Política Externa e Mídia: A participação brasileira nos processos de integração regional durante o governo Rousseff

June 6, 2017 | Autor: Lucas Eduardo | Categoria: Política Externa Brasileira, Mídia, Dilma Rousseff
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OBSERVATÓRIO DE POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA Política Externa e Mídia: A participação brasileira nos processos de integração regional durante o governo Rousseff.1 Giovanna Ayres Arantes de Paiva2 Kimberly Alves Digolin3 Lívia Peres Milani4 Lucas Eduardo Silveira de Souza 5

Introdução

A finalidade aqui é analisar a forma pela qual a mídia retratou a participação brasileira nos processos de integração regional, no que concerne ao Mercousul e Unasul, durante o governo Dilma Rousseff, tendo como subsídio os informes semanais do Observatório de Política Externa Brasileira (OPEB). O Observatório de Política Exterior (OPEx) é um projeto de informação executado desde 2003 pelo Grupo de Estudos de Defesa e Segurança Internacional (Gedes) que o coordena, atualmente, em parceria com a Universidad Nacional de Rosário (Argentina) e o Programa de Relaciones Internacionales de la Facultad de Ciencias Sociales de la Universidad de la República (Uruguai). Em termos gerais, o objetivo do OPEx é disseminar informação sobre política externa de Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, bem como fatos que envolvem políticas adotadas no âmbito do Mercosul e da Unasul, a fim de fornecer dados que subsidiem decisões em políticas públicas, pesquisas e formação acadêmica.

Os

informes semanais produzidos pelo OPEB são compostos por resumos das notícias

1

Esse artigo tem como fontes os informes semanais do Observatório de Política Externa Brasileira que são produzidos pelos estudantes de graduação em Relações Internacionais da Unesp-Franca: Aline Meschiatti, Analice Pinto Braga, Bárbara Renaut, Bianca Guarnieri de Jesus, Giovanna Ayres Arantes de Paiva, Henrique Neto Santos, Karen Oliveira Fassi, Laís Siqueira Ribeiro Cavalcante, Lívia Peres Milani, Natália Ruani Jorge do Prado, Thássia Pedrina Bollis, Vitor Garcia de Oliveira Raymundo. O projeto é coordenado pela Profa. Dra. Suzeley Kalil Mathias. 2 Graduanda em Relações Internacionais, Faculdade de Ciência Humanas e Sociais, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), Franca. E-mail: [email protected] 3 Graduanda em Relações Internacionais, Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Estadual Paulista “Júlio de mesquita Filho” (Unesp), Franca. E-mail: [email protected] 4 Graduanda em Relações Internacionais, Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), Franca. E-mail: [email protected] 5 Graduando em Relações Internacionais, Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), Franca. E-mail: [email protected]

sobre política externa brasileira que foram veiculadas pelos periódicos Correio Braziliense, Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo. Como o OPEB baseia-se nas ações de política externa promovidas pelo governo brasileiro, faz-se necessário um estudo destas, visto que expressam os interesses do país e estabelecem sua posição no cenário internacional, indo além de um âmbito meramente diplomático. De acordo com Cervo, “cabe à política exterior agregar os interesses, os valores e as pretendidas regras do ordenamento global, da integração ou da relação bilateral, isto é, prover o conteúdo da diplomacia desde uma perspectiva interna” 6. No exercício de analisar determinada notícia veiculada pela mídia, é preciso levar em consideração o contexto em que uma ação é desenvolvida e quais são ou serão suas possíveis repercussões para o país. Desse modo, avalia-se o grau de importância de tal ação, quais representantes do Estado estão envolvidos nesse contexto e qual a postura brasileira que determinada notícia reflete. De acordo com as concepções de política externa brasileira adotadas na produção do OPEB, constituem atos de política externa, de um modo geral, ações que envolvam ativamente o Estado brasileiro, seu comércio exterior ou a atuação de seus representantes, bem como notícias sobre o ordenamento interno ou práticas externas do Mercosul e da Unasul.

