Possibilidades pedagógicas do desenho no ensino da música - relatório final

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RELATÓRIO FINAL DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA
POSSIBILIDADES PEDAGÓGICAS DO DESENHO NO ENSINO DA MÚSICA


INTRODUÇÃO
Gilles Deleuze, em seu trabalho intitulado Francis Bacon: Logique de la Sensation (1981), desenvolve sua teoria da sensação em cima da obra do pintor Francis Bacon partindo do conceito de háptico criado pelo historiador da arte Alois Riegl (1858-1905). O espaço háptico seria um lugar em que os sentidos coexistem. Criado por Riegl como mecanismo de análise da arte plástica barroca, é uma forma de sintetizar a relação entre o que é visual e o que é tátil, como se para a visão fosse necessário o tato. Sua concepção de imagem a define como a passagem de uma plástica imaginária, virtual, a uma realização concreta (RIEGL, Historische Grammatik der bildenden Künste, 1966).
Wilhelm Worringer (1881-1965), discípulo de Riegl, sintetiza a obra de seu mestre e a usa para desenvolver suas próprias concepções. Em Abstraktion und Einfühlung : ein Beitrag zur Stilpsychologie (1921), Worringer aponta a projeção sentimental (Einfühlung) como o ponto de partida para a vivência estética.Vlad Ionescu, em seu Deleuze's Tensive Notion of Painting in the Light of Riegl, Wölf in and Worringer, diz:
A imagem para Riegl, Wolffin e Worringer é uma entidade por si só, não uma cópia do mundo mas algo constituido pela percepção do mundo. É uma extensão plástica do modo como o mundo é sentido (percebido) em um determinado momento (IONESCU, 2001, 55).
É tendo em vista essa ideia que proponho neste trabalho colocar a imagem visual e a imagem sonora em um mesmo espaço de compreensão assim como Riegl o fez com o visual e o tátil, usando da definição de Ferraz em seu Notas do caderno amarelo: a paixão do rascunho, porém com um intuito pedagógico, e não composicional:
A formula do desenho tem seu lado relevante no momento em que no desenho imperam procedimentos que não são aqueles da música tal qual aprendida em sua história e teoria tradicionais. O desenho traz sempre um frescor de um novo lugar de encontro no qual um bloco sonoro extraido de uma amostra de música africana pode mesclar-se facilmente com um fragmento de Beethoven. Não existe necessariamente nenhuma hierarquia musical no desenho, nenhum sistema de alturas e durações, nenhuma forma a priori, o que permite fluxos mais livres de imagens musicais. (FERRAZ, 2007, 11)
Para isso, as análises que aqui apresento partem principalmente das propostas de Paul Klee, pintor e professor da Bauhaus que, para sua obra e aulas, explorou a relação entre música e desenho. Klee, que começa sua vida profissional como violinista, acaba por traduzir a música na ideia de pontos e linhas, criando imagens que remetem à música. Seu pensamento está registrando em três livros: Pedagogical Sketchbooks (aulas compiladas por Lazlo Moholy-Nagy), La pensée créatrice e Histoire naturelle infinie. Em seu Le Pays Fertille (1989), Pierre Boulez, influenciado por Stockhausen a ler a obra de Klee, mais especificamente o La pensée créatrice, se dedica a mostrar como o pintor sempre trouxe a música para sua pintura: "Você verá, Klee é o melhor professor de composição" (Stockhausen para Boulez, 1989).
No entanto, assim como Ferraz diz no inicio de seu Notas do Caderno Amarelo, se fez necessário complementar o pensamento de Klee: "Para transcrever tal idéia à música, apenas acrescentei outra idéia, esta de Kandinsky (...)". Assim, junto ao estudo de Klee está o Ponto e linha sobre plano de Kandinsky que, ao desenvolver os aspectos teóricos da arte abstrata, usa constantemente da teoria musical. Tanto Klee como Kandinsky, assim como seus colegas da Bauhaus, foram fortemente influenciados por Worringer e pelo conceito de háptico.

