Políticas e Sistema de Saúde no Brasil. Capítulo 24: Bioética

July 21, 2017 | Autor: B. Cátedra UNESCO | Categoria: Bioethics, Bioética
Share Embed


Descrição do Produto

Parte V Temas Relevantes em Políticas e Sistemas de Saúde

741

24. Bioética

Volnei Garrafa

A bioética completou quarenta anos de existência como um novo território do conhecimento, como uma disciplina autônoma. No princípio, seu foco de preocupação foi direcionado preferencialmente para os campos da relação profissional-paciente e da pesquisa com seres humanos. Com o passar dos anos, esse horizonte de atuação foi gradualmente ampliado. Neste início do século XXI, justificando sua inclusão na temática de um livro que trata de políticas e sistema de saúde, alcançou uma relação formal e concreta com as áreas social e sanitária. O objeto deste capítulo é analisar, a partir de um breve histórico da bioética e de sua fundamentação epistemológica redesenhada nos últimos anos, pontos de possível relação, apoio e diálogo entre o atual quadro de desenvolvimento sanitário brasileiro e esta nova disciplina.

Conceito e breve histórico da bioética A compreensão do conceito de bioética pode variar de um contexto para outro, de uma nação para outra e até entre diferentes estudiosos do assunto dentro de um mesmo país. No início dos anos 70, no seu alvorecer, foi concebida como uma nova maneira de perceber e encarar o mundo e a vida a partir da ética. Incorporava conceitos mais amplos na interpretação de qualidade da vida humana, incluindo, além das questões biomédicas propriamente ditas, temas como o respeito ao meio ambiente e ao próprio ecossistema como um todo. O neologismo ‘bioética’ foi introduzido pelo cancerologista estadunidense Van Rensselaer Potter, inicialmente em artigo publicado em uma revista de Nova York (Potter, 1970) e, logo depois, no livro que se confunde com a própria gênese da área, Bioethics: bridge to the future (Potter, 1971). Mais recentemente, alguns estudiosos europeus resgataram um texto isolado escrito em 1927 pelo pastor protestante alemão Fritz Jahr, no qual era mencionada a palavra bioética. Contudo, no contexto acadêmico mundial não paira dúvida que a paternidade da ideia de bioética, com sua fundamentação atualmente seguida, cabe a Potter, um pesquisador de reconhecido renome internacional que presidiu durante vários anos o National Cancer Institute dos Estados Unidos.

Epistemologia Teoria da ciência ou, melhor dizendo, estudo crítico de princípios, hipóteses e resultados das ciências já constituídas, cujo valor e alcance dos objetivos se pretende alcançar.

742

Políticas e Sistema de Saúde no Brasil

Apesar de ser apresentada por um conjunto de ideias relativamente homogêneas, são variados, até hoje, os conceitos propostos para a bioética. A primeira enciclopédia publicada sobre o assunto a definiu como “o estudo sistemático da conduta humana no âmbito das ciências da vida e da saúde, enquanto esta conduta é examinada à luz de valores e princípios morais” (Reich, 1978: XIX). Nos anos 90 alguns filósofos italianos, como Maurizio Mori e Francesco Bellino, a conceituaram, respectivamente, como “um novo movimento cultural” e um “novo território do saber”. De qualquer modo, o que motivou Potter a propor “uma ciência para a sobrevivência humana” foi sua apreensão com o acelerado processo científico e tecnológico experimentado no mundo após a Segunda Guerra Mundial. Para ele, assim como para outros pesquisadores, era preocupante a constatação de que o homem tinha adquirido poderes não só para criar novas formas de vida, como também para destruir o próprio planeta. Mais recentemente, as acirradas discussões sobre a construção da Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos desenvolvidas em Paris (Unesco, 2005) não conseguiram chegar a qualquer conclusão sobre o Artigo 1 das ‘Disposições Gerais’ do documento cujo título era exatamente ‘Conceito de Bioética’. Diante da absoluta impossibilidade de estabelecer um consenso, os delegados dos 191 países participantes decidiram por não incluir o conceito no documento. Na oportunidade, abriu-se uma das discussões mais complexas registrada no contexto hodierno da bioética, com posições polarizadas entre as nações mais desenvolvidas, que defendiam uma fundamentação universal para a bioética, e as nações pobres e em desenvolvimento (principalmente da América Latina, África, Oriente Médio e Ásia), que lutavam pela necessidade de que fossem respeitadas as peculiaridades culturais de cada país ou região do planeta. Estas duas posições, que até podem conviver conjuntamente por meio de diálogos construtivos, tolerantes e bilaterais, são denominadas, respectivamente, de universalismo ético e pluralismo histórico, temas abordados mais adiante ainda neste capítulo. De todo modo, adotada imediatamente por alguns institutos estadunidenses, a bioética sofreu, já em 1971, uma significativa redução da ampla concepção apresentada originalmente por Potter no âmbito biomédico (Durand, 2003). Foi com esta roupagem que ela acabou difundida pelo mundo a partir dos Estados Unidos: uma bioética anglo-saxônica, com preferencial conotação individualista, cuja base principal de sustentação repousava sobre a autonomia dos sujeitos sociais. Esta foi, fundamentalmente, a concepção que acabou divulgando a bioética no cenário internacional a partir dos anos 70 e durante década seguinte, tornando-a conhecida e consolidada por todo o mundo nos anos 90. A bioética faz parte das chamadas éticas aplicadas, as quais, por sua vez, estão incluídas no campo da filosofia moral (Singer, 2002). Incorpora a ética biomédica, mas não se limita a ela, estendendo seu conceito além dos limites tradicionais que tratam dos problemas deontológicos decorrentes das relações entre os profissionais da saúde e seus pacientes. Apesar de a conceitualização da jovem bioética estar em constante evolução até hoje, ela não significa apenas uma moral do bem e do mal ou um saber acadêmico a ser transmitido e aplicado diretamente na realidade concreta, como as ciências biomédicas, jurídicas ou sociais, por exemplo. Tendo como uma de suas bases de sustentação conceitual o respeito ao pluralismo moral, incorpora a legitimidade das tomadas de posição frente a conflitos éticos, em detrimento de posturas jurídico-legalistas ou decisões ancoradas em absolutos morais religiosos.

Bioética

Ética aplicada Refere-se à necessidade de a filosofia (e a ética) dar respostas concretas aos conflitos, indo além da teoria, das abstrações e do maniqueísmo entre temas como bem/mal, certo/errado, justo/injusto. A ética prática ou aplicada ressurge a partir dos anos 60, com três campos: a ética dos negócios, a ética ambiental (ecologia) e a bioética.

Ética biomédica Também denominada deontologia. Refere-se, no presente contexto, à chamada ética profissional que pauta os códigos éticos das diferentes profissões biomédicas. É direcionada preferencialmente para os deveres e as obrigações morais dos participantes de uma determinada comunidade profissional da área biomédica.

Pluralismo moral Situação constatada nas sociedades secularizadas contemporâneas, com coexistência de grupos de pessoas de posições morais diversas e independentes de outros grupos. O respeito ao pluralismo moral significa a capacidade de ‘estranhos morais’ conviverem pacificamente com base no referencial da tolerância. Trata-se, ainda, de requisito indispensável na composição de comitês multidisciplinares e no próprio diálogo bioético.

