POSSIBILIDADES DO USO DO CINEMA PARA A CONSTRUÇÃO DOS CONCEITOS DE TERRITÓRIO E TERRITORIALIDADE EM ALUNOS DO ENSINO MÉDIO

June 6, 2017 | Autor: J. Oliveira | Categoria: Cinema, Territoriality, Ensino de Geografia, Geografia e cinema
Share Embed


Descrição do Produto

Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais – CEFET-MG Departamento de Geografia e História

POSSIBILIDADES DO USO DO CINEMA PARA A CONSTRUÇÃO DOS CONCEITOS DE TERRITÓRIO E TERRITORIALIDADE EM ALUNOS DO ENSINO MÉDIO

Belo Horizonte – Minas Gerais – Brasil 2012

João Paulo Flores de Souza João Victor Fonseca de Oliveira

POSSIBILIDADES DO USO DO CINEMA PARA A CONSTRUÇÃO DOS CONCEITOS DE TERRITÓRIO E TERRITORIALIDADE EM ALUNOS DO ENSINO MÉDIO

Relatório final de Iniciação Científica (BIC-JR) do Departamento de Geografia e História do Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais. Orientador: Matusalém de Brito Duarte. Co-orientador: Daniel Moreira de Souza

Belo Horizonte Coordenação de Geografia 2012

Ata de finalização de relatório:

Aos vinte e dois dias do mês de agosto de dois mil e doze, finalizamos o relatório referente ao projeto de pesquisa de Bolsa de Iniciação Científica Jr. da FAPEMIG, intitulado “Impacto do cinema na construção do conceito de território e territorialidade em alunos do Ensino Médio do CEFET-MG”, cujo título fora modificado para “Possibilidades do uso do cinema para a construção dos conceitos de território e territorialidade em alunos do Ensino Médio”, conforme demanda surgida no andamento do processo. Como requisito para conclusão do projeto, assinamos e encaminhamos ao DPPG/CEFET-MG, cópia impressa do relatório a seguir:

____________________________________ Matusalém de Brito Duarte (Orientador)

_______________________________________ Daniel Moreira de Souza (Co-orientador)

______________________________________ João Paulo Flores de Souza (Bolsista)

________________________________________ João Victor da Fonseca Oliveira

RESUMO

A Geografia no Ensino Médio, constantemente utiliza-se dos conceitos de território e territorialidade, seja para subsidiar o debate acerca da reordenação territorial global ou para tecer críticas à disseminação de uma “ética” neoliberal. Esses conceitos, porém, na história do pensamento geográfico, foram se metamorfoseando à medida que novas correntes de pensamento se consolidavam e se sobrepunham às precedentes. Nessas mudanças, a aparente imobilidade dos territórios se dinamiza e traz à geografia novas demandas por recursos metodológicos mais plásticos e móveis, capazes de aproximarem o ensino de geografia às novas realidades configuradas. Nesse contexto, o uso de filmes e documentários vem sendo apontado como importantes recursos audiovisuais para o ensino de conceitos e temas da geografia, principalmente para alunos do Ensino Médio. Por sua linguagem metafórica e abstrata, a problematização de filmes e documentários apresenta-se como rico recurso para o desenvolvimento da reflexão e compreensão do espaço geográfico. Sendo assim, esse projeto tem como objetivo selecionar e analisar filmes de modo a verificar sua contribuição para a apreensão dos conceitos de território e territorialidade em alunos do Ensino Médio.

Palavras-chaves: Geografia e cinema; Território; Ensino de Geografia; Área do conhecimento: 1.07.00.00-5 - Geociências

1 SUMÁRIO

1 - INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 2 1.1 - Objetivos ...................................................................................................................... 4 1.1.1 Objetivo geral ......................................................................................................... 4 1.1.2 Objetivos Específicos e Metodologia ................................................................. 4 2 - TERRITÓRIO E CINEMA ................................................................................................ 5 2.1 - As diversas acepções do conceito de território ..................................................... 5 2.3 - A relação entre ensino de Geografia e cinema para o estudo do território e da territorialidade..................................................................................................................... 16 3 - ANÁLISE DOS FILMES .................................................................................................. 18 3.1 - Território Restrito [Crossing Over] ......................................................................... 18 3.1.1 - Sinopse do filme ................................................................................................ 18 3.1.2 - Como e qual território é abordado no filme? ................................................ 18 3.1.3 - Quais questões os professores poderiam utilizar para discussão a partir do filme?.......................................................................................................................... 19 3.1.4 - Contribuições para o ensino de geografia no Ensino Médio. .................... 20 3.1.5 - Como é a relação imagética no filme com o território? .............................. 21 3.2 – O preço do amanhã (In time) ................................................................................. 21 3.2.1 - Sinopse do filme ................................................................................................ 21 3.2.2 - Como e qual território é abordado no filme? ................................................ 22 3.2.3 - Quais questões os professores poderiam utilizar para discussão a partir do filme?.......................................................................................................................... 22 3.2.4 - Contribuições para o ensino de geografia no Ensino Médio. .................... 23 3.2.5 - Como é a relação imagética no filme com o território? .............................. 24 3.2.6 - Quais os aspectos técnicos do cinema(fotografia,roteiro,figurino) se relacionam para definir o conceito de território? ...................................................... 25 3.3 – Dogville ...................................................................................................................... 25 3.3.1 - Sinopse do filme ................................................................................................ 25 3.3.2 - Como e qual território é abordado no filme? ................................................ 26 3.3.3 - Quais questões os professores poderiam utilizar para discussão a partir do filme?.......................................................................................................................... 26 3.3.4 - Contribuições para o ensino de geografia no Ensino Médio. .................... 28 3.3.5 - Quais os aspectos técnicos do cinema(fotografia,roteiro,figurino) se relacionam para definir o conceito de território? ...................................................... 28 4 - CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................... 30 5 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................. 31 ANEXO .................................................................................................................................... 32

2 1 - INTRODUÇÃO

Os conceitos de território e territorialidade são constantemente enunciados nos discursos didáticos do Ensino Médio, seja nos livros didáticos, nas diversas fontes gráficas ou até mesmo na interação entre professor-aluno. Esses conceitos são elencados e utilizados em vários momentos e temáticas do currículo de Geografia. A reordenação territorial que a globalização e as redes técnicas-informacionais bem como, a disseminação de uma “ética” neoliberal, (re)colocam essa discussão o tempo todo, demandando cada vez mais uma atualização desses conceitos. Além dessa temática mais ampla, outras como: conflitos mundiais, segregação urbana, movimentos migratórios, planejamento territorial e apropriação da natureza, povoam o universo da discussão territorial, e trazem à cena novas demandas metodológicas e didáticas por parte da relação ensino-aprendizagem em sala de aula. O Ensino de Geografia, de modo a possibilitar maiores aproximações entre aluno e realidade, precisa se apoiar em diversos recursos didáticos, sejam eles verbais, representacionais ou imagéticos. E dentre esses recursos, o uso de filmes e documentários para o ensino dessa disciplina, vem se ampliando no interior das salas de aula. Denis Zagha Bluwol, em sua dissertação de mestrado em Geografia afirma que ler um filme geograficamente é, portanto, mais do que procurar nele conteúdos comumente trabalhados por geógrafos. É entendê-lo como dotado de geograficidade. É perceber sua espacialidade e tentar desvendar seus significados (BLUWOL, 2008, p. 2).

A linguagem cinematográfica, por seu caráter visual, conciliado ao verbal, traz ao aluno um contato mais “fiel” com a realidade, em sua multiplicidade, e permite a “viagem” a espaços limitados pela questão dos recursos financeiros. Sergei Eisenstein aponta também a importância do cinema O cinema, sem dúvida, é a mais internacional das artes. Não apenas porque as plateias de todo o mundo veem filmes produzidos pelos mais diferentes países e pelos mais diferentes pontos de vista. Mas particularmente por que o filme, com suas ricas potencialidades técnicas e sua abundante invenção criativa, permite estabelecer um contato internacional com as ideias contemporâneas (EISENSTEIN, 2002, p. 11).

