Políticas Públicas em busca de um espaço sustentável

August 1, 2017 | Autor: Herbert Schützer | Categoria: Planejamento Rural
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Políticas Públicas em busca de um espaço sustentável Solange Camilo Asen1 Herbert Schutzer2

Resumo Procuramos apresentar neste trabalho os problemas do espaço rural brasileiro, decorrentes de um modelo do liberalismo aplicado na sua estruturação a partir dos anos 1960. A exclusão provocada pelo capitalismo moderno no campo, criou um quadro dramático para os pequenos proprietários rurais e para os que se viram sem acesso a terra. A situação sensibilizou os governantes do país bem como a classe política. Movimentos sociais se organizaram no campo e mobilizaram os camponeses a exigir mudanças no panorama, com apoio de outras organizações os movimentos se espalharam pelo país. As pressões e a necessidade de uma nova ordem no campo provocou uma reação do Estado, este por sua vez tornou-se patrocinador de inúmeras políticas públicas que procuravam amenizar o drama e diminuir as injustiças sociais. Assim, aqui procuramos mostrar as intervenções governamentais para o desenvolvimento do espaço rural do país. Palavras-chave: Políticas públicas, movimentos sociais, espaço rural, território. Abstract We present in this paper the problems of field Brazil, under the liberalism model applied in its structure from the 1960s. The exclusion caused by modern capitalism in the countryside, created a dramatic situation for small farmers and for those who found themselves without access to land. The situation has sensitized the country's rulers and politicians. Social movements organized in the countryside and peasants mobilized to demand changes in the landscape, with support from other organizations movements spread across the country. The pressures and the need for a new order in the countryside provoked a reaction from the state, this in turn became the sponsor of numerous public policies seeking to minimize the drama and decrease social injustices. So, here we try to show government interventions for the landspace development of the country. Keywords: Public policies, social movements, landspace, territory.

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Mestranda em Planejamento Regional, UNITAU/SP, docente da Estácio Radial/SP. Mestre em Geografia, docente da Estácio Radial/SP

Introdução

Neste artigo apresentamos as políticas públicas que foram produzidas para modernização do campo brasileira. Modernização que tem como objetivo maior reduzir o dramático panorama criado pelo modelo liberal excludente. As políticas públicas implementadas com essa finalidade são aqui apresentadas e vinculadas aos diversos tipos de políticas públicas. Dessa forma, pretendemos entender sua abrangência e perceber os encaminhamentos para a solução do problema. Assim, apresentamos um pequeno contexto do problema, concebendo alguns recortes conceituais que amparam nossa discussão do tema e permitem uma compreensão da dimensão do problema. Problema que provocou o surgimento de vários movimentos sociais no campo e a adesão de várias organizações não-governamentais, que passaram a pleitear uma intervenção do Estado na solução dos problemas. O quadro é amplo, com inúmeras particularidades decorrentes da dimensão territorial e seus problemas regionais e locais próprios. Uma pesquisa bibliográfica contribuiu para o levantamento das inúmeras políticas públicas, mostrando sua vinculação teórica, cujos objetivos são a modernização do campo e permitiram a determinação da abrangência e eficácia. Sem que se pretenda aqui demonstrar a solução dos problemas, apenas tratar das intervenções governamentais no espaço rural brasileiro, bem como sua estrutura organizacional. Por fim, mostramos como as redes que se procuraram forma no campo colaboram com o atendimento das famílias de trabalhadores rurais, visando sua manutenção e inserção num sistema de mercados mais amplo, que possibilite, dessa maneira, garantir níveis aceitáveis de vida de seus componentes.

1. Funções do espaço rural e conceito de território O espaço rural brasileiro passou por profundas transformações na década de 1960, quando por influência da Revolução Agrícola europeia o governo, através de políticas públicas, promoveu a modernização do campo. A introdução de maquinários e insumos visava o aumento da produção e produtividade em sintonia com o paradigma produtivista liberal que avançava sobre o meio rural e inegavelmente provocou um aumento da produção gerando excedentes exportáveis. O aumento da oferta para de produtos agrícolas atendia aos anseios dos governos militares alinhados com o modelo nacional-desenvolvimentista dos anos 1950.

