POR UMA POLÍTICA DE DESIGN NA LEITURA – APROXIMANDO JOVENS E LITERATURA

July 4, 2017 | Autor: J. Farbiarz | Categoria: Editorial Design
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POR UMA POLÍTICA DE DESIGN NA LEITURA – APROXIMANDO JOVENS E LITERATURA Maíra Gonçalves Lacerda 1 Doutoranda

em Design; PUC-Rio; Rio de Janeiro, RJ. E-mail: [email protected].

Jackeline Lima Farbiarz 2 Doutora

1

2

em Educação; PUC-Rio; Rio de Janeiro, RJ. E-mail: [email protected].

RESUMO: A literatura é um portal capaz de possibilitar o acesso a outras realidades, e o livro é seu suporte privilegiado, capaz de tornar tangível o imaginário. Por se caracterizar como fator indispensável à humanização (CANDIDO, 2004, p.174), a experiência literária possibilita um conhecimento único do mundo e dos homens, e resulta num conhecimento de si próprio que possui especial relevância para o jovem leitor, em processo de formação de subjetividade. Contudo, existe um discurso recorrente no campo da Educação no Brasil referente ao afastamento do povo brasileiro da experiência da leitura literária, que se inicia na juventude, dados ratificados pela pesquisa Retratos da Leitura no Brasil (FAILLA, 2012). Identificando o Design como mediador de leitura e possível aliado no processo de aproximação entre o público juvenil e os livros de literatura, busca-se neste artigo um entendimento dos lugares do Design no mercado editorial contemporâneo e nas políticas públicas de fomento à leitura, por meio da análise quantitativa e qualitativa de livros pertencentes ao acervo para os anos finais do Ensino Fundamental do PNBE 2011 – Programa Nacional Biblioteca da Escola.

LUGARES DO DESIGN: ANÁLISE DE UM ACERVO A categorização realizada, organizada a partir dos conceitos de Linden (2011), Haslam (2007) e Lupton & Phillips (2008), compõe um panorama dos livros para jovens estudantes em relação ao espaço ocupado pelas ilustrações, ao diferencial gráfico apresentado, às funções do texto e da imagem, à relação entre texto e imagem nos aspectos narrativos, à tipologia de diagramação e à presença dos novos fundamentos do Design. Ao analisar as relações entre conteúdo textual e imagético nos livros para jovens, foi possível relacionar a presença de elementos do Design à valorização da fruição do leitor e ao diálogo entre as diversas linguagens do objeto-livro, contudo constatou-se que a maioria dos livros não considera o lugar social do jovem leitor e não explora as possibilidades de mediação oferecidas pelo Design. Seguem alguns dados encontrados: • alguns livros apresentaram uma temática inconsistente com o momento de constituição da identidade e de transformações características do jovem, descritas pelos PCNs (BRASIL, 1998, p.45);

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• apesar da grande presença de imagens na constituição dos livros selecionados para os jovens estudantes, os elementos de design relacionados à própria constituição do objetolivro são tratados, na grande maioria das vezes, de forma padrão, sem diferenciação; • na categorização referente às funções do texto e da imagem apenas poucos livros tiveram sua instância primária identificada como a interação entre conteúdo textual e conteúdo imagético, exceção feita às história em quadrinhos; • 59% dos livros que possuem ilustrações possuem conteúdos redundantes no texto e na imagem. Foi possível perceber que, apesar de algumas obras analisadas possuírem projetos que valorizam a fruição do leitor e o diálogo entre as linguagens que os compõem, a grande maioria dos livros que formam o acervo estudado não considera o lugar social do jovem leitor, o que se torna mais um fator de afastamento entre os jovens estudantes e a experiência literária. Por meio dos dados coletados, percebe-se que o Design tem sido considerado, na maioria das vezes, apenas como um agente produtor na cadeia do livro, e não como um campo de saber presente no próprio desenvolvimento do objeto-livro. Constatou-se então que as possibilidades instauradas pelo Design, enquanto atividade projetual interdisciplinar e mediadora de leitura, não estão sendo exploradas na constituição dos livros para jovens selecionados pelo PNBE.

CONSIDERAÇÕES O design de livros tem a função primeira de dar forma ao objeto. Contudo, uma vez criado, o produto não apenas contém a transcrição do texto do escritor em suas páginas, mas é capaz de estabelecer uma comunicação própria que se soma à mensagem que ele materializa. Ao pensarmos o Design também como mediador de leitura, percebemos seu papel para além da construção do objeto-livro, isto é, seu papel na produção de sentidos, como afirma Chartier (1999). Partindo desta concepção propõe-se uma ampliação do conceito de design do livro para o conceito de Design na Leitura (FARBIARZ, 2006) – um Design pensado como projeto interdisciplinar com vistas à fruição do leitor, pensado como ser social e dinâmico, e visando ao seu diálogo com o objeto-livro e todas as pessoas participantes de sua produção. A compreensão do Design na função de mediador de leitura e o estabelecimento do conceito de Design na Leitura possibilitam uma nova forma de olhar para os objetos-livros, considerando-os para além da perspectiva da fruição da experiência literária, como um projeto interdisciplinar que inclui a integração das linguagens do livro e a adequada compreensão do leitor enquanto instância cultural e social, perspectivas desejáveis em um cenário de políticas públicas de leitura. Apesar de algumas publicações analisadas se destacarem, com projeto que une as diversas linguagens existentes no objeto-livro em prol da experiência literária, concluímos que a grande maioria dos livros selecionados para o jovem estudante não exploram tal

