PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA

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FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS ESPECIALIZAÇÃO EM DIREITO PÚBLICO

NELSON MINORU YAMAGAMI SAWASAKI

PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA

CURITIBA 2009

NELSON MINORU YAMAGAMI SAWASAKI

PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA

Monografia apresentado ao Curso de Direito da Escola da Magistratura Federal do Paraná como requisito parcial à obtenção de título de Especialista em Direito Público pela UNIBRASIL. Orientadora: Profa. Ms. Estefânia Maria de Queiroz Barboza

CURITIBA 2009

À minha mãe, Norma, ao meu pai, Nelson e aos meus irmãos Sérgio e Cindy

AGRADECIMENTOS

Agradeço à minha família pelo grande apoio, auxílio e colaboração. Em especial a minha mãe pelos seus inúmeros sacrifícios. Pessoa que me ensinou a viver e a vencer. À professora Estefânia Maria de Queiroz Barboza, sempre atenciosa na orientação e nos pontos a serem abordados no trabalho. Aos professores e funcionários da Escola de Magistratura Federal do Paraná, muito amistosos e zelosos em seu trabalho. Em especial ao Luiz e a Iza por serem sempre atenciosos e gentis. A todos que de alguma forma contribuíram para este trabalho.

RESUMO

A capacidade contributiva é um princípio constitucional presente no art. 145, § 1º da Constituição da República de 1988. Tal princípio representa uma proteção do contribuinte frente ao poder de tributar do Estado. A proteção se manifesta de duas formas: pela preservação do mínimo existencial e pela vedação do efeito confiscatório do tributo. O mínimo existencial determina que o Poder Público não deve tributar aquelas riquezas que se enquadram no mínimo necessário para que o contribuinte mantenha uma vida digna. Já a vedação do confisco visa o impedir um ônus excessivo ao patrimônio do contribuinte, de forma a evitar que lhe seja retirado todos os frutos de seu esforço.Desta forma o princípio em questão busca a justiça através da tributação. Para que essa justiça seja concretizada é preciso que instrumentos adequados sejam utilizados. Estes podem ser representados pelos critérios da seletividade, da proporcionalidade e da progressividade. Todos estes critérios demonstram ser adequados, contudo, a progressividade é o critério que mais demonstra consonância com os objetivos de justiça adotados pela Carta Constitucional. Palavras-chave: Constituição da República de 1988 – Princípio da Capacidade Contributiva – Mínimo Existencial – Vedação do Confisco – Justiça Fiscal – Seletividade – Proporcionalidade – Progressividade.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .............................................................................................................7

CAPÍTULO 1: OS PRINCÍPIOS ...............................................................................10 1.1. OBJETIVOS DO CAPÍTULO ...........................................................................10 1.2. ASPECTOS GERAIS .........................................................................................10 1.3. PRINCÍPIOS JURÍDICOS DA TRIBUTAÇÃO ...............................................11 1.3.1. Princípio da legalidade ................................................................................12 1.3.2. Princípio da anterioridade e da irretroatividade ..........................................13 1.3.3. Princípio da competência ............................................................................15 1.3.4. Princípio da igualdade .................................................................................17 1.3.5. Princípio da capacidade contributiva ..........................................................19 1.3.6. Princípio da vedação do confisco ................................................................19 1.3.7. Princípio da liberdade de tráfego.................................................................21 CAPÍTULO 2: O PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA ................23 2.1. OBJETIVOS DO CAPÍTULO ...........................................................................23 2.2. ASPECTOS GERAIS .........................................................................................23 2.3. O PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA ....................................24 2.3.1. Destinatário do art. 145, § 1º da Constituição da República de 1988 .........24 2.3.2. “Sempre que possível [...]” ..........................................................................25 2.3.3. “[...] os impostos [...]” .................................................................................26 2.3.4. “[...] terão caráter pessoal [...]” ...................................................................31 2.3.5. “[...] serão graduados [...]” ..........................................................................32 2.3.6. “[...] segundo a capacidade econômica do contribuinte [...]” .....................32 2.3.7. “[...] facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte” ..........................................................................................................34 2.3.8. Interpretando o art. 145, § 1º da Constituição da República de 1988 .........35 2.4. CAPACIDADE CONTRIBUTIVA COMO JUSTIÇA FISCAL ......................35 2.5. RESPEITO AO MÍNIMO VITAL OU MÍNIMO EXISTENCIAL...................38 2.6. LIMITAÇÃO DA TRIBUTAÇÃO PELA VEDAÇÃO DO CONFISCO .........42

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CAPÍTULO 3: PROGRESSIVIDADE, PROPORCIONALIDADE E SELETIVIDADE E O PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA .......46 3.1. OBJETIVOS DO CAPÍTULO ...........................................................................46 3.2. ASPECTOS GERAIS .........................................................................................46 3.3. CRITÉRIO DA SELETIVIDADE .....................................................................47 3.4. CRITÉRIO DA PROGRESSIVIDADE E DA PROPORCIONALIDADE ......51 3.5. PROGRESSIVIDADE COMO O MELHOR INSTRUMENTO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA ..........................................................................53 3.6. PROGRESSIVIDADE NA CONSTITUIÇÃO ..................................................54 CONCLUSÃO ..............................................................................................................58

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................61

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INTRODUÇÃO Todos os seres humanos possuem necessidade, desejos e vontades. Isso é inato das pessoas, na verdade é o que compõe a essência de todos os seres vivos. Não há vida se não existirem objetivos a serem alcançados. E para que sejam atingidos são necessários meios adequados. Em nosso mundo não é possível conquistar grandes feitos sem uma fonte de renda. O dinheiro é essencial em uma sociedade fundada no modelo capitalista. O capital move o mundo, move as pessoas e move as relações entre os indivíduos. O capital move o próprio Estado. O Estado tem como objetivo zelar pelo interesse público e para isso precisa de uma fonte de receitas. É por isso que a cobrança de tributos é imprescindível para a manutenção da estrutura do Estado. Os tributos proporcionam uma entrada contínua e permanente de riquezas. De posse desses valores promove a manutenção e o incremento do meio ambiente da civilização contemporânea. A cobrança de tributos não representa apenas um ônus para o contribuinte, demonstra ser também um bônus. É como as duas faces de uma mesma moeda. De um lado o contribuinte usufrui das comodidades oferecidas pelo Estado, e do outro é responsável por arcar com os custos destas. Se por um lado o Estado tem o direito de cobrar tributos, por outro tem o dever de fazê-lo sob determinados limites. Estes são determinados pelos princípios e mandamentos constitucionais. Os princípios constitucionais do Direito Tributário representam escudos de proteção do contribuinte frente ao poder de tributar do Estado. Sem esta defesa o Poder Público poderia atuar abusivamente sobre o contribuinte exigindo deste o possível e o impossível. A própria história demonstra que sem limites e controles o poder corrompe, é corrompido e se torna destrutivo. Neste trabalho deu-se maior atenção ao princípio da capacidade contributiva. Este demonstra ser uma decorrência do princípio da igualdade. Este, por sua vez, se harmoniza com a própria idéia de justiça.

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A igualdade busca trazer a sociedade um maior equilíbrio através do tratamento igualitário daqueles que se apresentam em mesmas condições e pelo tratamento diferenciado dos que se encontram em condições desiguais. No direito tributário esse pensamento é o mesmo. Pelo princípio da capacidade contributiva busca-se tratar igualmente os contribuintes que se encontram em situações equivalentes e desigualmente os contribuintes que se encontram em situações desiguais. Por este princípio, os contribuintes que possuem mais riquezas devem ser tributados mais severamente que aqueles que apresentam poucas riquezas. Pelo apresentado pode-se ter a falsa impressão que o princípio da capacidade contributiva representa um poder nas mãos do Estado. Contudo esta é uma idéia equivocada. Esse princípio, na verdade, representa uma limitação ao poder de tributar. E é com base nessa idéia que se desenvolveu este trabalho monográfico. O presente trabalho tem como objetivo responder as seguintes questões: Sobre o que se trata o princípio da capacidade contributiva? Qual o seu fundamento constitucional? Quais os seus limites? Por que esse princípio se coaduna com a idéia de justiça? Quais são os instrumentos que possibilitam a materialização do princípio? Para responder essas indagações a monografia foi dividida em três capítulos. No primeiro capítulo é realizada a contextualização do tema. Neste é apresentado definições sobre os princípios em geral, com maior ênfase nos princípios constitucionais tributários. No segundo capítulo, considerado o núcleo do trabalho, é onde se aprofunda o entendimento sobre o princípio da capacidade contributiva. Realiza-se uma análise sistemática do art. 145, § 1º da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Comenta-se sobre o papel do princípio como meio de realização da justiça e observase o entendimento doutrinário e jurisprudencial sobre os conceitos de mínimo existencial e vedação do confisco. No terceiro capítulo faz-se a análise dos instrumentos que possibilitam a materialização do princípio. São apresentados os critérios da seletividade, da proporcionalidade e da progressividade demonstrando a sua compatibilidade

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conceitual, ou não, com os objetivos almejados pelo constituinte ao incorporar o princípio da capacidade contributiva no ordenamento jurídico constitucional.

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CAPÍTULO 1: OS PRINCÍPIOS 1.1. OBJETIVOS DO CAPÍTULO

O primeiro capítulo tem como objetivo responder as seguintes indagações: Qual o conceito de princípio? Quais são os princípios que regem o Direito Tributário? As indagações não serão exaustivamente estudadas, apenas serão feitas breves considerações sobre as mesmas.

1.2. ASPECTOS GERAIS

O termo princípio remete a idéia de origem, de início. Além desses significados, na Ciência Jurídica a palavra princípio tem um entendimento mais amplo, podendo significar a base, o suporte, o fundamento sobre o qual o Direito se ergue, ou ainda, pode ter o sentido de direção, de orientação, de destino para onde o Direito deva caminhar. Nesse sentido, princípio jurídico seria o ponto de partida da Ciência e ao mesmo tempo a “pedra angular” 1 sobre a qual se estrutura o Sistema Jurídico. Para Roque Antonio CARRAZA o sistema jurídico é comparável a um edifício 2 . Para que se erga é necessário uma forte estrutura construída por vigas mestras e alicerces. São estas que mantém a construção em pé. Se destruídas tudo cai por terra. Essa estrutura representa para o edifício aquilo que os princípios representam para o sistema jurídico. De forma mais técnica o referido autor conceitua os princípios jurídicos como “[...] um enunciado lógico, implícito ou explícito, que, por sua grande generalidade, ocupa posição de preeminência nos vastos quadrantes do Direito e, por isso mesmo, vincula, de modo inexorável, o entendimento e a aplicação das normas jurídicas que

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CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 19. ed . rev. ampl. atual. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 31. 2 Idem.

