírito libertário que animou os estudantes nos anos 60 e 70; o "MAC do Zanini" não é apenas um lugar, mas, principalmente, um tempo. No terceiro pavimento do prédio projetado por Niemeyer, no Parque do lbirapuera, o museu da USP mantém hoje uma de suas sedes, mas todo seu perfil se alterou bastante. Aliás, nào apenas o museu, mas toda a cena artística paulistana e nacional mudou muito nessas últimas décadas. Outros museus surgiram, além de vários espaços culturais

prof. Walter Zanini: "Não será fácil reconstituir o MAC dos anos 70 com base em hemerotecas, pois os críticos não subiram a rampa e, quando o 'fizeram, não entenderam."

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que participaram desses eventos, expressa o perlil desse tempo/lugar. Assim como se reconhece a rua Maria Antônia, no centro de São paulo,

com programas incluindo exposições de artes. De forma que isso foi alterando o perfil do sistema das artes em São paulo. Mas, naqueles anos, o lugar privilegiado do MAC-USP na cena artística paulistana era inquestionável. Mesmo assim, adverte o primeiro diretor do MAC

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os artistas?

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participar, mas alguns art 'suavez,indicavam nomes a rede torna-se mais signi

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Essa significativa participação dos artistas das mais variadas partes do mundo é ressaltada pelo prof. Zanini logo na lntrodução do catálogo da mostra Prospectiva 746:"Um diálogo profundo poderá estabelecerse com os artistas brasileiros. O MAC tem procurado incessantemente

e' por mento, e'

facilitar esse contato com a ârea mundial, como atestam suas exposições e sua atuação no estrangeiro". Em outra oportunidade

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observa que a exposiçã.o Prospectivadialoga com as demais exposições de caráter conceitual que vinham ocorrendo em diferentes países. Uma entrevista na éPoca exPlica:

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) o próprio catálogo (da expo. Prospectiva), embora seja restrito, pode

se inserir entre as publicações internacionais que estão encadeando a divulgação da linguagem conceitualista. Tanto é que já mandamos 20

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catálogos para serem vendidos em Nova York7.

inscrição pafa a exposiçào

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CaPa do catálogo da exPosiçáo ProsPect¡va,

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1974' MAC.USP

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Só hoje, com o passar do tempo, podemos observar como são muitos

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MUSEU DåARTE CONTEMPORÂNEA

os que desapareceram da cena artística depois daquela única apariçäo fugaz. Estavam, talvez, em busca daqueles quinze minutos de fama de que falava Andy Warhol.

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da Ufivê.s¡dÊdÊ de Såo Pauh Pilqw lbirarurå, Sào Påú0. &åsil

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Nessa perspectiva mais internacionalista, não parece acertada qualquer Por outro lado, participaram também outros que, embora desconhecidos

divisão por nacionalidade dos trabalhos apresentados em tal

naquele momento, hoje são reconhecidos no sistema da arte

oportunidade no MAC e que ora constitui sua coleção conceitual. Parece,

contemporânea, em nível internacional. Nesse caso, é exemplar o artista polonês Krzyszlof Wodiczko que, ainda morando na Polônia em 1974, envia ao MAC-USP fotografias do projeto Vehicles. Hoje esse artista é um dos mais significativos nomes da arte contemporânea, e projetos como Homeless Vehicles (1988) já estão indicados, como veremos, nos Vehicles das fotos enviadas ao MAC-USP, há duas décadas.

isto sim, relevante lançar alguma luz sobre as aproximações

e

distanciamentos entre as proposições dos artistas. Vale observar que, nesse momento, talvez tenha sido a arte Conceitual a que mais tenha facilitado a participação de artistas, especialmente latino-americanos, em geral excluídos do sistema hegemônico de circulação de informações artísticas, centralizado na Europa e nos Estados Unidos.

KrzYs4d Wodrc¡lo

Honelé Vehicles

Proiecl 19885

No entanto, a recepção dessa produção supõe, é certo, um repertório anterior. A necessidade de ser explicada, de serem fornecidos mais subsidios, para que as propostas conceituais materializadas em fotos, documentos, projetos, sejam compreendidas, torna ainda mais importante a reflexão sobre o problema de como apresentá-las ao público.

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que embora não tivessem alguma culpa pessoal, morreram sem batismo que as livrasse do pecado original".

Capa dq catálogo, expostçà(

Poélic4s Visua¡s,

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Essa definição parece interessante. O que seria o batismo na "teologia da arte" atualizada no museu? Seria o "batismo" da obra, a sua eventual inclusão na coleção que garantiria sua exposição, sua existência como obra aurática, por exemplo? Que museu seria esse e a partir de que programa oPeraria?