Muitas vezes, porém, os recursos utilizados para o acesso ao conhecimento se limitam ao verbal, desconsiderando as múltiplas inteligências e a riqueza do discurso metafórico no desenvolvimento da abstração, tão importantes para o desenvolvimento da reflexão geográfica. Por outro lado, o alto caráter metafórico, às vezes realístico dos filmes, traz consigo a necessidade da problematização em sala de aula, para que o uso do recurso

3 não se restrinja simplesmente à assimilação vertical, que pode ampliar aspectos ideologicamente negativos. A proposta de inserção do cinema, e de demais recursos de apelo metafórico, demanda um tratamento didático-processual bastante cuidadoso e atento, que deve fazer parte do planejamento dos profissionais da educação envolvidos. Categorias de análise geográficas, como Paisagem, Lugar, Fronteira, dentre outras, são bastante representativas no audiovisual. Além do mesmo ser uma ótima maneira de trabalhar conceitos, este serve também como interpretação e observação textual e/ou imagética, para que o aluno consiga abstrair a linguagem cinematográfica junto a sua realidade espacial. Os conceitos de território e territorialidade, pelos motivos apontados no início deste projeto, aparecem de várias formas nos discursos geográficos. Na história do pensamento geográfico, esses conceitos foram se metamorfoseando à medida que novas correntes de pensamento foram se consolidando e se sobrepondo às precedentes. Dessa forma, a cristalização do conceito de território enquanto espaço físico delimitado por relações de poder, ganha uma dinâmica muito diferente na contemporaneidade que precisa ser considerada e trabalhada com os alunos, de modo a aproxima-los da realidade de forma mais coerente e atual. Pela dinâmica que esses conceitos ganham nas atuais correntes de pensamento da geografia, é preciso buscar metodologias e materiais didáticos cada vez mais diversos, sendo o cinema uma das mais importantes de suas formas. Segundo Bluwol O cinema é um exemplo de representação que é criada no interior da espacialidade contemporânea e ajuda a criar a espacialidade do mundo em que vivemos, até mesmo alterando a leitura que possuímos do mundo objetivo e interferindo na forma que o criamos (o transformamos). Sua importância é ainda aumentada por sua presença maciça na cultura do século XX e deste início do século XXI (BLUWOL, 2008, p. 20).

São diversas as contribuições para se pensar o cinema na geografia. O cinema traz consigo a paisagem fílmica, o recurso à profundidade de campo, os movimentos de câmera, a sequência de planos e de transformações e a iluminação, que funcionam como signos dinâmicos ricos de significados territoriais. Esses recursos, se bem explorados, poderão contribuir para leituras das territorializações e desenvolvimento de conhecimentos dos alunos do Ensino Médio. Com base nesse contexto é que se estrutura esse projeto, que pretende verifica a possibilidade do uso de alguns filmes no ensino de Geografia, de modo a possibilitar um avanço na apreensão dos conceitos de território e territorialidade em alunos do Ensino Médio.

4

1.1 - Objetivos

1.1.1 Objetivo geral O objetivo geral dessa pesquisa é selecionar e avaliar filmes, de modo a verificar a possibilidade do uso dos mesmos no ensino de Geografia, de modo a possibilitar um avanço na apreensão dos conceitos de território e territorialidade em alunos do Ensino Médio. Para isso uma ampla bagagem teórica foi percorrida, de modo a subsidiar as leituras feitas pelos bolsistas envolvidos. Inicialmente o objetivo era avaliar a eficácia dos filmes em alunos do CEFET, mas devido problemas ao longo do projeto (mudança de bolsista; desinteresse e desmobilização dos alunos convidados, etc.), reformulamos o projeto para a análise dos filmes sem participação de público externo.

1.1.2 Objetivos Específicos e Metodologia

Para o alcance do objetivo geral, alguns objetivos específicos/metas foram percorridos pelos bolsistas: 

Primeiramente os bolsistas tiveram contato com bibliografia a respeito da evolução do conceito de território, de modo a construir o capítulo teórico sobre tal conceito em suas diversas matizes.



Em seguida os alunos pesquisaram a importância do cinema para o Ensino de Geografia.



Outras etapas importantes foram a seleção, exibição e análise dos filmes, a partir da diversidade dos conceitos de território.



Por fim, foram construídas análises técnicas e pedagógicas dos filmes selecionados para uso de professores do Ensino Médio.

5 2 - TERRITÓRIO E CINEMA

2.1 - As diversas acepções do conceito de território

De acordo com o senso comum, podemos definir território como uma parte do espaço geográfico delimitada e sobre posse de um ser vivo, ou seja, como espaço pertencente á alguém ou a mais de uma pessoa. Ao afirmamos que o território é certa área delimitada a alguém podemos dizer que uma área não pertencente a alguém é denominada de espaço, estando sujeito a estar largado no meio ou sofrendo interação do mesmo. Ao buscarmos a palavra território nos sites de busca podemos encontrar definições como: área delimitada sob a posse de um animal, de uma pessoa (ou grupo de pessoas), de uma organização ou de uma instituição. O termo é empregado na política (referente ao Estado Nação, por exemplo), na biologia (área de vivência de uma espécie animal) e na psicologia (ações de animais ou indivíduos para a defesa de um espaço, por exemplo). Há vários sentidos figurados para a palavra território, mas todos compartilham da ideia de apropriação de uma parcela geográfica por um indivíduo ou uma coletividade e etc. (http://territoriosertaodosaofrancisco.blogspot.com.br)

Percebemos assim os possíveis meios de trabalho e interpretação a quais podem ser utilizadas para a simples palavra território, desse modo notamos a complexidade que é elaborar uma afirmativa ou definição concreta sobre o que é o território. Um dos primeiros pensadores a utilizar a noção de território foi o alemão Ratzel no século XIX. Ratzel concebe o território como área delimitada concretamente e aquela que garante a soberania e sobrevivência de um povo. Conforme destaca Ademir Terra (2003) para Ratzel

o território é a base de sustentação do Estado, pois este, sem aquele não existe, ou seja, o território é a própria condição de existência do Estado, pois é nele que se encontram os recursos naturais que sustentam a sociedade. Assim, a ideia de território iguala-se ao conceito de “espaço vital” (TERRA, 2009, p. 22).

Ratzel restringe a noção de território ao poder estatal, conceito que alargado pelo geógrafo Raffestin. Para esse teórico o território:

6 é sempre um enquadramento do poder ou de um poder, em um determinado recorte espacial. Por isso, podemos dizer que as relações de poder se dão em diferentes escalas territoriais. A escala do território determina a escala dos poderes. Existem poderes que interferem em diferentes escalas territoriais, como é o caso do Estado. Contudo, há poderes que estão limitados a determinadas escalas territoriais. Assim sendo, temos relações de poder em diferentes escalas: local, regional, nacional, supranacional etc., produzindo uma multiplicidade de territórios, cada qual com uma territorialidade diferente, ou seja, com uma dimensão própria, e um conteúdo específico, sendo apropriado, apreendido e vivenciado de maneira singular pelos atores sociais. (TERRA, 2009, p. 2728).

Como podemos perceber, além de reforçar a noção de poder como essencial para definir território, Raffestin amplia as escalas de delimitação dos territórios, inaugurando a noção de territorialidade e territorialização como a vida que produz e reproduz territórios. Territorialização então pode ser entendida como a nomeação dada à mudança sofrida por um território já existente, dando desse modo um novo aspecto aquele espaço que outrora era pertencente a outros. Analisamos assim como uma forma de tornar familiar aquela área e seus novos habitantes, criando dessa forma uma relação de interdependência entre o território, que não era mais delimitado como espaço, com seus novos proprietários. Nessa parte de nossa analise podemos constatar que o território é algo que existe mutuamente com o ser humano, sendo o mesmo constituído através de sua existência, notamos assim que ambos necessitam de uma relação para se construírem: É possível partir de uma constatação aparentemente banal: sem dúvida o homem nasce com o território, e vice-versa, o território nasce com a civilização. Os homens, ao tomarem consciência do espaço em que se inserem (visão mais subjetiva) e ao se apropriarem ou, em outras palavras, cercarem este espaço (visão mais objetiva), constroem e, de alguma forma, passam a ser construído pelo território. (HAESBAERT; LIMONAD, 2007, p. 42)

Percebemos que há necessidade de uma diferenciação das noções de território e espaço. Este é algo mais abrangente e amplo, já o território é uma construção social, a qual sem sombra de duvidas apresenta a existência de relações de poder. Deste modo, podemos nos focar para as relações de poder existentes entre os espaços, as quais podem ser predominantes ou ao mesmo tempo essenciais para a existência do território. Ao se apropriar dessa categoria para o entendimento do espaço na globalização econômica, Milton Santos, se utiliza de diversos conceitos para tentar entender a multiplicidade territorial que passa a organizar o espaço mundial. Em uma de suas obras, intitulada “Por uma outra globalização” (2008), SANTOS desenvolve o conceito de “território do dinheiro”, de “horizontalidades” e “verticalidades”,

7 como componentes essenciais para entender os territórios atuais. Inicialmente ele define o dinheiro. Para ele

o dinheiro é uma invenção da vida de relações e aparece como decorrência de uma atividade econômica para cujo intercâmbio o simples escambo já não basta. Quando a complexidade é um fruto de especializações produtivas e a vida econômica se torna complexa, o dinheiro acaba sendo indispensável e termina se impondo como um equivalente geral de todas as coisas que são objeto de comércio. Na verdade, o dinheiro constitui, também, um dado do processo, facilitando seu aprofundamento, já que ele se torna representativo do valor atribuído á produção e ao trabalho e aos respectivos resultados. (SANTOS, 2008, p. 97).