Este projeto, cujas origens ideológico-estratégicas se

encontram no movimento tenentista dos anos 20, tendo sido dinamizado a partir dos anos 30 com Getúlio Vargas, prosseguiu durante o período populista entre 1945 e 1964. O golpe de 1964 encerrou o ciclo nacionaldesenvolvimentista

do

populismo,

dando

início

ao

processo

de

desenvolvimento industrial que acabou por atingir o espaço rural. Como é da natureza do sistema capitalista, a modernização do campo no seu conjunto foi incapaz de atingir de forma homogênea o meio rural e gerou

exclusão,

que

com

o

tempo

ocasionou

movimentos

sociais

reivindicatórios. As várias críticas que surgiram com os resultados da modernização, conduziu o debate para novos elementos ligados ao meio rural nacional. Na atualidade o espaço rural brasileiro se configura como podemos verno mapa a seguir:

Fonte: http://www2.fct.unesp.br/nera/atlas/configuracao.htm. Acessado em: 11/06/2013

Observa-se que a intervenção do estado na organização do espaço rural resultou e tentativas de superação das contradições decorrentes da modernização, com assentamento de famílias, de outro lado, essas medidas não foram suficientes para eliminá-las, pois ainda há uma grande área onde os conflitos mais sistemáticos ocorrem. Outras tensões continuam a ocorrer no espaço rural a partir da ação dos movimentos sociais camponeses. Decorridos quase cinquenta anos do início do processo de modernização percebe-se que o espaço rural brasileiro ainda é um foco de tensões e lutas sociais evidenciando os problemas existentes que necessitam de intervenção política das diferentes esferas da administração pública e de instituições do setor privado que possam trazer, juntamente com o Estado, novos elementos para superação dos problemas rurais no país.

Entre esses novos elementos, podemos considerar as políticas públicas como geradoras de múltiplos bens e serviços para reduzir as assimetrias

da

modernização

anterior

dando

ao

espaço

uma

multifuncionalidade.

1.1. Múltiplas funções do espaço rural O movimento social europeu que questionava o aporte de subsídios e as tentativas de mudanças na política agrícola comum, nos anos 1990, deu origem ao tema multifuncionalidade da agricultura e do rural. Os aspectos a ele relacionados são: proteção ambiental e a preservação do patrimônio sociocultural ligados à atividade agropecuária e aos espaços rurais. As novas configurações do espaço rural possibilitam a existência de espaço rural inserido nas regiões metropolitanas, sendo estas extensões da área urbana, constituída por agricultura familiar que se integrou a partir de estratégias bem definidas. É chamado de espaço rural integrado. Além dele, vem o espaço rural peri-urbano, geralmente ocupado por agricultura familiar, mas que devido as facilidades de fluidez foi sendo ocupado por chácaras para lazer. O espaço rural profundo apresenta diferentes características de ocupação, o que se encontra nas proximidades do peri-urbano das cidades e regiões metropolitanas apresentam o predomínio da agricultura familiar de subsistência e de baixo rendimento, os além destes constituem as grandes propriedades produtivas comerciais. Os espaços integrados e peri-urbanos são os que apresentam maior incidência de conflitos decorrentes da preservação ambiental, como também a atuação do Estado é maior no sentido de organizar e criar as condições necessárias,infraestrutura básica, para a reprodução e preservação. (Souza, Bagolin & Corona, 2007) Já

a

noção

de

rural

adotada

pelo

Conselho

Nacional

de

Desenvolvimento Rural Sustentável (CONDRAF), tem como concepção de rural a mesma adota por outros países que exclui dessa condição as regiões metropolitanas e zonas de elevada população relativa, fazendo com que a participação da população rural no conjunto da população nacional esteja mais próxima da realidade. Para esse órgão, o rural comporta uma multiplicidade de ambientes físicos, recursos naturais, agroecossistemas, sistemas agrários,