1977,

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N/AC-USI

ABTE CONCEITUAL E O CONCEITO DE ARTE A mais "pura" definição de arte conce¡tual pode ser um questionamento aos fundâmentos do conceito de "arte" e o que isso

passou a significar. Joseph Kosuth

O crítico inglês Lawrence Alloway (1926-1990)8, notabilizado pelo o Ø

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impulso dado à arte pop britânica no final dos anos 50, observa que a produção de arte Conceitual especialmente quando consiste de

- e instruções é mais passível de fotos, diagramas, listas, mapas aproximação por parte do público quando publicada. A forma de livro,

Em Art after Philosophy (1969), Joseph Kosuth delineia uma definição propria do que seria arte conceitual, separando-a de outras poéticas ;'impuras". Para esse artista, a arte conceitual teria como fundamento

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uma origem puramente analítica ou linguística.11

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Sol LeWitt publica, em 1967, Paragraphs on Conceptual Art e a crítica

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considera o crítico, é mais adequada do que uma exposição (tradicional) na qual os trabalhos podem passar por "obras gráficas mal-acabadas,,.

Lucy Lippard acentua a questão da desmaterializaçáo do objeto na arte conceitual (1973). E bom lembrar que Nova York já representava,

Em consonância com essa opinião, a historiadora e crítica de arte

naquele momento, o centro privilegiado de atração, irradiação, promoção

Aracy Amaral anotou, a propósito das exposições de caráter conceitual

e distribuição de arte e os trabalhos feitos ali foram, sem dúvida, mais cllscutidos e divulgadosl2.

ocorridas no MAC, que os trabalhos não solicitariam as formas tradicionais de exposição podendo se dar "em forma de lançamento de publicações em livrarias ou museus, contendo arte postal ou registro de arte Conceitual neste caso sob a forma gráfica, veículo muito mais apropriado para uma atenciosa apreciação de um ou diversos autores"s.

Se há distinções nos conteúdos programáticos dos artistas que se propuseram a definir arte conceitual nos anos 1960 e 1970, na também importantes pontos comuns que pretendemos indicar ao longo deste trabalho A existência da aura (ou sua ausência), o significado do

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contexto (no caso a exposição e/ou museu) assim como o papel reservado ao artista se formulam em novas bases nessas poéticas conceituais A obra Conceitual quebra expectativas arraigadas e cria, muitas vezes, um desconforto intelectual ou em alguns casos até mesmo fÍsico para o espectador. Freqüentemente, a participação a

Expor ou dar acesso a esse material não é uma questão isolada, mas uma das muitas que envolvem essa produção dentro do museu. Além

disso, a falta de definições mais precisas fez com que por mais de vinte anos, desde, pelo menos, as exposiçõe s prospectiva 74 e poéticas Visuais 77 (sem mencionar as Jovem Arte Contemporânea - JACs anteriores), os trabalhos enviados pelos artistas das mais diversas

que nos referimos é a atividade resultante desse incômodo. De qualquer

maneira, seja através de intervenções no ambiente, (dando a ver o contexto), seja através de projetos envolvendo a consciência do corpo, ou seja alnda nos trabalhos envolvendo palavras (que têm o potencial de mesclar as proposições artísticas a outros e mais amplos contextos), o que importa ressaltar é o predonrínio da idéia sobre o objeto.

partes do mundo fossem deixados à parte, sem necessariamente serem

incluídos na coleção do museu. lsto signif ica não terem sido devidamente expostos, publicados ou estudados. À margem, apesar de esforços iniciaisl0 inconclusos, a coleção permaneceu vagando entre a biblioteca e corredores anódinos, no limbo.

Esta noçào implica na revisão de categorias tradicionalmente ligadas às

.1" arte que se fundamentam ño culto renascentista do objeto :lllÎ. ¿tLrlonomo. Nas