Tal citação busca nos nortear sobre a evolução do dinheiro, para o que hoje conhecemos com um território tão presente nas decisões do mundo atual, tanto em âmbito econômico e político, assim como em âmbito diplomático para muitos estados. “O território usado pela sociedade local reage às manifestações da ida social, inclusive o dinheiro.” (SANTOS, 2008, p. 98). Podemos afirma que a evolução desse território se deu por meio a globalização, sendo um fluxo proveniente do comercio e sua evolução. De tal modo hoje o dinheiro é indispensável em nossa sociedade, mais ainda do que isso a sua condição de poder para com o mundo de hoje se torna inimaginável, sendo a não existência dessa relação algo fora do nosso padrão de sociedade. O dinheiro se fixou no próprio Estado, sendo o mesmo regido pelas influências do mercado global, para tal afirmativa podemos buscar como exemplo a União Europeu, a qual hoje possui uma união monetária, a qual ultrapassa os próprios Estados membros. Sendo essa União monetária um exemplo vivo do que visa ser esse território do dinheiro na prática podemos notar que o Estado juntamente com o privado se torna dependente do modo como esse fluxo se interage entre os outros territórios, podendo a unificação do mesmo desastroso para a sociedade, podendo atuar de forma a desfragmentar aquilo que busca unificar. Com a ampliação do comércio produz-se uma interdependência crescente entre sociedades até então relativamente isoladas, cresce o número de objetos e valores a trocar, as próprias trocas estimulam a diversificação e o aumento de volume de uma produção destinada a um consumo longínquo. O dinheiro se instala como condição, tanto desse escambo quanto da produção de cada grupo, tornando-se instrumento á regulação da vida econômica e assegurando, assim, o alargamento do seu âmbito e a frequência do seu uso. (SANTOS, 2008, p. 98).

8 Destacando o território do dinheiro não devemos nos esquecer de que o mesmo se trata de um território, e como tal esta sujeito aos amplos conceitos territoriais assim como o que define território como uma relação de poder e hierarquização. Desse modo esse território também possui as suas hierarquias, o qual o torna indispensável para o mundo capitalista. Deste modo temos o dinheiro global como ponta dessa hierarquia, passando pelo dinheiro do Estado e do privado, sendo finalizado no dinheiro de cada individuo. Tornando assim indispensável à existência e aplicação do mesmo. Considerando essa organização capitalista global, Milton Santos contrapõe duas “estruturas” como constituintes da territorialização e sua desterritorialização (embora ele não use esses termos em sua obra). Por verticalidade, Milton Santos afirma que estas podem ser definidas, num território, como um conjunto de pontos formando um espaço de fluxos. A ideia, de certo modo, remonta aos escritos de François Perroux (L’économie Du XX siécle, 1961), quando ele descreveu o espaço econômico. Tal noção foi recentemente reapropriada por Manuel Castells (A sociedade em rede, 1999). Esse espaço de fluxos seria, na realidade, um subsistema dentro da totalidade-espaço, já que para os efeitos dos respectivos atores o que conta é, sobretudo, esse conjunto de pontos adequados ás tarefas produtivas hegemônicas, características das atividades econômicas que comandam este período histórico. (SANTOS, 2008, p. 105-106).

Percebemos desse modo que a verticalidade se mantém com o único intuito de proteger a relação do fluxo existente hoje. Deste modo podemos afirmar que como algo indiferente ao local ela age de forma a buscar a alienação da sociedade local, para que a mesma não seja reconhecida como estranha e posteriormente descartada por uma insatisfação, já que o fluxo presente na mesma é excludente, o que por sua vez deixa grande parcela do sistema descontente. Mesmo com grande parte do sistema sendo descartada a alienação ocorrente na verticalidade exerce um papel brilhante, pois mesmo existindo o descontentamento em um numero considerável a quebra do sistema não é algo muitas vezes ocorrente, e quando atua é mascarado pela própria alienação. Nessas condições, a tendência é a prevalência dos interesses corporativos sobre os interesses públicos, quanto á evolução do território, da economia e das sociedades locais. Dentro desse quadro, a política das empresas – isto é sua policy – aspira e consegue, mediante uma governance, tornar-se política; na verdade, uma política cega, pois deixa a construção do destino de uma área entregue aos interesses privatísticos de uma empresa que não tem compromissos com a sociedade local. (SANTOS, 2008, p. 107).

Deste modo notamos que essa forma de atuação é contagiante, que muitas vezes se torna impossível de se conter, ou quebrar, criando assim um intuito de hegemonia nas

9 menores parcelas que também estão ligadas as redes, criando assim um ciclo. Esse instinto de individualidade vai crescendo junto com a sobreposição do território, buscando assim que essa alienação seja constante, seguindo o mesmo caminho do fluxo, ate o momento onde a mesma não será alienígena a sociedade, mas sim parte dela. O que buscamos dizer é que com a atualização dos bancos de dados e exclusão das velhas teorias essa alienação vai tomando esses pequenos espaços, se fixando de tal modo como se sempre estivesse presente, sendo uma parte da natureza real da humanidade e do próprio território. Contrapondo às verticalidades, Santos afirma que há as horizontalidades que podem ser definidas como zonas da contiguidade que formam extensões contínuas. Valemo-nos, outra vez, do vocabulário de François Perroux quando se referiu á existência de um “espaço banal” em oposição ao espaço econômico. O espaço banal seria o espaço de todos: Empresas, instituições, pessoas; o espaço das vivências. (SANTOS, 2008, p. 108).

Ao analisarmos a citação acima percebemos que a horizontalidade é formada pelo espaço banal, aquele espaço que é dispensado, o espaço existente entre as sobreposições de territórios, ou seja, uma criação do sistema a qual não é planejada. Ao buscamos uma melhor analise da formação da horizontalidade percebemos que a mesma muitas vezes é algo desconhecido para o próprio estado, ou ate mesmo sem relevância, tendo o mesmo suas ações e intervenções pouco aplicáveis, afinal o mesmo é financiador da construção desse espaço territorial.

Nesse espaço banal, a ação atual do Estado, além de suas funções igualmente banais, é limitada. Na verdade, mudadas as condições políticas, é nesse espaço banal que o poder público encontraria as melhores condições para sua intervenção. O fato de que o Estado se preocupa, sobretudo com o desempenho das macroempresas, ás quais oferece regras de natureza geral que desconhecem particularidades criadas a partir do meio geográfico, leva á ampliação das verticalidades e, paralelamente, permite o aprofundamento da personalidade das horizontalidades. (SANTOS, 2008, p. 109).

Com essa nova citação, percebemos que as horizontalidades presentes no mundo de hoje é algo criado pela verticalidade, a sobreposições do território com a ajuda do estado, seguindo o fluxo da rede, ou seja, quanto mais se busca seguir essa verticalização mais ocorrente é a horizontalidade. Como sabemos o sistema das verticalidades é algo excludente, dessa maneira quanto mais há atuação do sistema, maior é a parcela excluída, a qual cria um maior território horizontal, o qual não ser torna real através da sobreposição dos territórios, atuando assim com as sobras dos espaços banais, aqueles que não são úteis para o sistema.

10 Concluímos assim que quanto maior a sobreposição dos territórios e maior fluidez do sistema, maior são os espaços vazios existentes, os quais rapidamente são preenchidos pela parcela excluída do próprio sistema, criando assim um novo ciclo. As horizontalidades, pois, além das racionalidades típicas das verticalidades que as atravessam, admitem a presença de outras racionalidades (chamadas de irracionalidades pelos que desejariam ver como única a racionalidade hegemônica). Na verdade, são contra-racionalidades, isto é, formas de convivência e de regulação criadas a partir do próprio território e que se mantêm nesse território a despeito da vontade de unificação e homogeneização, características da racionalidade hegemônica típica das verticalidades. A presença dessas verticalidades produz tendências á fragmentação, com a constituição de alvéolos representativos de formas específicas de ser horizontal a partir das respectivas particularidades. (SANTOS, 2008, p. 110).

Deste modo podemos dizer de forma mais rudimentar que se as verticalidades buscam agir seguindo um fluxo de sistema, buscando assim uma homogeneização do mundo atual. As horizontalidades são a forma de resistência do próprio territorial, juntamente com a parcela excluída do sistema, atuando de maneira a resistir como um contrassistema, o qual não admite regras e racionalidades, apenas o intuito de resistir de forma a juntar as parcelas excluídas. Rede Territorial:

Definimos como Rede a ligação entre os territórios existentes, sendo assim uma malha a qual interagem os territórios, ou seja, a Rede de um modo mais grosseiro é aquilo formado pela ligação entre os territórios. Nesse sistema há o compartilhamento de informações e relações de poder. Buscando assim uma melhor compreensão desse conceito, podemos destacar: Esse espaço tornado território pela apropriação é denominado social é constituído ao mesmo tempo por pontos e linhas redes e superfícies ou áreas zonas. É possível acrescentar então que são elementos ou unidades elementares do território aquilo que Raffestin denomina de malhas – que preferimos denominar de áreas ou zonas; e as linhas e os nós ou ponto – que, reunidos, preferimos denominar de redes.” (HAESBAERT, 2007, p. 43).