etnias, culturas, relações sociais, padrões tecnológicos, formas de organização social e política, linguagens, simbologias, demonstrando que o espaço rural brasileiro não é uniforme, mas diverso, plural e heterogêneo. (MDA, 2006) Essa descrição minuciosa não difere muito da anterior que considera os espaços próximos às regiões metropolitanas, mas denotam a diversidade de aspectos e funções que o espaço rural possui na atualidade. A multifuncionalidade está vinculada a uma série de processos desencadeados por políticas públicas que visam atender a ideia de desenvolvimento sustentável, incorporada a esse processo pelas novas perspectivas da modernidade. As formas clássicas foram abandonadas em razão das várias funções que o espaço rural passa a exercer, produtivas, preservacionistas, sociais e culturais, neste conjunto, o espaço rural passa a atender aos desejos oriundos do âmbito da sociedade. (SOUZA, BAGOLIN & CORONA, 2007) Outrossim, a abordagem pela multifuncionalidade do meio rural não pode ser restrita a produção, as sociedades rurais não são meramente econômicas, possuindo apenas a condição de fornecedoras de produtos agrícolas, mas também deve-se como foco as múltiplas funções dos agricultores. (SALES & ANTONIO FILHO, 2011)

1.2. O território e a territorialidade rural A premissa de que partimos é a questão do desenvolvimento territorial está vinculado às iniciativas do Estado e a forma de sua atuação sobre o espaço. Assim, o processo de territorialização das políticas públicas se dá a partir

da

articulação

das

dimensões

administrativas

envolvidas

na

implementação. Sendo esses processos de natureza horizontal que consiste na articulação de políticas setoriais incidentes sobre uma mesma região, e verticais a partir da articulação de esferas diferenciadas de poder – nacional, regional, estadual, departamental, territorial, local, etc. – tendo por base uma determinada política. Neste trabalho adotamos o conceito de território como sujeito do Estado, o território é um dos elementos constitutivos do Estado, “o modo de

existência do Estado no espaço” (HAESBAERT, 1997). Já o território como função do Estado corresponde a um espaço utilizado como meio (mediador) de ação do Estado. A escola, anglo-saxônica, define o território como área de influência de uma autoridade ou de um grupo de atores sociais que controlam as “coisas” e as pessoas. Nesse sentido, o território é o local onde se materializam as políticas públicas elaboradas pelo Estado, porém admite a participação de outros atores na sua elaboração. A territorialidade, nesta perspectiva vincula-se à tentativa de um grupo ou um indivíduo de influenciar ou controlar outras pessoas. O controle é executado numa determinada área delimitada por cada grupo social dominante. Dessa forma, a territorialidade cumpre os papéis de classificação, comunicação e controle. Desta maneira, o território é um espaço utilizado para conter, restringir ou excluir pessoas, objetos ou relacionamentos. (SAQUET & BRISKIEVICZ, 2009)

2. O escopo das políticas públicas rurais no Brasil A necessidade de priorizar e qualificar a intervenção do Estado brasileiro sobre os espaços rurais nacionais, lançou o projeto de construção da Política de Desenvolvimento do Brasil Rural (PDBR), de caráter participativo, o projeto configura-se como um instrumento orientador das ações do Estado nas áreas rurais do país. Assumindo uma postura indutora dos processos de desenvolvimento, o projeto visa a desencadear melhorias a partir das inúmeras experiências vivenciadas pela população rural do Brasil e de outras partes do mundo. (MDA, 2010) A concepção que o PDBR adota se fundamenta em três atributos básicos do ambiente rural: o espaço de produção, o espaço de relação com a natureza e o espaço de (re)produção de modos de vida diferenciados. (MDA, 2010) Os objetivos do projeto estão vinculados a nova proposta de gestão social como aponta a proposta aprovada em fevereiro de 2010: “A PDBR emerge no contexto de um Estado republicano fundado no regime da democracia representativa, mas que, simultaneamente, tem buscado criar, ampliar e fortalecer

espaços públicos de participação, estimulando a gestão social das políticas públicas. Essa política é produto, por um lado, do saldo obtido pelo conjunto de políticas públicas setoriais implementadas nos últimos anos, as quais propiciaram uma diversificação dos instrumentos, uma ampliação dos recursos aplicados, uma distribuição mais equilibrada desses investimentos e a democratização do acesso às populações beneficiárias e, por outro, também é fruto de um conjunto de ações desencadeadas pelas instituições governamentais e pelos movimentos e organizações sociais. Esse processo contou com os debates e elaborações acumulados nos dez anos de existência do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável (CONDRAF), culminando na realização da I Conferência Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário, em Olinda (PE), no mês de junho de 2008, que lançou as bases para a formulação da Política de Desenvolvimento do Brasil Rural.” (MDA/CONDRAF, 2010, p. 07)