Define-se limbo como "o lugar, segundo a teologia católica posterior ao século Xlll, onde se encontram as almas das crianças muito novas,

ciências humanas, a noção de,'mudança de paradigma,,13



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1) Ver cronologia das expos¡çoes conceituais no lr,4AC-USP nos anos 70 (Anexos) 2) GODFREY Tony. Conceptual Ar¿ London: Pha¡don Press, 1998, p 198 3) Da expos¡ção ln-Comunícabile participaram os artistas Arthur Matuck, Bené Fonteles, Leon Ferrar¡, entre outros 4)ZANlNl,Walter DuasDécadasDifícels:60e70 FundaçáoBienaldeSãoPaulo Bienal Brasil SéculoXX FBSP,1994, p 317 5) New York City Tableaux: Tampkins SquareExit Art Gallery. New York, set /out 1 989 6) Julio Plaza organ¡zou a exposição Prospect¡va com Walter Zanini, em 1974, e jâ havia organizado mostra sim¡lar na Universidaöe de Porto Rico, em 1971 7) ECA-USP,49éncia Un¡versilár¡ade Notícias: Prospectiva, a exposiçáo que ve¡o pelo correio Boletim n 115,9set 1974. 8) ALLOWAY Lawrence Network: The Art World Described as a System Artforum, v 1 1 , n 1, sep 1972 9) A|\4ARAL, Aracy Rev¡sta Arte em São Paulo, set , 1 981 10) lnclui-se aqui o projeto de pesquisa do Prof Dr Marcelo Lina: Objeto e Processo na Arte Conce¡tual, |\4AC-USB 1989, mimeo (5 p ), que, embora não tenha lornado públicos desdobramentos teóricos ma¡s aprofundados, possibilitou o inÍcio da catalogação da coleção conceitual do i\4AC-USP sob responsabilidade de Aida Cordeiro 1 1 ) Este conteÚdo programático rígido viria a ser flex¡bilizado mais tarde pelo prórpio Kosuth que declarou, em 1996, "arte conceitual, de maneira simples, seria a compreensão que os artistas trabalham com significados, não com formas, cores ou materiais" Citado em Godfrey, Iony Conceptual art Op cit , p. 14 12) Ver catálogo da exposição: Global Conceptualism: Po¡nts of Ot¡gins 1gs7's-1gBO's New york, eueens [,4useum of Art, 1 999 O conceito globalizante de "conce¡tualismo" é distinto da arte conceitual st,to sensu identificada aqui como originária do Minimalismo norte-americano '1 3) Termo cunhado por Thomas Khun, The Slructure of Scíentil¡c Revotutions, 1962 1 4) Não por acaso, os pesquisadores encontram dificuldades para aplicar os proced¡mentos inerentes à lógica museológica ao ¡nvesligar e expor tal produção, o que resulta no pouco conhec¡mento desse acervo por parte de um público mais amplo

ll Guerra Mundial, a obra-prima única e o projeto ¡novador das vanguardas eram os catalìsadores que impulsionavam

Antes da

o aparato artístico. Depois da

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Guerra

Mundial os sistemas de recepçào,

distribu¡çao e promoção tornam-se os fatores realmente novos e poderosos Mary Staniszewski

It4anuel

Caslmlro, EdiPo

Explüudo o Engrna lnletvençao enl Lnla nnagenl dc lngres, 1 976

A facilidade para a circulação de informações artísticas, a virtual possibilidade de acesso a um público mais amplo, a fuga do mercado e, especialmente para os latino-americanos, a oportunidade de subverter a repressão política e participar do debate internacional asseguraram até aos correios o papel de difusor de operações artísticas. Na arte postal, as instituições privilegiadas para a troca de informações deixam de ser galerias e museus. Não por acaso, foi corrente entre os

artistas conceituais dos anos 60 e 70 o questionamento dessas instituições.

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Nesse contexto, onde as definições são frágeis e as classificações oscrlantes, a legitimação institùcion"i 1o oàti.ro da obra) passa, tnequivocamente, pela situação de exibição.

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VALOR DE EXtBtÇÃo

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paradoxo é óbvio: ao mesmo rempo que o museu

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arte". Tal legitimidade é confirmada também pelo catálogo que irá assegurar sua memória, sua posteridade. Aliás, o texto do catálogo da exposição Poéticas Visuais organizada por Julio Plaza, juntamente com Walter Zanini em 1977, antecipa uma resposta a essa questão, que viria assolar aqueles responsáveis pelas peças que ficariam sob a guarda do museul.

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Escreve Plaza: "a intersemioticidade,

a intermediação e a interdisciplinaridade que permeiam estas linguagens são muitas vezes

Vista geral

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exPosiçao ,rosoecltva' 1974,

MAC.

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responsáveis por situações-limite, nas quais a demarcação de um trabalho como 'artístico'dá-se apenas por sua inclusão num contexto de arte"2.

Em outras palavras, a situação de exibição é seu "batismo,,.

IALOR DE EXtBtÇÃO: A PBOVENTÊNC\A DAS OBRAS

Esse valor de exibição, que ao ser agregado às coisas as torna obras de arte, já havia sido antecipado por Walter Benjamin no seminal ensaio A Obra de Arte na Época de sua Reprodutibitidade Técnica, escrito em 1936 e que se populariza na década de 60.