Buscando tornar mais fácil nossa compreensão, buscamos idealizar os conceitos destacado na citação acima em uma imagem, para assim podermos ter uma melhor visualização e analise do conceito de Redes.

11

Figura 1 Esquematização do conceito primitivo de rede, onde só há atuação em um plano.

Analisando a imagem e a citação mostrada ate então podemos definir a Rede como um fluxo de informações que interligam os territórios, sendo os mesmo constantes, mas o que é tomado até então é relacionando como uma ligação plana, onde as linhas estariam presentes apenas em um plano, livre de outras influências e fatores existentes no próprio território. Como já sabemos o próprio conceito de território é algo mutável, dessa forma podemos dizer que o conceito de Rede também não pode assumir uma forma concreta, sendo a mesma passível de mudanças. As redes podem ser matérias ou imateriais. As primeiras seriam compostas de pessoas, mercadorias, matérias-primas. As segundas estão relacionadas ao fluxo de informações e/ou ordens. Ao mesmo tempo em que a rede faz parte do espaço e serve de suporte a este, a rede faz parte e serve de suporte ao circuito espacial de produção. (BRAGA, 2010, p. 29)

Analisando tal citação voltamo-nos para a indagação do que seria constituído esse fluxo entre os territórios. Ressaltamos que tal citação é apenas uma das formas de visão do fluxo da Rede, sendo o mesmo muito mais amplo. Sendo assim, tendo um pouco mais de ciência sobre aquilo que constitui os fluxos, podemos passar para uma analise sobre a origem, ou ate mesmo evolução e ligação do conceito de território com a Rede.

Se nas sociedades tradicionais o homem preenchia todos os poros de seu território através de uma apropriação simbólica onde, por exemplo, uma dimensão sagrada dotava de sentido o espaço em sua totalidade, nas sociedades modernas o território passa a ser visto antes de tudo, numa perspectiva utilitarista, como um instrumento de domínio, a fim de atender ás necessidades humanas (e não “dos deuses”), embora a ciência, de alguma forma, também tenha construído suas próprias “divindades”. (HAESBAERT, 2007, p. 43).

12

Efetivando nossa analise, percebemos que a rede nada mais é do que uma forma de concentração e forma de dominação do território, se originando através da necessidade das sociedades primitivas de se preencher o seu território, mantendo-o assim protegido e no domínio se seu sistema progenitor, ou seja, dos seus idealizadores ou ate mesmo de seus donos. Deste modo podemos dizer que o fluxo territorial foi algo criado para a manutenção do domínio territorial, sendo assim uma evolução das sociedades transmitidas e passadas para nós de uma forma despercebida. Ao fazermos tal afirmativa, devemos nós ater aos conceitos separados de território e rede, os quais muitas vezes podem vim a se confundir devido a sua proximidade, pois como sabemos o território é a forma é como uma forma de poder, e a rede uma forma de manutenção de tal poder. Ao mesmo tempo devemos nos ater ao conceito primórdio de rede, o qual é uma forma de organização, se o interligarmos com o conceito de território como relação de poder para com o espaço podemos perceber que há certa hierarquia a ser seguida entre os conceitos sendo os mesmos passiveis de variação. Deste modo percebemos que ate mesmo o fluxo de informações provenientes da rede devam respeitar tal forma de hierarquização existente nas relações de poder territorial, sendo assim buscamos expressar nossos argumentos na imagem a seguir:

Figura 2 Esquematização do conceito atual de rede, onde há atuação em dois ou mais planos.

Antes de buscarmos ressaltar a analise de tal imagem seria interessante ressaltar uma parte dos textos estudados por nós, para assim possuirmos uma melhor concepção dos planos destacados na imagem.

13 É interessante destacar uma revisita á obra de Miossec feita por Miguel Ângelo Campos Ribeiro (2001). Segundo ele, o geógrafo francês Miossec em sua obra de 1976 (La localisation dês forces de décision dans La monde: esquisse de géographie politique théorique) destaca três tipos de redes geográficas (independentes entre si e superpostas). (BRAGA, 2010, p. 29).

a) Rede de distribuição: voltada para a distribuição de bens e serviços, foi calcada na teoria das localidades centrais de Walter Christaller (1933). São determinados centros com funções centrais aptas para a distribuição de bens e serviços. b) Rede de produção: composta de fluxos de matérias-primas, bens intermediários e/ou produtos finais. Está relacionada aos lugares com vantagens de produção visando atender á demanda de necessidades humanas e divisão do trabalho. c) Rede de gestão ou decisão: papel gestor desenvolvido pelo Estado ou pelo setor privado (empresas), formando redes estratégicas onde circulam informações e ordens.

Tendo então alguns conceitos de rede já em mente podemos dizer que a ligação entre os territórios não acontecem apenas em um plano, mais sim em planos múltiplos, em nossa imagem ressaltamos apenas dois planos (X,Y), mas acreditamos que o fluxo não respeita apenas esses dois planos indo muito mais além em sua ligação. Deste modo, nossa imagem buscar ilustrar de uma maneira grosseira as formas de transmissão do fluxo de nossa rede, sendo os territórios sobrepostos sobre os outros, ou seja, acreditamos que essa interligação entre os territórios não acontecem de maneira distinta, mas ao mesmo tempo como uma sobreposição dos mesmos, tornando difícil indicar a qual território corresponde originalmente o fluxo de transmissão.

Existe assim uma imensa gama de territórios sobre a superfície do globo terrestre e a cada qual corresponde uma igualmente vasta diversidade de territorialidade, com dimensões e conteúdos específicos. As conotações que a territorialidade adquire são distintas dependendo da escala, se enfocada ao nível local, cotidiano, ao nível nacional e supranacional. Igualmente, existem diversas concepções de território de acordo com sua maior ou menor permeabilidade: Temos, desta forma, desde territórios mais simples, exclusivos/excludentes, até territórios totalmente híbridos, que admitem a existência concomitante de várias territorialidades. Embora em vários períodos da história apareçam territorialidades múltiplas, sobrepostas (vide os múltiplos domínios territoriais medievais), elas são uma marca indiscutível do mundo globalizado/fragmentado. (HAESBAERT, 2007, p. 44).

Deste modo podemos notar que mesmo com a fragmentação existente nos territórios de hoje, a uma interligação e sobreposição do fluxo existente entre eles, ressaltando assim nossa teoria sobre a existência de planos distintos de transmissão da rede, destacamos

14 assim o qual complexo vem a se torna a rede ao analisarmos apenas os territórios já existentes, mas caso venhamos a olhar as novas territorialidades, perceberemos o qual parecida à rede vai se tronando de uma teia, adquirindo assim um aspecto tridimensional de transmissão de fluxo. O fato é que se as velhas territorialidades pareciam mais nítida ou mais fáceis de ser identificadas, hoje há uma complexificação e uma sobreposição muito maior de territórios. Muitas vezes não se tratam de novas territorialidades enquanto construção de novas identidades culturais: a novidade esta mais na forma com que muitas destas territorialidades, imersas sob o jugo da construção identitária padrão dos Estados-nações, ressurgem e provocam uma nova redefinição (ou mesmo indefinição) de limites políticos-territoriais, alterando a face geográfica do mundo neste fim de milênio. Da intensificação do fluxo de pessoas de diferentes classes, línguas e religiões á intensificação do fluxo de mercadoria, capital, informações, tudo parece mais móvel, relativizando as fronteiras territoriais tradicionais como forma de controle. Hoje o espaço nacional cede rapidamente lugar aos espaços locais, seletivamente escolhidos para se inserirem nos circuitos da globalização. (HAESBAERT, 2007, p. 48).

Se formos buscar interligar os territórios já existentes com as novas formas de territorialidades, juntamente com a sobreposição de ambos acabamos perdendo a essência da nossa rede, a qual segue uma linha de poucos planos, tornando assim sem limites. Buscamos deste modo dizer que a transmissão de fluxo existente hoje já não respeita mais o conceito de rede, passando a atuar em forma de teia, onde se torna impossível afirmação à direção e posicionamento do fluxo. Buscamos ressaltar tal afirmação na seguinte imagem, onde tentamos alinhar os três conceitos encontrados por nós para uma melhor analise e finalização de nossos estudos sobre o conceito de rede.

Figura 3 Esquematização da evolução do conceito de rede, passando do conceito primitivo para o moderno e do moderno para o de teia territorial.

15 Com essa imagem buscamos assim finalizar a nossa analise sobe a Rede, passando por uma breve analise da evolução do conceito de rede abordado por nós inicialmente ate o conceito de teia citado. Desta maneira a primeira imagem buscar ressaltar a ligação entre os territórios ocorrentes em apenas um plano, sendo assim o conceito primórdio da rede territorial, já na segunda imagem destacamos que os fluxos não se movimentam em apenas um plano, tendo o conceito moderno de rede, levando apenas os territórios já existentes como objeto de analise, já na terceira imagem destacamos a interligação da rede com as novas territorialidades, onde se torna impossível definir de onde começa ou termina o fluxo, dando assim um aspecto de “teia” a rede territorial, a qual nada mais é do que uma sobreposição de redes.

