Praia da Rocha: um paradigma da antropização do litoral algarvio
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15028 Workshop Antropicosta Iberoamerica 2010. CD-ROM:paper TÍTULO: PRAIA DA ROCHA: UM PARADIGMA DA ANTROPIZAÇÃO DO LITORAL ALGARVIO AUTORES: Joana Gaspar de Freitas, João Manuel Alveirinho Dias TEMA: Modificações na morfologia costeira RESUMO: Primeira estância balnear do Algarve, a Praia da Rocha tem pouco mais de um século de existência no que toca à sua ocupação com vista à utilização dos banhos marítimos. Durante este tempo, a localidade transformou‐se radicalmente passando de um pequeno povoado à beira‐mar com meia dúzia de casas a um grande centro urbano que, durante o verão, atrai milhares de turistas. Neste processo, os pequenos châlets no topo das arribas foram substituídos por torres de apartamentos, os hotéis e pensões familiares deram lugar às grandes cadeias hoteleiras e os escassos espaços de comércio e diversão – dos quais o mais importante era o casino ‐ multiplicaram‐se numa pluralidade de restaurantes, cafés, bares, discotecas e lojas, sendo também criado um novo espaço destinado ao jogo. Este crescimento urbano desmedido, registado sobretudo nas últimas décadas do século XX, mostra‐se muito semelhante ao que ocorreu na maioria dos núcleos costeiros do Algarve Central. O caso da Praia da Rocha, porém, revela‐se paradigmático, uma vez que no arranque da expansão turística, no princípio dos anos 70, se procedeu à alimentação artificial da praia, com vista ao alargamento do areal para aumentar a sua capacidade de utilização balnear e para evitar que as vagas atingindo as arribas pudessem em risco as construções edificadas ali na última década. A Rocha nunca foi uma praia extensa, a sua largura dependia das trocas sedimentares com os bancos do delta submerso do rio Arade: as obras de construção do molhe W na barra daquele rio provocaram alterações no sistema e provavelmente contribuíram para o emagrecimento da praia, que só viria a recuperar com a conclusão daquela estrutura, que favoreceu a acumulação de areia. Contudo, a Praia da Rocha nunca poderia de forma natural converter‐se num grande areal, pois nesta região a quantidade de areia disponível na deriva litoral é relativamente reduzida. Ora a questão que se punha em finais de 60, é que a Rocha, ao contrários de outros tempos em que era apenas frequentada por algumas dezenas de banhistas que se concentravam em dois ou três pontos, à sombra dos rochedos, passara a ter uma procura muito intensa e não havia espaço útil para a instalação de tão grande número de turistas. A solução encontrada foi a construção de um sistema costeiro artificial com materiais provenientes da dragagem do ante‐porto. O sucesso das operações de enchimento (1970, 1983 e 1996) fazem da Praia da Rocha um caso único no país e um magnífico exemplo de antropicosta. Os perfis levantados em 1988 indicavam que mais de 80% do material depositado permanecia ali: o facto de o transporte longilitoral ser reduzido, de o clima de agitação marítima ser bastante moderado em comparação com a costa Oeste portuguesa, e de a praia constituír um sistema praticamente fechado graças à Ponta dos Três Castelos e ao
São Paulo, Iguape e Cananéia – Brasil – de 27 de março a 01 de abril de 2010
molhe W do porto, explica o sucesso destas alimentações artificiais. Pelo contrário, no trecho litoral a ocidente, entre os Três Castelos e o Vau, alvo das operações de 1983 e 1996, verificou‐ se a perda rápida e significativa (cerca de 60% em 1988) do material ali colocado, o que resulta destas praias não serem sistemas fechados. O êxito alcançado na ampliação do areal na Rocha teve, contudo, um lado perverso no que toca à ocupação humana daquele litoral: possibilitou a expansão do turismo de massas, ao criar uma praia com maior capacidade de carga e ao permitir – graças à subtracção da arriba aos processos marinhos ‐ um crescimento da volumetria das construções, dando origem, a partir dos anos 80, ao aparecimento de uma frente contínua de edificações de grandes dimensões adjacentes à costa. A singularidade da Praia da Rocha, aquela que foi descrita como a mais bela das praias algarvias, foi sacrificada em nome da perpetuação dos interesses estabelecidos: dos muitos milhares de turistas que a visitam poucos sabem que estão perante uma paisagem totalmente antropizada, construída especificamente para os receber. Entretanto, as rochas peculiares – escolhos, leixões, pináculos, arcos – que deram nome e fama áquela praia, foram na maior parte destruídas ou cobertas pelo areal. A nosso ver, o estudo deste caso, com base na análise da evolução histórica desta localidade, no elencar das expectativas e dos planos de urbanização para esta região e no confronto entre os usos dados a este espaço e o seu impacto sobre o meio envolvente, permitem ilustrar com grande clareza a relação que se estabeleceu nos últimos séculos entre a sociedade e o litoral, baseada numa interligação estreita que assenta na capacidade de transformação do homem ‐ que procura domesticar o espaço e criar paisagens artificiais que se enquadrem nos seus objectivos e aspirações ‐ e na resposta dos sistemas naturais a essas alterações, gerando novas realidades que obrigam os seres humanos a buscar outras soluções, num ciclo aparentemente interminável de acção‐reacção, impossível de ignorar.
São Paulo, Iguape e Cananéia – Brasil – de 27 de março a 01 de abril de 2010
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