Do artista alemão Joseph Beuys (1921-1986), o MAC-USP guarda uma coleção de litografias (Codices Madrid) que poderia Íazer parle de sua coleção conceitual. As litografias em questão originaram-se de uma seqüência de esboços do artista surgida em 197411975 por ocasião da publicação dos Codlces Madrid, obra homônima de Leonardo da Vinci, encontrada por acaso na Biblioteca Nacional de Madri, em 1965.

Escreve Benjamin: o a Ø o O o

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) seria possível reconstituir a história da arte a part¡r do confronto de dois pólos no ¡nterior da própria obra de arte e ver o conteúdo dessa história no peso conferido seja a um pólo seja a outro Os dois pólos são o valor de culto da obra e seu valor de exposição (...) A exponibilidade de uma obra de arte cresceu em tal escala, com os vários métodos de sua reprodutibilidade técnica, que a mudança de ênfase de um pólo para outro corresponde a uma mudança qualitativa comparável a que ocorreu na pré-história. Com efeito, assim como na pré-história a preponderância absoluta do valor de culto conferido à obra levou-a a ser concebida em primeiro lugar como instrumento mágico e só mais tarde como obra de arte, do mesmo modo a preponderância absoluta conferida hoje a seu valor de exposição atribui-lhe funções inteiramente novas, entre as quais a "artística", a única de que temos consciênc¡a e que talvez se revele, mais tarde, como secundária3.

Para Benjamin, a passagem do valor de culto ao valor de exposição transforma os modos de produção e recepção da arte, que passam da esfera religiosa (valor de culto) à praxis política (valor de exposição). Para a arte Conceitual, o caráter "artístico" é antes de mais nada o processo e a análise da natureza mesma da informação.

Walter Zanini, ao apresentar a exposição prospecfiya, ressalta a importância do caráter de informação, de idéia, em oposição à noção fetichizadora de objeto de arte. Escreve o prof. Zanini: Para além da pintura e de outras categorias tradicionais da expressão plástica

contestadas com energia crescente na década passada e ao lado das motivações conscientizadoras da arte corporal, a exploração de múltiplos canais de comunicação tecnológ¡ca é a característica fundamental da arte dos anos 70, sua forma lúcida e coerente de integração aos demais vetores prospectivos da sociedade do presente4.

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.o 'q) Joseph Beuys, Codßes Madfld, t(t74t1975 t lografta V papc¡

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livros de artista, não desmembrados como obras "únicas", compõem a tópico de nosso interesse. coleção conceitual

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Esse tratamento ambíguo oferecido a poéticas análogas não é um fator distintivo do MAC-USP. Do mesmo Joseph Beuys, um quadro negro, resultante de uma performance-aula na Tate Gallery de Londres, por exemplo, passou do arquivo à coleçäo juntamente com a oscilação do valor desse artista no mercado de arte.

I'e(ve Fiscne(

Arþ e

Conunt' cação

Assim, é fato que certas obras circulam entre esses vários locais de acordo com a valorização (de mercaáo) a que estão sujeitos os artistas. O critério de valor (econômico e simbólico) nada tem de f ixo, é oscilante, instável, relativo, e a exibição é fator decisivo na agregação de valor no caso da arte Conceitual.

lilaßinal' 1974' Balland Off-set s/ Pa1el 248 P

E interessante observar a tentativa recente de normatizar critérios que possam nortear, pelo menos, a terminologia da arte Conceitual, pois muitos museus passam também a adquirir obras dessa natureza para suas coleções. Em 1993 a coleção de livros de artista do espaço de

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vanguarda Franklin Furnace (a maior e mais importante coleção de livros de artista nos Estados Unidos), publicados a partir de 1960, foi transferida, através de um acordo, para o Museu de Arte Moderna (MoMA) de Nova York, reduto tradicional da linguagem moderna entre os museus.

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Nesse contexto de definições instáveis, compreende-se por que o procedimento tomado inicialmente para a catalogação dos trabalhos conceituais no MAC-USP foi o critério norteador da situação de exibição.

museus e generaliza-se em instituições similares. Foi bastante revelador encontrar ao longo dessa investigação vários volumes (livros de artista),

Assim foram inicialmente catalogados como obras conceituais aqueles

impossibilidade de enquadrá-los nas categorias disponíveis.