Figura 4 Esquematização a qual buscar mostrar que a teia territorial esta integrada de certa maneira ao mundo, criando um giro de 360º em torno de um eixo de tangência entre os fluxos, criando assim a imagem de uma esfera.

Ao fazermos uma análise mais detalhada sobre a teia territorial, percebemos que se a mesma for formada por um mesmo ponto de tangencia entre todos os fluxos, ao colocarmos a mesma em uma rotação de 360º encontraremos a imagem de uma esfera, a qual grosseiramente poderia ligar a imagem que temos do próprio planeta terra. Desta maneira acreditamos que o conceito sobre teia territorial tem um grande potencial de exploração, podendo o mesmo ser utilizado em outras pesquisas e melhor desenvolvido. Ao longo da historia humana, olhando o planeta como um todo ou observando através dos continentes e países, o espaço geográfico sempre foi objeto de uma compartimentação. No começo havia ilhas de ocupação devidas á presença de grupos, tribos, nações, cujos espaços e vida formariam verdadeiros arquipélagos. Ao longo do tempo e á medida do aumento das populações e do intercâmbio, essa trama foi se tornando cada vez mais densa. Hoje, com a globalização, pode-se dizer que a totalidade da superfície da terra é compartimentada, não apenas pela ação direta do homem, mas também pela sua presença política. Nenhuma fração do planeta escapa a essa influência. Desse modo, a velha noção de ecúmeno perde a antiga definição e ganha uma nova dimensão; tanto se pode dizer que toda a superfície da terra tornou ecúmeno quanto se pode afirmar que essa palavra já não se aplica apenas ao planeta efetivamente habitado. Com a globalização, todo e qualquer pedaço da superfície da terra se torna funcional ás necessidades, usos e apetites de Estados e empresas nesta fase da história. (SANTOS, 2008, p. 80-81).

16

Com essa citação finalizamos nossa curiosidade, deixando a indagação se tal comparação possa vim a ser torna algo mais concreto e estudado pela geografia.

2.3 - A relação entre ensino de Geografia e cinema para o estudo do território e da territorialidade

A Geografia no Ensino Médio, segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais traz como um dos objetivos levar o aluno a uma maior compreensão dos conceitos de território e territorialidade. Segundo esse documento, no Ensino Médio estes conceitos devem ser abordados de forma que o aluno compreenda as novas dimensões das escalas e formas territoriais, como afirma o documento: os conceitos de território e territorialidade enquanto espaço definido e delimitado por e a partir das relações de poder, ou seja, quem domina ou influencia e como domina e influência uma área. Implica avançar da noção simplista de caracterização natural ou econômica por contiguidade para a noção de divisão social. Todo território, seja uma aldeia indígena na Amazônia, é definido e delimitado segundo as relações de poder, domínio e apropriação que nele se instalam. Desta maneira, a territorialidade é a relação entre os agentes sociais, políticos econômicos, interferindo na gestão do espaço geográfico; não é apenas uma expressão cartográfica. Ela refere-se aos projetos e práticas desses agentes, numa dimensão concreta, funcional, simbólica, afetiva, e manifesta-se em escala desde as mais simples às mais complexas. (BRASIL, 1999, p.313)

Como podemos perceber, estudar o território e a territorialidade na complexidade do mundo atual desafia à construção de novas metodologias de ensino bem como, novas leituras da realidade. Sendo assim, o cinema enquanto linguagem imagética do movimento da sociedade traz ao ensino de Geografia possibilidades do enriquecimento das relações ensino-aprendizagem. As relações entre a Geografia e o cinema se veem cada vez mais interligados, uma vez que o último pode cooperar para a construção do pensamento crítico geográfico. Levando em conta que essas relações, segundo vários estudos, ainda se apresentam de forma tímida. Através dos meios audiovisuais o assunto analisado ganha “vida”, “forma” e “cor”. Passa a interagir no meio em que se manifesta, a imagem em movimento torna-se ainda mais expressiva, o que capacita o processo de aprendizagem, a partir da aproximação desses meios com a nossa realidade. O cinema se solidifica em uma linguagem perceptível por mais de um sentido, que possibilita uma melhor interpretação do tema analisado. Como

17 afirma Jorge Luiz Barbosa: “O papel do filme em sala é o de provocar uma situação de aprendizagem para alunos e professores” (BARBOSA, 2003, p.112). Mesmo assim, temos que levar em conta que embora a linguagem cinematográfica exponha seus pensamentos de forma a permitir uma construção crítica a respeito de si própria e da sociedade, reflete também as opiniões e interpretações individuais do autor as quais as produções audiovisuais são submetidas, desse modo é importante que o professor tenha domínio da abordagem preterida pelo diretor e roteirista para que tenha condições de problematizar tanto a realidade quanto as formas com que esta é apresentada pelas imagens. É preciso ter clareza de que, apesar de oferecer um instrumental para leitura da realidade, a produção do cinema engloba a constituição dupla entre técnica e arte e entre obra e mercadoria, ou seja, há uma necessidade de ficar atento para os visíveis e os invisíveis presentes nas imagens. Como o filme não é um instrumento neutro nem ingênuo, ele não pode ser utilizado como um substituto do papel do professor com relação ao conteúdo em estudo. Esse recurso deve ser utilizado como complementar para permitir, através da construção de um pensamento sólido, um ensino mais eficaz. Através do Cinema é possível estudar as relações definidos por territorialidade, analisando de forma um tanto mais precisa, suas causas e consequências, pois por apresentar diferentes perspectivas e variadas interpretações, propicia inquietações, um reconhecimento de si e ao mesmo tempo do mundo. Enfim, as práticas da ”Geografia e Cinema” nos permitem também um aprofundamento no contexto territorial, trazendo de forma lúdica e real, os conceitos que giram em torno de territorialidade e território. Como os PCNs expõem a necessidade de ampliar o uso do território e da territorialidade para leituras da realidade espacial e como os filmes possibilitam essa abordagem em várias escalas e dimensões, tanto simbólica, funcional ou afetiva, selecionamos quatro filmes que foram avaliados quanto a sua importância e possibilidade de uso em sala de aula, com alunos do Ensino Médio. São eles: Território Restrito, O signo da cidade, O preço do amanhã e Dogville.

18 3 - ANÁLISE DOS FILMES

3.1 - Território Restrito [Crossing Over]

3.1.1 - Sinopse do filme

Território Restrito (Crossing Over) apresenta por diferentes ângulos a problemática da imigração ilegal nos Estados Unidos. Imigrantes de diversas origens lutam para conseguir a legalidade de sua situação em Los Angeles. Seguindo o exemplo de outras produções, como Maus Hábitos e Gomorra, o filme Território Restrito (Crossing Over) traz um tema central cujas diversas histórias se cruzam durante tramas paralelas. A partir do cruzamento dessas histórias é possível visualizar diferentes aspectos de uma mesma questão. Como o título original sugere, o objetivo do filme é “ir além” do comum. Os assuntos mais óbvios são abordados, como o preconceito sofrido por imigrantes ou pessoas que vão tentar melhores oportunidades de trabalho do outro lado da fronteira. Por outro lado, questões que não lembramos em um primeiro momento também são discutidas, como artistas que procuram o estrelato de Hollywood ou a adoção de crianças de outros países. O filme aborda os temas de vigilância de fronteiras, fraudes de documentos, o processo de obtenção do green card, o emprego de imigrantes em situação ilegal, naturalização, o combate ao terrorismo e o conflito entre culturas. 3.1.2 - Como e qual território é abordado no filme? O filme ‘Território Restrito’ possui um âmbito ora focado em um território formal, com os E.U.A sendo o grande império territorial, ora focado em outros territórios móveis que vão se formando para dar conta de contrastar/conflitar com esse território maior. Sendo a Imigração o ponto chave do filme. Por se tratar de um filme comercial estadunidense, várias cenas evocam a supremacia dos Estados Unidos como terra de oportunidades para os que se devotam àquele território. Por outro lado, aqueles que não “aproveitam” essas oportunidades, são colocados como vilões da história que devem ser deportados. O território legal e estatal é bastante focado, ao mesmo tempo em que as interrelações entre os personagens vão formando uma rede de relações sobrepostas. As temáticas da imigração ilegal e dos Estados Unidos enquanto um “caldeirão étnico” se misturam na trama, tentando relativizar as ações agressivas que são feitas com

19 os indesejados ao sistema. Os territórios móveis e sobrepostos aparecem durante toda a trama sem deixar de perder de vista o Estado centralizador, na figura dos Estados Unidos. Considerando os personagens, podemos perceber processos de terrritorialização e desterritorialização constantes. Como exemplo temos a personagem australiana que, para conseguir o Green Card, se submete à prostituição. No final do filme, num processo de desterritorialização, ela desfaz a relação com o agente emissor de cartões, mas é novamente territorializada e deportada. Sendo assim, o filme possibilita trabalhar as contradições e o dualismo existente entre o território concreto, macro e delimitado com as redes e territórios móveis que existem na realidade complexa atual.