A Política Externa Brasileira recente

A investigação da política externa acompanha a observação das próprias ações dos tomadores de decisão. Dessa maneira, conforme a relevância galgada pelo Estado brasileiro, pode-se ter concomitantemente uma mudança na intensidade e na forma como as políticas do Brasil são percebidas no sistema internacional. Os primeiros anos do OPEB acompanharam um período no qual o Brasil conquistou certa notoriedade internacional, deflagrada por uma possível mudança ou fortalecimento paradigmático na formulação de suas políticas externas7. Nesse contexto, somam-se combinações de novos fatores que ajudam a entender como ações anteriormente não consideradas do âmbito da política externa passam a ter maior relevância com a promoção de uma agenda internacional sul-sul, do tipo 6

CERVO, Amado Luiz (1998). Eixos conceituais da política exterior do Brasil. Revista Brasileira de Política Internacional [online], vol.4, p.9. 7 CERVO, Amado Luiz (2008). Inserção Internacional: formação dos conceitos brasileiros. São Paulo: Editora Saraiva.

horizontal. Essa agenda nasce da postura brasileira em instituir sua própria visão de expressão exterior, ao mesmo tempo em que quer mostrar seu rechaço quanto às políticas externas das grandes potências. Alvaréz pontua que “esta nova fase está surgindo nos países da África, Ásia e América Latina como alternativa às tendências vigentes nos países desenvolvidos” 8. Isso significa que possuir agenda própria aponta que o Brasil busca autonomia política. Considerando como um paradigma, ele sugere que o Brasil conserva em suas características principais o estreitamento de seus vínculos com países emergentes, em uma política que visa à integração, à cooperação e ao fortalecimento do eixo horizontal, mais notadamente a partir do último período do governo Fernando Henrique Cardoso (1998-2002), e que ganha novo fôlego na era Lula (2003-2010). Segundo Pecequilo, O Brasil está reforçando as dimensões verticais e horizontais da agenda, do bi e do multilateralismo, com prioridades que retomam as ações de FHC com a introdução de novos tópicos, havendo uma mudança tática do “bom comportamento” pela “barganha de” alto perfil [...] O eixo horizontal é representado pelas parcerias com as nações emergentes, por suas semelhanças como grandes Estados periféricos e países em desenvolvimento como Índia, China, África do Sul e a Rússia [BRICS]9.

Ademais, de acordo com Cervo10, durante o governo Lula, a América do Sul tornou-se uma das prioridades da política externa brasileira. Segundo o Itamaraty, a integração do subcontinente é um objetivo estratégico da política externa, uma vez que desenvolve o mercado interno sul-americano e aumenta a competitividade dos países no mercado internacional. Ainda de acordo com a chancelaria, no que concerne ao Mercosul, o bloco representa o núcleo central da política externa brasileira,

pois

constitui uma zona de livre comércio e uma União Aduaneira em fase de consolidação, que visa a livre circulação de bens, serviços e fatores de produção entre os paísesmembros, o estabelecimento de uma tarifa externa comum e a adoção de uma política 8

ÁVAREZ, Gladys Lechini (2007). “A cooperação sul-sul ainda é possível?: O caso das estratégias do Brasil e dos impulsos da Argentina”. In: VILLA, R. A. D. ; MATHIAS, S.K. (orgs.). Ensaios Latinoamericanos de Política Internacional. Editora Hucitec, p. 239 9 PECEQUILO, Cristina Soreanu (2008). “A Política Externa do Brasil no Século XXI: Os Eixos Combinados de Cooperação Horizontal e Vertical”. Revista Brasileira de Política Internacional, Vol. 51, Núm. 2, julho-dezembro, pp. 136-153. 10 CERVO (2008), op. cit., p. 203