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com ele se conectam” 3. Ressalta CARRAZZA que o fato do princípio ser implícito ou explícito não os distinguem em grau de importância 4, o relevante é sua existência para o Direito. Existindo um princípio para o sistema jurídico ele se vinculará com a norma jurídica para interpretá-la. Da mesma forma, Celso Antônio BANDEIRA DE MELLO 5 , visualiza o princípio como sendo o: [...] mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico. É o conhecimento dos princípios que preside a intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que há por nome sistema jurídico positivo.

Devido ao seu caráter de núcleo, de espírito do sistema jurídico, BANDEIRA DE MELLO considera que a violação a um princípio representa a mais grave forma de ilegalidade “porque representa a insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra” 6. Ofender um princípio significa um ataque a própria estrutura do sistema jurídico.

1.3. PRINCÍPIOS JURÍDICOS DA TRIBUTAÇÃO

Os princípios tributários existem para proteger o cidadão-contribuinte frente aos abusos de Poder do Estado. São limites ao poder de tributar. Instrumentos de defesa do cidadão, jamais podendo ser invocados pelo Estado contra aquele 7. Kiyoshi

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Idem. Idem. 5 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 21. ed. rev. atual. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 912 e 913. 6 Ibdem. p. 913. 7 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 19. ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 35 e 36. 4

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HARADA visualiza os princípios tributários com sendo um “escudo de proteção dos contribuintes, atuando como freios que limitam o poder de tributação do Estado” 8. A classificação dos princípios varia de autor para autor, sendo assim, optou-se neste trabalho pela classificação de Hugo de Brito MACHADO. Desta forma, os seguintes princípios serão analisados: da legalidade, da anterioridade, da competência, da igualdade, da capacidade contributiva, da vedação do confisco e da liberdade de tráfego.

1.3.1. Princípio da legalidade

“Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Assim estabelece o art. 5º, II da CF/88. Essa máxima representa a regra geral do princípio da legalidade no nosso ordenamento jurídico. Mais especificamente sobre o Direito Tributário, expressa o art. 150, I da Constituição que é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios exigir ou aumentar tributos sem lei que o estabeleça. Pela legalidade cabe a lei, ao criar o tributo, estabelecer quatro elementos essenciais para a definição do tributo 9: (a) descrição do fato tributável; (b) base de cálculo e alíquota; (c) sujeito passivo da obrigação tributária; (d) sujeito ativo da relação tributária. Por este princípio o Estado só poderá cobrar um tributo se este estiver fixado em lei. Mas e a Medida Provisória, poderia ela versar sobre matéria tributária? Sobre esse assunto deve-se observar a redação do art. 62 da CF/1988, segundo o disposto na Constituição as medidas provisórias terão força de lei e poderão ser adotadas pelo Presidente da República em caso de relevância e urgência: Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional.

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HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2004. p.366. MACHADO, Hugo de Brito. op. cit., p. 37.

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Além disso, o texto do art. 62 da Constituição da República, alterado pela Emenda Constitucional nº 32 de 2001, no § 2º faz expressa menção a utilização da medida provisória para instituir ou majorar tributos: § 2º Medida provisória que implique instituição ou majoração de impostos, exceto os previstos nos arts. 153, I, II, IV, V, e 154, II, só produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte se houver sido convertida em lei até o último dia daquele em que foi editada.

Como se observa a letra do texto constitucional apenas menciona o termo “imposto”, sendo assim, caberia a medida provisória para as outras figuras tributárias? A resposta seria um “sim” pois este foi o entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal, como se pode observar no Informativo Jurisprudencial nº 60 do STF10: Concluindo o julgamento de dois recursos extraordinários em que se discutia sobre se o dispositivo legal que elevou de 8% para 10% a alíquota da contribuição social instituída pela Lei 7689/88 - dispositivo, esse, que resultara da conversão em lei da MP 86, de 25.09.89 poderia ser aplicado no próprio exercício de 1989, alcançando o lucro apurado em 31 de dezembro daquele ano, o Tribunal, por maioria de votos, admitiu essa possibilidade, afirmando ainda, também por maioria, a aptidão das medidas provisórias para instituir e majorar tributos. (grifo nosso)

Desta forma pode-se dizer que tanto a lei em sentido estrito quanto a medida provisória, que tem força de lei, podem versar sobre a matéria tributária. Assim, há obediência ao princípio da legalidade se o tributo estiver determinado em lei ou em medida provisória.

1.3.2. Princípio da anterioridade e da irretroatividade

A irretroatividade no Direito Tributário significa que o Poder Público não poderá cobrar tributo em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado (art. 150, III, ‘a’, da CF).

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Supremo Tribunal Federal. Informativo jurisprudencial nº 60. Disponível em: . Acesso em: 25 ago. 2009.

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Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: [...] III – cobrar tributos: a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado;

A anterioridade por sua vez está presente no art. 150, III, ‘b’ e ‘c’, da Constituição segundo as quais é vetada a cobrança de tributos no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, e também, antes de decorrido noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou. Art. 150. [...] III – cobrar tributos:[...] b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou; c) antes de decorrido noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b;

Contudo é preciso lembrar que o art. 150, § 1º da CF/88 estabelece exceções com relação à anterioridade: a) Não se aplica o inciso III, b do art. 150 da CF/88 aos seguintes tributos: • Empréstimo compulsório para atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência (art. 148, I - CF); • Importação de produtos estrangeiros (art. 153, I - CF); • Exportação, para o exterior, de produtos nacionais ou nacionalizados (art. 153, II - CF); • Produtos industrializados (art. 153, IV - CF); • Operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários (art. 153, V - CF); • Impostos extraordinários, quando houver iminência ou guerra externa declarada, que serão suprimidos gradativamente com a cessação das causas que os criaram (art. 154, II - CF).

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b) Não se aplica a vedação do inciso III, c do art. 150 da CF/88 aos seguintes tributos: • Empréstimo compulsório para atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência (art. 148, I - CF); • Importação de produtos estrangeiros (art. 153, I - CF); • Exportação, para o exterior, de produtos nacionais ou nacionalizados (art. 153, II - CF); • Renda e proventos de qualquer natureza (art. 153, III - CF); • Operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários (art. 153, V - CF); • Impostos extraordinários, quando houver iminência ou guerra externa declarada, que serão suprimidos gradativamente com a cessação das causas que os criaram (art. 154, II - CF). • Para a fixação da base de cálculo do imposto sobre a propriedade de veículos automotores (art. 155, III - CF); • Para a fixação da base de cálculo do imposto sobre a propriedade predial territorial urbana (art. 156, I - CF). Ressalta-se que excetuando esses casos expressamente previstos pela Constituição a aplicação do princípio da anterioridade é obrigatória.

1.3.3. Princípio da competência

O princípio da competência é aquele pelo qual a “entidade tributante há de restringir sua atividade tributacional àquela matéria que lhe foi constitucionalmente destinada” 11. A Constituição da República de 1988 determina a competência tributária de cada ente da federação, desta forma, será:

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MACHADO, Hugo de Brito. op. cit., p. 40.

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(1) Competência da União: • Os impostos estaduais dos Territórios Federais e, caso este não seja dividido em Municípios, cumulativamente, os impostos municipais - (art. 147 ); • Instituir empréstimos compulsórios, mediante lei complementar; - (art. 148); • Instituir, exclusivamente, contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas - (art. 149); • Instituir impostos sobre: (1) importação de produtos estrangeiros; (2) exportação, para o exterior, de produtos nacionais ou nacionalizados; (3) renda e proventos de qualquer natureza; (4) produtos industrializados; (5) operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários; (6) propriedade territorial rural; (7) grandes fortunas, nos termos de lei complementar - (art. 153); • Instituir imposto extraordinário no caso de iminência ou de guerra externa (154, II). (2) Competência dos Estados: • Instituir contribuição para o custeio do regime previdenciário de seus servidores - (art. 149, § 1º); • Instituir impostos sobre: (1) transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos; (2) operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior; (3) propriedade de veículos automotores - (art. 155). (3) Competência dos Municípios: • Instituir contribuição para o custeio do regime previdenciário de seus servidores - (art. 149, § 1º);

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• Instituir contribuição para o custeio do serviço de iluminação pública - (art. 149-A); • Instituir impostos sobre: (1) propriedade predial e territorial urbana; (2) transmissão "inter vivos", a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição; (3) serviços de qualquer natureza, definidos em lei complementar - (art. 156). (4) Competência do Distrito Federal: • Os impostos municipais dispostos no art. 156 da CF/1988 - (art. 147); • Instituir contribuição para o custeio do regime previdenciário de seus servidores - (art. 149, § 1º); • Instituir contribuição para o custeio do serviço de iluminação pública - (art. 149-A); • Os impostos estaduais apresentados no art. 155 da CF/1988. Pelo princípio da competência cada entidade tributante deve se limitar pelo que foi determinado na Constituição da República de 1988. Nesses termos, no Brasil foi adotado um “sistema tributário rígido” 12, pois não há espaço para a criatividade dos entes da federação para estipularem as suas próprias competências tributárias.

1.3.4. Princípio da igualdade

O princípio da igualdade pode ser subdividido em igualdade formal e material: (a) igualdade formal: está expressa na Constituição da República em seu art. 5º caput ao estabelecer que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”; (b) igualdade material: é a consideração das desigualdades existentes entre as pessoas, e será estudada no tópico sobre o princípio da capacidade contributiva. A igualdade formal está intimamente ligada com o princípio republicano. Sobre isto explica Roque Antonio CARRAZZA 13 que: 12 13

MACHADO, Hugo de Brito, op. cit., p. 41. CARRAZZA, Roque Antonio. op. cit., p. 49.

