Prevenção e gestão de inundações no Estado do RJ: limites dos instrumentos de urbanismo e gestão ambiental frente à fragmentação das competências

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JOURNEES FRANCO-BRESILIENNES D’HYDROLOGIE URBAINE – PARIS 2015

Prevenção e gestão de inundações no Estado do RJ: limites dos instrumentos de urbanismo e gestão ambiental frente à fragmentação das competências Viviane Japiassú

1 Viana ,

Rosa Maria Formiga

2 Johnsson ,

Bernard De

3 Gouvello

1 - Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ / Programa de Pós Graduação em Meio Ambiente (PPGMA) / Bolsista da CAPES 2 - Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ / Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental (DESMA) 3 - Centre Scientifique et Technique du Bâtiment (CSTB)/ Laboratoire Eau Environnement et Systèmes urbains (LEESU)

A forte pressão urbana exercida sob os rios fluminenses devido à retirada da vegetação das margens de rios, às intervenções não autorizadas e ao acúmulo de lixo nos corpos d´água, bem como a ocupação das áreas de risco, têm intensificado os danos causados por este tipo de desastre nos últimos anos. Adicionalmente, diversos municípios brasileiros ainda negligenciam e até mesmo incentivam a ocupação desordenada do solo em áreas de risco, desrespeitando a legislação ambiental e urbanística em vigor. Neste contexto, impõem-se o seguinte questionamento: A não consideração dos riscos de inundação nos planos diretores e nas licenças ambientais (estaduais e municipais) e urbanísticas (municipais) têm contribuído para o aumento da ocorrência de desastres ambientais no estado do Rio de Janeiro?

Figura 4: Mapeamento de áreas risco de inundação na região serrada do RJ

1. Desastre de 2011: um aprendizado sobre a ocupação de áreas de risco e reflexões sobre as políticas de meio ambiente e urbanismo no Brasil Em janeiro de 2011, após cerca de 10 dias de período chuvoso, a região serrana do estado do Rio de Janeiro foi atingida por fortes chuvas durante 32 horas. Este fenômeno atípico causou uma combinação de inundações, enxurradas e escorregamentos de massa, resultando em um desastre com proporções catastróficas. Dados oficiais registraram mais de 900 mortos, 22.479 desalojados e 304.562 habitantes afetados (mais 40% da população local atingida pelo desastre e mais de R4 bilhões de danos). No entanto, apesar de surpreendentes, estes números ainda estão subestimados, tendo em vista uma grande quantidade de pessoas que até hoje estão desaparecidas.

Figuras 1, 2 e 3: Áreas atingidas em janeiro de 2011 pelo desastre na região serrana do RJ

A falta de controle da ocupação de áreas de risco de inundação devido à não consideração deste risco nos planos diretores, assim como nas licenças urbanísticas e ambientais, somados à falta de controle da ocupação do solo foram apontados pelos especialistas como fatores que contribuíram para o aumento dos danos causados pelo desatre. Este evento colocou em evidência a urgência do estabelecimento de uma política pública articulada entre os três níveis de governo (federal, estadual e municipal) que considere os riscos de desastres na regulamentação do uso e ocupação solo.

Apesar de traumática para a população, a tragédia da Região Serrana promoveu reflexões em âmbito governamental, acadêmico e popular, constituindo uma oportunidade de aprendizado sobre a ocupação de áreas de risco no país, levando para a agenda política brasileira a problemática da gestão de risco de desastres.

2. Uma nova política para a prevenção de desastres no Brasil Desde o desastre da região serrana, o governo federal vem realizando uma série de medidas de proteção, recuperação e prevenção de desastres.

Figuras 5 e 6: Zoneamento de áreas de risco de inundação na região serrada do RJ

O Estado também regulamentou em 2013 a Lei estadual no 6.442/2013 reforçando a obrigatoriedade da consideração dos riscos de inundação nos planos diretores municipais e demais instrumentos reguladores da ocupação e uso do solo, e determinando que os estudos e mapeamentos de áreas de risco poderão ser realizados pelo governo estadual ou por outras instituições ou técnicos especializados, desde que chancelados pelo Estado. Todas estas medidas contribuem para uma melhor preparação no que diz respeito ao enfrentamento de desastres causados por inundações. No entanto, algumas das áreas de risco atingidas no desastre de 2011 já foram reocupadas pela população, demonstrando a incapacidade dos municípios atingidos para regular e controlar a ocupação de seu território.

3. Uma política marcada pela complexidade institucional e a fragmentação de competências A perspectiva de gestão integrada adotada pela nova política brasileira de proteção e defesa civil deu nova dimensão à gestão de riscos de inundação incluindo diversas instituições (federais, estaduais e municipais) neste processo. No entanto, apesar de definir competências para os três níveis de governo, a legislação (federal e estadual) não especifica em que medida cada um deles é responsável pelas obrigações compartilhadas. Para ilustrar a complexidade deste cenário, a tabela a seguir apresenta as principais instituições hoje envolvidas com o tema, bem como suas principais atribuições ou ações neste contexto, suas temáticas principais de atuação, a etapa do gerenciamento de risco de inundação (GRI) da qual participam, e a natureza de sua participação (P planejamento, E – execução, C – controle).