comercial conjunta. O bloco, portanto, é fundamental para a política externa brasileira, uma vez que garante a coordenação de políticas macroeconômicas e setoriais entre os Estados, o que fortalece não só as relações de caráter bilateral, como também as multilaterais11. Dessa forma, pode-se verificar que desde o governo Lula, a integração regional avançou, podendo-se citar como um dos mais importantes resultados a criação da Unasul, envolvendo os países da região sul-americana. De acordo com o Itamaraty, a posição do Brasil dentro do bloco possui grande relevância para a política externa nacional, pois o ente regional objetiva a construção de um ambiente integrado e consensual entre os países-membros, além de priorizar o diálogo político, o fortalecimento da democracia e a redução das assimetrias na região. A Unasul também vem se apresentando como um forte instrumento na resolução pacífica de controvérsias regionais, o que favorece o adensamento das relações econômicas e políticas entre os países sul-americanos. Entretanto, este avanço não significou que os problemas foram superados, sendo que mesmo dentro do Mercosul, o livre comércio enfrenta obstáculos e a imposição de medidas protecionistas por parte da Argentina e consequentes retaliações por parte do Brasil são frequentes nos dias atuais.

A Política Externa Brasileira e a integração regional durante o governo Rousseff

O avanço da integração regional e os problemas inerentes a esse processo podem ser percebidos através das notícias veiculadas pela mídia brasileira e publicadas nos informes do OPEB. Nesse período, a atuação brasileira na Unsaul e no Mercosul foi marcada por problemas que a política paraguaia está enfrentando e que levaram esses órgãos a tomar certas medidas importantes. Ademais, os problemas de avanço na integração regional apareceram nas relações entre Brasil e Argentina, marcadas pela existência de medidas protecionistas e tensões decorrentes. No que concerne ao Mercosul e Unasul, a conduta brasileira concentrou-se na suspensão do Paraguai dos blocos e a entrada da Venezuela como membro pleno no Mercosul. O Brasil também participou ativamente das reuniões da Unasul, sobretudo no

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Brasil: Ministério das Relações Exteriores. Resumo Executivo. Disponível em: Última visualização em: 5/09/2012.

que diz respeito ao envio de uma missão diplomática ao Paraguai, no dia 21 de junho, para avaliar a crise política no país, devido ao impedimento do então presidente Fernando Lugo. Nesse contexto, o Brasil agiu em conjunto com os demais membros do bloco, ao defender que todos os países da região devem ser defensores extremados da integridade democrática na América do Sul e que a missão enviada ao Paraguai estava de acordo com o tratado constitucional do bloco sobre compromissos com a democracia, conforme declarou o ministro das Relações Exteriores brasileiro, Antonio Patriota. Tal postura foi reforçada pelas declarações do assessor especial do Palácio do Planalto, Marco Aurélio Garcia, o qual considerou estranha a rapidez do processo de impeachment contra o presidente do país vizinho. Garcia também ressaltou que a crise política causa uma inquietação na região, onde há um convívio invejável, e declarou não acreditar que o Paraguai queira romper com esse convívio. O Brasil, assim como os demais países dos blocos citados, condenaram a destituição de Lugo e decidiram suspender o Paraguai do Mercosul e da Unsaul, em reunião do dia 24 de junho. Porém, a presidente brasileira, Dilma Rousseff, explicitou que não pretendia retaliar sozinha o governo de Federico Franco, atual presidente paraguaio, restringindo-se apenas a adotar decisões coletivas e em órgãos multilaterais. Portanto, o Brasil condenou a rapidez no processo de impeachment contra Lugo e indicou uma ruptura na ordem democrática do Paraguai. Esse discurso em prol da democracia serviu para legitimar as ações da Unasul no envio de tal missão diplomática, a fim de analisar a situação no país. Entretanto, conforme afirmou o chanceler brasileiro em 23 de junho, o Brasil não fechou a embaixada no Paraguai, pois, de acordo com o governo, o país reconhece Estados e não governos. Ademais, o Brasil reforçou sua posição a respeito do impasse regional na Organização dos Estados Americanos (OEA). Na reunião do dia 25 de junho, o representante interino do Brasil na organização, o ministro Breno Dias da Costa, não apoiou o envio da missão da OEA ao Paraguai, tampouco a expulsão do país vizinho da organização. Dias da Costa ressaltou que o Brasil considera ter havido um rito sumário contra Lugo e o rompimento da ordem democrática, mas que a melhor opção era esperar pelo encontro de chefes de Estado da Unasul antes de adotar qualquer postura. Já no dia 10 de julho, nos Estados Unidos, em nova reunião da OEA, o chanceler brasileiro ressaltou que a decisão de suspender o Paraguai dos blocos foi compartilhada por governos de perfis ideológicos distintos, não sendo exclusiva do Brasil. Entretanto,