Existe muita controvérsia nos meios acadêmicos sobre o sentido das palavras moral e ética. ‘Ética’ deriva do grego ethos, que significa ‘modo de ser’ ou ‘caráter’, com sentido similar a ‘forma(s) de vida(s) adquirida(s) pelo homem’. Já o termo ‘moral’ se origina do latim mos ou mores, que quer dizer ‘alguma coisa que seja habitual para um povo’. As duas, portanto, têm o mesmo significado. Quando o direito foi criado na Roma Antiga, os legisladores construíram as leis da época com base em situações concretas que mais se aproximassem do mores vigente, ou seja, dos costumes e formas habituais dos cidadãos e comunidades procederem cotidianamente na vida em sociedade. Como os romanos não encontraram uma tradução que lhes fosse inteiramente satisfatória para o ethos, utilizaram de forma generalizada o mores, que em português é traduzido por moral. Resumindo, se, por um lado, o significado etimológico de ética e moral é similar; por outro, existe uma diferença historicamente determinada entre ambas as expressões. A moral romana é uma espécie de tradução latina de ética, que acabou adquirindo uma conotação formal e imperativa, direcionada ao aspecto jurídico e não ao natural, a partir da antiga polarização verificada entre o ‘bem’ e o ‘mal’. Para os gregos, o ethos significava o conjunto de comportamentos e hábitos constitutivos de uma verdadeira ‘segunda natureza’ do homem. Na obra histórica Ética a Nicômaco, Aristóteles (1992) interpreta a ética como a reflexão filosófica sobre o agir humano e suas finalidades. E é a partir dessa interpretação aristotélica que a ética passou a ser referida como uma espécie de ‘ciência da moral’. O desenvolvimento histórico da bioética pode ser estabelecido com base em quatro etapas ou momentos bem determinados: 1) Etapa da fundação – relacionada com os anos 70, quando os primeiros autores que sobre ela se debruçaram estabeleceram suas primeiras bases conceituais. 2) Etapa da expansão e consolidação – relacionada com os anos 80, quando se expandiu por todos os continentes por meio de eventos, livros e revistas científicas especializa-

743

744

Políticas e Sistema de Saúde no Brasil

das, principalmente a partir do estabelecimento do principialismo, a corrente bioética estadunidense baseada em quatro princípios pretensamente universais: autonomia, beneficência, não maleficência e justiça. Principialismo É uma corrente hegemônica da bioética estadunidense, baseada em quatro princípios pretensamente universais, oriundos do Relatório Belmont (veja mais detalhes adiante): autonomia, beneficência, não-maleficência e justiça. Trata-se da chamada bioética baseada em princípios ou bioética principialista. A corrente principialista anglo-saxônica da bioética tornou o princípio da autonomia, na prática, uma espécie de ‘superprincípio’, hierarquicamente superior aos demais, deixando o princípio da justiça como mero coadjuvante: importante, mas adicional no contexto da teoria. O ‘eu’ do individualismo sufoca o ‘nós’ do coletivismo.

3) Etapa da revisão crítica – compreende o período posterior à década de 1990 até o início do século XXI. Caracteriza-se por dois movimentos: a) o surgimento de críticas ao principialismo, com consequente ampliação do seu campo de atuação a partir da constatação da existência de ‘diferenças’ entre os diversos atores sociais e culturas, espaço onde movimentos emergentes, como o feminismo e os de defesa dos negros e homossexuais, entre outros, adquiriram grande importância; b) a necessidade de se enfrentar de modo ético e concreto as questões sociais e sanitárias mais básicas, como a exclusão social ou a equidade no atendimento sanitário, conjuntamente à universalidade do acesso das pessoas aos benefícios do desenvolvimento científico e tecnológico. Este último aspecto, extremamente atual, diz respeito à ética da responsabilidade pública do Estado diante dos cidadãos, no que se refere à priorização, à decisão, à alocação, à distribuição e ao controle de recursos financeiros direcionados às ações de saúde. Ampliação conceitual da bioética Após as críticas constatadas com relação ao enfoque principialista da bioética no início dos anos 90, começa-se a verificar uma ampliação do horizonte de atuação da disciplina, que passa a incorporar, além dos temas biomédicos e biotecnológicos iniciais, as questões sociais, sanitárias e ambientais.

4) Etapa da ampliação conceitual – verificada após a homologação, em 19 de outubro de 2005, em Paris, da Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos, da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), a qual, além de confirmar o caráter pluralista e multi-intertransdisciplinar da bioética, amplia sua agenda da temática preferencialmente biomédica-biotecnológica para os campos sanitário, social e ambiental (Garrafa, 2005). Multi-intertransdisciplinar: o que é isso? Multidisciplinaridade – Também chamada de pluridisciplinaridade, refere-se ao estudo de um objeto de uma mesma e única disciplina por várias disciplinas ao mesmo tempo. Os conhecimentos de uma, no entanto, não interagem com os de outra. É mais estática. Interdisciplinaridade – Intercâmbio de conhecimentos entre diferentes disciplinas. Refere-se à transferência de métodos de uma disciplina para outra, com existência de intercâmbio. É dinâmica. Transdisciplinaridade – Todo conhecimento que está, ao mesmo tempo, entre as disciplinas, através das disciplinas e além de qualquer disciplina. Refere-se à unidade do conhecimento, é profundamente dinâmica e essencial à bioética. Tem relação com o ‘salto’ que se dá para além das disciplinas, a partir de ensinamentos das mesmas. É a síntese.

Bioética

745

O aborto, tema frequente na agenda bioética, pode ser analisado isoladamente sob a ótica biomédica, jurídica, sociológica, religiosa ou outra (multidisciplinaridade). Quando a área jurídica, por exemplo, dialoga com as ciências biomédicas, com incorporação e aproveitamento do conteúdo de uma e outra área para uma tomada de decisão, está havendo interdisciplinaridade. Já a multidisciplinaridade significa a construção e a obtenção do resultado de um novo conhecimento, de uma nova ótica, de um outro ‘olhar’ sobre o assunto estudado (no caso, o aborto) a partir da utilização harmônica dos conhecimentos de várias e diferentes áreas ou disciplinas. Criada a partir do Relatório Belmont e explicitada na primeira edição do livro Principles of Biomedical Ethics (Beauchamp & Childress, 1979), a bioética principialista tomou como fundamento os quatro princípios básicos já mencionados, os quais passaram a constituir uma espécie de ‘mantra’, um instrumento acessível e tentadoramente prático para a análise dos conflitos surgidos no campo bioético. Como essa teoria foi construída a partir de uma cultura anglo-saxônica do mundo, o tema da autonomia terminou maximizado hierarquicamente com relação aos outros três, tornando-se uma espécie de superprincípio. Este fato contribuiu para que a visão individual dos conflitos passasse a ser aceita como a vertente decisiva para a resolução dos mesmos, o que nem sempre acontece (Selleti & Garrafa, 2005). A autonomia é um referencial indispensável na análise das questões éticas contemporâneas. Introduzida por Kant na sua interpretação atual, em que o filósofo substituiu Deus pela razão, sua aplicação modificou praticamente todas as formas de relações interpessoais e o próprio trato do Estado democrático com cidadãos e usuários de seus serviços. No entanto, o que acontece no principialismo bioético é, muitas vezes, a interpretação da autonomia como individualidade, que se aproxima do individualismo – o qual, por sua vez, pode cair no egoísmo, visão exacerbada do ‘eu’, que tende a anular o ‘nós’ mesmo em situações públicas e coletivas. A fragilidade da utilização maximalista da autonomia está na possibilidade de esta ser direcionada a um individualismo extremado, que sufoca qualquer direcionamento inverso, coletivo, indispensável para o enfrentamento dos grandes problemas sociais, constatados especialmente nos países do hemisfério Sul.