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Aceitando que todos os homens, indistintamente, possuem condições de pretender os mesmos direito políticos, a República impõe o princípio da igualdade, como fulcro da organização política. E o princípio da igualdade, como é pacífico, tem um conteúdo prevalentemente negativo: a abolição e o afastamento dos privilégios. Evidentemente, esta igualdade é formal, e não substancial. Portanto, numa República todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei, sem distinção de condições sociais.

A igualdade na tributação é apresentada no art. 150, II da CF/88 segundo o qual é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: Art. 150 [...] II – instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos.

Observa-se que este artigo da Constituição trata da igualdade formal e material entre os contribuintes. Veda-se o tratamento desigual (igualdade formal) daqueles que se encontrarem em situação equivalente (igualdade material, pois por conseqüência lógica é permitido o tratamento desigual daqueles que se encontrarem em situação de não equivalência). O princípio da igualdade aplica-se tanto a pessoas físicas quanto jurídicas, como se pode perceber pela redação do art. 151, I da CF/88: Art. 151. É vedado à União: I – instituir tributo que não seja uniforme em todo o território nacional ou que implique distinção ou preferência em relação a Estado, ao Distrito Federal ou a Município, em detrimento de outro, admitida a concessão de incentivos fiscais destinados a promover o equilíbrio do desenvolvimento sócio-econômico entre as diferentes regiões do País.

Este princípio, no entender de Kiyoshi HARADA, veda o tratamento diferenciado de pessoas sob os mesmos pressupostos de fato, ou seja, “impede discriminações tributárias, privilegiando ou favorecendo determinadas pessoas físicas ou jurídicas” 14.

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HARADA, Kiyoshi. op. cit., p. 371.

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1.3.5. Princípio da capacidade contributiva

Este princípio é uma decorrência do princípio da igualdade, e é possível compreendê-lo a partir dos ensinamentos de Rui BARBOSA 15: A regra da igualdade não consiste senão em quinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade. O mais são desvarios da inveja, do orgulho, ou da loucura. Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real. Os apetites humanos conceberam inverter a norma universal da criação, pretendendo, não dar a cada um, na razão do que vale, mas atribuir o mesmo a todos, como se todos se equivalessem.

Percebe-se que o princípio da capacidade contributiva poderia ser entendido como a própria aplicação da igualdade material ao direito tributário e pode ser encontrado no art. 145, § 1º da CF/1988 que determina que: Art. 145. [...] §1º - Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultando à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.

Similar é a redação do art. 146, III, ‘d’ da CF/1988, ao determinar que cabe a lei complementar estabelecer normas gerais em matéria de direito tributário para definir tratamento diferenciado as microempresas e empresas de pequeno porte. Este princípio por se tratar do objeto do presente trabalho será melhor estudado no capítulo 2.

1.3.6. Princípio da vedação do confisco

Determina o art. 150, inciso IV da Constituição que é vedado à União, aos Estados, aos Municípios e ao Distrito Federal utilizar tributo com efeito de confisco.

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BARBOSA, Rui. Oração aos moços: edição popular anotada por Adriano da Gama Kury. 5. ed. Rio de Janeiro : Fundação Casa de Rui Barbosa, 1997.

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O texto constitucional menciona ser vedado a utilização do tributo com efeito de confisco. Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada (art. 3º do Código Tributário Nacional). É certo que o tributo não pode ser confiscatório, mas e quanto a multa? Seria possível dizer que não pode haver multa com efeito de confisco? Para Hugo de Brito Machado o efeito confiscatório se limitaria aos tributos, já a multa por representar uma penalidade ao contribuinte poderia ser confiscatória 16: [...] o tributo deve ser um ônus suportável, um encargo que o contribuinte pode pagar sem sacrifício do desfrute normal dos bens da vida. Por isto mesmo é que não pode ser confiscatório. Já a multa, para alcançar sua finalidade, deve representar um ônus significativamente pesado, de sorte a que as condutas que ensejam sua cobrança restem efetivamente desestimuladas. Por isto mesmo pode ser confiscatória.

Contudo este não foi o entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal ao julgar a ADI 1705 MC / DF 17: A TRIBUTAÇÃO CONFISCATÓRIA É VEDADA PELA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. - É cabível, em sede de controle normativo abstrato, a possibilidade de o Supremo Tribunal Federal examinar se determinado tributo ofende, ou não, o princípio constitucional da não-confiscatoriedade consagrado no art. 150, IV, da Constituição da República. Hipótese que versa o exame de diploma legislativo (Lei 8.846/94, art. 3º e seu parágrafo único) que instituiu multa fiscal de 300% (trezentos por cento). - A proibição constitucional do confisco em matéria tributária - ainda que se trate de multa fiscal resultante do inadimplemento, pelo contribuinte, de suas obrigações tributárias - nada mais representa senão a interdição, pela Carta Política, de qualquer pretensão governamental que possa conduzir, no campo da fiscalidade, à injusta apropriação estatal, no todo ou em parte, do patrimônio ou dos rendimentos dos contribuintes, comprometendo-lhes, pela insuportabilidade da carga tributária, o exercício do direito a uma existência digna, ou a prática de atividade profissional lícita ou, ainda, a regular satisfação de suas necessidades vitais básicas. - O Poder Público, especialmente em sede de tributação (mesmo tratando-se da definição do "quantum" pertinente ao valor das multas fiscais), não pode agir imoderadamente, pois a atividade governamental acha-se essencialmente condicionada pelo princípio da razoabilidade que se qualifica como verdadeiro parâmetro de aferição da constitucionalidade material dos atos estatais.

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MACHADO, Hugo de Brito. op. cit., p. 42. ADI 1075 MC, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 17/06/1998, DJ 24-11-2006 PP-00059 EMENT VOL-02257-01 PP-00156 RTJ VOL-00200-02 PP00647 RDDT n. 139, 2007, p. 199-211 RDDT n. 137, 2007, p. 236-237 17

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Observa-se que o STF entendeu que o art. 150, IV da Constituição de 1988 representa uma limitação ao Poder Público. Esse artigo determinaria a vedação da atuação imoderada do Estado no patrimônio do particular. Tal dispositivo legal visa a proteção ao indivíduo para que não lhe seja tirado o mínimo necessário para sua existência digna. Desta forma, tanto os tributos quanto as multas não poderiam ser confiscatórias a ponto de atingir o mínimo vital do contribuinte.

1.3.7. Princípio da liberdade de tráfego

A Constituição da República de 1988 estabelece que aos entes da Federação (União, Estados, Municípios e Distrito Federal) é vedado: Art. 150 [...] V - estabelecer limitações ao tráfego de pessoas ou bens, por meio de tributos interestaduais ou intermunicipais, ressalvada a cobrança de pedágio pela utilização de vias conservadas pelo Poder Público

É importante salientar que esta regra não impede a cobrança de tributos interestaduais ou intermunicipais. Proíbe-se “a instituição de tributo em cuja hipótese de incidência seja elemento essencial a transposição de fronteira interestadual ou intermunicipal” 18. Esta limitação é decorrência do princípio federativo. Segundo o princípio federativo: a República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados, Municípios e do Distrito Federal (art. 1º da CF/1988) e sua organização político-administrativa compreende a autonomia desses entes federados (art. 18 da CF/1988). Para Roque Antonio CARRAZZA esse princípio poderia ser assim explicado 19: Em síntese, como o próprio pórtico da Lei Maior revela, o federalismo – como seu consectário conatural, que é a autonomia dos entes federativos – dá a tônica do Estado Brasileiro. De fato, inexiste hierarquia entre os entes federativos. Todos são pessoas jurídicas dotadas de plena capacidade política, enquanto atuam dentro de suas esferas de competência, 18 19

MACHADO, Hugo de Brito. op. cit., p. 43 CARRAZZA, Roque Antonio. op. cit., p. 129.

22

constitucionalmente traçadas. Portanto, a harmonia deve presidir a convivência dos entes federativos (pessoas políticas). Há, aliás, implícita na Constituição Brasileira a idéia de que desta convivência harmoniosa resultará o bem de toda a Nação.

No entender de Regina Helena COSTA o princípio federativo ao estabelecer a isonomia entre os entes da federação tem como objetivo evitar a chamada “guerra fiscal”

20

.

Observa-se da leitura da regra constitucional que a cobrança de pedágio não representa violação a princípio da liberdade de tráfego.

20

COSTA, Regina Helena. Curso de Direito Tributário: Constituição e Código Tributário Nacional. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 58.

23

CAPÍTULO 2: O PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA 2.1. OBJETIVOS DO CAPÍTULO

Este capítulo tem o objetivo de aprofundar o conceito do princípio da capacidade contributiva, fazendo uma análise do art. 145, §1º da Constituição da República de 1988, bem como apresentar os conceitos de justiça fiscal, mínimo vital e não-confisco.

2.2. ASPECTOS GERAIS

O Estado detém o poder de tributar, porém não pode fazê-lo conforme a sua vontade. Nesse contexto de limitação e restrição ao poder de tributar do Estado é que se encontram os princípios do Direito Tributário. Tais princípios representam um “escudo de proteção dos contribuintes, atuando como freios que limitam o poder de tributação do Estado” 21. O princípio da Capacidade Contributiva representa um desses princípios que protegem o contribuinte. O objetivo desse princípio não é autorizar a tributação, dando ao Estado o poder de tributar como queira, mas estabelecer limites a este poder. Esses limites são representados pelo mínimo vital e pela vedação do confisco. Não pode o Estado tributar o cidadão a tal ponto de lhe retirar o mínimo necessário para sua sobrevivência. Da mesma forma, não pode tributar aqueles que possuem mais riquezas de forma a retirar-lhes aquilo que com esforço alcançaram. Tributar é uma questão de equilíbrio. Tributar excessivamente pode impossibilitar o exercício de atividades econômicas, por onerar demasiadamente o contribuinte.

Tributar

pouco

geraria

um

déficit

impossibilitando a este o exercício dos serviços públicos.