O Estado brasileiro diante das crises capitalistas que assolam o campo nas dimensões social, econômica, ambiental e energética, afetando as relações sociais e a convivência humana com a natureza, decidiu reorientar sua política para o processo de desenvolvimento das áreas rurais do país. Com essa nova postura, Ele decidiu rever as prioridades promovendo uma mudança efetiva, que posicionam o Brasil o mesmo plano dos países desenvolvidos com uma visão contemporânea das sociedades rurais.

2.1. Tipologias das políticas públicas Temos as políticas públicas (public policy)3, são outputs4, resultantes das atividades políticas, sendo estas fundamentais para o desenvolvimento do local, do Município, do Estado e da Nação, em um conjunto de procedimentos formais e informais que envolvem aquisição de poder. É necessário distinguir entre política pública e decisão política. Uma política pública quase sempre envolverá mais do que uma decisão e requer diversas

ações

que

são

copiosamente

pensadas

selecionadas

para

implementar as decisões tomadas. Já uma decisão política corresponde a uma escolha diante de demasiadas alternativas. Para saber o que são políticas públicas,

é imprescindível o

conhecimento de alguns fatores, que compõe as políticas públicas, um deles

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Diretriz elaborada para enfrentar um problema público. Produto ou valor gerado por um processo. SECCHI (2010)

seria a ideia de que elas estão inseridas em um contexto onde podem ser utilizadas como estratégias de governo para guiar possíveis resoluções de problemas. As políticas públicas do ponto de vista geral são como ações voltadas para determinados grupos de pessoas, de diferentes classes, e diferentes interesses. Uma política pública não é apenas um conjunto, ela é formulada, desenvolvida por uma série de atores sociais, em um determinado ambiente, propicio a conflitos e consenso, sempre a depender do que se está em jogo. Com base nas abordagens anteriores, podemos dizer que as políticas públicas têm duas características gerais. Primeiro, a busca do consenso em torno do que se pretende fazer e deixar de fazer. Assim, quanto maior for o consenso, melhores as condições de aprovação e implementação das políticas propostas. Segundo, a definição de normas e o processamento de conflitos. Ou seja, as políticas públicas podem definir normas tanto para a ação como para a resolução dos eventuais conflitos entre os diversos indivíduos e agentes sociais. As políticas públicas podem ser divididas em três tipos: (i) políticas públicas redistributivas; (ii) políticas públicas distributivas; (iii) políticas públicas regulatórias. i) O objetivo das políticas públicas redistributivas é redistribuir renda na forma de recursos e/ou de financiamento de equipamentos e serviços públicos. No que se refere ao financiamento, são os estratos sociais de alta renda os responsáveis por essa modalidade de política, sendo os estratos de baixa renda os beneficiários. ii) As políticas públicas distributivas têm objetivos pontuais ou setoriais ligados

à

oferta

de

equipamentos

e

serviços

públicos.

Quanto

ao

financiamento, é a sociedade como um todo, através do orçamento público, quem financia sua implementação, enquanto os beneficiários são pequenos grupos ou indivíduos de diferentes estratos sociais. iii) As políticas públicas regulatórias visam regular determinado setor, ou seja, criar normas para o funcionamento dos serviços e a implementação de equipamentos urbanos. Assim, a política regulatória se refere à legislação e é um instrumento que permite regular (normatizar) a aplicação de políticas

redistributivas e distributivas, como por exemplo a Lei de Uso do Solo e o Plano Diretor. O conjunto das políticas públicas visa atender as diferentes demandas existentes no meio rural e incorporar e transversalizar a noção contemporânea de rural nas políticas públicas, tanto nas políticas setoriais quanto nas políticas estruturantes do projeto de desenvolvimento nacional, redefinindo as bases do lugar estratégico a ser ocupado pelos espaços rurais no país.