OBJETIVOS
O projeto intitulado Possibilidades Pedagógicas do Desenho no Ensino da Música teria como objetivo final viabilizar a aplicabilidade experimental de uma pedagogia forjada em ferramentas visuais para o ensino musical, mais especificamente do violoncelo. Para tal, seria necessária a contrução de uma metodologia facilitadora da interface entre o sonoro e o visual. Essa interface, tão comum a Klee, Kandinsky e Ferraz, foi, no primeiro momento dessa pesquisa, estudada com base em toda a bibliografia encontrada.
A pesquisa realizada até o momento esteve concentrada em coleta e organização de dados. Para que seja possível a criação a partir do estudo teórico e conceitual da interface aqui apresentada, se faz necessária uma completa compreensão do trabalho de Klee, que só existe com um estudo aprofundado da bibliografia que o circunda. Foi esse aprofundamento bibliográfico o objetivo primordial do primeiro momento da pesquisa, que agora seguirá com o intuito de usar de todo o arcabouço teórico acumulado para a criação de uma metodologia que utiliza da imagem visual para a compreensão da imagem sonora.

METODOLOGIA
O método usado nesse momento da pesquisa foi o da coleta e análise de dados. A bibliografía inicial utilizada partiu de Paul Klee e Wassily Kandinsky. Com base em um estudo profundo da obra de ambos, fez-se necessária a busca do que os influenciou, e foi inevitável chegar ao trabalho de Worringer e Riegl. Para uma melhor compreensão dos conceitos criados pelos dois, estava Deleuze.
Em uma busca por uma bibliografia que pudesse esclarecer como prosseguir com a análise partindo da bibliografia inicial, está Ferraz, com seu Notas do caderno amarelo. No entanto, o que em sua pesquisa aparece de forma muito mais exaustiva por tratar-se de seu material composicional, aqui aparece sucintamente como estrutura para o que se tornará material pedagógico. Junto a Ferraz, está a pesquisa de Ficagna, que expande o que era material visual para composição, apresentando trabalhos como o do compositor grego Iánnis Xenakis. Ao estudar Ferraz e Ficagna, havia em comum Sciarrino, que também aparece nas análises dessa pesquisa.
Por fim, foram analisados também os Játekok, jogos musicais criados por György Kurtág, compositor húngaro, que partem do desenho e da imagem visual para o ensino do piano, método mais próximo do que foi proposto como material final dessa pesquisa.



ANÁLISES
RIEGL E WORRINGER
Alois Riegl, ao criar o conceito de espaço háptico como ferramenta da sua pesquisa, possibilitou, então, inúmeras relações, e não só a união tato-visão, objeto de seu trabalho. Ferraz diz:
Ao falar desta fusão imagem-escuta, é próximo pensar-se no que Alois Riegl chamou de espaço háptico, lugar em que todas as faculdades de percepção se mesclam, e o olho ouve tão bem , ou melhor, do que o ouvido, e o ouvido vê tão bem, ou melhor, que o olho. (FERRAZ, 2007, 12).
E assim, dentro desse espaço de fusão dos sentidos, as linhas de Klee e Kandinsky, que são analisadas mais para frente, podem estar associadas, na música, a altura, dinâmica, densidade, tessitura… Ou seja, qualquer elemento.
2. KLEE
Enquanto lecionava na Bauhaus, de 1921 a 1931, Klee teve uma volumosa produção teorica. Em Pedagogical Sketchbooks (1953), é possível perceber o quão meticulosa era a preparação de suas aulas. A compreensão das linhas, planos e todos os desenhos com aparência de notação musical ali presentes não parece clara desde o princípio, porém, com a análise também de seu Cours du Bauhaus (2004), o pensamento do artista deixa de ser turvo. Dissecando o material encontrado nesses dois livros, as análises feitas nessa pesquisa acontecem a partir de um pensamento musical, tendo como objetivo uma aplicação pedagógica. Assim, a conceituação de ponto, linha e plano no trabalho de Klee com suporte também do que é apresentado por Kandinsky se dá aqui de forma a ressaltar a musicalidade potencial desse conteúdo.
Para Klee, o ponto é o agente do movimento. Sua análise do ponto aqui é mais sucinta do que a que será apresentada por Kandinsky, mas não menos densa: o papel do ponto é movimentar-se ou limitar o movimento de uma linha ativa. Ele conceitua dois tipos de linha, sendo a primeira a ativa: aquela que por si só se movienta, podendo ser acompanhada, se auto-circundar ou até ter uma sombra: as possibilidades são inúmeras. É essa linha que pode ter seu movimento limitado por um mais pontos.