21

HARADA, Kiyoshi. op. cit., p.366.

nas

finanças

do

Estado

24

2.3. O PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA

A capacidade contributiva é um dos princípios constitucionais tributários e se encontra presente na Constituição da República em seu artigo 145, § 1º, a citar: Art. 145 – A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: [...] §1º - Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte. (grifo nosso).

Como em todo estudo científico, para compreender o objeto de estudo é preciso decompô-lo, analisá-lo em suas partes para compreender a sua estrutura e posteriormente recompô-lo para poder ter uma visão do seu todo. Neste caso, por uma questão metodológica realizar-se-á o estudo das expressões que compõem o dispositivo constitucional supra mencionado procurando mencionar o posicionamento doutrinário sobre o assunto.

2.3.1. Destinatário do art. 145, § 1º da Constituição da República de 1988

Antes de analisar pormenorizadamente o art. 145, § 1º da CF/1988 é preciso determinar o seu destinatário, ou seja, a quem é destinado o referido texto constitucional. O dispositivo constitucional tem como destinatário o Poder Legislativo. Decidiu o Poder Constituinte Originário por balizar a atuação do legislador determinando os princípios que este deveria seguir ao legislar sobre a matéria tributária. Neste sentido, é preciso compreender o que o constituinte originário pretendia ao estabelecer o texto do art. 145, § 1º da CF/1988, para verificar se a atuação do legislador está ou não conforme o ideal constitucional.

25

2.3.2. “Sempre que possível [...]”

A expressão “sempre que possível” traz a mente de qualquer ser humano a idéia de possibilidade. Trata-se de uma escolha, de uma faculdade em que o sujeito pode exercer o seu poder de decisão. No convívio social é comum expressões que denotem possibilidade em diversas situações do cotidiano. Exemplos se encontram por toda parte: duas amigas conversando no parque e uma pergunta a outra se quer comer algo, e a amiga pensando em seu regime responde: “talvez”; dois amigos andam pela rua quando um deles ao olhar para um terceiro indaga o amigo se este não seria o professor de direito civil da faculdade, o amigo, que é um pouco míope, responde: “não estou certo, mas me parece que seja ele”. Qualquer falante da língua portuguesa não teria duvidas ao afirmar que a expressão “sempre que possível” está impregnado por uma forte carga discricionária em que alguém possui o poder de escolha, no caso, de escolher entre a aplicação ou não do princípio da capacidade contributiva. Contudo, no mundo jurídico, nem tudo é o que parece ser, e a expressão “sempre que possível” pode não significar possibilidade, mas obrigatoriedade. Pela interpretação sistemática do texto constitucional, diversos autores têm entendido pelo caráter vinculativo, e não discricionário, dessa expressão. Roque Antonio CARRAZZA 22, assim se expressa sobre a expressão “sempre que possível”: A nosso ver, ele não está fazendo – como já querem alguns – uma mera recomendação ou um simples apelo para o legislador ordinário. Em outras palavras, ele não está autorizando o legislador ordinário a, se for de seu agrado, graduar os impostos que criar, de acordo com a capacidade econômica dos contribuintes. O sentido desta norma jurídica é muito outro. Ela, segundo pensamos, assim deve ser interpretada: se for da índole constitucional do imposto, ele deverá obrigatoriamente ter caráter pessoal e ser graduado de acordo com a capacidade econômica do contribuinte. Ou, melhor: se a regra matriz do imposto (traçada na CF) permitir, ele deverá necessariamente obedecer ao princípio da capacidade contributiva.

22

CARRAZZA, Roque Antonio. op. cit., p. 90.

26

Semelhante é o entendimento de Fernando Aurelio ZILVETI

23

sobre o

assunto: A cláusula “sempre que possível” não outorga ao legislador ordinário, ou ao intérprete, ou, ainda, ao aplicador e destinatário da norma a faculdade de respeitar, ou não, o princípio da capacidade contributiva na graduação dos impostos pessoais. [...] O respeito ao princípio é, portanto, imperativo, visto que a norma constitucional é autoaplicável, inadmissível o poder discricionário. Há nessa expressão, uma ordem, de cumprimento obrigatório para o legislador ordinário, para o aplicador e para o judiciário. Segundo tal ordem, o Estado tem o dever de discriminar as condutas passíveis de carga fiscal, atender aos demais preceitos fundamentais, e garantir o respeito ao princípio da capacidade contributiva. [...] O respeito ao princípio da capacidade contributiva é obrigatório [...].

Logo, conclui-se que apesar da expressão “sempre que possível” utilizada pelo constituinte, não se deve interpretar de maneira literal o texto, pois onde aparentemente se vê uma “possibilidade” é na verdade uma “obrigatoriedade”. O legislador não tem escolha, sempre que necessário deverá tributar tendo como parâmetro o princípio da capacidade contributiva.

2.3.3. “[...] os impostos [...]”

Constitucionalmente existem cinco espécies tributárias

24

. Três delas estão

presentes no art. 145, incisos I, II e III da CF/1988, que são, respectivamente, os impostos, as taxas e as contribuições de melhoria: Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: I - impostos; II - taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição; III - contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas. (grifo nosso) 23

ZILVETI, Fernando Aurelio. Princípios de direito tributário e a capacidade contributiva. São Paulo: Quartier Latin, 2004. p. 253. 24 Vale lembrar a definição de tributo estabelecida pelo art. 3º do Código Tributário Nacional: Art. 3º. Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.

27

As outras duas espécies tributárias são: o empréstimo compulsório (art. 148 da CF/1988) e as contribuições sociais (art. 149 da CF/1988). Art. 148. A União, mediante lei complementar, poderá instituir empréstimos compulsórios: I - para atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência; II - no caso de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional, observado o disposto no art. 150, III, "b". Parágrafo único. A aplicação dos recursos provenientes de empréstimo compulsório será vinculada à despesa que fundamentou sua instituição. Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo. (grifo nosso)

Nota-se que a Constituição da República em seu art. 145, § 1º delimita a atuação do princípio da capacidade contributiva aos impostos. O fato da Constituição de 1988 restringir o princípio apenas aos impostos é na visão de José Marcos Domingues de OLIVEIRA uma violação ao próprio princípio, um desrespeito a isonomia, chegando inclusive a atingir a estrutura do sistema tributário, transformando-o em uma “massa heterogênea, coxa” 25. OLIVEIRA 26 se expressa no sentido de que: O princípio da capacidade contributiva, enquanto pressuposto e critério de graduação e limite do tributo, aplica-se não só ao imposto mas também às demais espécies tributárias, pois em todas elas trata-se de retirar recursos econômicos dos particulares para transferi-los aos setor público. É a força econômica que dirá da possibilidade do seu concurso para a manutenção do Estado. Por outro lado, sendo o princípio expressão tributária da Igualdade, evidentemente que não se poderá admitir que as taxas e as contribuições de melhoria discriminem os contribuintes independentemente das suas diversas riquezas que estejam relacionadas com a atividade estatal ensejadora da instituição desses tributos.

Ricardo Lobo TORRES 27 apresente o mesmo entendimento: 25

OLIVEIRA, José Marcos Domingues de. Capacidade contributiva: conteúdo e eficácia do princípio. 2. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Renovar, 1998.p. 79. 26 Ibidem. p. 91.

28

O imposto é realmente a categoria a que, por excelência, se dirige o princípio da capacidade contributiva. Definindo-se como o tributo pago sem qualquer relação com serviços públicos prestados, o imposto tem como único parâmetro a riqueza do contribuinte. Mas parece-nos que as taxas e as contribuições de melhoria também sofrem a influência desse princípio de justiça fiscal, pelo menos no que concerne às isenções e à entrega de serviços e obras públicas às populações carentes.

OLIVEIRA destaca a presença do princípio da capacidade contributiva na taxa e contribuição de melhoria quando o Estado, percebendo a condição de vulnerabilidade do contribuinte (ou seja, este não consegue suportar o tributo sem a ameaça ao seu mínimo existencial) estabelece imunidades e isenções 28. Neste sentido, OLIVEIRA 29 apresenta a seguinte argumentação sobre a incidência do princípio da capacidade contributiva sobre as taxas, ressalvando que o mesmo argumento se aplica as contribuições de melhoria: Malgrado a característica remuneratória das taxas, submetem-se elas, por “aplicação natural”, segundo VALDÉS COSTA, ao cânone da capacidade contributiva, em primeiro lugar, determinando ele a intributabilidade daqueles que, por incidência delas, estariam tendo o seu mínimo de existência digna comprometido [...], entendendo-se como redistribuído pela comunidade mais favorecida economicamente a parcela não suportada pelos administrados mais modestos. [...]. Assim, e também por força da isonomia constitucional, que ilumina pela noção de capacidade contributiva, determina que pessoas em posições econômicas diversas paguem tributo diferenciado, as taxas admitem graduação em função de condições fáticas do contribuinte indicadoras de riqueza, podendo implicar em diferentes quantidades ou unidades de serviço público e, pois, de cobrança. [...]. Note-se, finalmente, que o Estado não se ode recusar a prestar serviços públicos tributados só porque alguém não disponha de recursos para pagar as taxas respectivas: em primeiro lugar, porque se o serviço é público ele é de interesse público, e não apenas dos contribuintes, e se estes não se podem recusar a sofrer a ação do Poder Público, também o Estado não pode deixar de atuar em relação a todo o universo da população a que se destina o serviço. Mais, o Estado não se pode furtar a prestar certos serviços públicos, ditos juridicamente essenciais, sob pena de desnaturar-se como pessoa política, ferindo diversos outros princípios de direito constitucional, e não apenas o da capacidade contributiva.

Como assevera OLIVEIRA, o Poder Público, ao cobrar as taxas e contribuições de melhoria, deve levar em conta a capacidade do contribuinte de arcar 27

TORRES, Ricardo Lobo. Curso de direito Financeiro e Tributário. 15. ed. Rio de Janeiro: Renovar. 2008. p. 97 28 OLIVEIRA, José Marcos Domingues de. op. cit., p. 96, 97 e 110. 29 Ibidem. p. 95 – 99.