2.2. As políticas públicas para o desenvolvimento rural

Para o desenvolvimento dos espaços rurais foram e estão sendo criadas políticas que incorporem inovações que visam consolidar o projeto de modernização do campo. As novas políticas incorporam territorialidades de etnia e raça, gênero, geração, abordagens ambientais e culturais, e procuram construir espaços democráticos de participação, buscando desenvolver a cultura de governança democrática que tem como objetivo integrar os setores em ações comuns. A

PDBR

constitui-se

num

importante

instrumento

das

ações

estruturantes para sustentar e orientar as ações do Estado, podendo alavancar uma série de medidas multisetoriais estratégicas para o desenvolvimento do meio rural. Com articulação do sistema econômico e o território, a presença efetiva da justiça e um projeto de inclusão, procura-se dar garantias de funcionamento

das

estruturas

e

superestruturas

para

consumar

o

desenvolvimento planejado. (MDA, 2010) A PDBR deverá valorizar o caráter estratégico assumido pelo rural brasileiro no desenvolvimento nacional, considerando-se que as enormes potencialidades das distintas regiões, em termos de recursos naturais e culturais e de suas potencialidades econômicas e institucionais, podem se transformar em elementos decisivos na construção do projeto de futuro do país. A nova abordagem adotada pelo Estado brasileiro visa a suprir essas lacunas, tornando disponível um referencial capaz de planejar e intervir no tecido social, a partir da articulação de ações nas diferentes escalas (comunitária, municipal, territorial, estadual, regional e nacional). Além disso, a

posição estratégica que assume com a participação das organizações da sociedade civil nas diversas etapas da construção das políticas públicas, desde a sua formulação até a avaliação de seus impactos e resultados, o protagonismo político desempenhado pelos diversos segmentos organizados da sociedade civil, constitui-se em premissa fundamental dessa nova abordagem. (MDA, 2010) Além disso, as políticas públicas devem superar seu caráter fragmentado, ganhando novos conteúdos e sentidos, à medida que passam a ser planejadas de forma integrada, articulando-se horizontalmente com outros setores governamentais e verticalmente com outras esferas do poder público. Dessa forma, consolidar os espaços e instrumentos de controle e gestão social das políticas públicas, por meio de mecanismos democráticos e participativos dando um caráter cidadão na formulação e implementação dessas políticas. (MDA, 2010)

3. Abrangência e ações para o desenvolvimento rural Como já foi apresentado anteriormente, a modernização do campo bem como a melhoria das condições de vida das populações que vivem no meio rural constituiu-se em meta dos últimos governos. Nesse sentido, várias políticas públicas visando concretizar os objetivos foram produzidas, como veremos a seguir segundo Miranda e Tibúrcio (2011). Em 2003, foi criado o Programa Nacional de Universalização do Acesso e Uso da Energia, cujo objetivo era ampliar o atendimento de energia elétrica, principalmente para as populações mais carentes. Substituiu o Programa Luz no Campo, de 1999. Para atender as populações mais isoladas foi criado o Programa Luz para Todos, como uma política pública que visava organizar a oferta do serviço público, que é um direito e um dever do Estado. Para o nordeste foi criado o Programa de Formação e Mobilização Social para a Convivência com o Semiárido, que se propunha a ampliar o acesso à água pelas famílias rurais da região e construir uma nova relação homem-natureza baseada na convivência. Surgiu de uma articulação da sociedade civil que envolveu mais de 900 organizações, movimentos sociais e sindicatos.