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Essa situação, repito, não é prerrogativa deste ou daquele museu, mas é parte da contradição inerente à situação da arte Conceitual nos

na biblioteca do MAC-USP, sem qualquer classificação, pela

trabalhos enviados pelos artistas com a intenção de exibição (nas exposições Prospectiva e Poéticas Visuais). Outros trabalhos permaneceram fora da catalogação, pois, em geral, não foram identificados como pertencentes às exposições tomadas como eixos do trabalho de catalogação. O tratamento dado à coleção de livros de artista é exemplar. Aqueles provenientes da exposição organizada pelas histôriadoras e críticas de arte Annateresa Fabris e CacildaTeixeira da Costa no Centro Cultural São Paulo6, em 198S, e doados ao Museu num bloco único tiveram destino inconteste: foram catalogados como obras. No entanto, outros livros de artistas, doados diretamente pelos autores ou provenientes de outras fontes fora da condição legitimadora da exposição, ficaram no limbo, não raro na

biblioteca, causando grandes dúvidas às bibliotecárias quanto classificação daqueles insólitos livros/objetos/caixas.

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A experiência de encontrar casualmente livros de artista na Biblioteca Pública da cidade de Nova York foi analisada por Douglas Crimp, que, ao realizar pesquisa de imagens sobre meios de transporte, depara com um livro de fotografias do artista Ed Ruscha (Vinte e Sels Posfos de Gasolina,1962) dentro da classificação "meios de transporte". Escreve CrimpT: (

.) eu me lembro de achar muito engraçado que o livro tivesse sido mal catalogado

e colocado junto a livros sobre automóveis, estradas etc Eu sabia, coisa que a bibliotecária com certeza desconhecia, que o livro de Ruscha era um livro de arte e, portanto, pertencia ao setor de arte. Mas agora, devido às reconfigurações trazidas pelo pós-modernismo, eu mudei de idéia; eu agora sei que o livro de Ruscha não fazia nenhum sentido dentro das categorias de arte segundo as quais os livros de arte sáo catalogados na biblioteca, e está justamente aí parte de seu mérito. O

fato de não haver nenhum lugar para Vinte e Seis Postos de Gasolina no atual sistema de classificação é um indício de seu radicalismo em relaçáo às formas instituídas de pensamento (o grifo é nosso)

de classificação |"Ìfl_:t" tt,rstllucionaliza o

não oferece lugar, ou em atguns casos nãolugar: esse espaço am-bíguo, amorfo, transitório;

uma zona de passagem.

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surgem para definir outras poéticas; Happenings, Ambientes, performances, rnstaraçõe", i¡i"*'ìirJi"., os termos rradicionais são ampriados em seu r entido originàr.ÊÃ'.eu "rivro passages in Modern Scutpture, Rosatind

"rliyr:r\i?unffo:ruròy,oDE,NA DE NovA yoRK (MoMA) coMo

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sentido do termo ,,es "r.", ltura,, no ,ltir" mats, como outrora, o trabalho

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as entidades sue se

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para alguns críticos como,Arthur Danto (1996), C-arol Duncan (199S),

Nesse processo de formulação de valores e representações conapreéentam

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livros ilustrados, fotografia, arquitetura e design_, apesar de parecer naturarizada em muitos museus do gênerõ, enúorvå outra questão

que merece uma análise aprofundada.

Douglas Crimp, em seu livro On the Museum,s Ruins (lgg,), observa que o MoMA força o que poderia ser a construção de uma

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história formalista do modernismo. Dentro dessa abordagem, qualquer referência

lnclusoes

sao Paulo' 1973

a contexto (histórico, sociar ou porítico) para as obras torna_ se impensáver. para exemprificar ponto, crimp rerembra os vários meios (fotografia, pintura, desenho) que RoOcfrenko utilizou em seus trabalhos. No entanto, como anota o crítico, esse artista particular não

Ofl'sel sl PaPel

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pode ser considerado em sua versatilidãde devido à fragmentação imposta à sua produção que, no lvovÀ, ãivide_se de acordo com os meios e técnicas. ls-to significa que a opçào corrente em museus de arte

de sectarizar o conjunto de uma obra e crassificá-ra através dos meios e técnicas utilizados peros artistas pode prejudi"",. ob."ruação do fruxo orgânico da criação e o acompanhamentó da " materiatização de uma idéia. Regrna

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Nesse sentido, é bastante interessante observar que trabarhos realizados em meios como cartões-postais, off-sets ,"Ã*.ao]'nao raro' deixados à margem do tratamento Álseotogico" dispensado às obras rearizadas nos meios tradicionais lfintura, escurtura, desenho, gravura), mas representam, muita. u"r"i, o momento originário de

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Ao observar mais cuidador^u1:lt" o conjunto de trabalhos de Regina coteção do MAC-USP por. ll::l: l" nos postais da série ""årö,o, as rmasens da cidade rmpressas tnterferências são -util¡zaJ"r-n"" serigrafias Destruturas!.rlana3 Ua uÁa piofunOa int"i_r"t"çáä os suportes e, para a artista, não existe quarquer privirégio entre "ntr" esses diferentes meios.