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possibilidade. O Design ocupa um espaço de redundância e de pouco diferencial, apresentando baixa interação com o conteúdo textual dos livros, seu potencial enquanto mediador de leitura foi percebido apenas em um seleto grupo de obras do acervo. Para que o Design se consolide junto às políticas públicas de fomento à leitura como mediador da experiência literária é necessária uma real compreensão do seu potencial como atividade projetual interdisciplinar, tanto por parte do designer como pelos demais profissionais da cadeia do livro, incluindo editores e os responsáveis pelas compras governamentais. O ciclo vicioso que se instaurou na produção editorial para crianças e jovens, entre as editoras e o comitê de seleção dos programas de compra do governo, parece gerar obras que repetem um padrão esperado, disponibilizando pouco espaço para projetos diferenciados, em que seja contemplado o potencial do Design para a educação de cultura visual em uma sociedade multimodal. Com a formalização do conceito de Design na Leitura e a compreensão da articulação possível entre a fruição do texto e o lugar social do leitor espera-se contribuir para modificar esse paradigma que circunda o mercado editorial contemporâneo, recomendandose a incorporação do conceito de Design na Leitura aos critérios de avaliação de livros para o PNBE. Por meio de uma seleção que compreenda o Design como atividade interdisciplinar e mediadora de leitura, que privilegie livros que estejam comprometidos com o jovem, e considerem em seu projeto a fruição do leitor, acredita-se que seja possível alcançar um acervo que aproxime o jovem da experiência literária. Assim, de forma mais efetiva, pode-se ultrapassar a experiência de fruição pessoal, atingindo a formação de uma sociedade leitora hábil na compreensão do texto e da imagem. Em apoio às considerações acima, acredita-se que, juntamente com a efetivação do Design na Leitura como conceito participante da avaliação dos livros, é necessária a constituição de um conjunto de iniciativas com vistas a incorporar um projeto de formação continuada do magistério que propicie aos demais mediadores de leitura a percepção do potencial das contribuições do projeto gráfico. Se um país se faz com homens e livros, como nos antecipou Lobato (1946, p.45), e se, como nos antecipa Bomfim (1999, p.150), o Design pode se apresentar como mantenedor ou como anunciador de caminhos, acredita-se que as reflexões apresentadas aqui possam contribuir para que novos valores se constituam na formação de uma sociedade leitora.

REFERÊNCIAS BOMFIM, G. A. Coordenadas cronológicas e cosmológicas como espaço das transformações formais. In: COUTO, R. M. S.; OLIVEIRA, A. J. (Org.). Formas do design: por uma metodologia interdisciplinar. Rio de Janeiro: 2AB/ PUC-Rio, 1999. BRASIL. 1998. Parâmetros curriculares nacionais: terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: língua portuguesa. Brasília: MEC/ SEF.

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CANDIDO, A. O direito à literatura. In: ___. Vários Escritos. 4. ed. reorg. pelo autor. Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul/ São Paulo: Duas Cidades, 2004. CHARTIER, R. A ordem dos livros: leitores, autores e bibliotecas na Europa entre os séculos XIV e XVIII. Tradução Mary Del Priori. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1999. FAILLA, Z. (Org.). 2012. Retratos da leitura no Brasil 3. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo/ Instituto Pró-Livro. FARBIARZ, J. L. Design na leitura: um dos percursos do Núcleo de Estudos do Design do Livro da PUC-Rio. [2006] Disponível em: http://www.dad.puc-rio.br/nel/artigos/06farbiarz-livro.pdf. Acesso em: 09 agosto 2010. HASLAM, A. O livro e o designer II: Como criar e produzir livros. Tradução Juliana A. Saad e Sérgio Rossi Filho. São Paulo: Edições Rosari, 2007. LINDEN, S. V. Para ler o livro ilustrado. Tradução Dorothée de Bruchard. São Paulo: Cosac Naify, 2011. LOBATO, M. América: os EUA em 1929. São Paulo: Editora Brasiliense, 1946. LUPTON, E.; PHILLIPS, J. C. Novos fundamentos do design. Tradução Cristian Borges. São Paulo: Cosac Naify, 2008.

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