Em 2004, foi criado o Pronat – Programa Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Territórios Rurais, tendo como objetivo a construção coletiva de um plano de desenvolvimento rural e a elaboração de projetos coletivos. O programa Território da Cidadania – TC, é uma ampliação do Pronat, cujo intento era articular várias políticas públicas num mesmo território. Visava implementar ações multissetoriais com prioridade para as populações mais carentes e combater a pobreza. Nas localidades com propensão natural para alguma especialidade econômica foi criado o APL – Arranjos Produtivos Locais, programa que procurava fomentar as atividades econômicas enraizadas no território aproveitando sua sinergia. O Programa Fome Zero, através da ação do PAA – Programa Aquisição de Alimentos, cujo objetivo era o combate a pobreza e a insegurança alimentar visava facilitar a comercialização dos produtos provenientes da agricultura familiar. Procurou estimular o desenvolvimento por meio de políticas dirigidas a esse segmento. O Programa de desenvolvimento Socioambiental de Produção Familiar Rural – Proambiente, implantando pela sociedade civil no ano de 2000, tinha como objetivo equilibrar conservação dos recursos naturais e a produção familiar rural. O programa foi incorporado ao conjunto das políticas públicas em 2004, buscando novas formas de desenvolvimento. O Pronaf – Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar, é a mais importante política pública para o campo, em termos de recursos. O objetivo é atender exclusivamente agricultores familiares fornecendo crédito com taxas diferenciadas para fortalecer a capacidade produtiva. A questão da dotação de terras para as famílias sem terra é promovida pelo INCRA – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, desde 2007, quando foi encerrado o Programa Nacional da Reforma Agrária – PNRA. A ideia que orienta o programa é a equidade no acesso aos recursos produtivos, neste caso, a terra. O Programa Educação do Campo promove articulações das ações educativas para o desenvolvimento. A ideia principal é a ampliação dos serviços públicos de educação para todo o território nacional, com atenção maior para aqueles segmentos cujo acesso à educação é dificultado.

O Consad – Consórcio de Segurança Alimentar e Desenvolvimento Local, é parte do Programa Fome Zero, estimulando a criação de cadeias de produção de alimentos em circuitos curtos de produção e consumo. O Pronera – Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária, com os mesmos objetivos do Programa Educação do Campo, pretende atingir os assentados pela reforma apenas. A ideia central é a ampliação do acesso à educação. O programa Desenvolvimento Regional Sustentável (DSR), foi criado em 2005, no âmbito do Fome Zero, implementado pelo Banco do Brasil, sendo seu objetivo o fortalecimento dos processos de desenvolvimento regional democratizando o acesso ao crédito, possibilitando a inclusão social e a geração de trabalho e renda. A partir dessa exposição podemos distinguir quatro grupos de políticas de acordo com a sua finalidade e relação com o território: i) as desconcentradas5, ii) as descentralizadas6, iii) as políticas de fomento a projetos territoriais7, e iv) as políticas concebidas no nível territorial8. Esse conjunto de ações políticas e sua consequente abrangência, mostra

que

o

país

está

procurando

encaminhar

o

processo

de

transformação/modernização rural na direção do que vem se evidenciando como estrutural para o desenvolvimento das economias dos países em desenvolvimento, contribuindo para a redução das desigualdades, que impede o crescimento econômico. Segundo um dos diretores do Instituto de

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Desconcentradas são as políticas caracterizadas pela centralização na esfera federal governamental dos atores mais atuantes e com maior poder de decisão. Eles definem as regras e as normas que orientam a política, delegando totalmente ou parcialmente a aplicação destas no plano local, numa hierarquização das responsabilidades. (BONNAL & KATO, 2011) 6 Descentralizadas são as políticas que se caracterizam por uma efetiva repartição do poder de decisão entre as três esferas do governo (federal, estadual e municipal) e o seu compartilhamento com atores privados e da sociedade civil em bases claras e com ampla repartição de responsabilidades. (BONNAL & KATO, 2011) 7 As políticas de fomento a projetos territoriais objetivam incentivar projetos territoriais e se caracterizam por uma localização da iniciativa no nível local, mediante um conjunto de regras definidas na esfera nacional. A proposta inicial é formulada pelo Governo Federal, que define as regras que norteiam operacionalização do programa. É o Governo Federal que seleciona os critérios norteadores do recorte territorial e elege, a partir deles, os territórios de ação em que a política se territorializará. (BONNAL & KATO, 2011) 8 As políticas concebidas no nível territorial visam ao fomento de projetos territoriais, mas diferencia-se do grupo anterior pela forma como estes projetos foram concebidos. Neste grupo específico, a ideia que deu origem à política e às suas formas de operacionalização é oriunda da sociedade civil. Neste grupo de políticas, o Estado tem uma participação mais restringida. (BONNAL & KATO, 2011)

