Políticas públicas de trabalho, renda e desenvolvimento no Banco do Nordeste

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Políticas públicas de trabalho, renda e desenvolvimento no Banco do Nordestei Public policies of work, income and development in Banco do Nordeste Políticas públicas del trabajo, de los ingresos y del desarrollo en el Banco do Nordeste Politiques publiques de travail, revenus et développement au « Banco do Nordeste »

Gláucia Furtado Brasil de Almeida Raul da Fonseca Silva Thé Alcides Fernando Gussi

Resumo: Este trabalho objetiva avaliar as experiências gestadas pelos programas de microcrédito em Fortaleza, refletindo acerca de suas ações, limites e possibilidades, além dos impactos sócio-econômico dos programas junto a distintos grupos sociais locais, diante de um contexto macro-econômico e político, paradoxalmente excludente. Sob a perspectiva etnográfica, a pesquisa acompanhou a trajetória institucional e os resultados de dois programas geridos pelo Banco do Nordeste, tipificados entre microfinanças e microcrédito: o Programa de Apoio a Projetos Produtivos Solidários (PAPPS), no campo das microfinanças solidárias, Fundos Rotativos Solidários, com a Rede Bodega; e o segundo do Crediamigo, microcrédito produtivo orientado. Às conclusões vem apontando que a primeira experiência procura recuperar uma metodologia de práticas culturais tradicionais das comunidades nordestinas, baseadas na solidariedade e na reciprocidade, como alternativa de desenvolvimento, enquanto o segundo traz a afirmação do



Administradora de Empresas (UECE), Mestre em Avaliação de Políticas Públicas (MAPP/UFC), Gerente executiva no Banco do Nordeste do Brasil. E-mail: [email protected]  Graduado em Ciências Sociais pela UFC, mestrando em Políticas Públicas e Sociedade (MAPPS/UECE). E-mail: [email protected]  Historiador, mestre em Antropologia Social e doutor em Educação pela UNICAMP, é professor do Departamento de Economia Doméstica e do Curso de Mestrado em Avaliação de políticas públicas da UFC. E-mail: [email protected]

Aval - Revista Avaliação de Políticas Públicas, Ano 7, v. 1, nº 13, jan/jun 2014. ISSN: 2176-9923

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desenvolvimento econômico dos tomadores de crédito, mais próximo da lógica de mercado. Palavras-Chave: Microfinanças Solidárias, Microcrédito, Banco do Nordeste, Desenvolvimento, Políticas Públicas. Abstract: This paper aims to evaluate the experiences gestated by the microcredit programmes in Fortaleza by analysing their actions, limits and possibilities, as well as their social and economic impact on local social groups in face of a macro-economic and political context that is paradoxically exclusionary. Under the ethnographic perspective, the study followed the institutional trajectory and the results of two programmes managed by Banco do Nordeste classified either as microcredit or microfinance. They are presented as follows: Projetos Produtivos Solidários (PAPPS) and Fundos Rotativos Solidários with Rede Bodega, in the field of microfinance solidarity; and Crediamigo, a guided productive microcredit. The conclusions suggest that the first experiment aims to recover a methodology of traditional and cultural practices of the Brazilian north eastern communities, based on solidarity and reciprocity as alternative ways of development. As for the second experiment, it is consonant with the economic development based on borrowing, which is closer to the market logic. Keywords: solidary microfinance, microcredit, Banco do Nordeste, development, public policies.

Introdução

A emergência do movimento social da economia solidária na década de 90 no Brasil ocorre como um movimento propositivo no campo da geração do emprego, trabalho e renda, mas conjugando, simultaneamente, a perspectiva da capacidade de empreender e a do trabalho associado. Assim, também, como ocorre com a experiência pioneira de um banco público no Brasil acerca de políticas de microcrédito com o programa Crediamigo. O que distingue a economia solidária é a posse e uso dos meios de produção e distribuição que são socializados por meio de práticas de gestão democrática dos empreendimentos, formando redes de empreendimentos,

e

a

repartição

dos resultados entre seus

associados.

