Primeiro teste da Unasul como mediadora na Venezuela

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TERÇA-FEIRA,13.05.2014

FABRÍCIO H. CHAGAS BASTOS Primeiro teste da Unasul como mediadora na Venezuela

O

ambiente político venezuelano pós-Chávez causa preocupação. Há três meses violentos protestos sacodem o país, e têm como componentes principais o desabastecimento de produtos básicos, inflação por volta de 56% a.a. e altos índices de violência urbana. Somemos a isso um crônico desacerto entre situação e oposição, que se arrasta desde, pelo menos, a tentativa de golpe frustrada contra Hugo Chávez em 2002. Àquela época o país flertou abertamente com uma guerra civil, e a memória daqueles dias ainda se faz presente. Em linhas gerais, do lado oposicionista, o aventureiro Leopoldo López, político radical do nanico partido Voluntad Popular, conseguiu com seu histrionismo encobrir a figura moderada de Henrique Capriles - candidato do bloco oposicionista derrotado por Chávez nas últimas eleições. Maduro, por sua vez, se apega fortemente à missão que o ex-presidente lhe deu de prosseguir com a revolução em direção ao socialismo do século 21, mas não consegue encontrar

soluções para uma economia em frangalhos e altamente dependente do petróleo. A escalada de violência, que fez com que madrugada de hoje, 13 de maio, a oposição venezuelana anunciasse sua saída da mesa de negociações, após violenta repressão por parte das forças oficiais, acendeu o sinal amarelo dos vizinhos sul-americanos. Apesar de lento, estes têm se empenhado em criar canais de comunicação entre as partes para mediar a situação antes que se chegue a um ponto que seja impossível retornar. A missão da Unasul (composta pelos Chanceleres de Brasil, Colômbia e Equador) é a versão contemporânea do que um dia foi o Grupo do Rio, um mecanismo de consulta internacional que trabalhou em situações de crise na região. Sua principal missão será fazer com que Maduro e os oposicionistas possam dialogar de maneira direta e sem a pressão das disputas cotidianas. Tomando como exemplo a crise de 2002, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva convocou como parte da comitê que gerenciou aquela crise os Estados Unidos - para os quais todos os indícios apontam como principal suporte da tentativa de golpe. Isto é, mesmo que partes conservadoras estejam sentadas à mesa, como López e outros membros da oposição, é preciso que todos sejam ouvidos, sem exceção. A única saída para o governo é convocar eleições, descomprimir a pressão que vêm das ruas pela via democrática - não falo de eleições fraudadas ou boicotes, mas de juntar as partes em conflito sob os a observância de negociadores internacionais. Reite-

TERÇA-FEIRA,13.05.2014

ro, o governo Maduro não cede, a oposição não é coesa, por isso o importante papel dos Chanceleres. No entanto, a Unasul não se pode permitir que sua posição seja a mesma da diplomacia brasileira quando dos piores dias de conflito, que permitiu às suas manifestações seguirem a reboque do Mercosul (cuja presidência pro tempore é ocupada pela Venezuela), tendo remetido à comunidade internacional mensagem de tons bolivarianos em quase sua totalidade. É importante destacar que seja o governo bolivariano ou não, a radicalização e polarização política nunca são saudáveis. Radicalização não são black blocs quebrando vidros de bancos ou ateando fogo aos ônibus. No caso da Venezuela é

bem pior. Lembremos do Caracazo, em 1989, quando cerca de 300 pessoas foram mortas durante os protestos. Ao longo do século 20 a América do Sul assistiu ao surgimento de grupos armados no Peru e na Colômbia (Sendero Luminoso e as FARCS, respectivamente), cabe aos Chanceleres que representam a União de Nações Sul-Americanas não permitir que estas sementes sejam novamente plantadas, mas agora em solo venezuelano.

FABRÍCIO H. CHAGAS BASTOS É PESQUISADOR DO NÚCLEO DE PESQUISA EM RELAÇÕES INTERNACIONAIS DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (NUPRI/USP) E DOUTORANDO EM INTEGRAÇÃO DA AMÉRICA LATINA PELA MESMA UNIVERSIDADE

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