Relatório Belmont Documento elaborado por um grupo multidisciplinar de especialistas por solicitação do governo dos Estados Unidos, com o objetivo de criar novos referenciais no sentido de conter os abusos verificados naquele país com relação às pesquisas clínicas com seres humanos até os anos 70.

Immanoel Kant Filósofo alemão, viveu em Königsberg, Alemanha (antiga Prússia), entre 1724 e 1804. É autor de livros que até hoje fundamentam a ética moderna, entre eles: Crítica da Razão Pura, Crítica da Razão Prática e A Fundamentação da Metafísica dos Costumes. Este último é considerado uma das mais importantes obras já escritas sobre a moral. Kant é reconhecido por muitos autores como o verdadeiro introdutor do conceito de autonomia. Embora seguidor do protestantismo e crente em Deus, foi quem formalizou o conceito de ‘liberdade de consciência’, simbolizada pela maioridade do homem no pensar, com o fim de tutelas (inclusive divinas) e com o uso público da razão (Selleti & Garrafa, 2005).

Com a realização do IV Congresso Mundial de Bioética, da International Association of Bioethics, em Tóquio, Japão, em 1998, a bioética começou a percorrer outros caminhos, a partir do estabelecimento do tema oficial do evento, que foi Bioética global. No apagar das luzes do século XX, a disciplina passa gradativamente a expandir seu campo de estudo e ação das questões individuais para os temas coletivos, incluindo na discussão temas mais

Bioética global Enfoque da bioética que considera a ética da vida em seu mais amplo sentido, incorporando, além dos temas biomédicos e biotecnológicos diretamente inerentes ao ser humano, os temas ambientais e os relacionados com o próprio ecossistema planetário.

746

Políticas e Sistema de Saúde no Brasil

amplos relacionados com a qualidade da vida humana e outros assuntos, que até então apenas tangenciavam sua pauta. Entre outros, passa a priorizar a alocação de recursos em saúde, a exclusão social, a equidade, o racismo e outras formas de discriminação, as diferentes formas de vulnerabilidade, a finitude dos recursos naturais planetários e o equilíbrio do ecossistema. Assim, além dos quatro princípios tradicionais mencionados, novos referenciais e critérios começaram a ser incorporados nos últimos anos por bioeticistas críticos em seus estudos e pesquisas: responsabilidade, cuidado, solidariedade, ‘empoderamento’, libertação, comprometimento, alteridade e tolerância, entre outros, além dos quatro ‘Ps’ para o exercício de uma prática bioética comprometida com os mais vulneráveis, com a coisa pública e com o equilíbrio ambiental e planetário do século XXI. São eles: ‘prevenção’ contra possíveis danos, ‘proteção’ dos mais frágeis, ‘prudência’ nos avanços e ‘precaução’ diante do desconhecido. Para refletir A bioética principialista dá conta de interpretar e propor soluções para os macroproblemas sociais e sanitários comuns aos países pobres e em desenvolvimento do mundo? Por quê?

Bases conceituais da bioética latino-americana

Pluralismo histórico e contextualização Com variadas realidades e culturas, é impossível ao mundo contemporâneo conviver com imperialismos éticos, ou seja, com a imposição de parâmetros morais pretensamente universais exportados verticalmente das culturas mais ‘fortes’ para as mais ‘frágeis’. O respeito e a consideração de cada contexto específico, onde as situações, os problemas e os conflitos acontecem, são indispensáveis para o exercício de uma bioética cidadã, ou seja, de uma bioética politicamente comprometida com as necessidades e interesses das maiorias populacionais excluídas do processo de desenvolvimento societário.

Em 2005, na Unesco, foi impossível criar um consenso para incluir na Declaração Universal sobre Bioética e Direito Humanos uma definição universal de bioética. A conclusão a que se chegou, com um significado de vitória para os países pobres e em desenvolvimento que defendiam o respeito ao pluralismo histórico e aos contextos morais verificados nas diferentes culturas, foi que há uma impossibilidade de aplicação de princípios éticos universais, dada as diferentes visões morais de cada país ou região, decorrentes de realidades e culturas também variadas. O que existe, portanto, são bioéticas, no plural, e não uma única bioética. Isso, contudo, não significa a negação da existência de uma epistemologia da bioética, ou seja, não se nega a existência de bases conceituais, teóricas, de sustentação da disciplina. Com base no conceito expandido que se pretende dar à disciplina, seus verdadeiros fundamentos estão assentados em interpretações e ações multi-intertransdisciplinares que incluem, além das ciências biomédicas, a filosofia, o direito e as ciências humanas. Embora o objetivo deste capítulo seja mostrar um breve panorama introdutório e geral da bioética para os profissionais de diferentes carreiras que trabalham direta ou indiretamente com temas relacionados às políticas e ao sistema de saúde no Brasil, é indispensável reforçar que incorre em equívoco conceitual aquele que reduzir a bioética exclusivamente aos quatro princípios mencionados. Com 35 anos de existência, a especialidade já tem seu estatuto epistemológico assentado em sólidas bases teóricas de indispensável conhecimento e domínio por parte dos estudiosos interessados no assunto. De acordo com publicação recente da Rede Latino-Americana e do Caribe de Bioética (Redbioética), da Unesco (Garrafa, Kottow & Saada, 2006), os referenciais conceituais de uma bioética comprometida com a realidade concreta dos países periféricos são: 1) A não universalidade das diferentes situações, com necessidade de contextualização dos problemas específicos em exame, dos respectivos referenciais culturais, religiosos, políticos, de preferência sexual etc.

Bioética

2) O respeito ao pluralismo moral, a partir das visões morais diferenciadas sobre os mesmos assuntos e constatadas nas sociedades plurais e democráticas do século XXI. 3) A inequívoca aptidão da bioética para constituir um novo núcleo de conhecimento necessariamente multi-intertransdisciplinar. 4) A característica de ser uma ética aplicada, ou seja, originária da filosofia e comprometida em proporcionar respostas concretas aos conflitos que se apresentam. 5) A análise dos fatos a partir dos referenciais do pensamento complexo (Morin, 2001) ou da totalidade concreta (Kosik, 1976). Isso, contudo, não significa o simples somatório das partes de uma determinada situação, mas sua interpretação estruturada em rede, em que todos os conceitos e elementos se iluminam mutuamente, proporcionando uma noção mais harmônica e palpável de realidade a partir da religação de diferentes saberes. Pensamento complexo ou complexidade Paradigma proposto, entre outros autores, por Edgar Morin, que corresponde à religação de diferentes saberes. Segue na mesma direção da transdisciplinaridade, a qual contempla a propriedade de distinguir conhecimentos, respeitando os domínios disciplinares, mas impedindo o reducionismo. Trata-se de uma vertente teórica que dialoga com a imprevisibilidade e se sustenta no tetragrama da ordem e da desordem, da interação e da organização, como ferramentas de intercâmbio com a realidade sem, contudo, ambicionar conhecer o todo. Ambiciona, porém, aproximar-se dele. Um surto de hantavirose, doença transmitida pelos ratos silvestres, em uma cidade, poderá ser mais bem compreendido com o estudo de todas as variáveis biológicas (o rato), ambientais (a mata destruída que expulsou os animais para a cidade) e sociais (nível socioeducacional da população). O paradigma da complexidade auxilia na melhor compreensão de fenômenos multifatoriais como esse.

