POSSE AGROECOLÓGICA E A PROTEÇÃO SOCIOAMBIENTAL NA JURISPRUDÊNCIA DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS: REPENSANDO CONCEITOS

June 19, 2017 | Autor: Rafaela Sena Neves | Categoria: Direitos Humanos, Direito Internacional dos Direitos Humanos
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2. POSSE AGROECOLÓGICA E A PROTEÇÃO SOCIOAMBIENTAL NA JURISPRUDÊNCIA DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS: REPENSANDO CONCEITOS ANA LUISA SANTOS ROCHA Universidade Federal do Pará (UFPA) - Mestranda em Direitos Humanos pelo Programa de Pós-Graduação em Direito RAFAELA TEIXEIRA NEVES Universidade Federal do Pará (UFPA) - Mestranda em Direitos Humanos pelo Programa de Pós-Graduação em Direito

1. INTRODUÇÃO A compreensão da situação em que se encontram a defesa ambiental e o reconhecimento dos direitos dos Povos Tradicionais, a partir da aplicação especial dos direitos humanos, insta, antes de tudo, que sejam considerados, para além das normas legais, o contexto político e as peculiaridades e características próprias desses povos, especialmente na Amazônia. A historicidade da região amazônica é marcada pela exclusão, desigualdade social e degradação ambiental, todavia, com a presença maciça do Estado, mediante grandes ações voltadas para a realização de projetos desenvolvimentistas que, além de não proporcionarem o real desenvolvimento para a região, não respeitam o meio ambiente nem a sociodiverdisidade existente, ensejando conflitos fundiários e socioambientais. A corrida pelo acesso à terra e aos recursos naturais põe frente a frente atores sociais com objetivos totalmente distintos. A Amazônia, enquanto fonte de recursos ambientais com altíssimo valor de mercado, é o centro de inúmeros conflitos provocados pela incompatibilidade entre os interesses das populações tradicionais e dos pequenos posseiros que nela habitam e os interesses mercadológicos de grandes empresas mineradoras e hidrelétricas, além de madeireiros, pecuaristas, dentre outros. Nesse sentido, os instrumentos e institutos jurídicos que concedam direitos às populações tradicionais são de extrema importância, especialmente aqueles relacionados ao direito à terra, à moradia e à reprodução cultural. São esses institutos que serão analisados na presente tese. Em um primeiro momento, analisar-se-á quem são os povos tradicionais, sem propor uma conceituação específica, mas apenas situando a questão.

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Posteriormente, será visto o instituto da posse agroecológica, como modalidade de apossamento coletivo que legitima direitos para as populações tradicionais. Serão analisados também o funcionamento do Sistema Interamericano de Direitos Humanos e o modo como este reconhece e ventila os mesmos elementos reivindicados por outras comunidades, especialmente os elementos territoriais e culturais, a partir de decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Por fim, propõe-se um diálogo entre esses instrumentos, a fim de reafirmar a concretização dos direitos humanos às populações tradicionais.

2. CONSTRUINDO O CONCEITO DE POVOS TRADICIONAIS Enquanto categoria jurídica, o termo de textura aberta “povos tradicionais” é tratado pela Convenção 169 da OIT1021 como sinônimo de indígenas e tribais. Aliás, tal convenção, em seu primeiro artigo, busca apresentar os critérios relevantes para essa identificação, demonstrando a distinção essencial e necessária, do ponto de vista internacional, entre comunidades indígenas e comunidades tribais. Considerando o exposto, uma comunidade tribal consiste em uma comunidade não indígena, caso levada em consideração a região que esse povo habita. Contudo, trata-se de comunidades que possuem muitas características similares com as apresentadas pelos povos indígenas, como: as tradições sociais, culturais e econômicas que os diferem do restante da comunidade nacional, a identificação com seu território ancestral, e uma regulação, ao menos parcial, com base em seus próprios costumes, normas e tradições1022. No Brasil, entretanto, diante da sociodiversidade que o consagrou como um Estado pluriétnico e multicultural, através do reconhecimento extraído dos ditames da Constituição da República de 1988, os povos tradicionais incluem não somente os povos indígenas e tribais, mas também os ribeirinhos, os quilombolas, as comunidades locais, dentre outras populações que se assemelham entre si pelo seu modo de vida, isto é, pela íntima relação que mantêm com o ambiente natural, materializada através de tradições, costumes, cultura e religiosidade, que compõem a sua identidade. Em outras palavras, os direitos reconhecidos a uma categoria jurídica se aplicam às demais. É possível perceber que a Convenção 169 da OIT somente considera os indígenas e tribais como povos tradicionais, daí porque se faz necessário utilizar a explicação de Marina Osmarina Silva1023, que diz:

1021 OIT. Organização Internacional do Trabalho. Convenção nº169 sobre povos indígenas e tribais e Resolução referente à ação da OIT/Organização Internacional do Trabalho. Brasília. 2011, p.15. 1022 CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. 2007.Sentença de 28 de novembro. Case Saramaka vs. Suriname, par. 79. 1023 SILVA, Marina Osmarina. Saindo da Indivisibilidade – a política nacional de povos e comunidades tradicionais. Brasília: Inclusão social, v. 2, n. 2, 2007, p. 8.