Informação e comunicação

Defesa e Proteção Civil

Gestão das águas Licença ambiental para construção Áreas protegidas

X

Construção de habitação para desabrigados

X

Temática Licença urbanística para construir

Gestão Pós-crise

Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil (SEDEC) / Ministério da Integração Nacional (MI)  Ações de defesa civil  Consolidação de dados de monitoramento hidrometeorológico (Centro Nacional de Gerenciamento de Riscos e Desastres CENAD) Centro de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (CEMADEN) / Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI)  Previsão de ocorrência de desastres naturais Serviço Geológico Nacional (CPRM) / Ministério de Minas e Energia (MME)  Mapeamento de eventos hidrometeorológicos Ministério da Saúde  Atendimento aos afetados Ministério das Cidades  Obras de infraestrutura urbana  Políticas de urbanismo  Construção de habitação em áreas de risco Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio)  Criação e gestão de áreas protegidas Secretaria de Estado do Ambiente (SEA)  Políticas ambientais para áreas de risco Instituto Estadual do Ambiente (INEA)  Demarcação de faixa marginal de proteção  Mapeamento e Zoneamento de áreas inundáveis  Licenciamento ambiental e fiscalização ambiental Secretaria Estadual de Defesa Civil  Ações de defesa civil Secretaria Estadual de Obras  Recuperação e reconstrução de áreas afetadas Coordenação / Secretaria Municipal de Defesa Civil  Ações de defesa civil Secretaria Municipal de Urbanismo  Licença urbanística para construção  Plano diretor e zoneamento Secretaria Municipal de Meio Ambiente  Licença ambiental para construção e fiscalização ambiental

Escala

Função

Gestão de crise

Órgão / Instituição

Nível /

Proteção

Neste contexto, destaca-se a nova Política Nacional de Prevenção e Defesa Civil (Lei federal no 12.608/2012) que alterou o Código de Urbanismo brasileiro determinando que os municípios revisem seus planos diretores levando em conta os riscos de inundação previamente mapeados, bem a sua compatibilidade com os planos de recursos hídricos. O Estado do Rio de Janeiro também vem empenhando esforços para reduzir sua vulnerabilidade a inundações através de diversas medidas: aquisição de dois radares meteorológicos, ampliação do sistema de alerta de cheias, reassentamento de famílias em áreas de risco, criação de parques fluviais, fortalecimento da defesa civil, assim como a realização de mapeamento e zoneamento de áreas inundáveis em áreas piloto.

Prevenção

As inundações correspondem a um dos principais tipos de desastres que atingem o estado do Rio de Janeiro todos os anos. Somente no período de 1991 a 2012, foram registradas 190 ocorrências de inundações no estado que resultaram em “98 mortos, 5.745 feridos, 2084 enfermos, 20.980 desabrigados, 139.502 desalojados, 31 desaparecidos e 9.397 atingidos por outros danos” (CEPED/UFSC, 2014).

Etapas da GRI

Resíduos Sólidos

Introdução

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Ocorre que a prevenção de inundação não constitui a principal missão de algumas destas instituições. Além disso, como elas atuam em diferentes escalas, focadas em diferentes temáticas, e portanto, com diferentes prioridades, a articulação intersinstitucional ainda constitui um desafio. Neste aspecto, a indefinição do papel específico do estado e do município nas diferentes etapas da GRI tem levado à inação por parte de alguns órgãos competentes. Isto ocorre por exemplo, no caso do mapeamento de áreas de risco de inundação, que a legislação federal atribui ao estado e ao município de forma compartilhada, e a legislação estadual também não determina qual deles deve realizar.

Perspectivas A falta de clareza da legislação brasileira na definição das responsabilidade pelo mapeamento de áreas de risco (estado ou município), tem resultado na inexistência desta informação em muitos municípios brasileiros, impedindo a efetiva implementação de uma política preventiva onde os riscos de inundação sejam considerados antes da concessão de licenças ambientais e urbanísticas. Mesmo após o desastre da região serrana, alguns órgãos ambientais (estadual e municipais) continuam licenciando empreeendimentos em áreas inundáveis, assim como, os órgãos de urbanismo (municípais) continuam concedendo licenças urbanísticas que permitem a construção nestas áreas de risco. Neste contexto, esta pesquisa adota as seguintes hipóteses: • A falta de regulamentação pela legislação municipal quanto às restrições de uso e ocupação do solo em áreas de risco de inundação, bem como o desrespeito à legislação ambiental e urbanística em vigor (federal e estadual) expõem a população local aos desastres decorrentes de precipitações intensas ou prolongadas. • A falta de uma definição clara da responsabilidade de cada um dos níveis governamentais (federal, estadual e municipal) em determinadas etapas da gestão de risco de inundação e a multiplicidade de atores envolvidos neste processo complexificam a implementação de uma política de prevenção de inundação efetiva no Brasil. Considerando o caso particular do desastre da região serrana, foram escolhidos os municípios de Teresópolis e Petrópolis como estudos de caso para comprovar as hipóteses da pesquisa, mediante uma análise das estratégias de implementação da nova política brasileira de gestão de riscos de inundação na escala municipal.

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