POLÍTICAS DE CONVIVÊNCIA COM A SECA

July 24, 2017 | Autor: C. Gurgel da Silva | Categoria: Direito Constitucional
Share Embed


Descrição do Produto

POLÍTICAS DE CONVIVÊNCIA COM A SECA

Carlos Sérgio Gurgel da Silva1

Apesar de ser um tema recorrente na análise de diversos especialistas, a problemática da seca na região semiárida nordestina continua como um problema quase intransponível. Os anos se passam e este fenômeno climático cíclico se renova, trazendo consigo inseguranças e “fantasmas” adormecidos que tornam a vida das populações afetadas, em especial aquelas que vivem um estado de vulnerabilidade social e econômica (aqui chamados de “povos das secas”, segundo conceituação do Professor Fabiano André - UFRN), um verdadeiro suplício e uma afronta a ideia de dignidade da pessoa humana, pomposamente grafada em letras constitucionais, no Texto Magno nacional. Diante deste quadro, sempre me questiono: até quando tudo continuará como está? Quando vivenciaremos outra realidade? Quando este “povo das secas” será verdadeiramente livre, sujeito e agente de seu próprio desenvolvimento? Antes de respondermos a tais questionamentos devemos saber que não há como combater a seca, assim, como não há como combater as geadas no ártico ou combater as chuvas que caem na Amazônia todo final da tarde. Tratase, nestes casos, de fenômenos climáticos de ordem planetária e que, independentemente de ações antrópicas, irão sempre ocorrer. É certo que devido a ações antrópicas os efeitos destes eventos naturais podem ser alterados, permitindo ocorrências com maior ou menor intensidade. O Brasil precisa de uma política permanente de convivência com as secas, ou melhor, um Plano Nacional que possa criar um sistema nacional, instrumentos e medidas permanentes que permitam estabelecer as bases sustentáveis de um modelo de desenvolvimento que leve em consideração as potencialidades e peculiares de cada sítio, de cada região. Trata-se de uma política que, em nossa concepção, abarque aspectos educacionais (melhoria do nível de escolaridade das populações afetadas – em especial aquelas que se encontram em vulnerabilidade social e econômica), incluindo educação ambiental, aspectos ligados à empregabilidade (que sejam criadas condições para o desenvolvimento de atividades econômicas e para o pleno emprego, de caráter local), aspectos ligados a políticas agrícolas e ao fomento à agricultura familiar, de subsistência ou comunitária, de modo a se buscar um modelo de autossuficiência alimentar, entre outros que a brevidade de um texto desta ordem tende a limitar. Já dizia Celso Furtado que não se pode discutir (com a eficiência esperada) os principais entraves ao desenvolvimento do nordeste, sem que antes se enfrente (e se vença) o problema da fome na região. De todos estes problemas, o mais grave é aquele que persiste desde os primórdios da ocupação no Nordeste semiárido: a “apropriação” do discurso da 1

Geógrafo e Professor da UERN

seca por grupos políticos que só pensam em benefício próprio. Este discurso constitui a base que estabelece os padrões de estamentos que estampam a realidade do não desenvolvimento ou do desenvolvimento social e econômico deficitário que “escraviza” esta população de “vulneráveis sociais e econômicos”, tornando-os despidos de direitos subjetivos e prestações materiais proclamadas “em alto e bom som” pela Norma Fundamental do país, e se estabelecendo um grande hiato entre a realidade fática (resultante destas exclusões econômicas e sociais) e aquilo a que se propõe o Estado brasileiro, em sua missão de instituir um Estado Social e verdadeiramente democrático.

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.