Prémio científico Mário Quartin Graça 2016 (Ciências Sociais e Humanas)

May 26, 2017 | Autor: Vitor de Sousa | Categoria: Cultural Studies, Estado Novo, Identidades
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Muito bom dia! A minha investigação fala de identidade e do que lhe está adjacente. O que nos leva à 'portugalidade' e à dinâmica naturalizadora do termo. Um termo datado - que se inscreve no período do Estado Novo, entre as décadas de 50 e 60 do século XX -, mas que, nos últimos tempos, tem sido de certa forma, ressuscitado, mesmo que não conste dos dicionários de referência e, nos 'mainstream', seja sinónimo, por exemplo, de 'sentido verdadeiramente do que é português'. E o que será isso de verdadeiramente português, pergunto eu? Essa foi, de resto, uma das razões que me levou a investigar a 'portugalidade'. Ora, nada acontece a partir deste momento. Existe uma memória que é necessário preservar e contextualizar, nomeadamente os termos que se utilizam, para que estes sejam reabilitados em contexto e se não naturalizem sem mais. O conceito ‘portugalidade’ decorre, assim, de uma lógica estado-novista para que as ex-colónias fossem vistas pela ONU não como territórios autónomos, mas como parte integrante do território português (ou seja: como províncias ultramarinas), o que foi corroborado pelo discurso parlamentar da Assembleia Nacional, a partir de 1951 (data da revogação do Ato Colonial). Toda essa estratégia ia no sentido de combater os movimentos independentistas que emergiam nas antigas colónias, defendendo a pertença desses territórios a Portugal, por via do seu ‘destino histórico’. Esse facto seria sublinhado no discurso político da ‘portugalidade’, com a assunção de Portugal, como um país uno e indivisível: “Portugal do Minho a Timor”. Considero, por isso, que integrar a 'portugalidade' na lusofonia, é um contrassenso, já que remete para uma centralidade portuguesa num espaço cultural imaterial integrado por outros países com estatuto jurídico próprio, que antes foram colónias portuguesas, mas que hoje são independentes. Não obstante, toda a dinâmica da lusofonia esbarra numa série de equívocos que têm que ser desfeitos, que impedem o seu desenvolvimento. E, neste caso concreto, o plano político ajuda pouco à concretização desse desiderato, nomeadamente pela lógica luso tropicalista que ainda vai pairando. Este é um prémio importante para mim, porque tem um espectro internacional e porque reitera o trabalho que desenvolvi ao longo de vários anos sobre a ‘portugalidade’, numa verdadeira obsessão. É um incentivo para a área das Ciências Sociais e Humanas, evidenciando a necessidade de promover o espírito crítico e a desconstrução, numa altura em que a sociedade privilegia os consensos. E para a própria lusofonia que, desta forma, atinge um patamar de atenção raramente observado.

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