Totalidade concreta Não é um mero conjunto de fatos. Trata-se da própria realidade como um todo estruturado, dinâmico e inter-relacionado, a partir do qual se pode compreender, racionalmente, qualquer fato (classe de fatos, conjunto de fatos etc.). Reunir simplesmente todos os fatos não significa conhecer a realidade, assim como todos os fatos, somados, não constituem a realidade. O paradigma da totalidade concreta permite a melhor compreensão de muitos quadros mórbidos, principalmente quando a causalidade da doença em foco extrapola o campo exclusivamente biológico, estendendose às razões sociais, econômicas, políticas e outras.

6) A necessidade de estruturação do discurso bioético, que deve ter como base a comunicação e a linguagem (para se manifestar), a argumentação (que deve primar pela homogeneidade e lógica), a coerência (na exposição das ideias) e a tolerância (relativa ao convívio pacífico diante de visões morais diferenciadas). A bioética, como foi mencionado, é ‘ética prática’, ‘aplicada’. Atualmente, este campo específico da filosofia, apesar de ainda contestado por muitos filósofos, tem sua utilização mais aperfeiçoada, mais acabada, exatamente com a bioética. Isso é, até certo ponto, natural, uma vez que os grandes dilemas que passaram a se apresentar às pessoas e coletividades, na vida cotidiana e na prática, principalmente nas últimas décadas, começaram a exigir respostas ou decisões geralmente imediatas e sempre concretas. Ao lado de problemas

747

748

Políticas e Sistema de Saúde no Brasil

historicamente persistentes relacionados com a pobreza e a exclusão social, entre outros, passaram a ser comuns os conflitos éticos ligados a temas de fronteiras do conhecimento. Podem-se citar as novas tecnologias reprodutivas, os transplantes de órgãos e tecidos humanos, as terapias gênicas e tantas outras situações que atingem, de certo modo, os limites, os confins da vida, e que dizem respeito ao mais íntimo da espécie humana e ao seu bem-estar e desenvolvimento futuro. A rapidez dos avanços científicos e tecnológicos exigiu que as diversas áreas de saber envolvidas com os fenômenos direta ou indiretamente relacionados com o nascimento, a vida e a morte das pessoas se adequassem à nova realidade. A filosofia viu-se repentinamente obrigada a caminhar com agilidade compatível à evolução de conceitos e descobertas e com as consequentes mudanças que passaram a se verificar no cotidiano das pessoas e coletividades. Parâmetros morais secularmente estagnados começaram a ser questionados e transformados, gerando a necessidade de estabelecimento de novos referenciais éticos que, por sua vez, requerem da sociedade ordenamentos jurídicos também pertinentes à nova realidade. Ou seja, algumas referências morais intocáveis por muitos séculos – principalmente as de cunho conservador e/ou religioso, como as questões relacionadas com o início e o final da vida (o aborto e a eutanásia, por exemplo) – foram praticamente ‘atropeladas’ pela realidade dos fatos a partir dos anos 70. A velocidade das descobertas, de certa forma, ‘roubou’ das sociedades humanas contemporâneas o tempo necessário e indispensável para o amadurecimento moral das respostas frente às ‘novidades’. E é aí que surge a bioética, como uma nova ferramenta, um novo instrumento teórico e metodológico capacitado a proporcionar reflexões e respostas possíveis diante desses novos (e também dos antigos) dilemas morais.

Para refletir Quais as diferenças entre a teoria principialista da bioética estadunidense e a proposta conceitual latino-americana da Redbioética/Unesco, no sentido do enfrentamento dos macroconflitos e dilemas relacionados com as políticas e o sistema de saúde em curso no Brasil? Reflita sobre a seguinte situação: a Secretaria de Saúde de um pequeno município constata que o orçamento disponível é mínimo e permite apenas a implantação do programa anual de atenção primária (vacinação infantil, aleitamento materno, vigilância sanitária...), não sobrando recursos, por exemplo, para atender aos quatro pacientes da cidade que necessitam diálise renal para sobreviver. Qual o procedimento que deve ser tomado com base na fundamentação bioética aqui apresentada? Cortar recursos da atenção primária e desviá-los para atenção aos quatro pacientes que necessitam se deslocar até uma cidade vizinha onde o atendimento é pago? Buscar uma forma adicional de resolver as duas situações? Nesse caso, qual? Como proceder eticamente diante de conflitos coletivos como este, relacionados com a priorização na alocação de recursos escassos ou insuficientes?

Bioética e saúde pública Estão se tornando a cada dia mais frequentes e delicados os conflitos gerados entre a evolução do mundo, o progresso biomédico e os direitos humanos. Em alguns momentos, já tem sido rompido, muitas vezes de forma inescrupulosa, o frágil limite que separa essas situações. Cria-se, assim, uma série de distorções, como nas questões relacionadas com a ina-

Bioética

749

cessibilidade das camadas mais pobres da população tanto aos benefícios do desenvolvimento científico e tecnológico, como a bens básicos de consumo sanitário indispensáveis para uma vida digna. Incontáveis exemplos também acontecem no campo específico da saúde pública, em que recursos financeiros imprescindíveis para projetos que visam à sobrevivência de milhares de pessoas são frequentemente desviados, por políticos ou técnicos, para atividades de importância secundária, que não guardam qualquer relação com as finalidades originais dos referidos projetos (Berlinguer & Garrafa, 2001). Todos estes variados temas, portanto, que vão desde os dilemas éticos enfrentados pelo administrador de saúde com relação à repartição de verbas insuficientes para atividades impostergáveis até problemas gerados pela aplicação universalizada de tecnologias de ponta, fazem parte do campo de estudo da bioética. E esta, em poucos anos de existência, ampliou substancialmente seu campo de estudo, ação e influência. A discussão bioética surge para contribuir na procura por respostas equilibradas frente aos conflitos atuais e aos das próximas décadas. Já tendo sido sepultado o mito da neutralidade da ciência, requer abordagens pluralistas e transdisciplinares a partir de interpretações complexas, no sentido anteriormente exposto, da totalidade concreta que nos cerca, onde vivemos e onde os conflitos morais acontecem. De acordo com esse contexto e objetivando melhor sistematização e compreensão de sua área de estudo e abrangência, a bioética pode ser classificada em dois grandes campos de atuação, de acordo com sua historicidade: a bioética das situações emergentes e a bioética das situações persistentes (Garrafa & Porto, 2003). Com relação à bioética das situações emergentes, estão relacionados, principalmente, os temas surgidos mais recentemente e que derivam do grande desenvolvimento científico e tecnológico experimentado nos últimos cinquenta anos. Entre estas questões, podem ser mencionados: 1) o projeto genoma humano e todas as situações relacionadas com a engenharia genética, incluindo a medicina preditiva (que atua de modo interventivo e corretivo/ preventivo diretamente no embrião, em nível ainda intrauterino) e o uso terapêutico de células-tronco; 2) as doações e os transplantes de órgãos e tecidos humanos, com todas as suas inferências que se refletem na vida e na morte das pessoas na sociedade e a relação disso tudo com as ‘listas de espera’ e o papel controlador e moralizador do Estado; 3) o tema da saúde reprodutiva, que passa por diversos capítulos, como a fecundação assistida propriamente dita, a seleção e o descarte de embriões, a eugenia (escolha de sexo e determinadas características físicas do futuro bebê), as ‘mães de aluguel’, a clonagem etc.; 4) as questões relacionadas com a biossegurança, cada dia mais importantes e complexas; 5) as pesquisas científicas envolvendo seres humanos e seu controle ético. A expressão biossegurança, especificamente, deve ser entendida além da interpretação que a reduz exclusivamente ao tema dos organismos geneticamente modificados. Ao contrário, tem um significado mais amplo no sentido da proteção, diminuição e/ou controle dos riscos decorrentes de atividades biotecnológicas que possam comprometer a vida humana, animal ou ambiental. No que se refere à bioética das situações persistentes, que são aquelas que persistem teimosamente desde a Antiguidade, incluem-se todas as que dizem respeito à exclusão social; às discriminações de gênero, raça, sexualidade e outras; aos temas da equidade, da universalidade e da alocação, distribuição e controle de recursos econômicos em saúde; à atenção a