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“(..) são populações que se definem pelo uso sustentável da terra, pelo destino da sua produção e o seu vínculo territorial, incluindo sua situação fundiária, pela importância que os ciclos naturais têm nas suas práticas produtivas, pelo uso comunitário dos mesmos, pelo seu conhecimento profundo do ecossistema no qual vivem e pelo uso de tecnologias de baixo impacto ambiental, por sua organização social, na qual a família extensa representa papel importante, também por suas expressões culturais e as inter-relações com outros grupos da região”.

Daí porque, por possuírem uma relação ímpar com o ambiente natural em que habitam, entende-se que há aqui um direito de territorialidade1024, pois esse território é muito mais que uma propriedade com cunho meramente pecuniário. O território dos povos tradicionais é parte integrante da sua identidade, por envolver mais do que as relações sociais ou os manejos de sobrevivência, representando – e identificando - sua cultura, religião, espiritualidade, isto é, o seu “sagrado”. As comunidades possuem verdadeiras representações simbólicas1025 com esse espaço. Sendo assim, o território pode ser interpretado como um bem cultural, resignificando, a partir do apossamento coletivo que marca o modo de vida desses povos, o próprio direito de propriedade. Será tratado assim, o modelo de ocupação coletiva e comunitária pelo qual as populações tradicionais amazônicas se reproduzem social e culturalmente.

3. POSSE AGROECOLÓGICA: (RE)PENSANDO CONCEITOS A realidade sociocultural, ao lado da evolução história do acesso à terra e aos recursos naturais na Amazônia, contribuíram para o surgimento de uma modalidade de apossamento distinta e incompatível com concepções civilistas tradicionais da posse. As definições clássicas elaboradas por Savigny e Ihering – teoria subjetiva e teoria objetiva da posse, respectivamente – não respondem às demandas sociais de um país marcado por inúmeros conflitos fundiários.Ihering e Savigny desenvolveram concepções possessórias em função da propriedade1026, isto é, nenhuma dessas teorias concede à posse um valor independente do direito de propriedade. O próprio Código Civil Brasileiro, nos arts. 1.196 e 1.204, define possuidor e posse em razão dos poderes inerentes à propriedade, além de não a proteger 1024 Juliana Santilli aponta que a territorialidade tem sido considerada por estudos antropológicos como fator fundamental na identificação das populações tradicionais. In: Socioambientalismo e novos direitos:Proteção jurídica à diversidade biológica e cultural, São Paulo: Editora Pierópolis, 2005, p. 138. 1025 DIEGUES, Antonio Carlos. O Mito Moderno da Natureza Intocada. São Paulo: HUCITEC, 1998, p. 49. 1026 MATTOS NETO,Antonio José de. Estado de direito agroambiental brasileiro. São Paulo: Saraiva. 2010. p. 44.

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como um direito real. Em verdade, a posse deve ser encarada como o elemento fundamental e legitimador da propriedade1027. A posse representa, ante o dever constitucional que exige o cumprimento da função social da propriedade1028, o uso social do bem. Ao se exercer a posse, aplicando utilidade social ao bem, legitima-se o direito de propriedade. A necessidade de reconhecer o papel fundamental da posse se justifica em razão da contradição existente no sistema jurídico brasileiro: de um lado, a Constituição Federal estabelece a função social da propriedade como um dever (art. 5º, XXIII); do outro, o Código Civil enumera o uso como uma faculdade do proprietário (art. 1.228)1029. Desenvolve-se, assim, em Direito Agrário, o conceito de posse agrária. Na posse agrária, ao contrário da visão mais individualista da clássica posse civil, valoriza-se o trabalho humano exercido sobre a terra. Legitima-se não só o direito de propriedade, como também o direito à moradia, ao trabalho e à reprodução cultural. Nesse sentido, ensina Antônio José de Mattos Neto: “Em vias do processo de socialização do Direito, o Direito Agrário elege como valor maior a atividade agrária (o trabalho) que o homem empreende na terra. Valoriza-a mais que o simples domínio. Desta maneira, o Direito Agrário orienta-se no sentido de reconhecer a posse àquele que, no plano dos fatos, labuta a terra, explorando-a economicamente1030”.

