Por baixo da pele somos todos africanos

May 25, 2017 | Autor: A. Rocha | Categoria: Filosofía, Pedagogia, Ciência da religião
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POR BAIXO DA PELE SOMOS TODOS AFRICANOS

Arlindo nascimento Rocha1

Resumo: Este artigo tem como objetivo fazer uma reflexão sobre a nossa origem comum. Apesar das nossas diferenças genéticas, culturais e políticas é inequívoco que ao mergulharmos na historia da humanidade, logo chegaremos a uma mesma conclusão: todos os seres humanos têm a mesma origem, e por isso, somos todos iguais apesar das nossas diferenças. A origem comum da espécie humana foi encontrada há milhões de anos na África. Essa teoria é sustentada por diversos estudos antropológicos, e, através de pesquisas arqueológicas que descobriram restos dos nossos antepassados mais longínquos no continente africano, mais propriamente, na Tanzânia, no Quênia e na Etiópia.

Por baixo da pele somos todos africanos De acordo com Hans Kung, em sua obra As religiões do mundo: em busca do ponto comum de (2004, p. 38), “o homem é um ser que incessantemente reflete sobre suas origens. Na religião, na filosofia, nas ciências.” Ou seja, desde sempre, procurou entender, compreender e descobrir a resposta para milhares de perguntas vitais que se formulam. Respondeu primeiro com base no empírico, observando tudo o que o cercava, e ali descobriu sua incapacidade de revelar tudo por si só. Muitos estudiosos acreditam que o homo sapiens, o homem assim como é hoje teria desenvolvido em diversos lugares do mundo. Ainda segundo Kung, a maioria dos pesquisadores, com base em convincentes e recentíssimas descobertas, estão convencidos disso. O homo sapiens da quente e selvosa África tropical e subtropical, muito provavelmente do Great Rift Valley siro-africano ao norte da Zambeze. A África é, pois, nossa origem comum. O homo sapiens tornou-se um produtor de formas ao inventar ferramentas que lhe permitiram ultrapassar a condição comum a todos os viventes, submetendo progressivamente a seus fins os meios e objetos sobre os quais incidia sua luta pela sobrevivência. O “salto qualitativo” das formas pré-humanas à forma humana do trabalho constitui o elo decisivo da hominização: o homo se tornou sapiens ao se tornar faber. (MORAES, 2011, p. 28).

Mestre em Ciências da Religião – (PUC-SP) Pontifícia Universidade Católica de São Paulo; Pós-Graduado em Administração, Supervisão e Orientação Pedagógica e Educacional – (UCP) Universidade Católica de Petrópolis; foi aluno extraordinário do curso de Pós-Graduação em Filosofia da (PUC-Rio) Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro; Licenciado em Filosofia – (UNI-CV) - Universidade Pública de Cabo Verde; Formado em Pedagogia (curso Inicial de formação de professores do EBI) - Instituto Pedagógico do Mindelo. 1

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Nos albores da Pré-História,2 dois milhões de anos antes de qualquer cultura escrita, surgiu ali o homo habilis, o homem que sabia talhar ferramentas de pedra. O Homo habilis surgiu há cerca de 2,5 milhões de anos e viveu entre o Pleistoceno baixa e média. Nessa altura, nas regiões tropicais, menos chuva e seca piorou. Os mais importantes restos fósseis deste hominídeo foram encontrados em: a) Garganta do Olduvai (Tanzânia), onde o casal Mary e Louis Leakey arqueólogos descobriram o primeiro homo habilis. Este lugar é tão importante arqueologicamente que é chamado de "berço da humanidade". b) Koobi Fora (Quênia), onde encontraram numerosos restos fósseis humanos, entre os quais o primeiro homo habilis. c) Na Etiópia (deserto de Afar), o antropólogo Donald Johanson e o estudante Tom Gray descobriram em 1974 o fóssil da Lucy com 3,2 milhões de anos. Os utensílios mais antigos que conhecemos foram desenterrados pelo arqueólogo queniano Louis Seymour Bazett Leakey (1903-1972), no tufo vulcânico da região da garganta do Olduvai e no Quénia, e com base nas camadas geológicas, ele conseguiu estabelecer sua idade entre 2 120 000 a 2 160 000 anos. Desde então novas descobertas ocorreram. A África acompanhou os desenvolvimentos dos outros continentes na antiga e média idade da pedra é o que demonstram instrumentos de pedra cada vez mais aperfeiçoados, assim como os desenhos rupestres. Na região do Zambeze, tanto as descobertas de ferramentas quanto aos túmulos permitem acompanhar com clareza o desenvolvimento do homo habilis, até nosso antepassado direto, o homo sapiens. Para Hans Kung, (2004, p. 39) “foi certamente a cerca de cem mil anos que o homo sapiens, começou sua trajetória pelo globo, deslocando os neandertalenses na Europa e em outros lugares.” Os cientistas também concordam que há cerca de 70 mil anos, sapiens da África Oriental se espalharam na península Arábica e de lá rapidamente tomaram o território da Eurásia. Quando o Homo sapiens chegou à Arábia, a maior parte da Eurásia já era ocupada por outros humanos. O que aconteceu com eles? A teoria da miscigenação conta uma história de atração, sexo e miscigenação. À medida que os imigrantes africanos se espalharam pelo