29

com esse ônus tributário. Caso esse ônus atinja o seu mínimo existencial o Estado deve reduzir a carga tributária do contribuinte e, se necessário, até isentá-lo do pagamento. Jamais, na visão do referido autor, deve o Estado deixar de prestar um serviço público motivado pelo fato de que o contribuinte não tem capacidade para arcar com seus custos. Diferentemente é a opinião de Regina Helena COSTA. Segundo a autora o princípio que rege os impostos é o da capacidade contributiva, enquanto que a taxa e a contribuição de melhoria devem obediência ao princípio da retributividade

30

. A

cobrança de taxas não pode levar em conta a capacidade econômica do contribuinte, pois possuem “caráter remuneratório da atuação do Poder Público, devendo, por isso, manter razoável equivalência com a despesa por ele efetuada” 31, por esse motivo, “o sujeito passivo da taxa, seja rico ou pobre, pagará o tributo na mesma proporção, consoante o serviço público oferecido ou a atividade de polícia desencadeada” 32. No que se refere às isenções de taxas e de contribuições de melhorias Regina Helena COSTA tem um posicionamento diferente de José Marcos Domingues de OLIVEIRA. Considera Regina H. COSTA 33 que: Poder-se-ia argumentar com aquelas situações-limite, nas quais o Poder Público concede isenções de taxas à população carente. Quando, por exemplo, desobriga os hipossuficientes do pagamento de taxas de água e energia elétrica ou, então, quando autoriza seu acesso ao serviço público de prestação jurisdicional independentemente do pagamento de custas, em obediência ao disposto no art. 5º, XXXV, da Lei Maior. Em tais hipóteses, porém, a isenção é concedida não em virtude de diminuta ou inexistente capacidade contributiva dos sujeitos, mas em virtude de considerações de outra ordem, tais como a desigualdade social, a minimização do sofrimento das pessoas pobres etc. Justificase, portanto, tal medida, como fundamento em outras diretrizes constitucionais, sem recorrese ao postulado da capacidade contributiva, estranho à compostura da hipótese de incidência dos tributos vinculados. Idêntico raciocínio pode ser desenvolvido com relação à contribuição de melhoria.

30

COSTA, Regina Helena. Princípio da capacidade contributiva. São Paulo: Malheiros,

1993. p.56. 31

Ibidem. p.55. Ibidem. p. 56. 33 Idem. 32

30

Observa-se que ambos os autores não negam a existência de contribuintes hipossuficientes, contudo divergem na fundamentação sobre a isenção tributária sobre estes. No que se refere aos empréstimos compulsórios parece existir uma maior consenso na doutrina sobre a aplicação do princípio da capacidade contributiva, principalmente quando a natureza do empréstimo compulsório for de imposto. Fernando Aurelio ZILVETI explica que o empréstimo compulsório possui natureza jurídica de imposto. Mais precisamente, empréstimos compulsórios são “impostos restituíveis”

34

e desta forma “podem estar sujeitos ao princípio da

capacidade contributiva, desde que tenham, preferencialmente, fato gerador baseado na renda do contribuinte” 35. Para Regina Helena COSTA 36: Os empréstimos compulsórios, previstos no art. 148 da Constituição da República, cuja natureza tributária não mais se discute, também podem ser submetidos o princípio em estudo. A hipótese de incidência do empréstimo compulsório pode, em tese, assumir as feições de quaisquer das espécies tributárias: imposto, taxa ou contribuição de melhoria. Na prática, porém, os empréstimos compulsórios invariavelmente assumem a feição de imposto, o que explica por serem estes os tributos não vinculados a uma atuação estatal, de mais fácil instituição e cobrança. Assim, sendo o princípio da capacidade contributiva aquele informador dos impostos, reluz sua importância também no que tange à instituição de empréstimos compulsórios.

José Marcos Domingues de OLIVEIRA entende que se o empréstimo compulsório é um tributo, então também está sujeito ao princípio da capacidade contributiva 37. As contribuições sociais conforme ressalta Roque Antonio CARRAZZA podem ter natureza jurídica de imposto ou de taxa

38

, logo comporta as mesma

discussões já apresentadas acima, no que se refere a possibilidade ou não das taxa serem objeto do princípio da capacidade contributiva na ordem jurídica brasileira.

34

ZILVETI, Fernando Aurelio. op. cit., p. 287. Idem. 36 COSTA, Regina Helena. Princípio da Capacidade..., p. 58. 37 OLIVEIRA, José Marcos Domingues de. op. cit., p.112. 38 CARRAZZA, Roque Antonio. op. cit., p. 520. 35

31

2.3.4. “[...] terão caráter pessoal [...]”

A expressão “terão caráter pessoal” para alguns autores remete a classificação que distingue os impostos pessoais dos impostos reais. O imposto pessoal “é o que tem como destinatário a pessoa e a riqueza por ela presumidamente produzida”

39

, é o

imposto que leva em consideração no fato gerador certas qualidade, juridicamente relevantes, do sujeito passivo 40. Ao passo que os impostos reais são aqueles cujo fato gerador se refere a um fato, acontecimento ou coisa, e seja independente do elemento pessoal, ou seja, indiferente ao sujeito passivo e suas qualidades 41. ZILVETI entende que apenas os impostos pessoais podem ser objeto de aplicação do princípio da capacidade contributiva 42: O preceito constitucional sob análise dirige-se, então, aos impostos de caráter pessoal, cujo lançamento deverá ser feito com base no valor da matéria a ser tributada, levando em consideração a capacidade contributiva do cidadão. Isso porque, de fato os impostos direitos e pessoais são aqueles nos quais melhor se expressa a capacidade contributiva do contribuinte.

Diferentemente é o entendimento de José Maurício CONTI. Segundo este autor os impostos de natureza real também se sujeitam ao princípio da capacidade contributiva 43. CONTI 44 argumenta que: [...] o que se observa é, cada vez mais, a introdução de elementos pessoais nos impostos de natureza real. É o caso, por exemplo, do ITR, no qual podemos encontrar essa “personalização”, observando o disposto no art. 153, par. 4º. Prescreve o dispositivo que o imposto “não incidirá sobre pequenas glebas rurais, definidas em lei, quando as explore, só ou com sua família, o proprietário que não possua outro imóvel”. A introdução deste elemento tem levado inclusive a uma perda de nitidez da classificação, fazendo surgir determinadas situações em que se torna difícil estabelecer uma clara distinção entre a natureza do imposto – se real ou pessoa. Isto faz com que se torne ainda mais nítida a idéia de que a capacidade contributiva é perfeitamente compatível com os impostos de natureza real. 39

ZILVETI, Fernando Aurelio. op. cit., p. 257. CONTI, José Maurício. Princípios tributários da capacidade contributiva e da progressividade. São Paulo: Dialética. 1996. p. 70. 41 Idem. 42 ZILVETI, Fernando Aurelio. op. cit., p. 258. 43 CONTI, José Maurício. op. cit., p. 70. 44 Idem. 40

32

Observa-se que sobre o tema, ainda não se encontra na doutrina um entendimento pacífico.

2.3.5. “[...] serão graduados [...]”

O termo “serão graduados” apresentado pelo texto constitucional indica ao legislador que este ao criar um tributo deverá ter em mente que existem contribuintes capazes de se onerar mais e contribuintes que pouco podem arcar com as custas do Estado. Logo, é preciso, com base na justiça fiscal, verificar a capacidade de se onerar de cada contribuinte e graduá-los segundo sua capacidade de suportar a carga tributária necessária para manter o Poder Público. Fernando Aurelio ZILVETI não observa nessa expressão uma permissão para a utilização do critério da progressividade. Segundo o autor 45: Há quem infira daí que existe uma íntima ligação entre progressividade e capacidade contributiva, teoria que não se adota [...]. É óbvio que a progressão é uma graduação. Porém, o contrário não é verdadeiro. Graduação pode ser, por exemplo, a fixação proporcional do imposto, ou ainda fixação de alíquotas variadas de outros impostos, segundo o critério da essencialidade da atividade do contribuinte ou do produto. Pode, ainda, haver graduação segundo critérios da utilização do bem, como ocorre com a propriedade rural, em prol da justiça social extrafiscal, desestimulando a propriedade rural improdutiva.

A graduação, portanto, não possui uma única forma, podendo ser realizado segundo o critério da proporcionalidade, da progressividade, da essencialidade, da utilização do bem jurídico, dentre outros critérios que o legislador considerar necessários para atingir a justiça fiscal.

2.3.6. “[...] segundo a capacidade econômica do contribuinte [...]”

Verifica-se no citado artigo que a lei fala em “capacidade econômica”. Sobre essa questão de vocabulário, argumenta Fernando Aurelio ZILVETI que tal distinção é 45

ZILVETI, Fernando Aurelio. op. cit., p. 259.

33

tratada pela doutrina italiana, contudo o Direito brasileiro não faz separação entre esses termos, desta forma “capacidade econômica e contributiva são a mesma coisa” 46. Esse também é o entendimento de Roque Antonio CARRAZZA 47. Por outro lado, José Maurício CONTI distingue os dois termos: [...] a capacidade contributiva pode ser interpretada com aquela derivada de uma relação jurídica entre Fisco e Contribuinte, em que o primeiro detém um poder sobre o segundo, de forma a fazer com que este último tenha um dever para com o primeiro. Assim, tem capacidade contributiva aquele contribuinte que está juridicamente obrigado a cumprir determinada prestação de natureza tributária para com o poder tributante. A capacidade econômica, por sua vez, é representada pela capacidade que o contribuinte possui de suportar o ônus tributário em razão de seus rendimentos. (grifo nosso)

De forma simples, ter capacidade econômica é ter riqueza e ter capacidade contributiva é poder entregar parte dessa riqueza para o Poder Público para que este mantenha sua estrutura pública. “A capacidade contributiva é, pois, uma capacidade econômica específica – refere-se à aptidão para suportar determinada carga tributária”48. Tal distinção se torna necessária uma vez que todo aquele que possui capacidade contributiva, também possui capacidade econômica, mas o inverso não é verdadeiro. Em outras palavras, o Poder Público só pode exigir tributo daquele que possuir uma riqueza que ultrapasse o mínimo necessário para sua existência digna, não podendo exigir daqueles que possuem apenas o mínimo vital. Somente aquele que possui riqueza (capacidade econômica) em uma quantidade superior ao seu mínimo vital pode ser exigido do Estado a arcar com o ônus da tributação (capacidade contributiva). A capacidade contributiva não representa um poder do Estado de cobrar tributos, pelo contrário, representa uma limitação do poder de tributação do Estado. Trata-se de uma proteção ao contribuinte para que não lhe seja retirado o mínimo

46

Ibidem. p. 135. CARRAZZA, Roque Antonio. op. cit., p.91. 48 CONTI, José Maurício. op. cit., p. 36. 47

34

necessário para sobrevivência e para que não lhe seja destruído o patrimônio pelo desejo confiscatório do Estado.