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Obviamente os cartões_postais da coleção conceitual lrazemquestões a serem enfrentadas peros museur que ô" dispõem a rever cr¡tiåámàìte e em profundidade seus paradigmas. A museografia deve atentâr fara a nat.ureza (banal, próxima, sem aura) própria do cartão_po"t"i å ãiiu, condições para que esses cartões possam ser mostrados ao púbrico em sua especificidade. Seria um equívoco apresentá_lor, po, emotdurados em passe_partouf emprestando-thes "*"rpto,

ie lnclusões em São pauto (1973), os monumentos públicos da cidade , MASB Monumento às Bandeiras

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lamos tem o poder de descartar lizados, ou tentar assimilá_los às as de arte, consolidando a partir ocorre nos ateliers dos artistas) e, não raro, torna-se bastante

as instalações posteriores, (1

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dos mais importantes artistas entou no MoMA Ce Nova york o ) onde justapôs a cadeira real às deira do dicionário e fotografia rido pelo MoMA, essa obia foi ção do museu, uma vez que a tamento de Design, a foto ao

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Enfim, exibir, dar a ver, esboçar juízos, tornar a arte de nosso século inteligível dessa forma proposta pelo MoMA não nos parece, em

analisar a influência que o MoMA exerceu (e ainda exerce) sobre museus congêneres.

absoluto, um modelo distante.

Tal eixo de influência tem, como vimos, passagens textuais documentadas

Essa forma de construir um acervo, organizar as exposições, moldando

correspondência mantida entre São Paulo e NovaYork naquele principalmente do conselheiro do MoMA. Aracy Amaral partindo período, a análise da correspondência: prossegue a1ravés da

um certo padrão para museus de arte moderna e contemporânea, tem, como não podería deixar de ser, reflexos no Brasil. E como já indicamos,

certos fatos envolvendo a criação de nossos museus parecem significativos nesse sentido.

Esperando que o museu de São Paulo paute sua existência e funcionamento l\,4useu de NovaYork, Sprague Smith diz ainda que em Nova york ficar-se-á esperando "por conhecer seus estatutos, planos, quadro de membros etc. e estaremos, naturalmente, prontos a ajudar de toda a maneira possível Mandar-lhes-ei o material necessário imed¡atamente após minha chegada a Nova York", enfatizando ainda a importância da regulamentaçào do local legal da questáo, sobretudo para facilitar a realizaçáo de exposições internacionais.

a partir do

No auge do interesse político e econômico de Nelson Rockfeller (nào apenas dele, mas do governo ameiicano, lembremos do Zé Carioca de walt Disney) pelo potencial mercado da América Latina, os curadores do MoMA de Nova York são enviados para a América central e do sul para adquirir ob on Rockfeller vem ao Brasil para a p em 1949. A relação entre Assis inauguração da Chateaubriand ( e de comunicações do período no país) e Nelson casual e vale observar, embora resumidamente, outras linhas determinantes de poder que contribuem para a formulação de uma certa visualidade que passa a ser reiterada pelos museus de arte no Brasil.

Ambas as cartas, observa Aracy Amaral, mencionam estarem em Nova york ansiosos por estabelecer uma cooperação ativa com o Brasil, ao

mesmo tempo que afirmam ser a organizaçáo em vista de suma importância para o desenvolvimento cultural do Hemisfério18,

Certo está que o MoMA norte- americano forjou um modelo, criando o sedimento inicial do programa (nem sempre declarado ou consciente) dos museus modernos no Brasil.

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Nesse sentido, como analisou Guilbaut: "Nelson Rockfeller já em 1946 estava tentando, com resultados variáveis, encorajar os brasileiros a criar Museus de Arte Moderna em São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, duplicando o MoMA, a fim de iniciar o Brasil no sentido da modernidade econômica e na energia do liberalismo dos livres negócios. Brasil e a Argentina, graças a tais esforços, embarcaram num ambicioso llrograma de Bienais internacionais direcionadas para a apresentação

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Escreve Aracy Amaral:

da arte abstrata. O MoMA entendeu a importância dos museus nrodernos para a criação de alianças entre os grupos de elite no hemisfério ocidental, iniciando um amplo programa internacional (financiado pelo fundo Rockfeller) dedicado à defesa e divulgação da arte moderna, mas também da produção cultural norte-americana na ELiropa, india e América Latina.',1s

a circulação de certas coleções ambulantes no Brasil,,.