Na posse agrária, o elemento subjetivo, o animus, é representado pela vontade do possuidor de trabalhar a terra, e não necessariamente de se tornar o proprietário. O imóvel em que se exerce a posse é tido como um lugar de resistência, onde o possuidor pode viver dignamente com sua família. O elemento objetivo, o corpus, é demonstrado pela relação direta e física entre o possuidor e o local onde vive; há uma relação direta entre o homem e a terra. Pode se expressar, por exemplo, pelos atos materiais de produção empreendidos no local objeto da posse. Embora o conceito de posse do Direito Agrário possua intrinsecamente um viés social, ainda não é suficiente para explicar ou ser aplicado aos fenômenos possessórios específicos da Amazônia. As populações tradicionais que habitam a Amazônia, como ribeirinhos, remanescentes de povos quilombolas, castanheiros,

1027 ROCHA, Ibraim; TRECCANI, Girolamo Domenico; BENATTI, José Heder; HABER, Lilian Mendes; CHAVES, Rogério Arthur Friza. Manual de Direito Agrário Constitucional: lições de Direito Agroambiental. Belo Horizonte: Editora Fórum. 2010, p. 71. 1028 Art. 5º, inciso XXIII, da Constituição Federal de 1988. 1029 ROCHA, I. et al., ibidem, p. 75. 1030 MATTOS NETO, ibidem, p. 46.

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seringueiros, dentre outros, desenvolveram uma forma própria de apossamento coletivo da terra e dos recursos naturais: a posse agroecológica1031. O campesinato amazônico é marcado por grande diversidade cultural, onde as populações tradicionais desenvolveram suas próprias técnicas de relação com a terra e com o meio ambiente, fortemente influenciada pela cultura indígena. Benatti1032 se refere ao século XVIII, como sendo o período de formação do “caboclo amazônico” no contexto das políticas pombalinas para a Amazônia, da expulsão dos missionários e da miscigenação entre colonos, povos indígenas e negros. A questão da terra na Amazônia é marcada por um grave histórico de conflitos e violência no campo, além de registrar altos índices de degradação ambiental. Paralelamente, observa-se um verdadeiro caos fundiário, onde os Poderes Públicos federal e estadual não possuem pleno conhecimento sobre quais terras são públicas, quais estão sob o domínio particular de forma regular, e quais representam a grilagem1033, isto é, quais terras públicas foram indevidamente apropriadas por particulares. Sobretudo após a década de 70, com a militarização da questão agrária na Amazônia, o modelo de apossamento das populações tradicionais passou a ser intensamente desafiado pelos modelos de produção e crescimento econômicos introduzidos na região e pela valorização da terra como bem especulativo. Os povos da floresta na Amazônia nasceram como meros ocupantes, sem possuir quaisquer títulos de domínio, o que os torna extremamente vulneráveis no momento em que a Amazônia se torna grande reserva de valor comercial. É por isso que a estruturação do conceito de posse agroecológica se torna uma bandeira política no processo de disputa pela terra na Amazônia: “É a partir de 1970 que a posse agroecológica começa a se consolidar politicamente e os camponeses iniciam a reivindicação de seus direitos em defesa de seu apossamento. Isto ocorre quando se vêem ameaçados por outros grupos sociais que tem uma relação diferente com a terra. O convívio dessas duas concepções é incompatível no mesmo espaço físico, pois uma terá que desaparecer para que a outra se consolide. Nessa situação, o conflito se torna intenso e violento, já que o objeto da disputa é o mesmo, porém com destinações bem distintas1034”.

A posse agroecológica tem como um dos principais elementos 1031 Conceito desenvolvido por José HederBenatti. In: agroecológica e manejo florestal. Curitiba: Juruá. 2003. 1032 BENATTI, ibidem, p. 100. 1033 Conforme ressaltam Brenda Brito e Paulo Barreto, o relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito do Congresso Nacional, finalizado em 2001, sobre a ocupação de terras públicas na Amazônia, apontou os diversos casos de irregularidades e falsificações em registros de imóveis (In: A regularização fundiária avançou na Amazônia?Os dois anos do programa Terra Legal. Belém: Imazon, 2011, p. 39). 1034 BENATTI, op. cit., p. 110.