apesar da suspensão do Paraguai, respaldada pelos demais membros do bloco, Antonio Patriota confirmou que durante a reunião de ministros do Mercosul, ocorrida na Argentina, nenhum chanceler defendeu a aplicação de sanções econômicas contra o Paraguai. Além de tratar da crise política do Paraguai no âmbito da Unasul, Mercosul e OEA, o Brasil intermediou as negociações com a Venezuela a respeito da entrada desse país como membro permanente do Mercosul. A incorporação da Venezuela seria facilitada pela ausência do Paraguai, o qual é o único membro do bloco que não concordava com a entrada plena do país. O interesse do Brasil em relação à entrada da Venezuela pode ser verificado pela missão que a presidente Dilma Rousseff enviou a Caracas, na qual se acertou que a Venezuela terá até dezembro de 2012 para adotar o código aduaneiro do Mercosul. Antonio Patriota reafirmou o interesse na plena participação do país venezuelano, e ainda declarou que este é um tema que atrai o interesse dos chefes de Estado e mantém toda sua urgência. No dia 31 de julho, em Brasília, os integrantes do Mercosul confirmaram a entrada da Venezuela como quinto membro do bloco. Na ocasião, Rousseff defendeu que a entrada do país venezuelano dá inicio a uma nova etapa no bloco, o qual se transforma em uma potência alimentar e energética. Ademais, a mandatária brasileira enfatizou as razões econômicas para a inserção do quinto membro e fez promessas de exibir resultados concretos na adaptação da Venezuela às regras do grupo. Segundo o assessor internacional da Presidência, a meta é encurtar o caminho para a plena adesão de Caracas ao Mercosul, o que envolve mudança tarifárias, padronização de código de produtos e adoção de normas legais comuns do bloco. Por outro lado, o Itamaraty admitiu que existem processos difíceis de serem acelerados. Apesar do apoio do bloco em relação à entrada da Venezuela, o chanceler uruguaio, Luis Almagro, afirmou que o Uruguai era contrário ao ingresso da Venezuela e que ela só foi aprovada por intervenção da presidente brasileira. Em resposta, Patriota ressaltou que nenhum dos países, nem mesmo o Uruguai, apresentou questionamentos à entrada do novo sócio como membro permanente. Além disso, Marco Aurélio Garcia alegou que o governo brasileiro não pressionou outros países a acatarem a decisão, pois, segundo ele, essa não é uma prática da política externa brasileira. Garcia sustentou ainda que o Brasil levou à reunião na Argentina uma posição amparada por critérios