Linha ativa delimitada por pontos (KLEE, 1953, 18)

O outro tipo de linha apresentado é a linha passiva. A linha passiva não se movimenta por si só, como um ponto que ao se mover deixa um rastro, mas é movimentada. Ao ser movimentada, a linha passiva pode gerar um plano.


Planos formados pela linha passiva sendo movimentada (KLEE, 1953, 19)

Ferraz diz: As linhas de Klee parecem-se muito com música (falamos de linha melódica constantemente e não nos damos mais conta do cruzamento de olho e ouvido implicado nesta imagem). Assim, as possibilidades apresentadas pelos mais diversos movimentos de linhas ativas e passivas são infinitas. Relacionando o espaço na imagem visual com o tempo na imagem sonora, é possível criar a noção de ritmo a partir de linhas consecutivas, como a repetição de uma mesma unidade.

Linhas que formam ritmo (KLEE, 1953, 22)



3. KANDINSKY
Em Ponto e linha sobre o plano, Kandinsky apresenta o ponto geométrico como "a singular união de silêncio e fala" (1926, 25), podendo ser mudo, quando parado, ou audível ao ser movimentado. Quando movimentado, o ponto pode ter tamanhos e formas diferentes, o que varia o seu som. Ainda sim, é uma unidade, como a batida de um triângulo ou um pizzicato. A definição dada por Kandinsky do ponto como"a colisão inicial da ferramenta com o plano material" (p. 29) é o que possibilita, no resultado parcial desse trabalho, a transferência clara do conceito de Klee para a música, para o violoncelo ou para qualquer instrumento musical.

Pontos com diferentes sons (KANDINSKY, 1926, 31)
A partir dessa descrição, Kandinsky apresenta o ponto como o protótipo da expressão pictorial, material ao qual tudo pode ser reduzido. Ele, inclusive, se utiliza de partituras musicais para demonstrar a redução do material ao ponto.

Redução de partituras a pontos (KANDINSKY, 1926, 44)
Ao contrário de Klee, Kandinsky dá apenas uma definição de linha: ela é o resultado da transformação do ponto através de forças externas, definição quase idêntica à de linha passiva de Klee, acrescentando apenas a necessidade de um agente exterior que movimenta a linha, como o braço do instrumentista, o sopro que passa pelo instrumento, a colisão prolongada do agente com o plano. Ele ainda acrescenta:
É particularmente interessante e significante que a representação musical gráfica comumente usada hoje - a notação musical - é nada além de várias combinações de pontos e linhas (KANDINSKY, 1926, 99)
É clara a importância do ponto e da linha como alicerce estrutural para todo o trabalho que Klee e Kandinsky desenvolveram. O ponto é onde tudo surge, e, ao se movimentar, se torna uma linha. Assim, por enquanto, essa pesquisa se esquivou das relações que também existem entre cor e imagem sonora para o estudo apenas de ponto e linha primeiramente.