Bioética das situações emergentes É o campo da bioética temática que trata das situações que emergiram historicamente nas últimas décadas, como produto do desenvolvimento científico e tecnológico. Também chamada de bioética das situações relacionadas aos limites ou às fronteiras do desenvolvimento.

Bioética das situações persistentes É o campo da bioética temática que trata das situações historicamente persistentes no processo evolutivo da humanidade e que continuam se repetindo, apesar do atual estágio de desenvolvimento do mundo. Também chamada de bioética das situações cotidianas: que acontecem todos os dias e não mais deveriam estar ocorrendo.

750

Políticas e Sistema de Saúde no Brasil

crianças e idosos; aos direitos humanos e à democracia, de modo geral, e suas repercussões na saúde e na vida das pessoas e das comunidades; ao aborto; à eutanásia. Embora outros autores prefiram colocar estas duas últimas situações entre os temas ‘emergentes’ ou de ‘limites’, parece ser mais adequado classificá-las como persistentes, levando-se em conta sua conotação histórica, uma vez que se enquadram entre as situações que se mantêm teimosamente na pauta da ‘comédia humana’ desde os tempos do Antigo Testamento. Ética da responsabilidade individual Trata-se do compromisso moral e da responsabilidade pessoal e intransferível de cada cidadão para com a alteridade. É a visão do semelhante, do outro, principalmente aquele mais vulnerável e desassistido. Resgata, também, a responsabilidade e a ética no trato das questões públicas de parte dos servidores governamentais do setor saúde.

Ética da responsabilidade pública Refere-se ao compromisso e à responsabilidade do Estado diante dos cidadãos e de toda a sociedade, a partir do cumprimento rigoroso das normas constitucionais e das legislações complementares no campo da saúde, no caso deste livro.

Ética da responsabilidade planetária Diz respeito ao compromisso e à responsabilidade de todos os cidadãos, empresas, governos e Estado diante da preservação dos ambientes naturais, da biodiversidade e do próprio ecossistema. Trata-se, principalmente, de considerar a finitude dos recursos naturais e de assumir um papel protetor e fiscalizador desses recursos não renováveis, além de estimular o chamado desenvolvimento sustentável.

Para que se enfrente de modo mais adequado toda esta gama de questões, em vez de simplesmente importar referenciais éticos provenientes de outras realidades, é mais adequado que cada país ou região do mundo interprete e atue junto a seus problemas ou situações moralmente conflitivas de acordo com seus próprios contextos sociais, culturais, econômicos e biológicos. Alguns movimentos políticos e sociais – como aqueles relacionados com as mulheres e os negros – têm conseguido mostrar de forma clara ao mundo a importância de se compreender e respeitar as diferenças. O conceito de diferença nas questões de gênero, do mesmo modo que nos temas raciais ou de preferência sexual, não significa desigualdade (ou inferioridade). Pelo contrário, resgata a necessidade democrática de que cada situação seja contextualizada exatamente a partir desses parâmetros diferenciais para que, assim, se dê a verdadeira igualdade. Desde aspectos mais simples e diretos, como aqueles referentes aos direitos de uma gestante, até os que dizem respeito à igualdade de acesso para todas as pessoas indistintamente na disputa por postos de trabalho – conquistas consideradas longínquas para alguns grupos sociais há algumas décadas –, apesar das dificuldades ainda enfrentadas, ganharam novo impulso com os avanços destes movimentos democráticos. Em praticamente todos os assuntos relacionados com a bioética, independentemente de serem emergentes ou persistentes, existe uma questão que atravessa longitudinalmente os temas a serem abordados e estudados: a ética da responsabilidade. Com relação a ela, três aspectos podem ser considerados e analisados: 1) a ética da responsabilidade individual, que se refere ao papel e aos compromissos que cada cidadão ou cidadã deve assumir frente a si mesmo(a) e aos seus semelhantes, seja em ações privadas ou públicas, singulares ou coletivas; 2) a ética da responsabilidade pública, que diz respeito ao papel e aos deveres dos Estados democráticos frente não somente a temas universais, mas também à cidadania e aos direitos humanos, bem como ao cumprimento das cartas constitucionais de cada nação e, no caso do Brasil, especialmente dos capítulos que se referem diretamente à saúde e vida das pessoas; 3) a ética da responsabilidade planetária, que significa o compromisso de cada cidadão ou cidadã do mundo, de cada país e do próprio conjunto de todas as nações diante do desafio da preservação do planeta, em respeito àqueles que virão depois de nós (Jonas, 2006). Outro aspecto a ser analisado e relacionado ao contexto aqui desenvolvido é a proteção necessária – e até mesmo indispensável – às pessoas mais frágeis, mais vulneráveis, especialmente aquelas que vivem nos países periféricos. Essa linha de pensamento bioético com base na proteção, diferenciada do simples paternalismo estatal, tem como objetivo dar conta dos conflitos e dilemas morais enfrentados pela saúde pública, que muitas vezes não podem ser resolvidos concretamente por outras ferramentas da bioética mundial, em particular o principialismo (Schramm & Kottow, 2001). Em seu sentido estrito, a bioética que trata da proteção se refere especificamente às medidas que devem ser tomadas “para proteger indivíduos e populações que não dispõem