jurídicos. Ademais, o assessor da Presidência declarou que partiu do próprio presidente uruguaio, José Mujica, a proposta de incluir a Venezuela no Mercosul. O governo brasileiro demonstra, assim, a intenção expansionista em relação ao Mercosul, fortalecendo o bloco no cenário internacional através da incorporação de outro país como membro pleno que poderia contribuir para uma maior projeção econômica internacional do bloco. Em suma, a postura brasileira em relação ao Paraguai e a suspensão desse país do Mercosul e da Unasul foi legitimada pelo discurso em defesa da democracia e respaldada pelos demais membros, apesar das críticas do Uruguai. O governo brasileiro também manteve contato com a Venezuela para entrada desse país no Mercosul, motivado por interesses, sobretudo, econômicos. No que se refere às relações bilaterais com países da América do Sul, pode-se destacar a relação entre Brasil e Argentina que foi marcada pela imposição de barreiras comerciais, acordos e parcerias. Em março de 2012, o ministro da Agricultura do Brasil, Mendes Ribeiro, foi a Buenos Aires com a intenção de negociar uma via rápida no trânsito de alimentos entre os dois países e evitar retaliações. Ribeiro declarou que o governo brasileiro visa estabelecer uma política de integração que não prejudique os produtores rurais de ambos os países. De acordo com o ministro, as restrições comerciais impostas pela Argentina incomodam e atingem de forma visível o Mercosul. Por isso, em maio, o governo brasileiro incluiu cerca de mais dez produtos argentinos em uma lista que indica os que exigem pedido de autorização para a entrada no Brasil, chamada licença não-automática de importação. Dentre os produtos estavam vinho, farinha de trigo, batata, maçã e queijo. Tal atitude foi tomada em retaliação às medidas protecionistas adotadas pela Argentina para diminuir a entrada de produtos brasileiros em seu território. No dia 15 do mesmo mês, os ministros brasileiros das Relações Exteriores, Antonio Patriota; do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, e da Agricultura, Mendes Ribeiro, encontraram-se com o chanceler argentino, Héctor Timerman. Na reunião, foram discutidos os conflitos comerciais entre ambos os países e os dois lados determinaram que os problemas seriam resolvidos em um prazo de cento e vinte dias. Ademais, o Brasil recebeu uma proposta da Argentina de elevarem as tarifas cobradas para a entrada de produtos externos ao Mercosul para os maiores níveis permitidos pela Organização Mundial do Comércio (OMC). O Itamaraty declarou que estudaria essa ideia de elevar a proteção da indústria da região

Posteriormente, a Argentina sinalizou em direção a um acordo entre os países ao suspender as restrições à entrada de carne suína brasileira. As barreiras à importação haviam sido impostas pelo governo argentino em fevereiro e causaram forte impacto no setor. O ministro Fernando Pimentel, considerou tal decisão positiva. Porém, no mesmo mês, as relações entre os países voltaram a complicar-se quando o Brasil reteve duzentos caminhões carregados com produtos vindos da Argentina na fronteira entre Bernardo Yrigogen, no país vizinho, e Dionísio Cerqueira, em Santa Catarina. O governo brasileiro impediu a entrada de algumas mercadorias, entre as quais, frutas, cebolas e outras perecíveis. Além disso, as exportações argentinas de uva passa, farinha de trigo, maçãs, peras, azeitonas, merluza, leite em pó, batatas précongeladas e vinhos estavam travadas o Brasil. Somente no final de junho as barreiras comerciais entre ambos os países foram derrubadas. Na época, o Ministério de Agricultura da Argentina informou em nota oficial que o país garantia a entrada efetiva de um grupo de produtos brasileiros. A Argentina decidiu afrouxar as barreiras impostas contra a carne suína do Brasil para, em contrapartida, restabelecer exportações de carros, azeitona, azeite de oliva e outros alimentos ao país. A decisão deu-se a partir do recuo das barreiras que vinham impondo após notícia de fechamento de duas fábricas de azeitonas e azeite de oliva em La Rioja e Mendoza. No mesmo mês, diplomatas brasileiros liderados pela secretária de Comércio Exterior do Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Tatiana Prazeres, negociaram com a delegação argentina. O objetivo foi desenvolver um acordo geral para destravar barreiras aos produtos que causam maiores problemas ao comércio bilateral. Na ocasião, as partes acordaram o prazo de uma semana para o início da liberação de licenças e a secretária de Comércio Exterior da Argentina, Beatriz Paglieri, comprometeu-se a adotar gestos de boa vontade. No setor energético, os países buscaram maior aproximação ao estabelecer parcerias. Em abril, o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, o ministro do Planejamento da Argentina e interventor da petroleira YPF, Julio De Vido, e a presidente da Petrobras, Maria das Graças Foster, encontraram-se em Brasília. No encontro, De Vido apresentou uma proposta para a Petrobras dobrar sua participação no mercado de produção, processamento de petróleo e distribuição na Argentina. Em resposta, o ministro brasileiro afirmou que a intenção é investir o máximo no país vizinho, porque é um bom negócio para a Petrobras e de interesse argentino. Contudo,