4. SCIARRINO
O que traz o compositor italiano Salvatore Sciarrino a essa pesquisa é sua compreensão sinestésica da música. Gracia Giacco, em seu La notion de figure chez Salvatore Sciarrino analisa essa concepção sinestésica do compositor, mostrando, inclusive, as relações entre seu pensamento e o de Klee e Kandinsky. Ela diz que "parece haver uma simetria de pensamento entre Kandinsky e Sciarrino" (2001, 19). O que, a principio, para Sciarrino era espaço na música, se tornou Figura, partindo de uma base fisiológica para o processo de organização musical. Giacco explica: "Por que Sciarrino usa mais tarde o termo figura, e não espaço? O termo Figura pode não ter nada a ver com espaço; no entanto, a palavra vem das artes figurativas, se refere a uma dimensão sinestésica e obviamente para ele a figura é igual às estruturas que, elas mesmas, estão relacionadas ao espaço". Assim, o que Sciarrino estava tentando fazer era exatamente criar uma relação entre a arte visual e a música partindo da sinestesia, que seria a manifestação fisiológica do háptico.
Ao se tentar criar um material que usa o visual para a compreensão do sonoro, fisiologicamente, o que acontece, é uma relação entre os sentidos visão, ao ler a partitura; tato, quando os sinais apresentados naquele manual se tornam movimento no instrumento musical e audição, já que esses sinais causam movimentos com a intenção de um som específico. Ou seja, uma ação de caráter sinestésico.

5. KURTÁG
Com seus Játekok, o compositor húngaro György Kurtág permite o ensino do piano astravés de jogos, como o prórpio nome do livro já diz, utilizando-se de ferramentas visuais. Na introdução do método, antes da bula que desvenda os desenhos presentes nos sete volumes, Kurtág revela o piano como um brinquedo e apresenta seus Játekok como um método para a experimentação, e não para aprender a "tocar piano". Sobre as imagens visuais criadas por ele, diz: "Nós deveríamos confiar na figura das imagens impressas e deixá-la exercer sua influência em nós". (KURTAG, 1979, p.9)
Com exercícios em homenagem à Schostakovich, Kabalewsky, Verdi, Bartók e diversos outros compositores, e nomes como "Brincadeira de sombras", "Número do telefone de pessoas amadas", "Nós teimosos", o que Kurtág está fazendo é inclinar o aluno a uma projeção sentimental, fazendo com que ele, a partir do seu contexto e do significado que os conceitos apresentados têm para ele, vivencie estéticamente esses conceitos no piano.


(Formas de se tocar clusters, Introdução aos Jatekok, Kurtag, 1979, p. 10-11)


Notas que formam nós (Stubborn Knots, Kurtag, Jatekok: Spiele Games, Book 3, 1979, p. 25)
6. FICAGNA
Alexandre Ficagna, em trabalho intitulado O desenho como metodologia composicional: possíveis derivações da composição assistida por gráficos na música instrumental de Xenakis, partindo da obra do compositor grego Iannis Xenakis, analisa o desenho como material composicional. Ele mesmo, em suas peças, se utiliza desse material, como explica em Estudo, para quarteto de clarinetes: manipulação de imagens acústicas por meio de imagens visuais.
Ao analisar o processo criativo de Xenakis, Ficagna relata o conceito de tempo do qual Xenakis parte, possibilitando uma composição em que imagem sonora e visual são equivalentes: "Xenakis não só propõe esta equivalência como elabora ferramentas para operacionalizá-la: sua concepção de que tempo e espaço teriam uma mesma ordem estrutural subjacente permite-lhe representar o tempo como uma série de pontos formando uma linha reta, sendo possível contá-lo e até desenhá-lo"(2014, 181). Essa concepção de tempo e espaço possuindo uma mesma ordem estrutural é a mesma que Kandinsky desenvolve.
A análise de Ficagna, bastante prática, mostra a poética composicional de Xenakis, partindo de linhas, pontos e outros materiais criados e repetidos pelo próprio compositor. A sintetização das "imagens sonoro-visuais" de Xenakis demonstra de maneira quase didática como se dá a coexistência dos dois planos:
Várias de suas composições são imaginadas visualmente, com o auxílio de um gráfico formado por dois eixos, em um sistema visual que tem o eixo horizontal (abscissas) como o tempo e o eixo vertical (ordenadas) como as alturas. Com esta ferramenta, o compositor realizou diversas equivalências entre imagens sonoras e visuais, de pequenas sonoridades a eventos massivos. Foi com o auxílio de gráficos, manipulando linhas e pontos, que ele desenvolveu suas principais imagens sonoro-visuais: (a) o glissando como equivalente à linha (elemento de intersecção Música/Arquitetura); (b) a elaboração da técnica conhecida como "arborescências" (que diferem das texturas de glissandi pela coordenação das linhas e não apenas pela superposição das mesmas); (c) a manipulação de eventos massivos, sejam texturas de glissandi ou "nuvens de sons" ("ser massivo" de sons descontínuos). (FICAGNA, 2014, 182).
O trabalho de Ficagna permite um vislumbre daquilo que já foi feito partindo da transformação de imagem visual em imagem sonora.