Alem desses fatos que contribuíram para a definição do perfil de uma rnstitrrição a ser criada, de maneira mais geral e abrangente,

de idéias, mas com um medo patológico de um envolvimento direto visível com os eventos políticos e sociais do momento.,,

o museu as demais instituições disciplinares utas de seus visitantes através do sistema de poder, o tempo também tágios, uma evolução linear que o pio da galería progressiva, adotada s são apresentadas reiterando as eocupação com o percurso é fator s mais cotidianas e habituais do scurso da arte se desorienta nesse a um percurso determinado pelas

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No entanto, é notório como esse envolvimento se rieu, mesmo que não de forma tão direta e visível, especialmente quando passamos a

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a c1o13foOica.e faz de sua visita ao museu uma volra ordenada. um E

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Como escreve pierre Bourdieu2o:

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Hans Haacke (1936),

artista alemão, tem concentrado no ataque aos mecanrsmos rnerentes ao sistema du ,4" instituições (leiase.aguf, museus e galerias), que expoem ,ti*"_1t,r" o mesmo tempo que valores simbólicos Ë criam

economicos.

liberdade de exp

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os artistas

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Dessa forma, o meio de onde a contexto social e político mai, têm sido a moldura para diversos décadas, de manerra mais ou

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o progresso maior abstr

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da teoria

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É no.ório o seu proie,to

!?.ng, de Aspargus' daquere artista uma instalação. Ao du i?g:_r.

(1g74), no qual utilizou

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"b;;Ë;å;documentos de todos os u';;;5;

visando ass m reverar, em ffH:fliffi::å'i,i:"1::1' resses que regem a manipulaçá;;;;;1";ä'"".

domínios da

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Essa obra, desde então peça da coleção permanente de nosso acervo,

documentação, entre a experiência da obra e sua evidência, os museus, e não apenas o MAC-USP, enfrentam os maiores dilemas em sua

é mais um vestígio do espÍrito daqueles tempos que resiste pois pôde ser assimilada a uma coleção de museu. Vale aqui a pergunta: se esse quadro alcançou a segurança do acervo de um museu, quantas outras obras do período desapareceram não apenas pela repressão política reinante, em que a ordem era "apagar os rastros", mas pela fugacidade dos meios nos quais foram realizados e pela impossibilidade resultante de serem assimilados à lógica do museu? Quantas outras operações, movidas pela mesma urgência, de artistas não menos comprometidos, puderam ter o mesmo destino do S. Sebastião de Sérgio Ferro?

vocação classificatória. As proposições artísticas da arte Conceitual, assim como muitas obras contemporâneas, supõem uma nova concepção de museu que possa

também assimilar o fluido e entremear o paradoxo de incorporar dinamicamente o transitório. Nesta perspectiva, o museu de arte contemporânea não se limita a uma função passiva, com salas de exposições abertas à contemplação de poucos privilegiados.

Nesse mesmo ano de 1974 são realizadas também no MAC, como vimos, duas das mais instigantes exposições de arte Conceitual no Brasil. Além da Prospectiya, acontece a oitava edição da Jovem Arte Contemporânea. No catálogo desta última, escreve o prof. Zanini:

O prof. Zanini ia havia tornado explícita sua preocupação em relação à

função de um museu de arte contemporânea, quando escreve, no ca1álogo da Vl Exposição de Jovem Arte Contemporânea (1972): (. ) os dirigenles de instituiçoes museológicas tornaram-se absolutamente cônscios da impossibilidade de suas entidades continuarem a manter-se

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) dentre o material enviado (para a JAC) decidimos programar trabalhos e pi'opostas de prevalecente endereçamento para o conceitual, resultando um evento de idéias que é um pouco lragmenlário. Entretanto, nenhuma manifestação com tal ensejo de abertura parece-nos poder escapar agora destas condições que todavia só causarão transtornos aos espír¡tos desinformados Estamos fora do representacional e num território pósformalista, preocupado com a proposição da linguagem ao nível semiológico Sua imaterialização abre-se à multiplicidade dos métodos comunicativos, o que a indispõe com a problemática da arte/objeto A implicação crítica que carccleriza as dimensões de sua investigação, seja ela circunscrita ao fato artístico ou de envolvimento no que é amplamente universal, provoca a

exclusivamente na condição de órgãos técnicos da apropriação, preservação e exposiçáo de objetos de arte, ou seja, de órgãos expectantes de produtos destinados às suas salas contemplativas de exposição Se essas tarefas