Lobão pediu que em troca o governo argentino ofereça segurança jurídica. Ademais, o representante de Minas e Energia lembrou que a nacionalização da petroleira YPF não abala as relações da Petrobras na Argentina, visto que estas são sólidas e que o Brasil confia no relacionamento com o parceiro do Mercosul.

Considerações Finais:

Conforme visto nas notícias divulgadas através da mídia brasileira, o Brasil busca um caminho não só para consolidar seu papel na região como também para integrar os demais países, vencendo prováveis impasses comerciais, diplomáticos e políticos. Tais obstáculos bilaterais e multilaterais constituem um exercício em busca da integração consensual de todos os países membros da Unasul e do Mercosul, de modo a fortalecer a região. Nesse contexto, as relações na América do Sul representam mais um ponto estratégico na agenda internacional brasileira. Mesmo tendo em vista os avanços já alcançados no subcontinente, como a criação de dois blocos regionais, maiores progressos ainda podem ser alcançados em direção a uma integração efetivamente consolidada. Ademais, o questionável processo de impeachment no Paraguai mostrou que Unasul e Mercosul possuem preocupações significativas com relação à manutenção da democracia na região e estão preparados para lidar com situações de golpe de Estado, pressionando pela volta da democracia. Nesta ocasião, apenas os dois blocos tomaram medidas concretas para que não houvesse uma ruptura da ordem democrática no Paraguai. Dessa forma, o Protocolo de Ushuaia e o Protocolo Adicional ao Tratado da Unasul sobre o compromisso com a Democracia mostram-se como importantes mecanismos para a manutenção da estabilidade democrática na região. Por outro lado, as medidas protecionistas que a Argentina impõe ao Mercosul mostram que a integração econômica na América do Sul ainda necessita de grandes avanços para que um real mercado comum possa existir. Essa situação provavelmente é um reflexo das assimetrias da região e do fato de que o Brasil possui a maior economia, o que leva a que parte das empresas prefiram se instalar neste país 12. Este processo também leva a pensar sobre as assimetrias na região, que devem ser superadas para que 12

VIGEVANI, Tullo; FAVARON, Gustavo de Mauro; RAMANZINI JÚNIOR, Haroldo; CORREIA, Rodrigo Alves (2008). O papel da integração regional para o Brasil: universalismo, soberania e percepção das elites. In: Revista Brasileira de Política Internacional. Nº51, p.13. Disponível em: Visualizado em: 5/09/2012.

o processo de cooperação possa avançar, o que só seria possível através do fortalecimento do Fundo para a Convergência Estrutural e Fortalecimento Institucional do Mercosul (FOCEM). Ademais, de acordo com Vigevani et al, Na perspectiva brasileira, visto retrospectivamente, o Mercosul surge de forma claramente ambígua, o que não é essencialmente diferente na parte argentina. Colocado no topo das prioridades internacionais, no caso brasileiro, onde a força do universalismo permanece, ele é apresentado como instrumento muito importante, mas sempre instrumento. Não haveria uma clara especificidade da integração, não seria um fim em si mesmo.13