Gráfico de Xenakis para Syrmos, comp. 291-303 (SOLOMOS, 2001) (Apud. Ficagna, 2014, 186)

Esboço feito por Xenakis (1963: 31), dos comp. 52-59 de Pithoprakta. (Apud. Ficagna, 2014, 193)



RESULTADOS PARCIAIS
O resultado que se deu desse um ano de pesquisa, além do acúmulo e análise do material teórico que passa a servir como estrutura para a continuação dela, foi a aplicação prática, ainda de maneira simplista, no violoncelo, dos conceitos de ponto e linha solidificados a partir da bibliografia estudada. Com a imagem visual do ponto e da linha aplicada de maneira a formar imagens sonoras tendo como dispositivo o violoncelo, facilita-se a compreensão dos mecanismos do instrumento.
Foi possível criar uma relação som-imagem em esboços simples. São desenhos que, partindo da idéia de Kadinsky de espaço na representação visual como equivalente a tempo, no sonoro, utilizam-se de uma representação gráfica que usa de eixos (x, tempo; y, altura), como em uma partitura ou em um plano cartesiano, para localizar os pontos e linhas.
Se o ponto é a união entre silêncio e som, lugar onde a energia está contida, além da análise dele como um pizzicato, como afirma Kandinsky, ele é pode ser apresentado como a tensão do arco na corda antes de qualquer nota ser tocada. Quando o braço segura o arco e o apoia na corda, o som quase inaudível formado pela tensão da crina ao ser posicionada na corda é também um ponto.
Assim, se a linha é uma sucessão de pontos ou o ponto que se movimenta e, para se movimentar ou ser movimentada ela necessita de uma energia externa, ela se dá quando a tensão da crina na corda é liberada e, o braço do instrumentista, antes parado e aplicando força, se movimenta, deslizando sobre a corda e formando um som contínuo. É a energia autocontida do ponto sendo liberada e o movimentando para que ele se torne linha.
Dentro do espaço háptico, no entanto, as possibilidades são infinitas. A linha interceptada por pontos de Klee pode ser, por exemplo, o arco que se movimenta em uma corda só enquanto a mão esquerda é representada pelos pontos, interceptando o som contínuo e dando a ele novas direções. Ou então, é possível que duas linhas paralelas representem um movimento intervalar também paralelo ao se tocar cordas duplas; uma linha com uma sombra, como as desenhadas por Klee, o movimento harmônico não paralelo de duas cordas ao mesmo tempo. A linha não precisa ser apenas melodia: ela pode representar intensidade ou pode ser movimentada como a linha passiva de Klee e formar um plano harmônico, tudo depende ao que serão atribuidos os eixos da abscissa (x) e da ordenada (y). É possível aplicar o conceitos aqui analisados de diversas maneiras à mecânica do violoncelo, e esses resultados, simples, são parciais, um prólogo ao objetivo final da pesquisa.
Na tentativa de esboçar essas relações entre visual - mecânico - sonoro, no entanto, constatou-se o caráter experimental delas. Não há como estabelecer uma atribuição engessada do que é o eixo x e o eixo y, pois esse papel já é cumprido pela notação musical que usamos e, assim, essa pesquisa não cumpriria sua função. Mas é exatamente essa liberdade de criação que aproxima o objeto pesquisado ao material tão utilizado na composição contemporânea, presente no trabalho de Ferraz, Sciarrino e tantos outros compositores, como Iannis Xenákis. Tendo em mente a projeção sentimental de Worringer, toda e qualquer imagem visual que faça parte o arcabouço do instrumentista, que tenha um significado forjado a partir de suas vivências anteriores, pode ser por ele transformado em material sonoro.