Bioética

751

de outras medidas que lhes garantam as condições indispensáveis para levar adiante uma vida digna e não somente dispor de uma sobrevida (...) e que são, portanto, excluídos da ‘comunidade política’ e das políticas dos direitos humanos” (Schramm, 2005: 21-22 – tradução livre). Considerando que a bioética tem pelo menos duas funções reconhecidas – a analítica, que é teórica e crítica, e a normativa, que, por sua vez, é prática –, parece razoável a proposta de agregar a essas funções tradicionais uma adicional: a de instrumento protetor, que objetiva ‘dar amparo’ e defender a vida no seu mais amplo sentido, seja humana ou não humana. Com a homologação da Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos, a agenda bioética do século XXI foi definitivamente ampliada. Projeta-se para além das situações exclusivamente biomédicas e biotecnológicas, as quais foram reduzidas nos anos 80 e 90 com base nos interesses unilaterais dos países desenvolvidos. A nova referência conceitual da disciplina, como foi dito, proporciona um vasto leque de possibilidades de atuação, incorporando os campos sanitário e social, fator indispensável para a consecução de uma bioética realmente empenhada com a ética das diferentes situações relacionadas com a qualidade da vida humana. O novo conceito de bioética ampliou substancialmente o campo de atuação da disciplina, oxigenando-a e politizando-a ao incorporar no seu escopo temas de interesse direto das nações periféricas do hemisfério Sul, como a inclusão social, a universalidade do acesso das pessoas a cuidados de saúde de qualidade e a medicamentos essenciais, a proteção da biodiversidade, o compartilhamento dos benefícios decorrentes do avanço científico-tecnológico, entre outros (Unesco, 2005). A ampliação conceitual da bioética permitiu incorporar ao seu campo de estudo e ação as diferentes situações relacionadas com a saúde pública, as políticas e o sistema de saúde em vigor no Brasil. Não há dúvidas de que o país avançou com relação às questões sanitárias, especialmente nas duas últimas décadas. Esses avanços, no entanto, sob a ótica da ética da responsabilidade pública, são relativos. Para o filósofo Hans Jonas (2006), diante das profundas contradições que a humanidade (e os países...) se vê obrigada a enfrentar, é necessário que a racionalidade ética caminhe com a mesma velocidade do progresso técnico-científico, o que por aqui infelizmente, não vem acontecendo. Apesar de não usar a expressão ‘ética prática’, Jonas afirma que a filosofia pode dizer várias coisas concretas: que tipos de vida são melhores que outros, que coisas trazem benefícios ou danos. Segundo ele, o progresso moral coletivo pode ser evidenciado de três formas: nas legislações dos Estados modernos, em certos valores incorporados nos códigos das leis e nos comportamentos públicos. O Brasil evoluiu significativamente nos últimos anos com relação aos dois primeiros pontos citados. Nossa Constituição está entre as mais avançadas do mundo no que se refere ao capítulo da saúde e das questões médico-sanitárias, assim como a Lei Orgânica que operacionaliza o Sistema Único de Saúde (SUS) está assentada sobre modernos conceitos teóricos relacionados com a descentralização administrativa, universalização, equidade e outros. Depois de diversos avanços e retrocessos políticos relativos à efetiva implementação do SUS, a maior dificuldade continua incidindo na implementação prática das conquistas legais; ou seja, de acordo com o terceiro item mencionado, significa, definitivamente, adicionar aos comportamentos públicos o progresso moral já presente na legislação. Procurando sintetizar o que foi dito, encontramo-nos frente à necessidade de algumas mudanças no campo sanitário com relação aos compromissos públicos e às responsabilidades

Para conhecer a legislação geral do SUS, consulte o capítulo 12.

752

Políticas e Sistema de Saúde no Brasil

sociais, o que não significa obrigatoriamente a dissolução dos valores já existentes, mas sua transformação. Há uma tradição na sociedade brasileira, no entanto, de certos segmentos hegemônicos estabelecerem unilateralmente os direitos do indivíduo e os rumos a serem seguidos pela sociedade. Esta tradição – que tem mudado, mas em proporção ainda insuficiente – não só é geradora de desigualdades profundas, mas também limita e condiciona o exercício dos próprios direitos (individuais e coletivos). O direito, que é elemento fundante da ordem da cidadania, não deve ser atribuído; ao contrário, o princípio ético-político que rege a noção mais elementar de direito é aquele decorrente da própria existência humana, pois, na medida em que a pessoa nasce, já se configuram seus direitos. Mais do que configurados, portanto, esses direitos precisam ser acessíveis e materializáveis, para o alcance da verdadeira cidadania. No caso brasileiro, é necessário que cada vez mais, por meio de um controle social realmente participativo e atuante, a sociedade passe a exigir o cumprimento das conquistas legais já verificadas. Comitês de bioética Conjunto de pessoas com moralidades diversas e formações profissionais diferenciadas, que se reúnem periódica ou excepcionalmente para fornecer pareceres sobre conflitos éticos, dirimir dúvidas morais e resolver conflitos éticos no campo biomédico-sanitário.

Neste sentido, a bioética tem a oferecer de seu rico instrumental teórico-prático a proposta de criação de comitês de bioética institucionais, hospitalares e outros – pluralistas, no que se refere à moralidade de seus membros; multidisciplinares, quanto às formações profissionais dos mesmos, incluindo representantes populares. Estes comitês têm o papel de analisar diferentes situações de conflito, interpretar problemas biomédico-sanitários das mais diversas origens, discutir moralmente a definição de prioridades, assim contribuindo com seu caráter democrático para o encaminhamento mais satisfatório dos diferentes problemas a eles confiados.

Para refletir Quais problemas relacionados com a ética da responsabilidade pública poderiam ser elencados no Brasil com relação ao funcionamento do SUS e o bem-estar e os direitos da população?

A bioética, as políticas e o sistema de saúde brasileiro Maximização da autonomia A bioética principialista de origem anglo-saxônica coloca a autonomia em escala preferencial com relação às questões coletivas. Essa distorção faz com que o ‘nós’ – das questões coletivas e relacionadas ao princípio da justiça – fique em segundo plano, em favor do ‘eu’ das questões individuais.

Até 1998, a bioética trilhou caminhos que apontavam muito mais para temas e/ou problemas/conflitos individuais do que coletivos. A maximização e a superexposição do princípio da autonomia tornaram o princípio da justiça um mero coadjuvante da teoria principialista. O individual sufocou o coletivo. O ‘eu’ deixou o ‘nós’ em posição secundária. A teoria principialista mostrou-se incapaz ou impotente de desvendar, entender e intervir nas macroquestões socioeconômicas e sanitárias coletivas, persistentes na parte sul do mundo. O princípio da justiça significa para o principialismo clássico, proporcionalmente, o que a promoção de saúde representava nos seus primórdios para a então chamada ‘medicina social’: algo teórico, coadjuvante, pouco palpável, onde cabiam todos os demais problemas não contidos nos itens considerados principais. Com o VI Congresso Mundial de Bioética, realizado em Brasília, em 2002, a voz daqueles que não concordavam com o desequilíbrio verificado na balança tornou-se mais forte, a partir da definição da temática do evento: Bioética, Poder e Injustiça. As discussões desenvolvidas trouxeram à tona a necessidade de a bioética incorporar aos seus campos de reflexão e de ação temas sociopolíticos da atualidade, como as agudas discrepâncias sociais

Bioética

753

e econômicas existentes entre as nações dos hemisférios Norte e Sul do planeta e, principalmente, a interpretação do acesso universal à atenção sanitária e dos medicamentos como um direito de cidadania. Bioética, Poder e Injustiça Tema oficial do VI Congresso Mundial de Bioética, que teve papel importante na transformação da agenda bioética do século XXI, contribuindo para a construção de uma bioética conceitualmente mais próxima dos problemas dos países pobres e em desenvolvimento. Ética e poder, da ótica da lógica formal, poderiam gerar, naturalmente, justiça. A lógica dialética, contudo, vê a realidade inversa e contraditória: ética e poder têm gerado injustiça no mundo contemporâneo.