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caracterizadores um apossamento coletivo ao lado do trabalho familiar baseado no agroextrativismo. Conjuga-se, assim, uma forma familiar de apossamento com uma posse coletiva. Seringueiros, ribeirinhos, castanheiros, comunidades remanescentes de quilombos, dentre outros, a partir de um regime pautado na solidariedade do grupo, consolidaram um modelo de posse coletiva inovador na estrutura agrária brasileira. Esse modelo se constitui em um espaço não só social como também ecológico. Para Benatti, “a posse agroecológica é, fisicamente, a somatória dos espaços familiares e das áreas de uso comum da terra”1035. Ao lado de um espaço de influência de cada família, seja para pequeno cultivo, seja para moradia, existe ainda um espaço comum, onde a comunidade pode usufruir dos recursos naturais, principalmente para atividades extrativistas sustentáveis. Um fator marcante, que na verdade constitui um plus em relação à posse agrária, é que, na posse agroecológica, destaca-se o papel das populações tradicionais na conservação de recursos naturais. Sua forma de organização social e cultural permite e regula de forma sustentável o acesso ao meio ambiente de forma sustentável1036. Nesse sentido, Ibraim Rocha et. al.1037tratam da posse agroecológica como “uma especial forma de relação com a terra, que compatibiliza a posse e as restrições em defesa do meio ambiente, pois toma por uso comum determinados bens ambientais com práticas de manejo que permitem a sustentabilidade dos usos dos recursos naturais”. Como exemplo de comunidades tradicionais amazônicas que desenvolveram essa forma de apossamento coletivo, Benatti cita a posse dos remanescentes de quilombos e dos seringueiros1038. Diante das abordagens acima elencadas, resta claro como o reconhecimento do modelo de posse agroecológica representa a concretização dos direitos humanos das populações tradicionais, visto que, ao lado do conceito de territorialidade, as questões ambientais, juntamente com a questão agrária, revelam-se dinamicamente interligadas aos fatores étnicos e afirmativos da identidade desses povos1039. Daí porque cabe agora analisar como esses elementos são também ventilados e levados em consideração na definição do direito de propriedade nos casos submetidos a julgamento pela Corte Interamericana de Direitos Humanos. 1035 BENTATTI, ibidem, p. 113. 1036 Segundo Diegues, isso contraria a Teoria da “Tragédia dos Comuns”, formulada por Hardin (1968), no sentido de que a propriedade comum causaria uma rápida degradação ambiental. In: DIEGUES, op. cit., p. 40. 1037 ROCHA, Ibraim; TRECCANI, Girolamo Domenico; BENATTI, José Heder; HABER, Lilian Mendes; CHAVES, Rogério Arthur Friza. Manual de Direito Agrário Constitucional: lições de Direito Agroambiental. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2010, p. 87. 1038 BENATTI, op. cit., p. 118 e p. 122. 1039 ALMEIDA, Alfredo Wagner Berno de. Amazônia: a dimensão política dos “conhecimentos tradicionais” como fator essencial de transição econômica – pontos resumidos para uma discussão. Somanlu, ano 4, n. 1, jan./jun. 2004, p. 21.

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4. A FUNCIONALIDADE DO SISTEMA INTERAMERICANO DE TUTELA DE DIREITOS HUMANOS: ENTRE CONVENÇÃO, COMISSÃO E CORTE Para que se possa relacionar o conceito de posse agroecológica com o entendimento jurisprudencial estabelecido pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, faz-se necessário, antes, o entendimento da funcionalidade e modus operandi da tríade sustentatória do Sistema Interamericano de Direitos Humanos (SIDH): (a) Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH); (b) Comissão Interamericana de Direitos Humanas (CIDH) e, por fim, a (c) Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH). Foi baseado na ideia de que a proteção dos Direitos Humanos não deve se reduzir à soberania de um Estado que a noção tradicional de soberania estatal sofreu (e sofre) um processo de relativização em detrimento da admissão de intervenções internacionais em prol da proteção dos direitos humanos. No entendimento de Roberto Taiar, houve a inclusão da “(...) dignidade da pessoa humana como característica inerente ao conceito de soberania”1040, e o SIDH surgiu como sistema normativo que internacionaliza as temáticas humanas no plano regional. Aliás, tal Sistema também funciona como complemento jurídico ao Sistema Global de Proteção dos Direitos Humanos. Nos dizeres de Flávia Piovesan, “(...) os sistemas global e regional não são dicotômicos, mas, ao revés, são complementares. Inspirados pelos valores e princípios da Declaração Universal, compõem o universo instrumental de proteção dos direitos humanos, no plano internacional”1041. O SIDH tem a CADH como seu principal instrumento. Foi assinada na Costa Rica, em San José, no ano de 1969, sendo que somente em 1978 passou a entrar em vigor, reconhecendo e assegurando direitos civis e políticos, além de estabelecer “um aparato de monitoramento e implementação dos direitos que enuncia (...) que é integrado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Interamericana”1042. No que tange à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), a sua principal função é promover a observância e a proteção dos Direitos Humanos na América, por isso, é considerada como um órgão conciliador, assessor, crítico e legitimador desta proteção. Tem sua normatividade advinda da CADH e da Carta da OEA e, segundo Maria Galli e Ariel Dulitzky, “(...) é um órgão central da Organização dos Estados Americanos (OEA) na supervisão e monitoramento do grau de cumprimento 1040 TAIAR, Rogerio. Direito internacional dos direitos humanos: uma discussão sobre a relativização da soberania em face da efetivação da proteção internacional dos direitos humanos. São Paulo: MP Editora, 2010.p.308 1041 PIOVESAN, Flávia. Introdução ao Sistema Interamericano de proteção dos direitos humanos: a Convenção Americana de Direitos Humanos.In GOMES, Luiz Flávio; PIOVESAN, Flávia (coord). São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000.p.20. 1042 Ibidem, p.33.

