Por uma Av. Paulista aberta: em diálogo com o MP

June 24, 2017 | Autor: Paula Santoro | Categoria: São Paulo (Brazil), Mobilidade Urbana, MOBILIDADE URBANA SUSTENTÁVEL, Ciclovias Temuco
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Por uma Av. Paulista Aberta: em diálogo com o MP | observaSP

Por uma Av. Paulista Aberta: em diálogo com o MP Publicado em outubro 22, 2015 *Letícia Lemos, **Luanda Vannuchi, ***Raquel Rolnik e ****Paula Santoro



Foto: Letícia Lindenberg Lemos

No último domingo, dia 18 de outubro, entre às 9h e às 17h, a avenida Paulista foi novamente aberta para pessoas como área de lazer, medida que deverá se repetir todos os domingos de agora em diante, segundo anúncio da prefeitura municipal. Festejada pela população, que lotou a avenida, apesar do frio, a medida foi contestada pela Promotoria de Justiça de Habitação e Urbanismo (PJHURB) do Ministério Público do Estado de São Paulo (MP) em duas notas à imprensa divulgadas nos dias 15 [1] e 16 de outubro [2]. Com argumentos conservadores e um claro posicionamento a priori contra a mudança no uso da via, a promotoria promete estudar as medidas cabíveis – incluindo ação civil pública e multa – caso o prefeito Fernando Haddad não reveja seu posicionamento. Elencamos e discutimos abaixo os principais argumentos contidos nas notas:

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O MP indica que a abertura da avenida para os pedestres está sendo “imposta à população sem que esta, sua destinatária final, tenha realmente oportunidade de externar sua opinião e anseios” e afirma que não há como saber “se a população é a favor ou contra a medida por inexistirem estudos ou pesquisas (por entidades independentes) nesse sentido”. Argumenta ainda que a audiência pública realizada no vão do MASP não tem valor estatístico. Conforme amplamente noticiado pela mídia, foram realizadas pesquisas que indicaram aprovação tanto da população quanto do comércio local que abre aos domingos [3]. Mesmo entre aqueles que utilizam o carro diariamente ou quase diariamente, 54% se mostraram favoráveis a essa ação [4]. Para além das pesquisas, a medida está respaldada pela Política Nacional de Mobilidade Urbana: o Inciso I do Artigo 23 garante aos entes federativos utilizar como instrumento de gestão “restrição e controle de acesso e circulação, permanente ou temporário, de veículos motorizados em locais e horários predeterminados” [5]. Além disso, ao questionar a representatividade estatística da audiência pública realizada no vão do MASP no dia 19 de setembro, o MP põe em xeque a legitimidade de qualquer audiência pública já organizada na cidade, por não terem nunca reunido um número de pessoas capaz de distinguir a posição da maioria. A audiência pública enquanto instrumento democrático não pode, e nem tem como objetivo, equiparar­se em representatividade aos processos eleitorais ou plebiscitos.

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O MP argumenta que a Paulista foi “concebida e construída para veículos” e que

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sua abertura para o lazer da população traz “inúmeras implicações e impactos”. Primeiro é importante ressaltar que a cidade é produto da ação humana para o ser Obtenha todo post novo

humano, ou seja, ela não é feita para veículos. A Av. Paulista foi concebida e construída entregue na sua caixa de para abrigar a aristocracia do café. Esta mesma avenida, quando aberta em 1898, entrada.

abrigava a circulação de carruagens e bondes. Hoje, os palacetes, bondes e carruagens Junte-se a 193 outros seguidores desapareceram para dar lugar a ônibus, carros, pedestres e ciclistas. Nenhuma rua ou avenida é estática: os modos de ocupar e circular se transformam e é próprio da política Insira seu endereço de e­mail pública promover estas transformações. Além disso, é comum que alterações tenham impactos. No caso da abertura da Paulista para lazer, acredita­se que em geral serão

Cadastre­me impactos positivos. Para medi­los, a CET fez estudos e apresentou­os ao MP, prevendo medidas para mitigar eventuais transtornos. Crie um site com WordPress.com

A nota do MP faz menção aos estudos realizados pela CET, indicando que seriam baseados em “modelos teóricos ou, na melhor das hipóteses, em dados colhidos nas duas únicas oportunidades em que o fechamento se deu”. Em primeiro lugar, os modelos teóricos são e devem ser usados para o planejamento. Caso contrário, a única base de análise seriam levantamentos empíricos e, na impossibilidade de realizá­los, nunca seria possível prever o impacto de nada e ficaríamos a mercê do status quo, eternamente. A questão é: quando um estudo é suficiente e https://observasp.wordpress.com/2015/10/22/por­uma­av­paulista­aberta­em­dialogo­com­o­mp/