3.1.3 - Quais questões os professores poderiam utilizar para discussão a partir do filme? O filme “Território Restrito” possibilita a abordagem em sala de aula da questão da Imigração inerente às leis e normas adotadas por um território, no caso os Estados Unidos. No filme encontramos um território dotado de patriotismo exacerbado, que defende uma autoproteção, por vezes hostil e repreensiva. Somos expostos à observação de vários casos, estes marcados por uma submissão árdua às leis de um território que mostra aversão a imigração, evidenciando uma forte xenofobia, uma vez que quase todos os seus habitantes são descendentes de imigrantes. Tal filme evidencia um território dominante e concreto, que apresenta em sua cultura um sentimento de superioridade, reprimindo a liberdade de expressão, quando esta representa uma ameaça aos seus interesses, a ponto de omitir o real sentido entre “entender” e “concordar” quando são representados por ataques terroristas que fragilizam e põe em risco seu território. A questão do 11 de setembro, a busca por uma identidade, o ‘querer ser ouvido’ o conflito entre o Ocidente X Oriente, entre outros, ampliam ainda mais o conceito que define e modela um território, revelando o que ele realmente representa. Um país cujo Hino se ostenta de: “Em Deus está a nossa confiança”, nos leva a conclusão que acreditam em Deus, Negociam com o diabo, e agem por suas próprias conclusões, estabelecendo uma relação Animália ao “marcarem território” justificado unicamente por razões capitalistas, mas que são mascaradas por um falso patriotismo, que levam as pessoas a analisarem a questão do território, cujas vertentes se desdobram na imigração, por dados distorcidos por suas lentes paranoicas.

20 O centro de detenção da imigração, o Gestapo (herança nazista que contradiz os princípios de liberdade, igualdade e fraternidade sobre os quais foram fundadas os Estados Unidos da América), e o eterno conflito destruidor de sonhos e vidas, representado pela fronteira entre os E.U.A e o México em San Diego (Califórnia), foge aos limites dos preceitos territoriais e abrange algo muito mais intenso e profundo: a incompreensão e ganância humana, como afirma Thomas Hobbes: “O homem se torna lobo do próprio homem”. Enfim, toda conclusão em relação a isso ainda revela eternas dúvidas e reflexivos desfechos: “Quais são as fronteiras da Liberdade? Quais são as fronteiras da oportunidade? A única coisa maior do que o que nos divide é o sonho que compartilhamos: a busca por uma identidade em um território restrito”.

3.1.4 - Contribuições para o ensino de geografia no Ensino Médio.

Segundo o PCN [Parâmetros Curriculares Nacionais] (BRASIL, 1999) é possível observar vários aspectos que destacam a importância do uso do cinema na construção dos conceitos de território e territorialidade em toda a sua abrangência e abordagem. No caso desse filme, é possível contribuir para os seguintes aspectos educacionais: 

Reconhecer e aplicar o uso das escalas geográficas, como formas de organizar e conhecer a localização, distribuição e frequência dos fenômenos humanos.



Reconhecer os fenômenos espaciais a partir da seleção, comparação e interpretação, identificando as singularidades ou generalidades de cada território.



Selecionar e elaborar esquemas de investigação que desenvolvam a observação dos processos de formação e transformação dos territórios.



Identificar, analisar e avaliar o impacto das transformações naturais, sociais, econômicas, culturais e políticas no seu “lugar-mundo”, comparando, analisando e sintetizando a densidade das relações e transformações que tornam concretas e vividas a realidade.



Posicionar-se de maneira crítica, responsável e construtiva nas diferentes situações sociais, utilizando o diálogo como forma de mediar conflitos e de tomar decisões coletivas;



Construção da identidade (pessoal e social), isto é, da capacidade de reconhecer-se em um lugar e de reconhecer as particularidades do mesmo, expressando com propriedade;



Formação para a cidadania, entendendo-se por cidadão aquele que é capaz de emitir opinião sobre temas públicos no sentido de direcionar decisões políticas e

21 como aquele que tem conhecimento e acesso aos seus direitos e que admite e assume seus deveres; 

Desenvolvimento da autonomia intelectual, da criticidade e da criatividade;



Promoção de atitudes de respeito, interesse, participação e cooperação

3.1.5 - Como é a relação imagética no filme com o território?

O filme evidencia imagens que personificam os EUA, como sendo um objeto de desejo. A imagem do filme denota ideia de sedução, através da qual o território estadunidense se pinta com cores fortes e reluzentes, indicando um sonho a ser buscado. A imagética do filme, trabalha com o território dos E.U.A como sendo algo a ser alcançado e que de fato de torna ansiado por muitos que se sentem atraídos a residirem lá.

3.2 – O preço do amanhã (In time)

Os pobres têm que morrer, é como o sistema funciona...

3.2.1 - Sinopse do filme O filme o “Preço do Amanhã”, se passa em um futuro onde o tempo virou a nova moeda de troca da humanidade. Alterados biologicamente o ser humano passa a não envelhecer logo após os 25 anos, mas em compensação depois dessa idade possuem apenas um ano de vida, como a moeda de troca se torna o tempo à medida que trabalham adquirem mais tempo de vida, mas as dividas dos pobres são maiores do que os seus salários. Enquanto isso os ricos conseguem “ganhar” décadas de uma vez só, podendo até mesmo se tornar imortais. Os outros passam a vida trabalhando ou ate mesmo pedindo esmola para conseguirem se manter vivo ate o fim do dia. A trama se passa quando o Protagonista Will Salas é acusado falsamente de ter cometido um roubo “milionário” de tempo, o qual busca provar sua inocência e descobrir uma maneira de destruir o sistema.

22 3.2.2 - Como e qual território é abordado no filme?

Rede Territorial: Ao longo do filme percebemos uma ligação entre todos os territórios e percebemos claramente o fluxo de informação e com os policiais do tempo percebemos os fluxos mantedores do sistema, os quais possuem a única finalidade de manter o sistema. Acreditamos que no momento em que os bancos estão interligados discutindo a questão do fluxo do dinheiro desviado, percebemos o quão interligado o mundo esta, e como a sobreposição de territórios forma a teoria da teia territorial. Horizontalidades e Verticalidades: No começo do filme percebemos nitidamente a horizontalidade, que é aquele território criado pela rejeita do sistema, ou seja, é aquele território onde uma parcela excluída se mantém, buscando uma quebra do sistema, que no caso dessa população seria se manter vivo por mais um dia. Já a verticalidade podemos nota-la quando o filme se passa na parte dos “ricos”, onde notamos uma integração do mundo, onde uma sobreposição de territórios cria um sistema único para todo o mundo, que possui como única função adquirir mais anos de vidas, mantendo a parcela da população privilegiada vivas por mais tempo ou ate mesmo imortais. Território do dinheiro: Ao acompanharmos o filme percebemos que o mesmo se move por um cenário totalmente moldado pelas questões financeiras, pelo próprio capitalismo. Notamos que mesmo não possuindo mais a capacidade de envelhecer o ser humano busca aquilo por dinheiro, o qual se tornou tão presente na sociedade que acaba por definir a vida dos habitantes desse mundo futurístico do mundo. Território Físico: Ao longo do filme podemos perceber o quão dividido são as áreas desse mundo moderno onde cada parcela da população possui seu próprio território, o qual por sua vez é dividido em zonas. Desta maneira é fácil notar as características que cada território oferece para a sua população, no território da população excluída percebemos a necessidade de rapidez, pois cada segundo é essencial para a sobrevivência desses indivíduos. Já no território dos ricos a coisa é diferente, eles buscam aproveitar cada segundo, fazendo as coisas o mais devagar possível, afinal tempo não é o problema para os mesmo.

3.2.3 - Quais questões os professores poderiam utilizar para discussão a partir do filme?

Ao se analisar o filme percebemos o quanto vários conceitos sobre território se tangenciam em uma só ponto, percebemos que o território do dinheiro é o mais presente,

23 sendo o mesmo regente da vida da população de mundo futurístico. Dessa maneira acreditamos que a questão de como o capitalismo juntamente com o território esta tão envolvido em nossas vidas e muitas vezes não possuímos essa noção, percebemos no mundo que esse território é um mais desenvolvido com o atual, onde o próprio Estado é confundido ou sugado pelo mesmo. Possuindo como regente da lei o capital e o fluxo financeiro que no filme é representado pelo tempo de vida. No filme também somos capazes de perceber a forte presença da rede territorial, a qual garante um envolvimento de todos os territórios físicos através do seu fluxo de informações, também podemos notar o quão desenvolvido é essa rede no mundo futurístico, onde todo o mundo esta integrado com um ponto primórdio de fluxo, que no caso seria o capital. Desse modo um trabalho sobre as formas de unificação dos territórios juntamente com as formas de fluxo se torna uma área bem abrangente para se tratar no filme. Uma grande questão que também pode ser vastamente analisada no filme é a questão das verticalidades e horizontalidades, onde o mundo sobreposto de territórios cria espaços banais os quais buscam lutar contra o sistema. Ao analisarmos essa parte podemos perceber o quando a verticalidade busca manter o sistema, mantendo o tempo de vida na mão de uma minoria, e ao mesmo tempo a grande maioria busca lutar contra o sistema excludente, tentando assim atuar em uma forma de contrassistema, representando assim a horizontalidade desse mundo futurístico. Finalizando nossa analise acreditamos que um grande ponto para a utilização desse filme para discussão seria a questão do território acrescentando características aos indivíduos, a própria questão do território físico sendo o moldador de algumas características ou modo de comportamento de seus cidadãos.