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das obrigações internacionais pelos Estados-membros em matéria de direitos humanos no âmbito regional”1043. Além disso, é pela CIDH que as denúncias são recebidas e protocoladas perante o SIDH, tendo em vista que é somente pela Comissão que um caso pode chegar a ser julgado e condenado pela Corte IDH. A Corte IDH se diferencia da CIDH por dois principais motivos: (1) o primeiro consiste na sua função contenciosa, ou seja, é, a Corte IDH, o órgão julgador do SIDH, que, ao verificar a violação de direitos humanos e comprovar sua competência em razão das partes, do objeto da denúncia e do tempo, pode responsabilizar internacionalmente aquele Estado que ratificou e reconheceu sua jurisdição; já o (2) segundo motivo consiste na sua função consultiva, pois o único órgão competente para interpretar a CADH e emitir pareceres, ou melhor, opiniões consultivas com efeito vinculante, é a Corte IDH. Insta aduzir que, por mais que a Corte IDH seja o órgão com função jurisdicional do SIDH, não se pode afirmar (para um melhor entendimento do próprio sistema) que seja superior à CIDH e, assim, subjugar as funções desta última, pois, em que pese se tratar de um sistema de proteção individual, o indivíduo não tem capacidade processual autônoma para litigar diretamente perante a Corte; logo, é imprescindível a relatoria dos casos pela CIDH. Ademais, no âmbito da sua função conciliadora, todas as atitudes de um Estado denunciado perante à CIDH são levadas em consideração no seu julgamento na Corte IDH. Daí porque o entendimento vigente é que os Estados-Parte que ratificaram a CADH reconhecem a competência e o poder jurisdicional da Corte IDH, e assumiram o compromisso de promover a proteção dos direitos humanos, devem respeitar e obedecer todos as normas imperativas de direito internacional, ou seja, as normas jus cogens, pois, conforme explica Flávia Piovesan, “é como se o Direito Internacional fosse transformado em parâmetro de validade das próprias Constituições nacionais (cujas normas passam a ser consideradas nulas se violadoras das normas do jus cogens internacional)”1044.

5. (DES)CONSTRUINDO O ENTENDIMENTO DE PROPRIEDADE NA JURISPRUDÊNCIA DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS Da simples leitura do artigo 21, é possível constatar que a CADH não menciona expressamente a propriedade relativa aos povos tradicionais, pois tal artigo somente faz uma abordagem genérica acerca do direito de propriedade, a saber: “Direito à propriedade privada: 1. Toda pessoa tem direito ao uso e gozo de seus bens. A lei

1043 GALLI, Maria Beatriz e DULITZKY, Ariel E. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos e o seu papel central no sistema interamericano de proteção dos direitos humanos. In GOMES, Luiz Flávio; PIOVESAN, Flávia (coord). São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000.p.54. 1044 PIOVESAN, op. cit.,2011, p.106.

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pode subordinar esse uso e gozo ao interesse social. 2. Nenhuma pessoa pode ser privada de seus bens, salvo mediante o pagamento de indenização justa, por motivo de utilidade pública ou de interesse social e nos casos e na forma estabelecidos pela lei. 3. Tanto a usura, como qualquer outra forma de exploração do homem pelo homem, devem ser reprimidas pela lei1045”.