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perfeito em se tratando de um organismo vivo e dinâmico como a cidade? Não existe perfeição, muito menos decisão absolutamente tecnocrática, decorrente de estudos infalíveis. O que existem são alternativas, construídas frequentemente a partir de opções políticas que devem ir ao encontro do interesse público. Um dos argumentos que serve como base para esses “modelos teóricos” está no fato de que as vias do entorno têm capacidade para receber o volume de veículos que circula na Av. Paulista. Segundo depoimentos de técnicos da CET, a Alameda Santos e a Rua São Carlos do Pinhal têm capacidade para receber os veículos que deixarão de circular pela Paulista aos domingos, por volta de 2 mil veículos por sentido, de acordo com contagens realizadas pelo órgão antes do primeiro fechamento da via. O principal conflito para o fechamento é a travessias dos ônibus pela Av. Brigadeiro Luiz Antônio, mas o cruzamento aí está sendo mantido. Além disso, análises baseadas em dados empíricos também são fundamentais. Podem e devem subsidiar os estudos de impacto desse tipo de medida. Durante as duas experiências de abertura da Paulista, as medições realizadas pela CET demonstraram que a ação causou um baixo impacto no trânsito local. É comum que medidas de alteração de tráfego nas primeiras vezes que são realizadas impactem mais que nas demais, uma vez que alguns motoristas ainda desconhecem as alterações. O que reforça o argumento de que as duas medições são relevantes e suficientes para uma boa análise técnica. Como já apontado, a cidade é dinâmica. Nada impede que novas medições sejam feitas no futuro, em processo de monitoramento que nos ajudará na tomada de decisões que vão na mesma direção de abrir outras avenidas para pessoas. Afinal, estamos construindo uma nova forma de utilizar os espaços públicos da cidade e não podemos refutá­la em função de um suposto desconhecimento preciso sobre sua implantação. O MP apresentou à prefeitura “medidas alternativas” ao fechamento total para veículos em audiência realizada em setembro, sobre as quais a gestão deveria se posicionar até o dia 15 de outubro, o que não aconteceu. Conforme reportado por veículos de comunicação no dia 08 de outubro (Estadão [6], UOL [7]), a alternativa que teria sido indicada pelo MP seria a manutenção de uma faixa de rolamento para veículos motorizados em cada sentido. Ora, não é de se espantar que a prefeitura não tenha acatado essa proposta, visto que a manutenção da circulação de automóveis, e ainda em ambos os sentidos, desconectando tanto as calçadas quanto as ciclovias das demais faixas destinadas ao lazer, implicaria em risco aos pedestres, ciclistas, crianças, praticantes de esporte etc. Cabe ao MP indicar os problemas decorrentes da opção da Prefeitura, fazer recomendações, solicitar soluções (sem direcioná­las ou impô­las), e avaliar as medidas técnicas propostas pela gestão. Se o problema é o acesso aos imóveis pela Av. Paulista, a Prefeitura já afirmou que ele será garantido para os moradores ou trabalhadores da região. Em relação ao acesso aos hospitais, o Santa Catarina será o mais impactado, https://observasp.wordpress.com/2015/10/22/por­uma­av­paulista­aberta­em­dialogo­com­o­mp/

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pois o acesso ao seu estacionamento se dá diretamente pela Paulista, mas também para esse caso a Prefeitura anunciou que está prevista uma faixa para acesso local. Assim, escapa ao papel do MP a proposição de “medidas alternativas”. Formular política pública é papel da gestão pública. Criar soluções técnicas é papel dos órgãos competentes. O MP argumenta que a atual gestão adota “posições radicais” ao defender o fechamento da avenida para carros – ao contrário do próprio MP, que buscaria “soluções alternativas que realmente democratizem a utilização dos espaços públicos”. Em primeiro lugar, é exagerado considerar uma “posição radical” o fechamento de 4,5 km de via para carros, a fim de criar áreas de lazer na cidade de São Paulo, quando em várias outras cidades no Brasil e no mundo essa já é uma prática antiga. No Rio de Janeiro, as avenidas Atlântica e Vieira Souto, que beiram as praias de Copacabana e Ipanema, são fechadas para carros aos domingos já faz muito tempo. Na Cidade do México, 50 km de vias são dedicadas ao lazer aos domingos. Em Santiago do Chile, são 30 km. Além dessas cidades, Bogotá, Nova York, Paris e Londres também têm experiências semelhantes, que são consideradas um sucesso. O problema nesse argumento vai mais além. Não cabe ao MP determinar se uma política pública é “radical”, principalmente dentro de um debate onde se criam oposições e no qual o próprio Ministério já demonstrou ter posicionamento definido. Finalmente, a nota remete ao Termo de Ajustamento de Conduta firmado em 2007 com a Prefeitura de São Paulo. Esse termo limita a três por ano os fechamentos da Avenida Paulista para grandes eventos. A abertura da Paulista aos domingos, para ser usada como local de lazer pela população, não é um evento, mas algo permanente, constante, já que se trata de uma política pública. Portanto, não se enquadra como “evento”, conforme descrito pelo próprio TAC, e logo este não pode servir para impedir que a abertura ocorra. Portanto, não há sentido algum em recorrer ao TAC para esse debate. Se esta visão prevalecer e o MP resolver se ater ao TAC, significa então que restam duas opções que acirram antagonismos entre nós, cidadãos, dado que a Av. Paulista já abrigou o máximo de eventos permitidos em 2015: ou cancelamos a São Silvestre e a festa de Réveillon, se a circulação de automóveis, no dia 31 de dezembro, for prioridade absoluta para a cidade, ou então o MP poderia propor uma revisão desse TAC. * Por fim, mas não menos importante, o Ministério Público é uma instituição de relevância inegável na defesa dos direitos difusos, que tem uma atuação fundamental, inclusive para coibir abusos e ilegalidades praticados pelo Executivo e por outros agentes que atuam https://observasp.wordpress.com/2015/10/22/por­uma­av­paulista­aberta­em­dialogo­com­o­mp/

