PREFÁCIO: UMA CONTRIBUIÇÃO COSMOPOLITIZANTE PARA OS ESTUDOS DA RELAÇÃO BRASIL-ESTADOS UNIDOS

June 1, 2017 | Autor: Daniel Chaves | Categoria: History of International Relations, Ditadura MIlitar Brasileira (1964 - 1985)
Share Embed


Descrição do Produto

Prefácio para AYRES PINTO, Danielle Jacon & BRAVO, Juliano dos Santos. A Ação dos Estados Unidos no Golpe Civil-Militar Brasileiro de 1964: uma perspectiva das relações internacionais. Rio de Janeiro: Autografia, 2016.

UMA CONTRIBUIÇÃO COSMOPOLITIZANTE PARA OS ESTUDOS DA RELAÇÃO BRASIL-ESTADOS UNIDOS

A discussão em torno das relações Brasil-Estados Unidos é uma das mais ricas e complexas diante da estruturação de um sistema hemisférico de relações internacionais, seja em corte internacionalista ou historiográfico. Não apenas por uma questão de entendimento da inserção nacional brasileira no mundo, diante de um determinado parceiro fundamental para o país, mas para uma compreensão ampliada sobre como, através do quê e de que modo os dois maiores países do hemisfério ocidental se relacionaram. Para além das normativas sobre a aceitação da principal hipótese que norteou os estudos sobre esta relação - a de que o alinhamento automático é uma linha geral e estruturante do relacionamento brasileiroestadunidense – é previdente e justo enfatizar tal papel, em especial diante da sua longeva duração de quase cem anos de parceria comercial de alto desempenho, além de uma afinidade quase particular entre as nações. A despeito do fato de que a China desbancou os Estados Unidos no papel do maior parceiro comercial brasileiro por volta do início dos anos ’10 do Século XXI, do ponto de vista cultural, político e ideológico, a relação se mantém forte e consolidada, com ampla aceitação por ambas as sociedades, segundo consulta do Pew Research Center. Contudo, segundo Hirst, a perda da centralidade de tais relações determinará, de forma cabal, as orientações analíticas e os resultados das iniciativas posteriores no âmbito das relações internacionais brasileiras 1. Ganha importância, nesta direção, a potencialidade para estudos regressivos nas relações internacionais, em busca de uma análise apurada de tais linhas-mestras para que seja possível a identificação das principais tendências e questões históricas.

1

HIRST, Monica. As relações Brasil-Estados Unidos desde uma perspectiva multidimensional: evolução contemporânea, complexidades atuais e perspectivas para o século XXI. Tese submetida ao Programa de Pós-Graduação em Estudos Estratégicos Internacionais da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, como quesito parcial para obtenção do título de Doutora em Estudos Estratégicos Internacionais. Porto Alegre, 2011.

Prefácio para AYRES PINTO, Danielle Jacon & BRAVO, Juliano dos Santos. A Ação dos Estados Unidos no Golpe Civil-Militar Brasileiro de 1964: uma perspectiva das relações internacionais. Rio de Janeiro: Autografia, 2016.

Ainda hoje são vastas as oportunidades para que os estudos se aprofundem e encontrem vasta documentação aberta, com originais teses e dissertações que sejam subsidiárias, além de uma continuada validade estratégica hemisférica e em agendas comuns como temas econômicos, políticos e de segurança. A importância das relações com os Estados Unidos, desde um ponto de vista brasileiro, estiveram sistematicamente voltadas para os melhores ganhos e a garantia de certa segurança diante das instabilidades do sistema internacional 2. Nesta direção é preciso frisar, com cuidado adequado, que ao passo em diversos momentos da história da política externa brasileira tais relações oscilaram entre a cautela para a sobrevivência, o alinhamento se impôs muitas vezes para assegurar saltos no desenvolvimento segundo os determinados padrões cimeiros que se tinha circulação no Rio de Janeiro ou em Brasília 3. Episódios como a formação da Comissão Mista Brasil-Estados Unidos, com dividendos incalculáveis para a substituição de importações na era Vargas, por exemplo, entram em contraste com momentos de relativa prudência vigilante como no alvorecer do projeto nuclear brasileiro dos anos ‘70. As continuidades e descontinuidades desta relação, de forma pivotada ou comparativista, podem suscitar uma amostragem caleidoscópica a respeito de como as variações caminharam desde uma relação direta e privilegiada até padrões menos intensos e acautelados, culminando em um ponto onde algumas situações assimétricas se tornam menos visíveis e o Brasil pôde, com alguma segurança, redimensionar e equilibrar seu jogo com o antigo Grande Irmão 4. Diversos estudos apontam, por outro lado, que tais relações teriam tido pontos baixos, ou oscilações, na sua curvatura. O chamado descentramento das relações, em momentos como a Política Externa Independente dos anos '60, ou do Pragmatismo Responsável e Ecumênico, na segunda metade dos anos '70, ou ainda durante os governos do PT (2003-...) no Brasil apontariam para a hipótese de que quanto mais a

2

CERVO, Amado & BUENO, Clodoaldo. História da política exterior do Brasil. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2008. 3 MOURA, Gérson. Autonomia na dependência: a política externa brasileira de 1935 a 1942. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980. 4 HIRST, Monica. Brasil – Estados Unidos: desencontros e afinidades. Rio de Janeiro: FGV de Bolso, 2009.

Prefácio para AYRES PINTO, Danielle Jacon & BRAVO, Juliano dos Santos. A Ação dos Estados Unidos no Golpe Civil-Militar Brasileiro de 1964: uma perspectiva das relações internacionais. Rio de Janeiro: Autografia, 2016.

doutrina internacional do governo brasileiro fosse internacionalizada, esta mesma seria mais autonomizada diante do seu parceiro tido usualmente como privilegiado desde o século XIX 5. Contrasta com isto o mais alto nível de relacionamento em episódios como a independência brasileira, e certa cautela ao longo do século XIX, com uma significante reversão nas vésperas da República brasileira e do relativo processo de industrialização nacional. Não obstante, neste livro as tensões em torno de uma relação complexa, e em determinado ponto dolorosa da História do Brasil – o golpe civil-militar de 1964 – são abordados desde uma perspectiva diferenciada e sofisticada: por um lado, é observado atentamente o papel dos Estados Unidos desde um ponto de vista histórico, no qual se desfraldaram as ações e o apoio, de forma institucional e particular, a um evento cujas consequências como ruptura, em interrupção desautorizada e inconstitucional, terminaram sendo dramáticas para as instituições democráticas do Estado brasileiro. Por outro lado, há uma atenção específica e devidamente balizada da conjuntura das relações internacionais, resultando em uma análise de inputs e outputs interdependentes que explicam o golpe de dentro para fora, e de fora para dentro. No reverso das discussões entre cientificismo e epistemologia no âmbito das Relações Internacionais como campo sólido e maduro no Brasil e no mundo, a contribuição de Danielle Jacon Ayres Pinto e Juliano dos Santos Bravo é de suma importância, como modelo de estudos, como abordagem conceitual e, fundamentalmente, como apontamento do passado para o futuro.

Daniel Chaves Professor de História Contemporânea e do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional (PPGMDR) da Universidade Federal do Amapá (Unifap) Pesquisador OBFRON / LABRIGEO / CPTP da Unifap

5

MILANI, Carlos Roberto Sanchez. A importância das relações Brasil-Estados Unidos na Política Externa Brasileira. Boletim de Economia e Política Internacional, n. 6, abr 2011.

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.