POLÍTICA EM MULTICULTURALISMO E UNIVERSALISMO: DUAS FACES DAS LUTAS PELO RECONHECIMENTO

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POLÍTICA EM MULTICULTURALISMO E UNIVERSALISMO: DUAS FACES DAS LUTAS PELO RECONHECIMENTO Luís Tenorio1

¹Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas - Universidade de São Paulo (USP)

Resumo. Este artigo científico apresenta a visão das tendências multiculturalistas e universalistas surgidas entre os séculos XIX e XX na visão política do espaço social e da execução da cidadania nos meios onde estão presentes as mesmas. Desde Sartre, marcado pela criação de ideais existencialistas, até mesmo em Hegel, com seus ideais políticos do Estado, contestados por Adorno no século XX, este artigo visa expor uma amostra qualitativa de suas aplicações, quanto amostras quantitativas em margens de aderência populacional a tais tendências.

Palavras-chave: Política, Multiculturalismo, Universalismo, Filosofia Moderna, Sociologia do Espaço.

1. Introdução Na idealização de conceitos pós-modernos, a sociedade busca entrelaçar duas tendências internas ao seu âmago e externas ao seu saber, onde se mostra presente a questão de “lutas pelo reconhecimento”, uma vez que as mesmas sejam expressas em ideias de lógica, filosofia e sociabilidade. A integração social é evidente em indivíduos de culturas semelhantes, entretanto, no mundo capitalista moderno, existem fatores que impulsionam a forçada “integração” de indivíduos com culturas totalmente diferentes, assim como é notório na África Setentrional, onde tribos disputam conflitos internos devido a má disposição política dos países em quais se localizam.

Partindo deste modelo, podemos tomar que tais disposições políticas e forçadas “integrações” de povos de tribos diferentes, façam parte da esfera do universalismo moderno, como este mesmo expressa a falsa ideia de cidadania, onde se proclama que todos os homens são iguais perante a lei, embora desiguais em contextos socioeconômicos. (FREDERICO, 2016:237). Assim como referido ao universalismo, podemos também colocar em impacto que as mesmas disposições políticas, consideradas pela visão multiculturalista, concentra que a luta de “minorias” seja de extrema importância, em um grau superior à igualdade, o que de fato não acontece.

2.

Conflitos Culturais Como exposto na passagem supracitada, a divisão cultural, étnica, religiosa e

moral do mundo político, influenciou as classes sociais a travarem a denominada luta de classes, onde se observa com clareza a opressão da classe trabalhadora por uma classe dominante, normalmente a burguesia (onde se concentram os mantenedores do sistema capitalista, com influência econômica e posse de bens de produção social) onde em condução coercitiva, a mesma concentra alianças com os aparatos de repressão, sejam estes estatais ou não. Com a divisão política de territórios, tomando novamente o exemplo da África Setentrional, notamos a concentração de poder nas mãos de governos eleitos após movimentos de independência em diversos países, como Ruanda e Nigéria, onde etnias foram mortas por outras e fiéis de uma religião buscam tomar o controle do país, respectivamente. Em meio à tais fatores, surgem duas formas de pensamento: o multiculturalismo e o universalismo, que buscam apaziguar os efeitos gerados pela desigualdade social e construir uma imagem melhor de vivência na sociedade moderna. Contudo, a busca por igualdade se esvai em meio a tensão de indivíduos coletivistas que reservam para si políticas públicas para favorecer a todo um coletivo geral da população. A criação da sigla “WASP” por militantes estadunidenses do multiculturalismo, exemplifica a crítica do universalismo, já que esse se caracteriza por ser destinado para brancos, anglo-saxões e protestantes (White, Anglo-Saxon and Protestant). A crítica efetuada pelos particularistas (FREDERICO, 2016) é debatida quando os mesmos sofrem críticas dos universalistas, uma vez que em meio à onda “crítica sobre crítica”, estes sofrem para estruturar uma sociedade democrática de fácil entendimento aos homens. Em Foucault (2005) notamos que a política de ocupação do espaço público burguês é