Demonstrando as possibilidades das microfinanças como políticas públicas. Nestas microfinanças destacam-se os fundos rotativos solidários e o microcrédito, que são pensados em dois momentos diferentes. O Microcrédito Aval - Revista Avaliação de Políticas Públicas, Ano 7, v. 1, nº 13, jan/jun 2014. ISSN: 2176-9923

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apresenta-se na agenda pública nos anos de 1990, primeiramente em discussões internacionais sobre o seu uso para apoderamento de capital de giro para os trabalhadores informais, como na Conferência de Hannover (1993) que tem em resolução que encontrou um caminho alternativo apontando para o microcrédito para segmentos “bancarizáveis” da população de baixa renda. Depois o Banco do Nordeste do Brasil coloca em atividade um programa-piloto (1997) na cidade de Fortaleza, com a atuação de uma unidade em uma região de Fortaleza, a Unidade Montese, que lhes dá retorno e então propõe a expansão e a efetivação do programa a partir do ano seguinte. Sem esquecer antes duas coisas, um, que a metodologia de crédito usada pelo Banco do Nordeste baseia-se nas experiências de Muhammad Yunus com o Grameen Bank em Bangladesh, evidenciados pelo aval solidário e a preferência pelos mais pobres; dois, que a atuação do Banco do Nordeste hoje, se dá em todo o Nordeste, além do norte de Minas Gerais e Espírito Santo e nas cidades de Brasília, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, com quinze anos de experiência, quase 1.800.000 clientes e sendo o segundo maior programa de microcrédito da America Latina, vinculado ao Programa Nacional de Microcrédito Produtivo Orientado (PNMPO). Já as microfinanças solidárias aparecem em um momento diferente da agenda governamental, e especificamente da agenda voltada para a Região Nordeste, uma série de articulações ocorreram entre 2003 e 2004, envolvendo o Fórum Brasileiro de Economia Solidária (FBES) e outras grandes redes do movimento, a então recém-criada Secretaria Nacional de Economia Solidária (SENAES), e o Banco do Nordeste. O objetivo era criar um programa de finanças solidárias de caráter antecipatório, com vistas a uma política nacional de financiamento da economia solidária. No bojo desta articulação foi elaborado e implementado, a partir de 2005, o Programa de Apoio a Projetos Produtivos Solidários (PAPPS) com a finalidade de apoiar financeiramente os empreendimentos de economia solidária com recursos não reembolsáveis oriundos de parcela do lucro do Banco do Nordeste. O PAPPS resgata como metodologia a prática dos Fundos Rotativos Solidários, um hábito ancestral das comunidades camponesas no Nordeste baseada na dimensão comunitária da reciprocidade, da dádiva e da moralidade presentes nos movimentos Aval - Revista Avaliação de Políticas Públicas, Ano 7, v. 1, nº 13, jan/jun 2014. ISSN: 2176-9923

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associativos. Trata-se de uma metodologia que confronta a tradição do Estado de promover ações desenvolvimentistas baseadas no individualismo e na propriedade privada capitalista. É com este desenho que o PAPPS fomenta desde 2008, o Fundo Rotativo Solidário da Rede Bodega. Embora os grupos produtivos sejam anteriores, a Rede Bodega iniciou a sua estruturação em 2004, com assistência técnica da Cáritas Brasileira Regional Ceará, reunindo empreendimentos nos territórios e entornos de Fortaleza, Aracati, Tianguá e Limoeiro do Norte, nas seguintes entidades cooperativas: Bodega Nordeste Vivo e Solidário, Budega do Povo, Budeg’AMA e Arcos. Hoje, são mais de de 50 grupos, produzindo horta orgânica, quintal produtivo, pequenos animais, mel, artesanato, mudas nativas e frutíferas, benecimento de frutas, que aplicaram em torno de R$ 120 mil em investimento e custeio oriundos do PAPPS. Neste artigo, com dados exploratórios, está em discussão o processo de avaliação destas políticas públicas, cuja especificidade é a incidência nas relações sociais de comunidades tradicionais, por conta da metodologia de gestão social compartilhada de recursos públicos.