2.3.7. “[...] facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte”

A primeira observação a ser feita é a de que o texto constitucional permite a administração tributária identificar o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte. A princípio esta parece ser uma profunda intromissão do Estado na vida do particular. No entanto, tal intromissão tem amparo constitucional e fundamento no tipo de sociedade criada pela Constituição de 1988. Não vivemos em um Estado Liberal, em que o Estado teria como única obrigação o dever de se abster da esfera privada, mas em um Estado Democrático de Direito que possui finalidades sociais. Em nosso modelo estatal o Estado deve atuar com políticas públicas e ao mesmo tempo se submeter ao império das leis. Em outras palavras, exige-se uma atuação positiva do Estado e ao mesmo tempo exige-se deste uma submissão as leis. Esta obediência do Estado à lei é necessária para que ele não exceda em seus poderes e transforme a democracia em ditadura. Essas idéias são importantes, pois a intervenção do Poder Público ao identificar o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte não pode ocorrer de qualquer modo, deve respeitar os direitos individuais e ser realizado nos termos da lei. Como se não bastassem esses limites a Constituição delimitou ainda mais essa intervenção estatal na esfera do particular. É preciso que o Estado respeite os direitos individuais e atue nos limites da lei apenas e estritamente para conferir efetividade aos seus objetivos, que seriam a aplicação (1) do caráter pessoal do imposto e (2) a graduação deste segundo a capacidade econômica do contribuinte.

35

Desta forma, se o Estado respeitar os direitos individuais, mas a lei que o limita estabelecer situações em que o Poder Público possa identificar o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte para outros fins que vão além dos objetivos determinados pela Carta Constitucional (caráter pessoal do imposto e a graduação deste segundo a capacidade econômica do contribuinte) deverá tal lei ser considerada inconstitucional.

2.3.8. Interpretando o art. 145, § 1º da Constituição da República de 1988

O legislador ao estabelecer um tributo tem o dever de criar critérios de exigibilidade destes que tenham fundamento no princípio da igualdade e na justiça fiscal, onerando os contribuintes segundo os limites de suas capacidades contributivas. E para que o legislador possa graduar o ônus tributário destinado a cada contribuinte a Constituição permite que ele intervenha na esfera privada daquele para identificar o seu patrimônio, seus rendimentos e suas atividades econômicas, devendo tal intromissão ser balizada pela lei e pelo respeito aos direitos individuais do contribuinte.

2.4. CAPACIDADE CONTRIBUTIVA COMO JUSTIÇA FISCAL

A capacidade contributiva é um dos princípios que podem ser invocados do grande ideal que é a justiça fiscal. Isso significa que a tributação deve ser utilizada não somente como meio de arrecadação de receitas para os cofres públicos, mas também como meio de trazer mais equilíbrio na distribuição de renda da sociedade brasileira. Nesse sentido comenta José Mauricio CONTI 49: A estrutura tributária deve guiar-se no sentido da Justiça Fiscal, e os critérios utilizados deverão ter por meta atingir esta Justiça Fiscal. Ela tem de ser justa, de modo a se fazer com que haja uma adequada distribuição do ônus tributário entre os indivíduos”.

49

Ibidem. p. 11.

36

A justiça fiscal, no entender de CONTI, pode ser atingida através de dois princípios: (1) o princípio do benefício e (2) o princípio da capacidade contributiva. O princípio do benefício se manifestaria pela reciprocidade, ou seja, o contribuinte deve colaborar com a arrecadação estatal na proporção do benefício recebido por este. Segundo CONTI 50: O princípio do beneficio “é aquele segundo o qual obtém-se a Justiça Fiscal por meio da tributação fazendo com que cada contribuinte colabore na arrecadação dos recursos por parte do Estado na proporção dos benefícios que obtenha com a realização das obras e/ou dos serviços públicos por ele prestados, ou seja, na proporção dos gastos que o Estado tenha efetuado para beneficiar aquele contribuinte. Cada contribuinte deve ter, então, um ônus tributário equivalente ao benefício obtido com a realização pelo Estado das funções que a este foram delegadas e que beneficiaram aquele.

A capacidade contributiva seria a manifestação da justiça fiscal no sentido de que os contribuinte deveriam arcar para os gastos do Estado na medida de suas possibilidade de arcarem com o ônus da tributação 51: [...] os contribuintes devem colaborar para o financiamento dos gastos do Estado na proporção de sua capacidade de contribuição para estes gastos, ou seja, o ônus tributário deve ser maior ou menor conforme seja maior ou menor, respectivamente, a capacidade econômica deste contribuinte.

Além disso, ressalta CONTI que o princípio da capacidade contributiva seria um desdobramento do princípio da igualdade 52: Pelo princípio da capacidade contributiva, deve-se tratar cada contribuinte segundo a sua capacidade de arcar com o ônus tributário. Ou seja, é uma das maneiras pelas quais se vai tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais no campo do Direito Tributário. Desta forma, podemos concluir que o princípio da capacidade contributiva nada mais é do que um desdobramento do princípio da igualdade no sistema constitucional tributário.

No plano constitucional a justiça fiscal se apresenta plenamente compatível com os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil apresentadas no art. 3º da Constituição: 50 51 52

Ibidem. p. 14. Idem. Ibidem. p. 26.

37

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Quando a Constituição determina a necessidade de construir uma sociedade livre, justa e solidária; de garantir o desenvolvimento nacional; e de erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais, tem através de uma política tributária uma das formas de materializar esses objetivos. Se isso não fosse verdade a Constituição não passaria de um "pedaço de papel”53, contudo ela não tem como objetivo ser “só mais um agente mantenedor do status quo em benefício das elites que comandam nosso país” 54 , a Constituição representa um ideal de transformação da realidade. Cabe à Carta Constitucional atuar no sentido de diminuir as desigualdades existentes no continental Brasil. É certo que nenhum ser humano é igual. As desigualdades existem e, como já ressaltava ROUSSEAU, podem ser de ordem natural ou moral. A desigualdade natural seria aquele determinada pela própria ordem natural do mundo, já a desigualdade moral seria aquela criada pelos seres humanos 55: Concebo na espécie humana duas espécies de desigualdade: uma, que chamo de natural ou física, porque é estabelecida pela natureza, e que consiste na diferença das idades, da saúde, das forças do corpo e das qualidades do espírito, ou da alma; a outra, que se pode chamar de desigualdade moral ou política, porque depende de uma espécie de convenção, e que é estabelecida ou, pelo menos, autorizada pelo consentimento dos homens. Consiste esta nos diferentes privilégios de que gozam alguns com prejuízo dos outros, como ser mais ricos, mais honrados, mais poderosos do que os outros, ou mesmo fazerem-se obedecer por eles.

53

HESSE, Konrad. A força normativa da constituição. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1991. p. 9. 54 BARBOZA, Estefânia Maria de Queiroz. A legitimidade democrática da jurisdição constitucional na realização dos direito fundamentais sociais. Curitiba, 2005. 185 f. Dissertação (Mestrado em Direito Econômico e Social) – Centro de Ciências Jurídicas e Sociais, Pontifícia Universidade Católica do Paraná. 55 ROUSSEAU, Jean-Jacques. Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens. 2. ed. São Paulo: M. Fontes, 2002. p.123.

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Sabendo da existência das desigualdades o constituinte originário criou meios para que fosse alcançada a justiça. No campo tributário uma das formas de alcançar esta justiça é através do princípio da capacidade contributiva. Este princípio legitima a existência de duas barreiras que limitam o desejo de arrecadar do Estado. Esses limites são a proteção do mínimo existencial do contribuinte, para que este sempre tenha o necessário para viver dignamente, e a vedação do confisco do patrimônio do contribuinte, evitando, desta forma, que o Poder Público lhe retire as riquezas que com esforço obteve. 2.5. RESPEITO AO MÍNIMO VITAL OU MÍNIMO EXISTENCIAL

A proteção do mínimo vital “consiste na proibição constitucional de tributar aquela parcela patrimonial voltada exclusivamente à manutenção do cidadão ou à de sua família, de modo a preservar aqueles valores indispensáveis à sua sobrevivência e à de seu núcleo familiar de forma digna” 56. Desta forma o mínimo vital manifesta as “condições mínimas de existência humana digna, que não pode ser objeto de incidência fiscal”

57

. Sua tributação

representaria não apenas uma violação do princípio da capacidade contributiva, mas também ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Para Fernando Aurelio ZILVETI o mínimo existencial 58: É a menor quantia de renda absolutamente necessária para a sobrevivência digna do contribuinte. É preciso haver um consenso entre Fisco e contribuinte de modo que o imposto não fira direitos fundamentais do cidadão, como o direito à alimentação, saúde, educação, habitação, ao exercício profissional, etc.. Interpretando a constituição, como fizeram alguns autores nacionais e estrangeiros, tem-se que o salário mínimo deve atender a todas as

56

IATAROLA, Ana Cristina Silva. Capacidade contributiva: princípio norteador de justiça tributária e sua limitação pelos direitos fundamentais: mínimo existencial versus não confisco tributário. Rio de Janeiro, 2005. 152 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade Gama Filho. p. 104 57 PEZZI, Alexandra Cristina Giacomet. Dignidade da pessoa humana, mínimo existencial e limites à tributação no estado democrático de direito. Porto Alegre, 2006. 153 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Faculdade de Direito, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. p. 114 58 ZILVETI, Fernando Aurelio. op. cit., p.203.

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necessidades vitais ali descritas, o que pode ser entendido como um parâmetro de mínimo existencial, isento de qualquer tributação.

