Porque não faço participação política partidária.

September 27, 2017 | Autor: Celeste Fortes | Categoria: Political Science, Juventud
Share Embed


Descrição do Produto

Da série: Porque não faço participação política partidária. Ausência de um projecto de formação pedagógica partidária. Celeste Fortes Antropóloga Durante um diálogo entre gerações, sobre a participação política partidária e não-partidária e os impactos, mais imediatos, que cada um pode proporcionar, me posicionei contra o determinismo de que só a participação politica partidária consegue estes resultados. Isto é, de que esta é via mais eficaz de participação com vista a transformações estruturais e visíveis no espaço público. Aqueles que têm projectos de participação, na vida do país, certamente já estiveram nesta encruzilhada e por algumas vezes já se devem ter questionado, será que para participar terei de me filiar num partido? Se sim, quais critérios para a filiação? A filiação faz-se em que sentido? Do futuro filiado para o partido escolhido ou a filiação é dialéctica e dialógica? Eu vejo a participação política partidária como um exercício de filiação e militância a um grupo, isto é, a aquilo que convencionamos apelidar de partido politico. Creio que este processo de filiação faz-se por aproximação e partilha dos mesmos ideais, do mesmo projecto para o país, bitolada também por uma relação de identificação, confiança e lealdade. Enquanto jovem, o processo de filiação partidária, como condição de participação, parece-me um exercício difícil. O processo de construção da relação partidária com o país é marcado, no geral, por uma tendência de apagamento da memória política e partidária do país. Isto é, sem haver um passado, que possa servir de referência, não conseguimos

conhecer a

identidade do partido. Será que o passado da formação do partido, não é pertinente para traçarmos a narrativa biográfica do partido X ou Y?

Não que seja uma condição central para a decisão. As identidades fazemse num processo relacional com os contextos sociais, culturais, económicos, mas a sua linha ideológica construi-se neste passado. Ou não? Por outro lado, esta filiação é dificultada pelo facto de não haver um programa de formação pedagógica de filiação. O resultado é que quando pergunto a outros jovens, porque se filiaram no partido X ou Y, a grande maioria assenta os seus argumentos em critérios pouco concretos, e por conseguinte, nada convincentes, para quem procura construir os sentidos da sua filiação. Estes, raramente conhecem a biografia do partido que defendem e mais ainda não se mostram interessados numa discussão crítica sobre o processo de filiação. Não será do interesse dos partidos a promoção de um processo de filiação pedagógica? Isto é, que os seus afiliados conquistem este estatuto ou papel porque tiveram oportunidade de criar laços genealógicos com o partido? Haverá espaço para participação crítica dos jovens na vida política partidária em Cabo Verde? Se não, porque somos sempre confrontados com este discurso que devemos participar mais? Porque nos descarregam nos ombros este papel de responsáveis pelo futuro do país? Pode-se responder a estas questões com o argumento de que não é do interesse dos partidos políticos que exista este programa de formação, já que a estratégia é a de promover uma filiação cega. A cegueira, na participação, confere maiores legitimidades ao partido para falar em nome dos seus afiliados. Como me disse um jovem, é uma estratégia de maximização dos potenciais filiados, que não cria espaços de possibilidade para um relacionamento tensional. Não é do interesse dos partidos que existem laços pendulares, que conduza a uma saída sem máculas, do afiliado. É compreensível que os partidos, enquanto grupo, se construam com base na confiança, mas terá este jovem razão?

Com base neste meu olhar, não tenho participação na vida politica partidária do país, porque não tenho esta relação de filiação com nenhum partido politico cabo-verdiano. Não tenho referências, não possuo laços que me permitam filiar. Para mim filiação, que permita entrega, defesa ideológica e partilha dos mesmos ideais, não se faz do dia para noite e nem porque fulano é do partido X então serei do partido X ou Y. Eu preciso que a minha caminhada de filiação, seja orientada, desde o início, por outros, que chegaram antes. Os partidos políticos não fazem isto. Necessito que esta seja uma filiação pedagógica para que resulte numa relação consciente. Mas não poderei filiar-me a partir de juramentos de lealdade cega, afinal de contas as nossas filiações, com excepção das familiares, raramente são eternas e acríticas. Os meus posicionamentos podem ser lidos a partir da ideia de que muitos jovens não querem envolver-se na vida politica cabo-verdiana, por não acreditarem na política ou porque vivem este momento biográfico com grande dependência em relação aos outros, quando devem tomar as rédeas do país. Se não se fizer um mapeamento destes que se declaram não alinhados com a participação política partidária, antes destes olhares sobre os jovens e a vida política, se reproduzirá a ideia cristalizada de que os jovens devem ser revolucionários. O futuro constrói-se hoje, mas não sou apologista da fácil relação que se faz entre jovem e mudança, como se a identidade política do jovem seja o resultado natural da ligação lógica entre o seu momento biográfico e a revolução. Acho que nem todos cabem dentro desta interligação. Não existe nada de expectável e de naturalizado nesta relação.

Jornal A Nação/ Nº377. De 20 a 16 de Novembro.

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.