Aspectos teóricos-metodológicos A avaliação, de cunho etnográfico, permitirá a apreensão das representações, a visão de mundo e a perspectiva dos atores envolvidos na gestão dos Fundos Rotativos, assim como na busca dos significados dados ao crédito oferecido pelo Crediamigo. Pretendemos realizar uma “descrição densa” articulada no conceito hermenêutico de cultura de Geertz (1978). Torna-se necessário entender três lugares institucionais de onde falam atores que cirscunscrevem o Programa: (1) a perspectiva dos portavozes das fontes de financiamento Banco do Nordeste e SENAES/MTE e do Comitê Gestor Nacional, com base nas atas de suas reuniões e nos relatórios de visitas técnicas às comunidades contempladas. Outra fonte (2) de informação é a literatura sobre os fundos rotativos solidários, onde destacamos Duque (2002, 2003 a, b; 2007, 2008, 2009); Gonçalves (2009, 2010a e 2010b); Heck (2006); Ibase/Cordel (2007); Mota (2009b); Santos Filho (2009a e 2009b; 2010a, 2010b, 2010c) e Schmidt-Rahmer Aval - Revista Avaliação de Políticas Públicas, Ano 7, v. 1, nº 13, jan/jun 2014. ISSN: 2176-9923

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(2010a e 2010b), em meio à uma diversidade maior de trabalhos sobre finanças solidárias e, ainda mais ampla, sobre economia solidária, conforme listamos ao final. E, a terceira fonte de reflexão (3), são os dados de campo coletados em entrevistas aos grupos produtivos da Rede Bodega, em diferentes ocasiões durante o ano de 2010 e 2011, além, de relatórios de acompanhamento e monitoração da execução do PAPPS elaborados pelo Comitê Gestor Local. Assim, também, a articulação do entendimento do Crediamigo, pode ser feita a partir das visões de vários atores como nos fala Silva (2010) e das pesquisas realizadas: os agentes de crédito, os desenvolvedores e avaliadores das políticas do Banco do Nordeste técnicos do Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste (ETENE), os agentes que operacionalizam o programa no Instituto Nordeste de Cidadania (INEC) e, necessariamente, os clientes, tomadores de credito. Além de uma grande gama de estudos feitos acerca da avaliação de programas de microcrédito, seus impactos e interpretações acerca da efetividade.

Economia Solidária e Finanças Solidária nas políticas públicas No quadro das profundas transformações ocorridas no mundo do trabalho, a Economia Solidária tem como desafio a construção de uma nova forma de organizar a produção, a distribuição e o consumo de bens socialmente produzidos, demonstrando à sociedade que existem outras possibilidades, ou experiências alternativas que rompam com a lógica do mercado e da competição (Bertucci, 2003). Especificamente a autogestão, diferente da gestão praticada na economia de mercado, exige um esforço adicional por parte dos trabalhadores que formam a empresa solidária, pois além de cumprir as tarefas inerentes ao cargo que ocupa, têm que se preocupar com os problemas gerais da empresa. Na gestão social, tudo que acontece é levado ao conhecimento e submetido à aprovação do grupo. Em um mesmo contexto de precarização do trabalho e desrregulação, o microcrédito apresenta-se como alternativas para políticas de emprego e renda direcionados para camadas em situação de exclusão socioeconômica, além de se relacionar intimamente com políticas de desenvolvimento trabalhadas em diversos países, sendo um deles, o Brasil. (Gussi, 2009). É, portanto, um meio de inclusão Aval - Revista Avaliação de Políticas Públicas, Ano 7, v. 1, nº 13, jan/jun 2014. ISSN: 2176-9923

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tanto na economia capitalista quanto no sistema de bancos, por meio de uma “bancarização”, mas demonstra seus limites no desenvolvimento social ao realmente incluir em um contexto geral de exclusão. Assim, o campo das microfinanças foi se constituindo a partir de um intenso debate pautado por uma diversidade de agentes, desde trabalhadores, gestores de políticas públicas e de entidades de apoio e fomento.