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A Pré-História corresponde ao período que vai do surgimento do homem primitivo (hominídeo) até a invenção da escrita. O termo Pré-História tem sido criticado, pois pode sugerir que o homem desse período não deva ser incluído na história. Ora, o homem, desde seu aparecimento, é um ser histórico, ainda que ele não utilizasse a escrita. Outras expressões foram propostas para denominar os povos sem escrita, como: povo pré-letrado, povo ágrafo etc. O emprego dessas expressões, entretanto, não se generalizou. Como o termo Pré-História é de uso universal, vamos também empregá-lo, mas conscientes de que esse período integra a história, em sentido amplo.

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mundo, eles procriaram, e as pessoas, hoje, é resultado dessa miscigenação, resultando assim, na diversificação genética das raças. Entretanto, é preciso realçar como afirma Kung (2004, p. 39) que, “não se trata de espécies humanas diferentes, mas sempre do mesmo gênero humano. E embora existam muitas diferenças nas caraterísticas externas, pode-se admitir que todos nós temos uma origem africana comum. Por baixo da pele somos todos africanos.” Relativamente a diversificação racial ou genética, Paulo Guilherme Almeida afirma que: Essa diversificação genética, que chamamos diversas “raças” do planeta em todos os continentes foi estabelecida através de uma série de migrações ao longo de milhares de anos desde os nossos primeiros ancestrais inteiramente formados mostra que, em todos os lugares de credos, costumes e “raças” distintas, por baixo da pele invariavelmente somos iguais. (ALMEIDA, 2006, p. 58).

Para o escândalo dos fundamentalistas, dos fanáticos ortodoxos e, sobretudo, dos racistas, existem menos diferenças no DNA de toda a raça humana do que num pequeno grupo de chimpanzés e gorilas. É por isso que a história da humanidade foi sempre marcada por guerras e perseguições originadas nas diferenças e nos ódios raciais, Atualmente, ainda existe um preconceito que continua sendo difundido: antes das missões e da colonização, os africanos eram tidos como selvagens. Povos primitivos, grosseiros sem mínima cultura. Puro engano. Mesmo sem falar das antigas culturas do Egito, da Núbia e da Etiópia, outros povos africanos também evoluíram. De acordo com Kung (2004, p 43), “os africanos conseguiram chegar a uma cultura que supera de longe os aborígenes da Austrália, ou, em certos aspetos, pode mesmo ser comparada à cultura medieval europeia.” Segundo o mesmo autor: Do final do século XII até o final do século XVI, a África passou por um grande crescimento econômico, politico e cultural: para a África esses foram esses grandes séculos. A cidade do Grande Zimbábue, por exemplo, como suas gigantes construções graníticas. Ao sul do Saara não existe nenhum monumento cultural maior e mais impressionante do que essa antiga capital. (KUNG, 2004, p. 43).

No final do século XVI, o desenvolvimento interno da África foi violentamente interrompido pela invasão externa. Foi nessa altura é que ocorreram estagnação e deformação dos povos africanos devido à invasão e a exploração levado a cabo pelos europeus. Apesar da missão evangelizadora e humanitária, essa interrupção do desenvolvimento da África pelo colonialismo europeu, teve a corresponsabilidade das Igrejas:

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[...] Que as igrejas e as missões aplanaram o caminho para as potencias europeias chegassem à dominação sobre a África inteira. Ou mesmo que eles legitimaram apoiaram ideológica e teologicamente o poder imperialista. Só mais tarde que elas perceberam que isso não poderia continuar. E, aos poucos foram desvencilhando do colonialismo e se colocando ao lado dos negros em sua grande luta pela libertação. (KUNG, 2004, p. 49).