ZILVETI conclui que somente seria passível de tributação o excedente do mínimo existencial. “O mínimo de existência do indivíduo e sua família não está disponível para pagamento de imposto, pois não tem capacidade contributiva quem somente ganha o mínimo existencial” 59. Ricardo Lobo TORRES observa que 60: Sem o mínimo necessário à existência cessa a possibilidade de sobrevivência do homem e desaparecem as condições iniciais da liberdade. A dignidade humana e as condições materiais da existência não podem retroceder aquém de um mínimo, do qual nem os prisioneiros, os doentes mentais e os indigentes podem ser privados. O fundamento do direito ao mínimo existencial, por conseguinte, reside nas condições para o exercício da liberdade, que alguns autores incluem na liberdade real, na liberdade positiva ou até na liberdade para ao fito de diferenciá-las da liberdade que é mera ausência de constrição.

O mínimo existencial é tão importante para o ser humano que chega a estar presente entre os direitos fundamentais, como se pode inferir pelo texto de TORRES61: O direito às condições mínimas de existência digna inclui-se entre os direitos da liberdade, ou direitos humanos, ou direitos individuai, ou direitos naturais, formas diferentes de expressar a mesma realidade. O mínimo existencial exibe as características básicas dos direitos da liberdade: é pré-constitucional, posto que inerente à pessoa humana; constitui direito público subjetivo do cidadão, não sendo outorgado pela ordem jurídica, mas condicionando-a; tem validade erga omnes, aproximando-se do conceito e das conseqüências do estado de necessidade; não se esgota no elenco do art. 5º da Constituição nem em catálogo preexistente; é dotado de historicidade, variando de acordo com o contexto social. Mas é indefinível, aparecendo sob a forma de cláusulas gerais e de tipos indeterminados.

Pelo mesmo caminho discursa José Maurício CONTI 62: É inconstitucional a tributação exercida sobre determinada manifestação de capacidade econômica de um contribuinte que o atinja naqueles recursos que destinaria às suas necessidades básicas, imprescindíveis à garantia de sua sobrevivência Os recursos destinados a atender estas finalidades, se somente para isso são suficientes, não revelam capacidade contributiva. Revelam apenas uma capacidade econômica mínima, não 59 60 61 62

Ibidem. p.204. TORRES, Ricardo Lobo. op. cit., p. 69. Ibidem. p. 70. CONTI, José Maurício. op. cit., p. 53.

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permitindo que dela sejam extraídos quaisquer valores destinados a compor a arrecadação do Estado, pois estar-se-ia atingindo alguém sem capacidade contributiva alguma – violando, pois o princípio constitucional.

Vale, neste momento, rememorar a diferença existente entre capacidade econômica e capacidade contributiva. Como dito antes a capacidade econômica representa o “ter riqueza”, enquanto que a capacidade contributiva é a possibilidade do contribuinte conseguir suportar o ônus da tributação sem que lhe seja retirado o mínimo necessário para sua existência digna. Tendo essa distinção conceitual em mente é preciso rememorar que o fato de uma pessoa ter capacidade econômica, não significa que ela terá capacidade contributiva. Pode ser que sua capacidade econômica seja tão pouca que mal consiga suportar suas necessidades de subsistência, nestes termos, não há para esta pessoa a capacidade contributiva. O Estado não pode tributar alguém só pelo fato desta possuir alguma riqueza. Por uma questão de justiça fiscal, igualdade e dignidade da pessoa humana o Poder Público apenas poderá exigir a tributação do montante que exceda o mínimo vital. Para que esse discurso não se torna vazio é preciso conceituar o “mínimo existencial ou mínimo vital” para que se possa dar materialidade, aplicabilidade e eficácia jurídica a esse conceito. Porém tal tarefa demonstra não ser fácil. Nas palavras de ZILVETI 63: É necessário definir o que é indispensável para um indivíduo, como membro de dada sociedade, num dado momento histórico, para a sua sobrevivência e, se for o caso, de sua família, de modo que, a partir daí, poderia ser identificada a sua capacidade contributiva.

Pelo que se percebe a conceituação do mínimo existencial vai muito além de um valor. Está intimamente ligado ao espaço e ao tempo. Em um país com dimensões continentais como o Brasil diversas dificuldades surgiriam: um contribuinte da região norte deveria ter o mesmo tratamento que um contribuinte do sudeste brasileiro? Eles possuem as mesmas necessidades? O mínimo vital de uma pessoa rica é o mesmo de uma pessoa pobre? Contribuintes de área urbana dever ter tratamento diferenciado dos 63

ZILVETI, Fernando Aurelio. op. cit., p.216.

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contribuintes que vivem em áreas rurais? Diversos são os questionamentos, e todos giram em torno do princípio da igualdade. Quem são os iguais? Quem são os diferentes? Qual o grau de suas diferenças? CONTI enfrenta a mesma dificuldade ao tentar conceituar o que seria o mínimo existencial 64: Há, evidentemente, dificuldades em se conceituar precisamente o que possa ser considerado como “mínimo vital”, e, portanto, o que não possa ser sujeito à tributação, de modo a caracterizar a imposição como institucional. Há, portanto, necessidade de se estabelecer, nas diversas formas pelas quais a capacidade econômica das pessoas se exterioriza, o que – ou quanto – não pode ser tributado, por atingir o mínimo indispensável à satisfação das necessidades humanas básicas. A idéia é a de que, levando-se em consideração as necessidades das pessoas dentro do contexto social, cultural e econômico em que vivem, sejam reconhecidos como não tributáveis os fatos que, embora exteriorizem alguma capacidade econômica, não indicam capacidade contributiva.

Além da necessidade da quantificação, Fernando Aurelio ZILVETI ressalta outro problema 65: o valor quantificado deve ser fruto de uma análise financeira ou de uma política de tributação? Se o valor do mínimo existencial for determinado de forma política, então o contribuinte terá sua capacidade contributiva sujeita à discricionariedade do Poder Público. Ou seja, será mínimo existencial aquilo que o Estado considerar que é. Tudo dependerá dos programas governamentais e sobre qual área social o governo estará mais focado (saúde, educação, cultura, esporte, alimentação). Por outro lado, se o seu valor for quantificado através de uma análise financeira, deverão ser determinados os elementos que comporão o seu cálculo. Quanto a isso, observa-se que a própria Constituição da República já mostrou um indicativo sobre o que poderia ser considerado o mínimo vital no art. 7º, inciso IV: Art. 7º - São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: [...] IV – salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos

64 65

CONTI, José Maurício. op. cit., p. 54. ZILVETI, Fernando Aurelio. op. cit., p.217.

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que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim; (grifo nosso).

Ressalta-se que o salário mínimo que representaria o mínimo vital não é aquele estipulado pelo Governo, mas o idealizado pela Constituição, uma vez que se observa que na realidade o salário mínimo vigente não é capaz de suprir todas as necessidades estipuladas pela Carta Magna. Além disso, o mínimo necessário a existência digna da pessoa deve levar em consideração as peculiaridades das diversas regiões do Brasil, de forma a tornar o princípio da capacidade contributiva um instrumento real de política social.

2.6. LIMITAÇÃO DA TRIBUTAÇÃO PELA VEDAÇÃO DO CONFISCO

A vedação do confisco é derivada do princípio da capacidade contributiva. Da mesma forma que o Estado não pode tributar o mínimo existencial de uma pessoa, também não pode exigir uma tributação excessiva daquele que tem capacidade contributiva. Em outras palavras. Existindo um contribuinte que tenha uma riqueza que ultrapasse o mínimo necessário para sua subsistência, não pode o Estado lhe retirar tudo o que exceda esse mínimo existencial. Se o fizesse, o Poder Público estaria punindo aquele que com seu esforço conseguiu acumular riquezas Imagine a seguinte situação: Duas pessoas, “A” e “B”, vivem em uma mesma cidade, possuem a mesma idade e partiram de condições de educação e de riqueza semelhantes. “A” opta por ter uma vida sem muitas regalias, vive apenas com o necessário. “B” possuindo um espírito empreendedor decide investir seu dinheiro nas mais diversas oportunidades do mercado. Com o tempo percebe-se uma grande diferença patrimonial entre “A” e “B”. Eis que surge o Fisco. O Fisco ao se deparar com “A” percebe que este apesar de ter capacidade econômica, não possui capacidade contributiva, e decide com fundamento nos princípios da capacidade contributiva, da igualdade e da justiça fiscal, não tributar “A”. Agora o Fisco se volta para “B”, percebe que este possui uma grande riqueza e que esta excede em muito o seu mínimo

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existencial. Decide então retirar-lhe tudo o que excede o seu mínimo existencial. O Estado teria direito de fazer isso? No exemplo acima se percebe que o Estado respeitou o mínimo existencial de “B”, porém em compensação retirou-lhe tudo o que excedia esse mínimo. Ao atuar assim o Estado agiu de maneira confiscatória. Segundo TIPKE e YAMASHITA o confisco surgiria quando o Poder Público exigisse uma tributação tão alta que pudesse trazer ruína ao patrimônio do contribuinte, explicam 66: Costuma-se supor confisco quando o imposto é tão alto que ele pode ser recolhido apenas da substância patrimonial, ou quando ele consome completa ou quase completamente o rendimento de capital, ou quando ele torna não-rentável um empresa, ou a leva à sua paralisia.

A tributação confiscatória inviabiliza o modelo econômico capitalista existente em nossa sociedade contemporânea. Além disso, os tributos confiscatórios sempre geraram revoltas nas civilizações e nossa história está repleta de exemplos dentre eles a Inconfidência Mineira. Não se pode permitir que o poder de tributar destrua o contribuinte, por esse motivo o Ministro Orosimbo NONATO, do Supremo Tribunal Federal, relatou no RE 18.331(f. 294) 67 que: O poder de taxar não pode chegar a desmedida do poder de destruir, substituída o conhecido axioma de Marshall pelo – de que “the Power to tax is the Power to keep alive”. Cita, ainda, o juiz, erudita conferencia do prof. Bilac Pinto tirada a lume na Rev. For., vol. 82, p. 547 que vale por eloqüente preconicio da doutrina elaborada na Côrte Suprema dos Estados Unidos de que o poder de taxar “somente pode ser exercido dentro dos limites que o tornem compatível com a liberdade de trabalho, de comercio e de industria e com o direito de propriedade”. É um poder, em suma, cujo exercício não deve ir até abuso, ao excesso, ao desvio, aplicável, ainda aqui, a doutrina fecunda do “detournement de pouvoir”.