Budeg’AMA e a experiência da Associação das Mulheres em Ação Iniciada a partir de um curso de Alfabetização de Adultos, apoiado pela Cáritas Arquidiocesana a Associação das Mulheres em Ação (AMA) reuniu 22 mulheres da zona periférica da Região Metropolitana de Fortaleza, sendo fundada em 1999. A partir de 2008 a AMA inseriu-se na Rede Bodega, tomando o nome Budeg’AMA para sua ação ação comercial. A AMA, ou Budeg’AMA, como é conhecida, nasceu de um sonho antigo de melhorar a renda das pessoas e da mobilização de um número pequeno de mulheres, dispostas a mudar o rumo de suas vidas. A amizade e a confiança entre essas mulheres continua sendo o diferencial e o essencial para chegar onde chegou e vislumbrar o crescimento que estar por vir, baseado no sonho de viver em um mundo melhor e mais justo. O início, mais difícil, começou com a produção e a comercialização de confecções em espaço cedido por uma das associadas, que ofereceu a sala de sua casa para a venda dos produtos, em 1999. Em 2008, obteve recursos do Programa de Apoio a Projetos Produtivos Solidários (Fundos Rotativos Solidários), repassados pelo Banco do Nordeste, mediante apresentação de projeto e nesse mesmo ano, conseguiu alugar um espaço para abrigar a loja para comercialização dos produtos, em uma das principais avenidas do bairro. Também, em 2008, começou a fazer parte da Rede Bodega, trabalho coordenado pela Cáritas Arquidiocesana, como também teve início a articulação com as Bodegas de Aracati e Tianguá, e mais recentemente com a Arcos, de Sobral, estabelecendo a troca de mercadoria entre o que é produzido pelas quatro bodegas que fazem parte da rede.

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A Budeg’AMA possui um fundo fixo que possibilita as associadas adquirir máquinas para o trabalho de produção e assim desenvolver as atividades voltadas para a produção de artesanato (bonecas, bordado etc) e confecção. A Associação trabalha com dois tipos de fundos: o rotativo que circula para a produção e comercialização dos produtos e o fixo, que antecipa a quem produz, até 50% do valor da mercadoria entregue.

Algumas considerações sobre Fundo Rotativos Solidários, Rede Bodega e os dilemas da gestão social dos recursos públicos

O Fundo Rotativo da Rede Bodega permitiu ampliar e consolidar as experiências das Bodegas como espaços fixos de comercialização coletiva e autogestionária, à medida em que contribuiu com alternativas de sustentabilidade, a partir do exercício feito pelos sujeitos – grupos integrantes da Rede Bodega e entidades de apoio – e favoreceu o pensar, levando-os a planejar os processos da gestão, da produção, da comercialização. Nesse sentido, a Rede Bodega é hoje referência de comercialização solidária no Estado do Ceará e, por extensão, representa a reafirmação da economia solidária enquanto proposta diferenciada de sustentabilidade na comunidade e regiões onde as Bodegas estão localizadas. Entretanto, nota-se ainda a baixa integração com o mercado, seja pela inconstância do volume de produção, seja baixa agregação de valor ao produto; a articulação institucional ainda é insuficiente, na medida que recursos requeridos ainda são também insuficientes, exigindo maiores esforços dos participantes. Isto fica muito claro na organização e participação em feiras de intercâmbio de produtos, que para funcionar exige a participação de muitos parceiros; e, consequentemente, ocorrem descontinuidade das ações, que é o lado sombrio da falta de parceiros tradicionais, pois as redes mais densas ainda estão por se construir. O grande desafio do fomento aos Fundos Rotativos Solidários, no caso do PAPPS, tem sido compatibilizar a dinâmica das maneiras de agir e decidir, alocar e poupar do movimento da economia solidária referenciada na utopia da inclusão de afetos que as relações cooperativas propiciam, quando confrontada com as normas e Aval - Revista Avaliação de Políticas Públicas, Ano 7, v. 1, nº 13, jan/jun 2014. ISSN: 2176-9923

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regramentos impessoais exigidas pela racionalidade weberiana, que é posta pela adesão a uma política pública. À exemplo disto cita-se as exigências da legislação e normativos, especialmente as leis que regem convênios, a exemplo da Lei 8.666 e a IN 01/97, que exigem concorrências e licitações para gastos acima de certos valores. O desconhecimento