3.2.4 - Contribuições para o ensino de geografia no Ensino Médio.

Segundo o PCN [Parâmetros Curriculares Nacionais] (BRASIL, 1999) é possível observar vários aspectos que destacam a importância do uso do cinema na construção dos conceitos de território e territorialidade em toda a sua abrangência e abordagem. No caso desse filme, é possível contribuir para os seguintes aspectos educacionais: 

Abordagem do território físico, a questão de limites para o território, barreiras e demarcações.



Abordagem da rede territorial, assim como sua sobreposição de territórios e fluxo de informações.



Abordagem do território do dinheiro e uma nova forma de evolução do mesmo, onde o financeiro se mistura com o estado, sendo assim o “dinheiro” o ditador de regras.

24 

Abordagem clara das horizontalidades e verticalidades, mostrando de maneira clara que quanto maior o sistema vertical maior a formação de um contrassistema horizontal. 3.2.5 - Como é a relação imagética no filme com o território? “A literatura apologética da globalização fala de competitividade entre Estados, mas, na verdade, trata-se de competitividade entre empresas, que, ás vezes, arrastam o Estado e sua força normativa na produção de condições favoráveis àquelas dotadas de mais poder. É dessa forma que se potencializa a vocação de rapidez e de urgência de algumas empresas em detrimento de outras, uma competitividade que agrava as diferenças de força e as disparidades, enquanto o território, pela sua organização, constitui-se num instrumento do exercício dessas diferenças de poder”. (SANTOS, 2008, p. 84-85)

O filme “O Preço do Amanhã” utiliza de imagens que ressaltam a temporalidade futurística onde a narrativa se desenvolve a todo o momento, contrastando de forma clara, as diferenças entre as classes sociais relatadas no longa. Isso pode ser positivo no início, mas acaba se tornando um meio de subestimar a inteligência do espectador. Uma vez apresentada a localização do longa no tempo e espaço, não é necessário mais identificá-lo nos mesmos a todo o momento, desde que não se apresentem mudanças nos referidos temas. A linguagem cinematográfica deve ser a mais imagética possível e certos diálogos no filme são bastante expositivos. Tomemos por exemplo, o vilão. Ele representa o clichê, ou seja, seus diálogos e expressões corporais do “mal” são até de certa forma, constrangedoras; “Eu sou muito mau quando quero”. Isso pode ser entendido como o uso de uma narrativa simples em que seja fácil para o espectador identificar o “malfeitor”. Isso pode ser explicado pela seguinte questão; o público-alvo do filme são os adolescentes. É um erro tomar essa “decisão” por subestimar a capacidade de abstração do público. Já em relação ao uso dos espaços, o filme usa uma paleta de cores bem interessante, usando e abusando das cores quentes como o vermelho (reparem na cor do vestido do par romântico inicial do Protagonista, que remete a desejo) e a laranja nos espaços da elite. Já nas cenas ambientadas nos subúrbios, o tom varia em função do azul, o que nos mostra claramente a oposição dos espaços sociais (Azul e Laranja estão diametralmente opostos no prisma das cores). Em termos de planos, o filme tem várias cenas de ação e a câmera tem um movimento frenético nestas referidas cenas, o que dá o caráter de entretenimento e ação contínua ao filme, às vezes, prejudicando o entendimento e o desenvolvimento do enredo. A relação imagética do filme pode ser de grande uso para que os alunos consigam refletir sobre a territorialidade abstrata e física e o filme representa um bom exemplar das espacialidades atuais, como a Globalização e suas redes. Seu uso em sala de aula do ponto

25 de vista da imagem pode trazer várias reflexões sobre a linguagem do cinema em prol das diferenciações de território, até mesmo o filme pode ser usado como um exemplar crítico das boas e más interpretações das imagens teóricas da linguagem cinematográfica.

3.2.6 - Quais os aspectos técnicos do cinema (fotografia, roteiro, figurino) se relacionam para definir o conceito de território?

Percebemos que o roteiro juntamente com o figurino contracena com a fotografia do filme há nos dar a impressão de que cada território é bem fragmentado, cada território possui a sua própria característica. Ao apresentarmos a periferia desse mundo o filme claramente nos mostra uma imagem mais suja do local, a própria roupa da população é desprovida de iluminação, há uma maior movimentação dos personagens, pois os mesmo não podem perder um só tempo. Já no mundo dos ricos percebemos uma cor mais nítida na fotografia, roupas com cores mais vivas e uma leveza no movimento dos personagens, onde o tempo é mais desfrutado, degustado pela parcela imortal dessa sociedade.

3.3 – Dogville

3.3.1 - Sinopse do filme

Anos 30, Dogville, um lugarejo nas Montanhas Rochosas. Grace (Nicole Kidman), uma bela desconhecida, aparece no lugar ao tentar fugir de gângsters. Com o apoio de Tom Edison (Paul Bettany), o autodesignado porta-voz da pequena comunidade, Grace é escondida pela pequena cidade e, em troca, trabalhará para eles. Fica acertado que após duas semanas ocorrerá uma votação para decidir se ela fica. Após este "período de testes" Grace é aprovada por unanimidade, mas quando a procura por ela se intensifica os moradores exigem algo mais em troca do risco de escondê-la. É quando ela descobre de modo duro que nesta cidade a bondade é algo bem relativo, pois Dogville começa a mostrar seus dentes. No entanto Grace carrega um segredo, que pode ser muito perigoso para a cidade.

26 3.3.2 - Como e qual território é abordado no filme?

Território Físico: Ao longo do filme notamos que mesmo o cenário não se dotado de matérias físicas, sendo apenas marcações no chão, o filme nos aborda o conceito de que cada cidadão possui o seu espaço, onde o mesmo possui total autoridade sobre o seu território. Podemos notar esse tipo de conceito quando Grace tenta invadir o território do cachorro Moises e o mesmo não permite a sua entrada, assim como em várias outras cenas do filme, onde o próprio território físico da cidade é respeitado, separando-a assim do restante do mundo. Território de influências: Ao longo do filme percebemos que cada cidadão procura manter a sua influência sobre a pobre Grace, buscando assim deixar a sua marca na pobre garota, percebemos que a jovem garota nada mais tem do que aceitar as imposições colocadas pelos moradores, pois a sua única proteção como fugitiva é o silencio dos mesmos. Percebemos de forma mais clara esse tipo de território quando a pobre garota é estuprada, tendo assim sue próprio corpo violado, notamos também no final do filme que Grace deixa a sua marca de influência no vilarejo, matando todos os habitantes, deixando apenas o cachorro Moises vivo. Territorialização: Esse aspecto é facilmente notado quando a protagonista chega ao vilarejo e se sente estranha ao território, mas ao longo do filme percebemos que a mesma é inserida nessa sociedade, tomando características de DOGVILLE e ao mesmo tempo dando novas características ao modo de vida dessa sociedade. Desse modo podemos dizer que quando Grace chega à cidade ela desfragmenta o território, e a medida do filme vai se tornando familiar a ele, criando assim uma nova territorialidade para os cidadãos de DOGVILLE, onde a mesma esta inserida nessa nova realidade. Rede territorial: No começo do filme assim como no seu decorrer podemos perceber o quão desfragmentado é a população de DOGVILLE, onde a cidade é quase totalmente excluída do território esterno, mas ao mesmo tempo podemos perceber um pequeno fluxo a ligando ao resto do mundo, tendo como exemplo a chegada de GRACE, as constantes visitas dos gângster e policiais, assim como a própria informação de que Grace é uma fugitiva. Notamos assim que mesmo em um território tão remoto a conexão com o fluxo de ligação das redes não pode ser descartada, sendo a mesma uma característica do nosso mundo moderno.

3.3.3 - Quais questões os professores poderiam utilizar para discussão a partir do filme?