Desenvolvimento Social do BID “a redução das desigualdades, além de ser fundamental para uma sociedade e básica para uma democracia, é estratégica para a obtenção de desenvolvimento real e sustentado”. (SANTOS, 2001) Dessa forma, entende-se que não há desenvolvimento no meio rural sem educação, saúde, garantias previdenciárias, salários dignos, erradicação do trabalho infantil e escravo, respeito à autodeterminação dos povos indígenas e preservação do meio ambiente. O que o Brasil vem procurando fazer com o lançamento dos vários programas de se viu, para superar suas questões agrárias. (SANTOS, 2001) Além disso, observa-se que a opção pela agricultura familiar justifica-se por sua capacidade de geração de emprego e renda a baixo custo de investimento. Bem como a capacidade de retenção da população fora dos grandes centros urbanos que essas políticas permitem. (SANTOS, 2001) As políticas públicas para o meio rural brasileiro procuram construir uma pluriatividade no meio rural, que um fenômeno que pressupõem a combinação de pelo menos duas atividades, sendo uma delas a agricultura. Onde os indivíduos que pertencem a um grupo doméstico ligado por laços de parentesco e consanguinidade entre si, compartilham um mesmo espaço de moradia e trabalho e se identificam como uma família.

3.1. As redes de desenvolvimento rural Nessa época de globalização, a interligação entre o global e o local é uma realidade inconteste. Desde que dotados de sistemas modernos e inovadores o local se projeta naturalmente para o exterior. Intensificando seu comércio interterritorial o sistema local se desdobra sobre seu hinterland9 e encontra os meios de tornar o desenvolvimento eficaz. Porque não se relaciona mais segundo a lógica centro-periferia, mas constrói uma relação mais intensa e diversificada de produtos que liga o local a uma economia externa, projetando o local na divisão internacional do trabalho. Ao estender sua economia a lugares diferentes o local é obrigado a inventar novas estruturas 9

Em geografia urbana, hinterlândia corresponde a uma área geográfica (que pode se tratar de um município ou um conjunto de municípios) servida por um porto e a este conectada por uma rede de transportes, através da qual recebe e envia mercadorias ou passageiros.

econômicas e territoriais. (BENKO, s/d) Isso ocorre não apenas por mecanismos econômicos ou por causa das técnicas preexistentes, mas por uma ação participava e integrada, ou seja, por uma autogênese local. Na tabela 1, observa que as propostas governamentais para o desenvolvimento rural estão sendo implementadas, principalmente através do crédito rural, ocorrendo um aumento substancial de recursos aplicados na agricultura familiar, acompanhando a proposta de inclusão das populações em estado de vulnerabilidade. O objetivo do desenvolvimento econômico e social do campo brasileiro vem sendo buscado pelo governo com a ampliação geral do crédito, que em valores absolutos, ainda são bastante desproporcionais em favor da agricultura empresarial. Embora, como já mostramos, existam vários programas de estímulo ao desenvolvimento das pequenas propriedades rurais, os recursos não são significantes em relação à propriedade rural empresarial. Nesse caso, inúmeros fatores podem contribuir para essa desproporção do crédito, como a falta de articulação dos movimentos sociais, ou a ausência de projetos consistentes de desenvolvimento.

Tabela 01. Financiamento Rural - programação e aplicação de recursos safras 2011/2012 e 2012/2013 Finalidades e Fontes / Programas Agricultura Empresarial Agricultura (Pronaf)

Familiar

jul/11 a abr/12

jul/12 a abr/13

(Em R$ milhões)

(Em R$ milhões)

Var.( %)

73.996,00

96.034,30

29,8

10.745,80

14.344,40

33,5

Fonte: RECOR/BACEN, BNDES, BB, BNB, BASA, BANCOOB e SICREDI. 2013.

A articulação entre os diferentes interessados no desenvolvimento através dos conselhos sob a supervisão do poder público, representado pelas organizações públicas oficiais, que são instrumentos acessórios na promoção do desenvolvimento. Desta forma o desenvolvimento rural estaria vinculado ao maior grau de liberdade, da população para realizar escolhas e determinar o futuro. Porém, a limitação ou dependência imposta ou estimulada pelos organismos públicos responsáveis, acaba por inviabilizar a autonomia para conduzir os processos de desenvolvimento. Assim, os pacotes prontos passam

a constituir-se em modelo e justificam a existência dos próprios organismos. (FIALHO & WAQUIL, 2008) As demandas acabam imperativas ao desenvolvimento social e econômico acabam por não serem atendidas pelo poder público e os movimentos sociais frustram as comunidades locais por não representarem os seus anseios desarticulando os movimentos. Dessa forma as redes ficam mais densas do lado da empresa agrícola e frágil do lado das populações que necessitam de medidas de inclusão.