Apesar disso, na história da África sucederam rápidas mudanças durante o período entre 1880 e 1935. Na verdade as mudanças mais importantes, mais espetaculares e mais trágicas ocorreram num lapso de tempo curto, de 1880 a 1910, marcado pela conquista e ocupação de quase todo o continente africano pelas potencias imperialista e, depois, pela instauração do sistema colonial. Só em meio à luta de libertação, na década de 1970 é que as igrejas amplamente hostilizadas pelo sistema colonial distanciaram do colonialismo e a “africanizar” suas lideranças. Porém, na arte, a africanização ocorreu mais cedo. Não nos devemos admirar que eles representassem Jesus e os santos e até Adão e Eva, como negros. Por isso, o nacionalismo africano pode manifestar-se também na religião. De acordo com Aron Paul, em sua obra Mistérios da história, “isso encaixa com as descobertas dos biólogos mostrando que a morada primitiva de Eva – digamos o Éden – ficava na África.” (ARON, 2001, p. 6). Mesmo com a independência, a África continua se debatendo com problemas antigos. No prefácio do livro A África na sala de aula de Leila Leite Hernandez, o escritor Moçambicano, Mia Couto, afirma que: “a África vive uma tripla condição restritiva: prisioneira de um passado inventado por outros, amarrado a um presente imposto pelo exterior e, ainda, refém de metas que lhe foram construídas por instituições internacionais que comandam a economia.” (HERNANDEZ, 2005). Apesar de todos esses problemas, a África permaneceu em larga escala em continente religioso. Embora hoje socialmente, a África possa ser considerada um continente problemático, no futuro podemos vislumbrar um renascimento africano como aconteceu com a Europa. De acordo com Kung: A África, com seus 750 milhões de habitantes, é um continente que tem futuro, apesar dos imensos problemas, e que está como que a espera do desenvolvimento e de investimentos [...] Ninguém espera que a cultura tribal se desenvolva rapidamente, nem que a religiosidade africana tradicional perca toda a sua importância. Pelo contrário, o pensamento africano e a religiosidade africana também tem algo a oferecer no futuro. (KUNG, 2004, p. 53).

Se, se perguntarmo-nos o que esperamos no futuro como contribuição africana para a ética comum da humanidade, a resposta mais óbvia é que os africanos contribuirão para a humanidade nos próximos milênios, através do seu forte senso de comunidade e solidariedade; com sua alta apreciação dos seus valores e critérios tradicionais; com a sua

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visão holística do mundo e do homem, onde há lugar para os jovens e velhos, onde a tradição e o progresso andam de mãos dadas. Considerações finais Desse pequeno resumo de um tema tão complexo, e investigado por tanta gente, fica-se ciente de que realmente os seres humanos, independentemente da sua cor da pele, realmente possuem uma origem comum, justificando assim o título no artigo, ou seja, por baixo da pele somos todos africanos, uma metáfora que nos ajuda a pensar nossas origens e a entender melhor as relações étnico-raciais. Com efeito, não há como duvidar dos estudos e das provas que sustentam a tese de que o nosso antepassado mais distante foi encontrado na África. A partir dai demarca-se a dispersão e a evolução da humanidade, tendo em conta as caraterísticas climáticas, hábitos alimentares, desenvolvimento biológico (cérebro, postura, etc.). Mas, é preciso ainda desmisticar a ideia de que a África sempre foi um continente subdesenvolvido, sem cultura, atrasada em que os povos são selvagens e sem religião. Numa leitura breve sobre a história da África acabamos verificando que o que é tido como verdade pelo senso comum, não tem fundamente histórico. Entretanto, reconhecem-se os problemas que herdamos de uma colonização que durou cinco séculos, e, pelo trágico processo de descolonização ainda a África enfrenta sérios problemas, que não teriam surgidos se a África não tivesse sido colonizada pelas grandes potencias europeias.

Referências ALMEIDA, Guilherme Paulo. A jornada do espírito. 1ª edição. Editora: Ibrasa, 2006. ARON, Paul. Mistérios da história: uma investigação reveladora sobre os acontecimentos mais intrigantes de todos os tempos. 1ª edição. Editora Manole. Barueri, SP, Brasil, 2001. HERNANDEZ, Leila Maria Gonçalves leite. A África na sala de aula: visita à história contemporânea. São Paulo: Selo Negro, 2005. História geral da África, VII: África sob dominação colonial, 1880, 1935/ citado por Albert Adu Boahen. – 2ª edição - rev. Brasília: UNESCO, 2010. KUNG, Hans. Religiões do mundo: em busca de pontos comuns. Tradução de Carlos Almeida Pereira. – Campinas, SP: Versus Editora, 2004. MORAES João Quartim de. O humanismo e o homo sapiens. Artigos crítica marxista. 2011.

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