27 Notamos desde o inicio do filme de Dogville que o mesmo se passa na época da grande recessão americana, nos anos 30, deste modo notamos a grande pobreza presente nesse vilarejo situado nas montanhas Américas. Notamos que Dogville outrora era uma pequena cidade minerada, pois no pouco cenário existente no filme somos capazes de notar, assim como as diversas referencias feitas pelos personagens, a existência do que seria uma pequena mina abandonada. Ao longo do filme percebemos a tristeza existente entre os habitantes da cidade, a falta de dialogo e companheirismo entre os mesmo, o filme busca nos passar a imagem de uma típica sociedade puritana, a qual possui todos os aspectos dos valores morais e de sociedade, mas ao longo do filme percebemos que tal imagem é falsa, escondendo apenas a severidade da população. Se notarmos os nomes dos personagens do filme somos capazes de notar o jogo de referencias utilizado pelo diretor, o qual busca correlacionar os poucos personagens com aspectos religiosos, como a jovem Grace representando a graça divina e o jovem Tom Edison que busca correlacionar o pai da ciência America. Sendo assim notamos que a chegada da jovem Grace e vista de maus olhos pela maioria dos habitantes, principalmente pelo fato de ser uma fugitiva, mas notamos que essa sociedade é totalmente relutante a presença de estranhos em seu território, mas notamos que a presença da jovem é aceita, quando a mesma oferece favores em troca de sua permanência. Em alguns momentos do filme somos capazes de percebe resquícios de humanidade nos habitantes da cidade, tendo como exemplo o momento que Grace encontra as pequenas oferendas na hora da votação de sua permanência. Notamos então a bondade é pureza presente nas atitudes e favores da jovem, correlacionando o seu nome com a graça, somos capazes de deduzir que a chegada da garota ao vilarejo é um fio de esperança ou tentativa de salvação dessa população desolada. Ao longo do filme percebemos que a jovem “graça” tenta de forma ineficaz tentar transforma o ambiente dessa cidade, mas ao pouco os cidadãos começam a mostrar sua verdadeira natureza, abusando assim dos atos de bondades da jovem, notamos desse modo que a própria graça é corrompida pela atmosfera maligna da cidade, o momento ápice do filme se passa na cena onde a jovem é estuprada, nesse momento percebemos a corrupção ocorrente de uma forma clara, mas mesmo após a sua mudança os personagens não cessam os abusos a garota, notamos assim o desespero da mesma, assim como o seu desgosto pelo vilarejo e pela própria vida. O filme termina com uma forma poética, notamos que a corrupção da “graça” foi o próprio abismo da população de Dogville, com a revelação de que o gangster procurador de Grace era seu pai a atmosfera do filme muda completamente, nesse momento percebemos que a mudança da garota a faz perde a esperança nos habitantes de cidade, pedindo assim ao seu pai que de um fim a vida dos mesmos, nesse momento percebemos o latido do

28 cachorro Moises, o qual faz citação ao personagem hebreu bíblico, o qual nos remete a cena da chegada de Grace, onde o jovem Tom a informa que o seu latido é um sinal de que a jovem representa um perigo para a cidade, mas o que notamos é que a cidade foi um perigo para a garota. Deste modo Grace permite que o cachorro continue vivo, não somos capazes de dizer se a jogada do diretor ao deixar o cachorro vivo é uma inversão do papel de seu personagem o qual é o único a morrer antes de chegar a sua terra prometida, mantendo-nos assim a perguntar e responder o motivo da vida do cachorro ter sido poupada. 3.3.4 - Contribuições para o ensino de geografia no Ensino Médio.

Segundo o PCN [Parâmetros Curriculares Nacionais] (BRASIL, 1999) é possível observar vários aspectos que destacam a importância do uso do cinema na construção dos conceitos de território e territorialidade em toda a sua abrangência e abordagem. No caso desse filme, é possível contribuir para os seguintes aspectos educacionais: 

Abordagem do território físico através de uma dialética com o surreal, adotando uma representação do físico por meio da imaginação, tendo como exemplo o cenário do filme.



Abordagem de uma rede territorial pouco desenvolvida, onde o território da vila é quase totalmente segregado ao mundo exterior, dando assim uma noção da evolução deste conceito.



Abordagem da territorialização, mostrando como um território pode ser tonar familiar para as pessoas ao longo de um tempo, ao mesmo tempo em que o próprio território se multa com essa agregação de um novo individuo.

3.3.5 - Quais os aspectos técnicos do cinema (fotografia, roteiro, figurino) se relacionam para definir o conceito de território?

Em DOGVILLE somos capazes de notar uma mudança do conceito popular de cinema, percebemos que o filme se passa exclusivamente em um estúdio sem a utilização dos recursos de cenário assim como edições digitais, o máximo utilizado são linhas demarcando o que seria o cenário, moveis, e alguns aspectos físicos do vilarejo em madeira.

29 O filme iniciação e em sua grande maioria apresenta fotografia escura, a qual procura representar a tristeza existente na cidade de DOGVILLE, percebemos que outros recursos são utilizados para demonstrar essa depressão presente entre os cidadãos dessa cidade, notamos que suas roupas são desprovidas de cores alegres, as quais buscam passam o sofrimento e angústia das pessoas, esse recurso cinematográfico é capaz de nos deixar bastante envolvido com a tristeza presente no vilarejo. Logo após a chegada de Grace notamos que a jovem garota busca ajudar pessoalmente e de maneira singela a vida de todos os moradores, essas atitudes tão puras são representadas como uma divindade para a cidade, nesses momentos percebemos que a iluminação do filme se clareia, mas como os atos dessa jovem não são capazes de mudar a realidade das pessoas do vilarejo percebemos que a sua luz e facilmente dissipada na filmagem escura da cidade. Mas esse recurso é banalmente notado, sendo marcante no filme, tendo como cena mais impactante o momento que a jovem Grace é capaz de levar um pouco de luz a casa do senhor cego (Ben Gazzara).

30 4 - CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo dos nossos estudos podemos perceber o quão primitivos são os conceitos existentes sobre o território nos dias de hoje, o mesmo apresenta várias derivações e nenhum conceito concreto, universal e usual para todos os geógrafos. Deixando assim o mesmo aberto a interpretações, com essa falta de um conceito formal e oficial o território passa a ser algo esquecido no ensino, podendo muitas vezes ser esquecido. O território estudado ainda é muito físico, deixando a desejar a leitura da realidade pelas outras possibilidades que o conceito nos oferece. No mundo globalizado percebemos que novos conceitos de território vão surgindo, à medida que novas territorialidades vão se tornando mais frequente. Ao nos aprofundarmos em nossos estudos percebemos que os conceitos tão importantes de território, os quais estão totalmente presente em nosso dia a dia de diversas maneiras, são negligenciados. Acreditamos assim que uma melhor inserção desse conceito na sociedade, assim como um estudo mais elaborado sobre o trabalho desse conceito junto à população, deve ser perseguido. Concluímos assim que o território não deva se prender apenas as questões físicas, e que muitas vezes a população não possui o conhecimento de sua atuação no mundo, podemos tomar como exemplo das influências do território do dinheiro, que, apesar de fazer parte do cotidiano de todos, ainda é de conhecimento de uma pequena parte da população. Quanto à importância e eficácia do uso de filmes para trabalhar os conceitos de território e territorialidade, concluímos que há uma gama enorme de filmes que possibilitam trabalhar tais conceitos, uma vez que estamos imersos em diversos territórios e territorialidades, mas que tal uso demanda leituras acerca dos filmes e dos conceitos de território.

31 5 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARBOSA, Jorge Luiz. Geografia e cinema: em busca de aproximações e do inesperado. In: CARLOS, Ana Fani. (Org.) A geografia na sala de aula. São Paulo: Contexto, 2003. p. 109133. BLUWOL, Dennis Z. Uma geografia do cinema: imagens do urbano. Dissertação de mestrado em Geografia. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo: 2008. BRAGA, Rhalf Magalhões. Território, rede e multiterritorialidade: Uma abordagem conceitual a partir das corporações. Geografia artigos cientificos, Belo Horizonte n. 06(2) 2010, p. 26-36. BRASIL, MEC. Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino Médio. Brasília: Ministério da Educação, 1999. EISENSTEIN Sergei. A Forma do Filme. Rio de Janeiro: Zahar, 2002. HAESBAERT, Rogério e LIMONAD, Ester. O território em tempos de globalização. In: Revista Eletrônica de Ciências Sociais Aplicadas e outras coisas. n. 2(4). vol, 1, 2007, p. 39-52. SANTOS, Milton. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. Rio de Janeiro: Record, 2008. TERRA, Ademir. Evolução histórica da categoria geográfica território e a sua atual multiplicidade interpretativa. Caderno Prudentino de Geografia. n. 31, vol. 1, 2009, p. 1731. http://territoriosertaodosaofrancisco.blogspot.com.br. Acesso em 15 ago. 2011.

32 ANEXO Filmes que poderiam vim a ser utilizados:

1. Amor e Ódio (La rafle): filme que aborda a utilização do território na segunda guerra mundial, mostrando

como o território

pode adquirir

e dar

características a uma população, criando assim uma rede de territorialização e novas territorialidades.

2. Peixe Grande (Big fish): nos mostra que cada território possui sua característica e atribui características a seus habitantes, mostrando diferenças culturais e formas de consegui visualizar as diferenças territoriais.

3. Xingu: filme que aborda o choque que pode representar as diferenças territoriais e as formas de atuação da territorialidade e territorialização.

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.