das

exigências

legais

afeta

as

prestações

de

contas,

principalmente em termos de comprovação de despesas, a saber: notas fiscais, carimbos, movimentação bancária, procedimentos licitatórios, formulários etc. Essa realidade suscita muitas reflexões, pois, pensando com o esquema analítico de Boaventura de Sousa Santos (2009), há uma tensão entre “regulação” e “emancipação” na qual o pilar da regulação do Estado tende a sugar as energias emancipatórias das experiências, burocratizando-as. Isto é, é importante notar que “regulação” e “emancipação” vinculam-se de uma forma extremamente complexa, pois ao mesmo tempo em que se constituem em “pilares” distintos de funcionamento do tripé Estado – Sociedade – Mercado, estão fortemente imbricados e, no caso do fomento aos Fundos Rotativos, corporificados na tensão entre o “autofinanciamento” e a dependência de repasses de fundos públicos. Para além do crédito não reembolsável ao banco, destinado a essas comunidades, o foco central dos Fundos são os interesses dos grupos ou das comunidades e a solidariedade tecida em suas relações sociais como poderoso instrumento na geração da renda. Em seu desenho e metodologia o papel atribuído aos Fundos não é de apenas prover o crédito segundo uma lógica financeira tradicional e ou segundo uma lógica clientelista presente em comunidades rurais, mas sim, exercitar um diálogo político-pedagógico onde a comunidade se aproprie dos circuitos financeiros, apontando para a emancipação das comunidades beneficiárias a partir da lógica da solidariedade. Desta forma, os resultados e impactos do Programa de Apoio aos Projetos Produtivos Solidários deverão ser examinados não só na melhoria das condições de vida das pessoas nas comunidades, mas principalmente deverão ser examinadas as incidências das ações do Programa sobre as relações de solidariedades e a própria sociabilidade na comunidade. Portanto, a questão central é de que forma os FRS vêm permitindo ressignificações nas relações entre as pessoas e entre estas e a natureza nas suas comunidades? Em busca de pistas, pelo menos quatro eixos Aval - Revista Avaliação de Políticas Públicas, Ano 7, v. 1, nº 13, jan/jun 2014. ISSN: 2176-9923

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fundamentais deverão ser analisados, seja para experiências na cidade ou no campo: fortalecimento da organização produtiva, das tecnologias e demais saberes tradicionais; autonomia política em relação às práticas clientelistas locais; desenvolvimento de novas relações homem-natureza condizentes com a proposta de convivência com o semi-árido, e ressignificações das identidades tradicionais.

Crediamigo,

dados

de

campo

e

algumas

considerações

sobre

microcrédito

O microcrédito aqui apresentado versa-se por um caminho em construção de um banco de desenvolvimento, Banco do Nordeste, para um setor social, mas altamente vinculado com o mercado e não sendo nem ponto de contradição, muito menos contraponto. O Crediamigo demonstra-se um sucesso para o banco em termos empresariais, já que têm altíssimos níveis de retorno nestes empréstimos a juros baixos e em que o número de contas e tomadores de crédito cresce muito rapidamente. Em contrapartida existe, sim, uma relativa mudança de vida com os tomadores de crédito de forma continuada, apresentada no maior nível de poder de compra, de mudanças de móveis e reformas de casa, ou seja, uma renda mais elevada; enquanto demonstram que outros quesitos necessários a um maior bemestar social, como lazer, educação e saúde, mantêm-se estável mesmo que as consequências nestes setores sejam vistas nas gerações imediatamente à frente nas famílias dos tomadores. Assim, também, encontramos nesta perspectiva de ampliação de renda e emprego com o aval solidário uma integração de irradiação social, mas que por conta da obrigação de retribuir e dar retorno ao banco dos empréstimos gera-se conflitos pela manutenção da honra ou do “nome”. Isso, porque, os avaliadores do grupo social têm, basicamente, que pagar as parcelas dos que atrasam ou perdem o crédito e por isso, também, existe a cobrança interna entre os tomadores. Demonstram que apesar do sucesso óbvio do programa do ângulo financeiro e de lucros, se apresentam limites e possibilidades para se aprofundar na perspectiva social, já que não há um apoio explicito e imediato aos empreendimentos feitos por Aval - Revista Avaliação de Políticas Públicas, Ano 7, v. 1, nº 13, jan/jun 2014. ISSN: 2176-9923

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via do giro solidário, ainda mais nas primeiras tomadas de empréstimos. Não havendo também o incentivo a maior escolarização dos participantes do programa, nem a disposição de cursos à ampla gama dos clientes.