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sobre a cidade. É fundamental que o MP continue tendo força nesse trabalho. Mas no caso da abertura da Paulista, não podemos aceitar o posicionamento desta promotoria, que tem se mostrado conservador e pouco flexível em relação ao plano de uma administração municipal democraticamente eleita de reduzir a importância do transporte individual motorizado na cidade de São Paulo, abrindo ciclovias e áreas de lazer em espaços antes reservados exclusivamente aos carros. Com notas como essa, o MP corre o risco de diminuir sua credibilidade enquanto órgão tão fundamental, verdadeira conquista de nossa sociedade.

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Foto: Flávio Moraes.



Foto: Thiago Benicchio

* Leticia Lemos é arquiteta e urbanista, mestranda na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, e compõe a equipe do observaSP. Tem especialização em mobilidade não motorizada pela UNITAR. **Luanda Vannuchi é geógrafa, mestre em estudos urbanos pela Vrije Universiteit Brussel e faz parte da equipe do observaSP. ***Raquel Rolnik é arquiteta e urbanista, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP e uma das coordenadoras do observaSP. ****Paula Santoro é arquiteta e urbanista, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP e uma das coordenadoras do observaSP. 

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R ELA C ION A D O

Implantar as ciclovias e superar os seus entraves Em "Mobilização"

Suspender obras não é solução para as ciclovias de SP! Em "Agenda"

Remoção na Rua Teodoro Sampaio: crônica de uma tragédia anunciada Em "Faria Lima"

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Lúcio Gregori em outubro 24, 2015 às 3:02 pm disse:

Penso que a abertura da Paulista aos pedestres questão muito importante para a cidade. A Prefeitura está corretíssima como e o MP bastante equivocado e, acrescento, seguindo o que prescreve a Lei da Mobilidade de 2012. O que me causa espanto é que essa mesma Prefeitura abre um edital de contratação dos ônibus da cidade e estabelece o prazo contratual de 20 anos renováveis por mais 20 ! E inclui no mesmo contrato a construção e operação do Centro de Controle Operacional e dos Terminais . E essa questão não está sendo tratada debatida como merece! O MP ausente! A mídia omissa! Porque será? Com a palavra o Observa SP.

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Lúcio Gregori em outubro 24, 2015 às 3:06 pm disse:

Na segunda linha corrija­se para; A Prefeitura esta corretíssima e o MP bastante equivocado e, acrescento, a Prefeitura está seguindo o que prescreve….etc



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Meli Malatesta em outubro 25, 2015 às 10:06 am disse:

Argumentação correta. acrescento ainda alguns aspectos: 1. O argumentação sobre a utilização de modelos teóricos é a metodologia utilizada pela CET não só no caso da Paulista mas também para avaliar impacto de toda e qualquer intervenção na cidade : novas obras viárias, novos empreendimentos (polos geradores), alterações viárias de qualquer natureza. Não aceitar esta metodologia implica em inviabilizá­la para qualquer tipo de análiise de impacto; 2. Deixar uma faixa aberta para a circulação de veículos, mesmo que seja só o de moradores ou veículos autorizados por lei implica não só na injustificável intensificação da situação de risco dos usuários dos modos não motorizados como também o aumento de custos operacionais envolvidos na ação, conta esta a ser paga pelo contribuinte; 3. Há que se avaliar a longo prazo os aspectos benéficos oriundos da intensificação do convívio social promovido pela ocupação para lazer dos espaços públicos na redução dos índices de violência urbana, melhoria na saúde pública pela prática de exercícios físicos e o consequente aumento da qualidade de vida, fatores estes certamente não considerados nem indicados para aferição pelo MP.

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