Considerações Finais

Observamos uma intensa ação no campo brasileiro cuja finalidade é permitir o desenvolvimento sustentável dos pequenos agricultores. Diferentes práticas foram sendo instaladas, que provocaram algumas modificações no panorama do espaço rural. Contudo, a dimensão territorial e as características particulares que se apresentam, exigem uma maior intervenção, não só do Estado, mas também da sociedade civil. A abrangência do problema não pode ser atendida por políticas gerais, exigem maiores estudos e planejamentos para a organização das intervenções necessárias a sanar os graves problemas que o campo brasileiro ainda apresenta. As políticas públicas, oriundas do Estado ou da sociedade civil precisam ser mais efetiva, no sentido de dar sustentação organizacional ao campo e possibilitar uma dinâmica econômica sustentável. Sem que isso caracterize uma solução permanente, ao contrário, as soluções são sempre temporárias numa economia globalizada.

É necessário uma atuação

constantes das forças dinâmicas da sociedade para promover os ajustes necessários. Para isso, precisamos que as soluções cheguem a todo o território nacional, o que ainda não foi possível como observamos.

Bibliografia BENKO, Georges. Economia, espaço e globalização, na aurora do século XXI. São Paulo. Ed Hicitec. s/d. BONNAL, Philippe & KATO, Karina. O processo contemporâneo de territorialização de políticas e ações públicas no meio rural brasileiro. In: MIRANDA, Carlos & TIBURCIO, Breno (orgs). Políticas Públicas, Atores Sociais e Desenvolvimento Territorial no Brasil. Série Desenvolvimento Sustentável, v 14. Brasília. Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura. 2011. BRASIL, MDA – Ministério do Desenvolvimento Agrário. Diretrizes para o Desenvolvimento Rural Sustentável. Brasília. Condraf, 2006. BRASIL, MDA – Ministério do Desenvolvimento Agrário. Política de Desenvolvimento do Brasil Rural. Brasília. Condraf, 2010. FIALHO, M. A. V.; WAQUIL, P. D. Desenvolvimento Rural: Concepções e Referências para a Proposição de Políticas Públicas de Desenvolvimento nos Territórios Rurais. Revista Extensão Rural. Santa Maria, número 15, ano XV, p. 128-164, jan/jun. 2008. HAESBAERT, Rogério. Des-territorialização e identidade: A rede “gaúcha” no nordeste. RJ, EDUFF, 1997. MIRANDA, Carlos & TIBURCIO, Breno (orgs). Políticas Públicas, Atores Sociais e Desenvolvimento Territorial no Brasil. Série Desenvolvimento Sustentável, v 14. Brasília. Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura. 2011. SAQUET, Marcos Aurélio & BRISKIEVICZ, Michele. Territorialidade e Identidade: um patrimônio no desenvolvimento territorial. Caderno Prudentino de Geografia, nº31, vol.1, 2009. SALES, Elias Jr Câmara & Antonio F°., Fadel David. A multiplicidade e a pluriatividade como temas de análise: o turismo rural na produção do programa de pós-graduação em Geografia da Unesp – 2001-2010. In: FERREIRA, Darlene Ap de Oliveira & FERREIRA, Enéas Rente (org). Estudos Agrários – A complexidade do rural contemporâneo. Rio Claro. Editora Unesp. 2011. SANTOS, Manoel José dos. Projeto alternativo de desenvolvimento rural sustentável. Estudos Avançados. V 15(43). São Paulo. 2001. SCHNEIDER, Sergio. A pluriatividade no meio rural brasileiro: características e perspectivas para investigação. México. Ed. Flacso, 2007. SECCHI, Leonardo. Políticas públicas: conceitos, esquemas de análise, casos práticos. 1. Ed. São Paulo: cengage learning, 2010.

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