prejudicada por inferências particularistas e universalistas, já que “que a cidade continua sendo organizada sobre dois pilares: vigilância e adesão; [...] ser urbano é aderir, é acreditar em uma cultura e ideologia coletiva plantada no território da polis”. Entretanto, se Foucault expressa a adequação de diversas culturas em uma só (como ideologia), sendo esta a cultura urbana, como fator de ideologia coletiva, o mesmo contrapõe a luta das minorias e a luta pelo reconhecimento de tais grupos, uma vez que em tese universalista, iguala todos como produto de um amparo peculiar, em razão, dominado pelo Estado burguês. As teses multiculturalistas demonstram a importância da luta de minorias como a “ascensão” dos oprimidos sobre a sociedade padrão, que vem sendo exposta com o pósmodernismo no século XXI. Entretanto as políticas de “empoderamento” de classes/minorias geram uma evasão ideológica sobre igualdade e democracia tornando tais lutas obsoletas com a exclusão dos fatores e ideais democráticos, surgidos pelas insurgências revolucionárias na Revolução Francesa, onde se aderiu uma união universalista simultânea a multiculturalista. Os multiculturalistas ao expressarem o desejo de gerir o poder das classes, se esquecem de que seu preceito principal advém da mesma forma da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, que propõe que “o princípio de toda a soberania reside, essencialmente, na nação. Nenhum corpo, nenhum indivíduo pode exercer autoridade que dela não emane expressamente”. Logo, tais conflitos que em primeira mão se configuram culturais, se tornam políticos e geram diversos problemas na disposição de organizações e movimentos sociais, os quais na atualidade se encontram divididos até mesmo dentre as divisões políticas existentes, como é perceptível em movimentos de Esquerda o surgimento dos chamados “pelegos”, anteriormente chamados “reformistas”. A desunião de organizações políticas por pontos estratégicos leva a esquerda a se esfacelar na luta pelos ideais revolucionários franceses e russos, em que todas se baseiam em seus manifestos. A cultura em detrimento de divisões políticas e econômicas se torna uma mercadoria, uma vez que irá estabelecer padrões de vida para determinados estágios de classes sociais e deixar outras em puro esquecimento, assim como produções culturais configuradas economicamente derrubam índices e arrasam economias, como uma produção de filmes de Holywood. (CEVASCO, 2010). Ainda que cultura seja algo impossível de ser concreto de uma única forma, em traçados multiculturalistas e universalistas, a mesma se torna um desvio econômico e artifício das classes sociais para suprir interesses democráticos na sociedade.

3. Política e Pós-Modernismo A cultura, com influências do pós-modernismo pode ser base para diversas manifestações ideológicas, configurando um meio estático para usos econômicos e sociais, como foi descrito. O pós-moderno não se configura como estrutura política ou sociocultural dominante na sociedade, mas um reflexo concomitante de mais uma modificação sistêmica do capitalismo (JAMESON, 2007, p.16). Como o pós-modernismo surge em meio a um sistema burguês, logo, suas ideologias expressam uma certa subversão, entretanto, dentro do sistema capitalista, sem buscar ultrapassar seus limites. Os sujeitos pós-modernos tendem a estruturar uma configuração alternativa, “descolada”, entretanto, dependendo de inúmeros fatores que os mesmos criticam. Em Harvey (1996) este explica que o regime de acumulação (lucro) é flexível, sendo resposta do capital para contornar suas crises sistêmicas. Os indivíduos do pósmoderno se auto-incluem ou se auto-excluem do lucro, dependendo de fatores temporários, entretanto depende do mesmo para propagação de seu ideal alternativo e moderno. Como visto em Adorno (1948b) é notória a perda da subjetividade autônoma, que se tornou diluída na própria objetividade reificada da sociedade moderna. Mas tal fator se designa como fenomenológico, da essência moderna, na medida em que o âmbito de manifestação da obra de arte autônoma sustentaria uma distinção com a cultura de massas, como também é visto pela vertente multiculturalista.