Entretanto, por se tratar de povos tradicionais, tal artigo deve ser analisado para além do texto, tendo em vista que, por possuírem, esses povos, uma relação ímpar com o ambiente natural em que habitam, entende-se que “território” é muito mais que uma propriedade com cunho meramente pecuniário, por constituir parte integrante da sua identidade e envolver mais do que as relações sociais ou manejos de sobrevivência, e sim representar – e identificar - sua cultura, religião, espiritualidade, isto é, o seu “sagrado”. Nesse sentido, a Corte IDH vem se posicionando a favor de um direito de propriedade de interpretação extensiva, por entender a intrínseca ligação desenvolvida pelos povos tradicionais com os territórios que tradicionalmente ocupam e habitam. A Corte IDH, inclusive, já se posicionou no sentido de interpretar o artigo 21 da CADH “(...) à luz do contexto próprio das comunidades tradicionais, bem como de outras normas internacionais, como a Convenção n. 169 da OIT – como direito comunal ou coletivo desses povos”1046. A interpretação extensiva da Corte IDH não se exaure aí, pois esta egrégia Corte entende que o conceito de propriedade é amplo, abarcando tanto as coisas apropriáveis, como também todo direito e interesse integrantes do patrimônio de uma pessoa1047, ou seja, a propriedade deve ser considerada de maneira autônoma, e não restritiva, devendo-se valer de todos os instrumentos legais à sua disposição para garantir a proteção das mencionadas comunidades, tendo em vista os prejuízos sociais, ambientais e econômicos que elas vêm enfrentando1048. Feito isto, passar-se-á, agora, a uma análise de casos já julgados pela Corte IDH, nos quais fica clara (e mais justificada) a interpretação extensiva acerca do direito à propriedade proposta pela própria Corte.

1045 OEA. Convenção Americana de Direitos Humanos. Pacto San José da Costa Rica. Disponível: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D0678.htm. Acesso em: 10 nov2013. 1046 AIDA. Guia de Defesa Ambiental: Construindo a Estratégia para o Litígio de Casos diante do Sistema Interamericano de Direitos Humanos. [S.l]: [s.n], 2010, p. 88. 1047 CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. 2008.Sentença de 06 de maio. Caso Salvador Chiriboga vs. Equador.Par.55; 2007.Sentença de 21 de novembro. Caso Chaparro Álvarez y LapoÍñiguez vs. Equador. Par. 174; 1048 CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS.2005.Sentença de 15 de junho. Caso Comunidade Moiwana vs. Suriname.

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5.1 Caso Saramaka vs. Suriname No presente caso, as vítimas solicitaram à Corte IDH a responsabilização internacional do Estado do Suriname, por não promover o reconhecimento ao uso e ao gozo do território ocupado e usado tradicionalmente pela comunidade Saramaka, além de ter violado o direito à proteção judicial, ao não oferecer um recurso efetivo para a proteção judicial aos direitos fundamentais da Comunidade Saramaka, em especial, o direito de possuir propriedade de acordo com suas tradições comunais. Diante disso, a Corte IDH entendeu que a comunidade Saramaka, apesar de não ser indígena, possuía uma ligação intrínseca com o seu território, uma espécie de ligação espiritual, e que, dessa forma, a terra ancestral possuía um papel de extrema importância para sua própria sobrevivência, uma vez que se apresentava como uma fonte necessária à continuação da vida e da identidade cultural dos membros daquela comunidade1049. Entretanto, Corte IDH ainda se manifestou no sentido de que, por mais que se reconheçam todas as especificidades da relação entre os povos tradicionais e suas terras, o uso e o gozo destas poderão sofrer limitações, visto que o direito de propriedade não é absoluto. Mas essa restrição somente será autorizada quando não implicar na completa denegação da existência desses povos, ou seja, “(...) em relação às restrições ao direito dos povos indígenas e tribais, especialmente o uso e aproveitamento da terra e dos recursos naturais que possuem tradicionalmente, um fator importante a se considerar, é se a restrição e esse uso implicarão na negação de tradições e costumes de modo que se coloque em risco a própria sobrevivência do grupo e seus membros. Ou seja, nos termos do artigo 21 da Convenção, o Estado poderá restringir o direito dos indígenas Saramakas a usar e gozar de suas terras, que tradicionalmente são titulares, e os recursos naturais que nelas estão disponíveis somente quando a restrição cumprir com os requisitos mencionados e também quando não implique na negação à sobrevivência como um povo tribal1050”.(Tradução Livre)