A bioética brasileira, que observou um desenvolvimento tardio por ter surgido de modo orgânico apenas nos anos 90, recuperou o tempo perdido com um vigor inusitado. Sua maioridade foi atingida no VI Congresso Mundial de Bioética, que contou com o apoio decisivo da Sociedade Brasileira de Bioética (SBB). Se até o final dos anos 90 a bioética brasileira ainda era uma cópia colonizada dos conceitos vindos dos países anglo-saxônicos do hemisfério Norte, a partir do surgimento e da consolidação de vários grupos de estudo, pesquisa e pós-graduação criados pelo país, sua história começou a mudar. A teoria dos quatro princípios – de certo modo já revisada em seu ‘núcleo duro’ e pretensamente universalista pelos seus próprios proponentes nas edições mais recentes do livro Principles of Biomedical Ethics (Beauchamp & Childress, 2008) – é reconhecidamente prática e útil para a análise de situações objetivas na clínica e em pesquisas. No entanto, é sabidamente insuficiente para a análise contextualizada de conflitos que exijam flexibilidade para uma determinada adequação cultural, bem como para o enfrentamento de macroproblemas bioéticos persistentes ou cotidianos vivenciados por grande parte da população de países com significativos índices de exclusão social, como o Brasil e seus vizinhos da América Latina. Apesar de algumas críticas pontuais provenientes de setores acomodados com a praticidade do check list principialista, sua adequação ao estudo dos conflitos e das situações que ocorrem nos países pobres da parte sul do mundo é indispensável. A bioética sanitária, com um marco conceitual ampliado como apresentado neste capítulo, defende como moralmente justificável, entre outros aspectos: 1) no campo público e coletivo, a priorização de políticas e tomadas de decisão que privilegiem o maior número de pessoas, pelo maior espaço de tempo e que resultem nas melhores consequências, mesmo que em prejuízo de certas situações individuais, com exceções pontuais a serem discutidas; 2) no campo privado e individual, a busca de soluções viáveis e práticas para conflitos identificados com o próprio contexto onde os mesmos acontecem. Inclui a reanálise de diferentes dilemas, entre os quais: autonomia versus justiça/equidade, benefícios individuais versus benefícios coletivos, individualismo versus solidariedade, omissão versus participação e mudanças superficiais versus transformações concretas e permanentes. As últimas décadas do século passado passaram a conviver com o ressurgimento da ética. A pluralidade cultural e a evolução dos costumes, em conjunto com novos referenciais morais que foram construídos no dia a dia, levaram grande parte das sociedades humanas a abandonar paulatinamente os princípios e valores que vinham norteando suas decisões e comportamentos, tanto na esfera individual como na coletiva. E foi nesse contexto que a

Macroproblemas bioéticos Problemas éticos persistentes comuns aos países periféricos, impossíveis de serem solucionados com a proposta principialista e individualista da bioética de origem estadunidense. Requerem soluções mais amplas, a partir da interpretação correta da realidade onde esses problemas ocorrem e a utilização de referenciais éticos também mais adequados.

Bioética sanitária Interpretação da bioética que prioriza os temas públicos e coletivos em detrimento de questões específicas, privadas e individuais.

Ressurgimento da ética As discussões éticas, que estavam abandonadas desde o final do século XIX e principalmente nas primeiras décadas do século XX, retornam com todo vigor a partir dos anos 90. O surgimento da bioética, como ética aplicada, é prova disso.

754

Políticas e Sistema de Saúde no Brasil

ética passou a crescer de importância, influindo direta ou indiretamente na transformação de questões como o posicionamento dos países com relação ao respeito às chamadas ‘minorias’ ou no direito ao acesso universal a sistemas de saúde adequados, por exemplo, até em posturas que redefiniram as relações interpessoais, intersexos, interetnias etc. Como consequência de todas estas mudanças de ordem geral detectadas no campo da ética, os temas relacionados com a área da saúde também passaram a exigir novas abordagens, muitas delas aqui já tratadas. O paciente/cidadão e a comunidade, como sujeitos legítimos da discussão ética em saúde pública, eram lembrados apenas tangencial ou complementarmente. Até então, as atenções no campo da ética estavam insistentemente dirigidas aos códigos de conduta das diferentes profissões do setor sanitário, gerando, em decorrência, uma visão unilateral, paternalista e socialmente distorcida da relação profissional-paciente ou da relação entre os programas e serviços com os respectivos usuários. Com as transformações e o novo ritmo que começaram a ser verificados no contexto internacional, os aspectos éticos anteriormente referidos deixaram de ser considerados como de índole supraestrutural para, ao contrário, passarem a exigir consideração direta nas discussões e na construção e no acompanhamento de propostas de trabalho, objetivando o bem-estar futuro e melhores condições de vida das pessoas e comunidades. No caso brasileiro, é imprescindível que essa discussão (ética e aplicada) comece a ser incorporada objetivamente na construção das políticas sanitárias do país e no próprio funcionamento do SUS, no que diz respeito: à responsabilidade social do Estado; ao gerenciamento do sistema como um todo e em suas diversas partes; à definição de prioridades na análise, na decisão, na alocação, na distribuição e no controle dos recursos; ao envolvimento responsável da população em todo o processo; à preparação mais adequada dos recursos humanos; à revisão e atualização dos códigos de ética das diferentes categorias profissionais envolvidas; às indispensáveis adaptações curriculares nas universidades. Enfim, contribuindo diretamente para a melhoria do funcionamento do setor como um todo. A questão ética, portanto, adquiriu identidade pública. Deixou de ser considerada um simples problema de consciência a ser resolvido na esfera privada, de foro exclusivamente individual ou íntimo (Garrafa, 1999). Hoje, ela cresce de importância no que diz respeito à análise das responsabilidades frente às diferentes situações sanitárias e à interpretação histórico-social mais precisa dos quadros epidemiológicos, como também é essencial na determinação das formas de intervenção a serem programadas, na formação de pessoal, na responsabilidade do Estado junto aos cidadãos mais necessitados. Em resumo, a ética aplicada, por meio da bioética, conquistou uma nova forma concreta de ser percebida e utilizada. Sua aplicação e utilização na elaboração e consecução das políticas sanitárias públicas no país, assim como no próprio contexto do SUS em suas diferentes instâncias, são de uma riqueza que não pode ser desconhecida e desrespeitada.

Para refletir Com base no que foi discutido neste capítulo, acredita-se que seria aconselhável que os membros dos conselhos de saúde (municipais, estaduais e nacional) tivessem alguma formação em bioética. Em que situações concretas essa formação poderia ser útil?