Este seria outro fator que poderia dificultar a integração, principalmente caso não existam medidas importantes por parte do Brasil para diminuir as assimetrias. O fato de o Brasil usar o Mercosul para aumentar seu poder em negociações internacionais e não promover medidas significativas para reduzir as assimetrias na região, pode levar a que seus vizinhos passem a entendê-lo como imperialista, o que acabaria por diminuir seus desejos de integração e seria um grande obstáculo na integração real da América do Sul. Pode-se, portanto, notar que as políticas externas brasileiras, apesar de visarem o fortalecimento do eixo horizontal em prol da integração sul-americana, não têm sido suficientes para garantir um ambiente completamente harmônico e consensual, pois, embora importantes, as ações e decisões do Mercosul e Unasul não garantem uma região plenamente integrada, sendo esta marcada por certas rivalidades e impasses entre os países-membros. Dessa forma, o avanço da integração regional parece ser ao mesmo tempo um importante objetivo brasileiro e um grande desafio para a política externa atual.

13

Idem, ibidem, p. 9

Referências Bibliográficas ÁVAREZ, Gladys Lechini (2007). “A cooperação sul-sul ainda é possível?: O caso das estratégias do Brasil e dos impulsos da Argentina”. In: VILLA, R. A. D. ; MATHIAS, S.K. (orgs.). Ensaios Latino-americanos de Política Internacional. Editora Hucitec. Brasil: Ministério das Relações Exteriores. Resumo Executivo. Disponível em: Última visualização em: 5/09/2012. _____. América do Sul. Integração Sul-americana. Disponível em: Última visualização em: 5/09/2012. _____. América do Sul. União de Nações Sul-Americanas (UNASUL). Disponível em: http://www.itamaraty.gov.br/temas/balanco-de-politica-externa-2003-2010/1_1_1america-do-sul_unasul/view Última visualização em: 5/09/2012. ______. Balanço de política externa. América do Sul. Mercado Comum do Sul (MERCOSUL). Disponível em: Última visualização em: 5/09/2012. CERVO, Amado Luiz (1998). Eixos conceituais da política exterior do Brasil. Rev. bras. polít. int. [online]. vol.4. ______. (2008) Inserção Internacional: formação dos conceitos brasileiros. São Paulo: Editora Saraiva. ______. (2003) Política Exterior e Relações Internacionais do Brasil: Enfoque Paradigmático. Revista Brasileira de Política Internacional, julho-dezembro, vol. 46, número 002. MINGST, Karen (2009). Princípios de Relações Internacionais. Rio de Janeiro: Elsevier. PÁDUA, A. S.; BRAGA, A. P.; PEREIRA, B. F.; PAIVA, G. A. A.; SANTOS, H, N.; MILANI, L. P.; ALMEIDA, R. A. R.; MACHADO, S.; MATHIAS, S. K.; BOLLIS, T. P. (2011). Observatório de politica externa brasileira. Rev. Ciênc. Ext. v.7, n.3.

PÁDUA, A. S.; MATHIAS, S. K. (2010). Observatório de Política Externa Brasileira. Rev. Ciênc. Ext. v.6, n.1. PECEQUILO, Cristina Soreanu (2008). “A Política Externa do Brasil no Século XXI: Os Eixos Combinados de Cooperação Horizontal e Vertical”. Revista Brasileira de Política Internacional, Vol. 51, Núm. 2, julho-dezembro. SEITENFUS, Ricardo (2004). Relações Internacionais. São Paulo: Manole. VIGEVANI, Tullo; FAVARON, Gustavo de Mauro; RAMANZINI JÚNIOR, Haroldo; CORREIA, Rodrigo Alves (2008). O papel da integração regional para o Brasil: universalismo, soberania e percepção das elites. In: Revista Brasileira de Política Internacional. Nº51. Disponível em: Visualizado em: 5/09/2012.

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