CONCLUSÕES FINAIS
Após a tentativa de coletar o máximo de dados possíveis em um ano de pesquisa, não passa despercebida a forma superficial que o assunto ainda é tratado na área musical. Assim, o intuito é de continuar o que vem sendo estudado, mas agora com uma abordagem mais prática. Essa abordagem, que no início parecia bastante incerta, começa a tomar forma a partir do conhecimento adquirido. No entanto, quanto mais profundo o estudo, mais experimental parece que será o caráter do material a ser desenvolvido.
Mesmo György Kurtág, já firmado como compositor, cria seus Játekok como método de experimentar o piano, e não aprender a tocá-lo formalmente. O objetivo de criar uma ferramenta facilitadora do ensino do violoncelo partindo da imagem visual para a construção da imagem sonora não foi abandonado, mas o ideal de sua criação no princípio dessa pesquisa foi moldado e renovado diversas vezes. Cada vez mais fica claro como essa ferramenta vem como aliada de uma música contemporânea, o que, assim, mostra que, na próxima etapa dessa pesquisa, buscarei fontes na composição musical contemporânea mais que no material teórico usado até o momento.



REFERÊNCIAS
BOULEZ, Pierre. Penser la musique aujourd'hui. Paris: Gallimard. 1963.
BOULEZ, Pierre. Le pays fertille. Paris: Gallimard. 1989.
DELEUZE, Gilles. Franci Bacon: Logique de la sensation. Paris: Ed. de la différence. 1991.
FERRAZ, Silvio. Notas do caderno amarelo: a paixão do rascunho. São Paulo: IA-UNICAMP. 2007.
FICAGNA, Alexandre. Estudo, para quarteto de clarinetes: manipulação de imagens acústicas por meio de imagens visuais. In: ENCONTRO INTERNACIONAL DE MÚSICA DE CÂMARA EM ÉVORA, 1, 2012, Universidade de Évora. Anais... Évora, 2012a, p. 28-43
FICAGNA, Alexandre Remuzzi. Entre o sonoro e o visual: a composição por imagens. UNICAMP, 2014.
GIACCO, Gracia. La notion de figure chez Salvatore Sciarrino. Paris: L'Harmattan. 2001.
IONESCU, Vlad. Deleuze's tensive notion of painting in the light of Riegl, Wölfflin and Worringer. Deleuze Studies 5.1, 52-62. Edinburgo: Edinburgh University Press. 2001.
KAGAN, Andrew. PAUL KLEE/ Art and Music. Nova Iorque: Cornell University Press, 1983
KLEE, Paul. Diários. São Paulo: Martins Fontes, 1990.
KLEE, Paul. Pedagogical Sketchbooks. Londres: Faber and Faber Limites, 1968.
KLEE, Paul. Cours du Bauhaus. Weimar, 1921-1922. Le Musée de Satrasbourg, 2004.
KURTÁG, György. Játékok, Spiele Games. Volumes 1-7. Budapeste: Editio Musica Budapest.
SCIARRINO, Salvatore. Le figure della musica: da Beethoven a Oggi. Milão: Casa Ricordi, 1998.
WORRINGER, Wilhem. Abstraction and empathy: a contribution to the psychology of style, traduzido por Michael Bullock. Londres: Routledge and Kegan Paul. 1953.




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