Bioética

Breve proposta de um programa de formação em bioética A bioética começa a ter seu espaço como disciplina isolada em representativo número de programas de pós-graduação relacionados com as áreas biomédicas e da saúde, embora existam hoje apenas três programas específicos stricto sensu de mestrado e doutorado a ela dedicados no Brasil: Universidade de Brasília (UnB); Centro Universitário São Camilo, de São Paulo; e um consórcio interinstitucional integrado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Universidade Federal Fluminense (UFF), Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp). É pequeno também, além de irregular em sua periodicidade, o número de programas de pós-graduação lato sensu (especialização) em bioética. O mais tradicional é o da UnB, que já está na sua 14ª edição anual, sendo oferecido regularmente desde 1998, e formou mais de trezentos especialistas neste período. Com relação ao ensino da graduação, apesar de ser crescente a demanda, infelizmente ainda são poucas as instituições que oferecem disciplinas de bioética nos currículos de seus cursos regulares. Contudo, apesar de o Brasil ser um país onde esse campo do conhecimento teve um aparecimento tardio, como foi dito anteriormente, já existe uma sólida produção acadêmica com ele relacionada, principalmente a partir do esforço da Sociedade Brasileira de Bioética, que promove regularmente seus congressos, sempre em estados diferentes, a cada dois anos, desde 1995. Há alguns anos, o Programa de Pós-Graduação em Bioética da UnB fez uma consulta entre membros de um Conselho Municipal de Saúde (Goiânia), de um Conselho Estadual de Saúde (Goiás) e do Conselho Nacional de Saúde (CNS) sobre o interesse e a necessidade de os participantes destas representações receberem um treinamento intensivo em bioética. A resposta foi surpreendentemente positiva, passando dos 60% no Conselho Municipal de Goiânia, superando os 70% no Conselho Estadual e ultrapassando os 80% com relação ao CNS. Levando em consideração os referenciais teóricos e práticos levantados no presente capítulo, a seguir é apresentada uma breve proposta de formação em bioética para estudantes de graduação e pós-graduação, profissionais da saúde, membros de diferentes tipos de conselhos (de saúde, de corporações profissionais etc.), assim como para os próprios representantes do controle social nestas diferentes instâncias. 1) Introdução à bioética – desenvolvimento de um breve histórico da disciplina e sua relação com as práticas de saúde em geral e a necessidade de tratamento ético que deve ser dispensado especialmente às populações mais vulneráveis. 2) Bases conceituais da bioética – apresentação das principais linhas ou correntes de pensamento existentes, além dos princípios utilizados e outros referenciais, com ênfase no enfoque brasileiro e latino-americano da matéria, fundamentado no respeito ao pluralismo moral histórico. 3) Situações persistentes em bioética – enfoque dos problemas, situações e conflitos morais decorrentes das contradições sociais registradas principalmente nos países periféricos,

755

756

Políticas e Sistema de Saúde no Brasil

mas também nas populações marginadas das nações ricas, como: exclusão social, pobreza, analfabetismo, discriminação e estigmatização, equidade, alocação de recursos escassos, aborto, entre outros. 4) Situações emergentes em bioética – enfoque dos problemas, situações ou conflitos morais decorrentes do desenvolvimento científico e tecnológico acelerado das últimas décadas, como: novas tecnologias reprodutivas, transplantes de órgãos e tecidos humanos, engenharia genética e todos seus desdobramentos, terapia celular, respeito à biodiversidade etc. 5) Bioética clínica – apresentação e desenvolvimento de discussões ao redor de casos clínicos problemáticos ou conflitivos que ocorrem usualmente em hospitais, clínicas e serviços de saúde, a partir dos referenciais conceituais expostos no item 2 (Bases conceituais da bioética). 6) Ética na pesquisa com seres humanos – histórico do controle ético das pesquisas desenvolvidas com seres humanos a partir do início do século XX, com apresentação e discussão de casos e situações reais analisadas por comitês de ética em pesquisa regularmente registrados no Ministério da Saúde.

Leituras recomendadas BEAUCHAMP, T. L. & CHILDRESS, J. F. Principles of Biomedical Ethics [1979]. 6. ed. Nova York, Oxford: Oxford University Press, 2008. BERLINGUER, G. Bioética Cotidiana. Brasília: Editora UnB, 2004. FORTES, P. A. C. & ZOBOLI, E. L. C. P. Z. (Orgs.) Bioética e Saúde Pública. São Paulo: Loyola, 2003. GARRAFA, V.; KOTTOW, M. & SAADA, A. (Orgs.) Bases Conceituais da Bioética: enfoque latino-americano. São Paulo: Gaia, Unesco, 2006. GARRAFA, V. & PESSINI, L. (Orgs.) Bioética: poder e injustiça. São Paulo: Loyola, Sociedade Brasileira de Bioética, 2003. SCHRAMM, F. R. et al. (Orgs.) Bioética: riscos e proteção. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, Editora Fiocruz, 2005. SINGER, P. Ética Prática. 3. ed. São Paulo: Martins, 2002. TEALDI, J. C. (Dir.). Diccionario Latinoamericano de Bioética. Bogotá: Unibiblos, Universidad Nacional de Colombia, Unesco, 2008. Disponível em: .

Sites de interesse Cátedra Unesco de Bioética da Universidade de Brasília: www.bioetica.catedraunesco.unb.br Sociedade Brasileira de Bioética: www.sbbioetica.org.br

Referências ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 3. ed. Brasília: Editora UnB, 1992. BEAUCHAMP, T. L. & CHILDRESS, J. F. Principles of Biomedical Ethics [1979]. 6. ed. Nova York, Oxford: Oxford University Press, 2008.

Bioética

BERLINGUER, G. & GARRAFA, V. O Mercado Humano: estudo bioético da compra e venda de partes do corpo. 2. ed. Brasília: Editora UnB, 2001. COSTA, S. I. F.; GARRAFA, V. & OSELKA, G. (Orgs.) Iniciação à Bioética. Brasília: Conselho Federal de Medicina, 1998. DURAND, G. Introdução Geral à Bioética. São Paulo: Loyola, 2003. GARRAFA, V. Ciência, poder e ética. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL SOBRE BIODIVERSIDADE E TRANSGÊNICOS, Brasília. Anais... Brasília: Senado Federal, 1999. GARRAFA, V. Inclusão social no contexto político da bioética. Revista Brasileira de Bioética, 1(2): 122132, 2005. GARRAFA, V.; KOTTOW, M. & SAADA, A. (Coords.) Bases Conceituais da Bioética: enfoque latino-americano. São Paulo: Gaia, Unesco, 2006. GARRAFA, V. & PORTO, D. Intervention bioethics: a proposal for peripheral countries in a context of power and injustice. Bioethics, 17(5-6): 399-416, 2003. JONAS, H. O Princípio Responsabilidade. São Paulo: Contraponto, 2006. KOSIK, K. Dialética do Concreto. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976. MORIN, E. A Religação dos Saberes: o desafio do século XXI. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001. POTTER, V. R. Bioethics: the science of survival. Perspectives in Biology and Medicine, 14:127-153, 1970. POTTER, V. R. Bioethics: bridge to the future. Englewood Cliffs: Prentice-Hall, 1971. REICH, W. T. Encyclopedia of Bioethics. Nova York: The Free Press, 1978. v. 1. SCHRAMM, F. R. Información y manipulación: como proteger los seres vivos vulnerados? La propuesta de la bioética de protección. Revista Brasileira de Bioética, 1(1): 18-27, 2005. SCHRAMM, F. R. & KOTTOW, M. Principios bioéticos en salud pública: limitaciones y propuestas. Cadernos de Saúde Pública, 17(4): 949-956, 2001. SELLETI, J. & GARRAFA, V. As Raízes Cristãs da Autonomia. Petrópolis: Vozes, 2005. SINGER, P. Ética Prática. 3. ed. São Paulo: Martins, 2002. UNESCO. Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos. Paris, 19 out. 2005. Disponível em: e . Acesso em: 8 ago. 2011.

757

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.