museológicas prosseguem, e com uma complexidade crescente, outros elementos despontaram no dia-a-dia do museu impelido num primeiro tempo

a lomar consciência da explosão das categorias técnico-estilísticas tradicionais e a seguir a fazer face à multiplicidade de proposiçòes que se definem como realidades transitórias, ou seja, fora do sentido individual e permanente visado como regra na dialética anterior da expressão artística Mais ainda, a realidade filtrada e transcendente do museu vê-se cada vez mais confrontada à existencialidade profana das coisas e esta constataÇão certamente o obrigará a reformular seus interesses ditados por uma filosofia un¡camente preocupada com as mais belas essências produzidas pela humanidade2l

substituição do posicionamento tradicional do receptor de receptor da mensagem pelo de sua participaÇão interativa no processo

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Nessa perspectiva alargada, o museu seria capaz de tomar toda a cultura visual de seu tempo como objeto para as interrogações que formula a partir dos trabalhos que expõe e guarda. Segundo Daniel Buren, artista francês que se vale sempre do contexto como elemento fundante de sua poética, o papel do museu como centro de arte equivaleria a um centro de dúvidas, onde as dúvidas dos artistas se confrontam com as dúvidas do público.

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Num tempo em que museus de arte contemporânea ao redor do mundo

säo inaugurados em profusão, ostentando, não raro, projetos arqLlltetônicos faraônicos, e novas alas são anexadas a museus já cxistentes para abrigar uma coleção que não pára de crescer, urge rerletir' em profundidade, sobre o significado de se manter uma coleçáo contemporânea.

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Quanto a essas obras efêmeras, o que parece interessante observar, portanto, é que maioria não pôde resistir a tal lógica, contra a qual se manifestavam, e por isso mesmo foram fadadas ao esquecimento Muitas, no entanto, resistiram como documentos, fotografias, como

registros de obras. Neste espaço intervalar entre a obra e

f.risar que manrer uma coteção contemporânea não significa,

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avidamente novas obraô, processo infindávet, fadado ao

pÊtâ sua própria natureza infinita.

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cristalizando narrativas que não correspondem à produção artística - mesmo dentro do museu (comparado a mausoléu, por Valéry), onde tal operação parece inviável.

diamante (mil desculpas pela pretensão), mas, olhando esses catálogos, penso que se poderia comprar pilhas novas e reanimar essas imagens que estão na

Tal esforço envolve a integraçäo e a contextualizaçâo de trabalhos de artistas vivos dentro de um conjunto dinâmico de réferentes individuais e sociais, pertinentes à ampra questão da visuaridade e dos recursos tecnológicos disponíveis em seu tempo. Envorve instigar questões mais do que reiterar dados.

Assim, ao tomar o museu como lugar privilegiado na formulação e reiteração de valores dinâmicos, não parece ser suficiente, ou mesmo possível, a análise da obra de arte e da trajetória do artista sem uma consideraçäo cuidadosa de sua posição, inserção ou exclusão dentro de um dado sistema de valores e de representações.

O desafio que

lsto é, as representações modulam a percepção do público, possibilitando que as pessoas vejam ou não vejam certas coisas. A própria forma de olhar, longe de ser espontânea, é construída a partir de tais

corrente

lembrança destes artistas e em parte do público, isto 22 anos depois...

se apresenta a_o pesquisaåor Oe arte que se debruça sobre a produção conceituar não envorve a decifração isorada oa oora,

mas a criação de novas metodologias Oe anâlise que po..u, acompanhar os significados dos projetos, conceitos e o'bjetos, junto com as instituições que os legitimam. lsto porque, em face Oé um trabalho conceituar (o mesmo pode varer para a arte contemporânea), o parecer do crítico, aquere que tem o bom orho capaz de reconhecer o valor intrínseco escondido na peça, não parece ser suficiente. o que

conceitos que possibilitam, ou não, a assimilação do novo. E a assimilação do novo sempre opera dentro de um repertório anterior. Ou seja, cada nova imagem é assimilada por um conjunto anterior que lhe dá sentido, configurando-se uma nova representaçäo. As representações sociais, que mencionamos aqui, articulam assim funções básicas tanto do ponto de vista psíquico individual pela função cognitiva de integração da novidade e sua conseqüente interpretação, quanto

vale é a interrogação constante como instrumento de uma anárise capaz

de compreender os artistas e suas poéticas inseridos no ,,"r¡rito'oo tempo" (zeitgeist) que os tornou possível. Ø Ø

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