Com essa construção adorniana da perda de subjetividade, a construção da obra de

arte autônoma se configura como um forte atentado ao Estado de direito, com uma ruptura dos preceitos democráticos da representatividade. (HEGEL, 1990). Os multiculturalistas, alinhados ao pós-modernismo existente no capitalismo tardio, tentam sobretudo a subversão cultural e política do meio social, onde a força coercitiva da lógica cultural que os atinge pode entre parâmetros específicos se configurar a favor ou contra de seus preceitos.



O tornar-se público da cultura, como proposta por ambas as tendências, se

configura da teoria para o espaço público, ainda que burguês, numa tentativa de construção de uma sociedade democrática com a destruição do espaço público acessível, sendo este público estatal, ou “pseudo” público, gerido por entidades privadas. (DAVIS, 1990).

4.

Metodologia Se configuramos o espaço público para multiculturalistas e universalistas, suas

posições políticas colocam em evidência a existência de uma nova organização social.

A busca por fatores que incidam tal organização, pode ser expressa na forma e concentração de indivíduos em locais públicos (eventos que aconteçam nestes locais, uso de praças, parques, bibliotecas) e em locais “pseudo” públicos (shoppings, galerias comerciais, teatros, cinemas, cafés literários). Se colocarmos a medida de frequentadores definida por um valor 𝜶, podemos obter uma equação sobre os frequentadores de determinados locais, estes localizados em diversas regiões R, obtendo preferências multiculturalistas ou universalistas, mostrando como políticas públicas de propaganda de determinados locais tomam força coercitiva para frequentadores apropriarem-se para uso pessoal e coletivo dos mesmos em w, como resultado de cálculo de participação de determinados eventos/locais. O cálculo que resume o fator citado é uma média aglomerativa, expressa por:

R

α = ∑ (wi − xi )2 i=1

Onde 𝜶 é o resultado da média de frequentadores em regiões R, para toda variável de valor w (número de frequentadores) e valor participativo x (média simples), elevados ao quadrado. É possível usar nesse cálculo, diversos fatores que viabilizem descobrir a frequência de participação em espaços públicos, com os dados também disponibilizados abaixo.2 Frequência de usuários de bibliotecas da USP em 2012: Biblioteca

Frequência

FFLCH

293.172

FAU

72.085

ECA

95.248

IME

53.472

EEFE

11.854

FE

129.024

Sistema Integrado de Bibliotecas - Universidade de São Paulo : http://www.sibi.usp.br/wpcontent/uploads/2013/09/RIBi_2012.pdf. Acesso em 29 de novembro de 2016. 2

Os resultados não apresentam números significativos para uma total certeza sobre o uso do espaço público, entretanto permitem a elaboração de melhor aproveitamento destes. A busca pelo uso do espaço público se faz evidente para que as políticas públicas se determinem concomitantes no sistema capitalista, buscando melhor expansão para as classes sociais. Como na pluralidade de pensamentos e ideologias, chegamos a crer que a metodologia universalista, com concordâncias multiculturalistas, ainda que se configurem como antagônicas em princípio, se completam para uma melhor gestão política, nos seus usos e planos sociais.

5.

Considerações Finais Na busca de elaboração para melhor adaptar as tendências multiculturalistas e

universalistas na política, percebemos que o que se configura como fator para tais, é ambíguo. A cultura, a política e a economia podem ser aproveitadas para tais expressões modernas. Assim como percebemos que a subjetividade se foi pelo obscurantismo pós-moderno, a objetividade prática de nossas prisões auto-condicionadas (condomínios fechados, meios de transporte privado, empresas) acabam com o componente do espaço público, já que a frequência de seu uso se mostra maior em relação ao anterior. (SENNETT, 1977). O pluralismo de ideias é capaz de persuadir a sociedade a seguir diversas ideologias, tendo base e conhecimento no que se propaga ou não. Isso é a definição de lutas por conflitos culturais em meio à lógica cultural do capitalismo tardio. A importância do espaço público para grupos particularistas e universalistas é tamanha que sem este os mesmos não existiriam, já que prezando pela igualdade ou aparecimento de uma minoria sobre a maioria, se deleitam da sociedade para divulgar sua ideologia.

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