1049 CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. 2007.Sentença de 28 de novembro. Case Saramaka vs. Suriname.Pars. 78 e 79 1050 Original: Adicionalmente, respecto de las restricciones sobre el derecho de los miembros de los pueblos indígenas y tribales, en especial al uso y goce de las tierras y los recursos naturales que han poseído tradicionalmente, un factor crucial a considerar es también si la restricción implica una denegación de las tradiciones y costumbres de un modo que ponga en peligro la propia subsistencia del grupo y de sus integrantes. Es decir, conforme al artículo 21 de la Convención, el Estado podrá restringir el derecho al usko y goce de los Saramaka respecto de las tierras de las que tradicionalmente son titulares y los recursos naturales que se encuentren en éstas, únicamente cuando dicha restricción cumpla con los requisitos señalados anteriormente y, además, cuando no implique una denegación de su subsistencia como pueblo tribal. (par 120122). Cfr., e.g. Comité de Derechos Humanos de las Naciones Unidas, Länsman y otros vs. Finlandia(quincuagésima segunda sesión, 1994), Comunicación No. 511/1992, ONU Doc. CCPR/ C/52/D/511/1994, 8 de noviembre de 1994, párr. 9.4 (permitiendo que los Estados lleven a cabo actividades de desarrollo que limiten los derechos de una minoría cultural, siempre y cuando

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Quanto aos requisitos mencionados no excerto, são eles: (1) as restrições devem ter sido previamente estabelecidas em lei; (2) devem ser necessárias; (3) proporcionais e (4) devem ter como finalidade um objetivo legítimo em uma sociedade democrática. Neste caso, a Corte ainda levou em consideração o fato de o Estado ter a obrigação de consultar os povos tradicionais e de obter o consentimento deles: “Em primeiro lugar, a Corte declarou que, para garantir a participação efetiva dos membros do povo Saramaka em planos de investimento ou desenvolvimento no seu território, o Estado tem o dever de consultar efetivamentea comunidade de acordo com seus costumes e tradições (supra par. 129). Este dever exige que o Estado aceite e divulgue informações, e implica na comunicação constante entre as partes. Essas consultas devem ser feitas de boa-fé, mediante procedimentos apropriados e deve procurar chegar a um acordo.1051 “(Tradução livre)

5.2 Caso Comunidade Moiwana vs. Suriname No Caso Comunidade Moiwana Vs. Suriname, a Corte se posicionou no sentido de que, em se tratando de comunidades tribais, ou seja, não indígenas, em virtude de sua ancestralidade e suas práticas consuetudinárias na terra, bastaria que os integrantes da comunidade tivessem a posse do bem para que os mesmos fossem considerados proprietários da terra1052. A Corte IDH levou em consideração o sofrimento pessoal ocasionado pelo afastamento de suas terras e a impossibilidade de realizar seus rituais para os falecidos no massacre, além da separação dos membros de sua comunidade.

6. O DIÁLOGO ENTRE POSSE AGROECOLÓGICA, CORTE IDH E O SOCIOAMBIENTALISMO A Constituição Federal de 1988 inaugurou um novo momento no constitucionalismo nacional. Nessa nova era, destaca-se a proteção concedida ao meio ambiente e ao patrimônio cultural do país. Trata-se de uma proteção que dicha actividad no extinga por completo el modo de vida del pueblo indígena). 1051 Original: Primero, la Corte ha manifestado que al garantizar la participación efectiva de los integrantes del pueblo Saramaka en los planes de desarrollo o inversión dentro de su territorio, el Estado tiene el deber de consultar, activamente, con dicha comunidad, según sus costumbres y tradiciones (supra párr. 129). Este deber requiere que el Estado acepte y brinde información, e implica una comunicación constante entre las partes. Las consultas deben realizarse de buena fe, a través de procedimientos culturalmente adecuados y deben tener como fin llegar a un acuerdo. Cfr. Comisión Interamericana de Derechos Humanos, Informe 40/04, Fondo. Caso 12.052.Comunidades Indígenas Maya en el Distrito de Toledo, supra nota 84, párr. 142. Cfr. también, los Principio del Ecuador, Principio 5. 1052 CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. 2005. Sentença de 15 de junho. Caso Comunidade Moiwana vs. Suriname. Par. 131.