Considerações Finais

Finalmente, entendemos que para avaliar políticas publicas de forma ampla é necessário

discussões

metodológicos.

verdadeiramente

Indagando-nos

sobre

plurais a

em

termos

problemática

disciplinares e

central,

verificada

profundamente nos FRS, que são as ligações complexas entre tradição e mudança social e entre estrutura e ação social, a partir da mercantilização e monetarização da vida social. Assim como o Crediamigo traz a luz pelas narrativas e de as interações – dos atores nele incluídos – com a prática do microcrédito, das questões postas sobre o (os) desenvolvimento(s). Que nos leva a questionar que vertente se pauta esta política pública, seria de um desenvolvimento somente econômico ou de um desenvolvimento

social com

reflexos econômicos

ou

um desenvolvimento

econômico-social, ou ainda uma política focada precisamente na perspectiva social. Compreendo-se como um primeiro passo para uma pesquisa mais profunda, que busquem no aporte da interpretação e a tradução cultural consolidação ampla de uma investigação. Esta trazendo um sem número de questões e discussões que devem ser postas, discutidas e compreendidas como aprofundadoras do conhecimento sobre as políticas públicas (sociais) feitas, geradas e geridas no Brasil.

Referências Bibliográficas

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Fundos

rotativos

solidários

e

capital

social.

Notas

preliminares.

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Resumen: Este estudio evalúa las experiencias gestadas por los programas de microcrédito en Fortaleza, al reflexionar sobre sus acciones, límites y posibilidades, además de los impactos socio-económicos de los programas en los distintos grupos sociales locales, en un contexto macroeconómico y político, paradójicamente excluyente. Bajo el punto de vista etnográfico, el estudio hizo un seguimiento la trayectoria institucional y los resultados de dos programas gestionados por el Banco do Nordeste, tipificado entre las microfinanzas y el microcrédito: el Programa de Apoio a Projetos Produtivos Solidários (PAPPS), en el campo de la solidaridad de las microfinanzas, los Fondos Rotatorios Solidaridad, con la Rede Bodega; y el segundo Crediamigo, microcrédito productivo orientado. Llega a conclusiones que apuntan hacia el primer experimento pretende recuperar una metodología de prácticas culturales tradicionales de las comunidades del nordeste, basadas en la solidaridad y la reciprocidad, como una alternativa de desarrollo, mientras que la segunda lleva la afirmación del desarrollo económico de los prestatarios, más cerca de la lógica mercado. Palabras clave: Microfinanzas solidaridad, Microcrédito, Banco do Nordeste, Desarrollo, Políticas Públicas. Résumé : Cette étude évalue les expériences issues des programmes de microcrédit à Fortaleza et propose une réflexion sur leurs actions, limites et possibilités et également sur l’impact socio-économique des programmes auprès de différents groupes sociaux locaux dans un contexte macro-économique et politique paradoxalement marqué par l'exclusion. Sous le point de vue ethnographique, Aval - Revista Avaliação de Políticas Públicas, Ano 7, v. 1, nº 13, jan/jun 2014. ISSN: 2176-9923

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l’étude a suivi l’histoire institutionnelle et les résultats de deux programmes administrés par Banco do Nordeste, lesquels se classifient dans les catégories micro finance et microcrédit : Programa de Apoio a Projetos Produtivos Solidários (PAPPS), dans le domaine de la micro finance solidaire, Fundos Rotativos Solidários avec Rede Bodega ; et Crediamigo, un type de microcrédit productif orienté. On a pu constater que la première expérience cherche à récupérer une méthodologie de pratiques culturelles traditionnelles des communautés du Nord-est du Brésil, où la solidarité et la réciprocité sont des voies alternatives vers le développement, alors que la seconde renforce le développement économique des emprunteurs, plus proche de la logique de marché. Mots-clés : micro finance solidaire, microcrédit, Banco do Nordeste, développement, politiques publiques.

Notas i

Conteúdo composto por pesquisa de dissertação financiada pelo Banco do Nordeste do Brasil e pesquisa no âmbito da iniciação científica (PIBIC) financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, ambas as experiências orientadas pelo professor Alcides Fernando Gussi.

Recebido em: 11/11/2014. Aceito em: 26/01/2015.

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