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deve ser interpretada de forma holística, especialmente quando se tem como destinatários desses direitos constitucionais as populações tradicionais. Ao expor a síntese dos ditames constitucionais socioambientais, Juliana Santilli enfatiza que os dispositivos relacionados à cultura, ao meio ambiente, aos povos indígenas e quilombolas e à função social da propriedade devem ser lidos de forma integrada, jamais fragmentada. Esses dispositivos, ao lado da força dos movimentos sociais em prol do reconhecimento dos direitos das populações tradicionais, compõem o chamado socioambientalismo brasileiro1053. A interpretação da Corte Interamericana de Direitos Humanos, nos dois casos expostos referentes ao reconhecimento de direitos de povos tribais, embora se refira ao Suriname, reflete, em sua essência, o reconhecimento do direito de pertencimento ao território e o modelo de apossamento histórico e cultural, que também são reproduzidos pelas populações tradicionais amazônicas. Nesse sentido, a análise da fundamentação da CIDH se configura como mais um instrumento de luta pelo reconhecimento dos direitos das populações tradicionais no Brasil. A afirmação do direito de reprodução física e cultural dos povos tribais no âmbito da jurisdição internacional fortalece a bandeira mobilizadora das comunidades tradicionais, favorecendo ainda a defesa de seus territórios1054e a relação especial de apossamento coletivo representada pela posse agroecológica. Essa tarefa, em prol das populações tradicionais, é primordial em um país que elege a dignidade da pessoa humana como fundamento, além de postular pela concretização de direitos sociais, culturais e ambientais. Esse é o papel de um Estado de Direito Ambiental1055, Multicultural e Pluriétnico1056.

7. CONCLUSÕES ARTICULADAS Pelo exposto, conclui-se: 7.1 Diante da sociobiodiversidade existente no Brasil e, em especial, no contexto amazônico, os povos tradicionais são categorias sociais que merecem o reconhecimento de seus direitos a partir da peculiaridade de seu modo de vida.

1053 SANTILLI, op. cit., p. 91 1054 Manuela Cunha e Mauro Almeida destacam que os direitos territoriais constituem a principal reivindicação política das populações tradicionais. (Almeida CUNHA, Manuela Carneiro da e ALMEIDA, Mauro W.B.. Populações Tradicionais e Conservação Ambiental. In: Biodiversidade na Amazônia. São Paulo: Estação Liberdade: ISA, 2001, p. 192). 1055 LEITE, José Rubens Morato e AYALA, Patrick de Araújo. Dano Ambiental: do individual ao coletivo, extrapatrimonial. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 26. 1056 PEREIRA,Deborah Macedo Duprat de Brito.O Estado Pluriétnico. In: LIMA, Antônio Carlos de Souza e HOFFMAN, Maria Barroso. Além da Tutela: bases para uma política indigenista III. São Paulo. Editora Contra Capa;2002, p.45. Disponível em: http://laced.etc.br/site/arquivos/04Alem-da-tutela.pdf. Acesso em: 5 abril 2012.

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Possuem uma relação ímpar com o ambiente em que habitam, sendo o “território” parte integrante das suas relações sociais, estratégias de sobrevivência, sua cultura, costumes, ancestralidade e identidade coletiva. Logo, a questão territorial ultrapassa a questão patrimonial, possuindo relação direta com o direito à vida e com o princípio da dignidade da pessoa humana. 7.2 Essas peculiaridades tornam a posse exercida por esses povos como distinta da posse tradicional, daí advém o conceito de posse agroecológica, como expressão do apossamento que integra tanto a posse exercida individualmente por cada família, quanto a posse exercida pelo grupo sobre as áreas destinadas principalmente para o agroextrativismo sustentável. 7.3 O SIDH visa proteger os direitos humanos com base o Princípio Pró-homine e constitui uma importante estratégia de reconhecimento de direitos para os grupos em situação de vulnerabilidade, como os povos tradicionais. Daí a necessidade de observar o entendimento da Corte IDH no que tange ao direito à terra de povos tradicionais, tendo em vista que o Brasil é signatário desse Sistema e ratificou a jurisdição da Corte IDH, devendo promover o diálogo entre os instrumentos internacionais e seus parâmetros internos. 7.4 Diante da análise dos casos já julgados pela Corte IDH que versam sobre o território dos povos tradicionais, é possível constatar que a egrégia Corte dialoga com o conceito de posse agroecológica. A Corte considera a ancestralidade e as práticas consuetudinárias na terra, bem como a posse exercida pela comunidade, como legitimadores do direito de propriedade, sendo esta sinônimo de “propriedade comunal”, pois ultrapassa o cunho material e integra a identidade dos povos. 7.5 Da noção de posse agroecológica e do entendimento retirado da jurisprudência da Corte IDH, é possível constatar que podem, estes, ser expressos no âmbito do socioambientalismo brasileiro, como interpretações aliadas aos movimentos sociais e ambientalistas que lutam pela afirmação dos direitos dos povos tradicionais. Daí porque há a necessidade de se utilizarem as diversas fontes do direito como instrumento de luta, havendo um diálogo uniforme da temática regional, que possibilita a internacionalização dessas reivindicações.

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