A vedação do confisco está prevista na Constituição Federal como uma das limitações ao poder de tributar. Expressa o art. 150, IV:

66

TIPKE, Klaus; YAMASHITA, Douglas. Justiça fiscal e princípio da capacidade contributiva. São Paulo: Malheiros. 2002. p. 46 67 RE 18331, Relator(a): Min. OROSIMBO NONATO, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/09/1951, ADJ DATA 10-08-1953 PP-02356 DJ 08-11-1951 PP-10865 EMENT VOL-00063 PP00283.

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Art. 150 – Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: [...] IV – utilizar tributo com efeito de confisco; (grifo nosso)

Para Kiyoshi HARADA tal dispositivo constitucional trata-se de uma expressão vaga e imprecisa 68 . Por esse motivo a interpretação sobre o efeito confiscatório ou não de um tributo caberia ao judiciário 69. Sobre o caráter aberto da expressão constitucional do “efeito confiscatório” se manifestou o Ministro Celso de MELLO, do Supremo Tribunal Federal, relator de acórdão proferido em sede de Ação Direita de Inconstitucionalidade (ADI 2010 MC, f. 160-166), cujo voto, devido a sua clareza, será citado em parte 70: Sabemos todos que o ordenamento normativo vigente no Brasil, ao definir o estatuto dos contribuintes, proclamou, em favor dos sujeitos passivos que sofrem a ação fiscal do Estado, uma importante garantia fundamental que impõe, em sede constitucional, aos entes públicos dotados de competência impositiva, expressiva limitação ao seu poder de tributar. Essa garantia reflete-se na vedação, que, destinada à União Federal, aos Estados-membros, ao Distrito Federal e aos Municípios, proíbe-lhes a utilização do tributo “com efeito de confisco” (CF, art. 150, IV). Revela-se evidente, desse modo, a meu juízo, que o “quantum” excessivo dos tributos, desde que irrazoavelmente fixado em valor que comprometa o patrimônio e a renda ou ultrapasse o limite da capacidade econômica do contribuinte, incide na proibição constitucional, hoje expressamente inscrita no art. 150, IV, da Carta Política, que veda a utilização de prestações tributárias com efeito confiscatório, consoante enfatizado pela doutrina [...]. É certo que a norma inscrita no art. 150, IV, da Constituição encerra uma cláusula aberta, veiculadora de um conceito jurídico indeterminado, reclamando, em conseqüência, que os Tribunais, na ausência de “uma diretriz objetiva e genérica, aplicável a todas as circunstância” (ANTÔNIO ROBERTO SAMPAIO DÓRIA, “Direito Constitucional Tributário e Due Process of Law”, p. 196, item n. 62, 2ª ed., 1986, Forense), procedam à avaliação dos excessos eventualmente praticados pelo Estado, tendo em consideração as limitações que derivam do princípio da proporcionalidade. [...] A Constituição da República, ao disciplinar o exercício do poder impositivo do Estado, subordinou-o a limites insuperáveis, em ordem a impedir que fossem praticados, em detrimento do patrimônio privado e das atividades particulares e profissionais lícitas, excessos que culminassem por comprometer, de maneira arbitrária, o desempenho regular de direitos que o sistema constitucional reconhece e protege. Como observei anteriormente, não há uma definição constitucional de confisco em matéria tributária. Trata-se, na realidade, de um conceito aberto, a ser formulado pelo juiz, com apoio

68

HARADA, kiyoshi. op. cit., p. 373. MACHADO, Hugo de Brito. op. cit., p. 42. 70 ADI 2010 MC, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 30/09/1999, DJ 12-04-2002 PP-00051 EMENT VOL-02064-01 PP-00086. 69

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em seu prudente critério, quando chamado a resolver os conflitos entre o Poder Público e os contribuintes. A proibição constitucional do confisco em matéria tributária nada mais representa senão a interdição, pela Carta Política, de qualquer pretensão governamental que possa conduzir, no campo da fiscalidade – trata-se de tributos não-vinculados ou cuide-se de tributos vinculados –, à injusta apropriação estatal, no todo ou em parte, do patrimônio ou dos rendimentos dos contribuintes, comprometendo-lhes, pela insuportabilidade da carga tributária, o exercício do direito a uma existência digna, a prática de atividade profissional lícita e a regular satisfação de suas necessidades vitais (educação, saúde e habitação, por exemplo).[...] Tenho para mim, portanto, assentadas essas premissas de ordem conceitual, e em face da escala de progressividade definida no art. 2º da Lei nº 9.783/99, que a identificação do efeito confiscatório deve ser feita em função da totalidade da carga tributária, mediante verificação da capacidade de que dispõe o contribuinte – considerado o montante de sua riqueza (renda e capital) – para suportar e sofrer a incidência de todos os tributos que ele deverá pagar, dentro de determinado período, à mesma pessoa política que os houver instituído (a União Federal, no caso), condicionando-se, ainda, a aferição do grau de insuportabilidade econômicofinanceiro, à observância, pelo legislador, de padrões de razoabilidade destinados a neutralizar excessos de ordem fiscal eventualmente praticados pelo Poder Público.

Ressalta-se que a vedação do confisco é destinada unicamente para os tributos e não para as multas. O motivo dessa distinção se encontra na própria definição de tributo, que seria uma prestação pecuniária que não constitua sanção de ato ilícito (art. 2º do Código Tributário Nacional). Uma vez que a multa é punição de ato ilícito não se aplica o art. 150, IV da CF/1988. Sacha Calmon Navarro COÊLHO adverte que “admite-se a tributação exacerbada, por razões extrafiscais e em decorrência do exercício do poder de polícia”71. Segundo o autor, alguns tributos possuem além do caráter fiscal um outro de caráter extrafiscal. A vedação dos efeitos confiscatórios atingiria apenas o campo da fiscalidade do tributo. A extrafiscalidade não seria atingida pelo não-confisco, pois se trataria de uma política adotada pelo constituinte para “induzir comportamentos desejados ou para inibir comportamentos indesejados” 72.

71

COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 272. 72 Ibidem. p. 274.

46

CAPÍTULO

3:

PROGRESSIVIDADE,

PROPORCIONALIDADE

E

SELETIVIDADE E O PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA 3.1. OBJETIVOS DO CAPÍTULO

Este capítulo tem como objetivo a análise do critério da progressividade, da proporcionalidade e da seletividade como instrumentos de aplicação do princípio da capacidade contributiva nos tributos brasileiros.

3.2. ASPECTOS GERAIS

Idéias e pensamentos regem a nossa vida intelectual, porém se elas somente permanecerem no campo da mente humana jamais se concretizarão. São como espíritos sem corpos. As idéias precisam ser materializadas. Precisam adquirir uma forma 73. Com o princípio da capacidade contributiva ocorreria a mesma coisa se não fosse possível lhe dar materialidade. Um princípio que permanece no mundo das idéias tende a ser esquecido, ao passo que quando lhe damos uma forma em nosso mundo físico ele tende a permanecer. Nesse sentido, como dar materialidade ao princípio da capacidade contributiva? O princípio da capacidade contributiva pode adquirir materialidade por três formas: seletividade, progressividade e proporcionalidade. Melhor dizendo, o princípio da capacidade contributiva adquire atua na sociedade por esses três instrumentos. Diz-se instrumentalidade, pois, a seletividade, a progressividade e a proporcionalidade não são o princípio da capacidade contributiva em si, mas formas de aplicar o princípio na realidade do cotidiano. São instrumentos de sua aplicação.

73

GAARDER, Jostein. O mundo de Sofia: romance da história da filosofia. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. p. 98.

47

Quando a Constituição da República de 1988 menciona no art. 145, §1º que os impostos serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte não determina o critério dessa graduação

74

. Podendo ser adotado o critério que o

legislador considerar mais justo. Daí se entender que o legislador poderia escolher entre os critérios da seletividade, da progressividade e da proporcionalidade de acordo com o objetivo que pretender para o tributo em espécie 75. Contudo para alguns autores, dentre eles Regina Helena COSTA, Klaus TIPKE e Douglas YAMASHITA, José Maurício CONTI, o que melhor traduziria o princípio da capacidade contributiva seria a sua aplicação através do critério da progressividade. A seguir serão explicados os três critérios.

3.3. CRITÉRIO DA SELETIVIDADE

A seletividade envolve a idéia de selecionar, de escolher. No cotidiano é possível observar que os seres humanos estão constantemente selecionando algo: no jogo de futebol o técnico seleciona os jogadores que comporão o time; no vestibular a instituição de ensino superior seleciona os alunos através de uma prova; no serviço público as pessoas são selecionadas de acordo com sua classificação no concurso público; em uma entrevista de emprego a empresa seleciona as pessoas para comporem o seu quadro de empregados; e assim por diante. Quando se fala em seletividade é preciso perguntar: seletividade em relação a o quê? Se algo é seletivo então deve ter algum critério de seleção. A Constituição da República de 1988 determinou um critério de seleção, e este critério é a essencialidade, como é possível observar pela leitura do art. 153, §3º, inciso I (IPI) e art. 155, § 2º, inciso III (ICMS).

74 75

ZILVETI, Fernando Aurelio. op. cit., p. 259. TORRES, Ricardo Lobo. op. cit., p. 94.

48

Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:[...] IV - produtos industrializados;[...] § 3º - O imposto previsto no inciso IV: I - será seletivo, em função da essencialidade do produto;[...] Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: [...] II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior; [...] § 2.º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: [...] III - poderá ser seletivo, em função da essencialidade das mercadorias e dos serviços;[...] (grifo nosso)

A seletividade em função da essencialidade do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) é repetida pelo Código Tributário Nacional: Art. 48. O imposto é seletivos em função da essencialidade dos produtos. (grifo nosso)

Da mesma forma se manifesta o decreto nº 4.544, de 26 de dezembro de 2002 (Regulamenta a tributação, fiscalização, arrecadação e administração do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI): Art. 64. Quando se tornar necessário atingir os objetivos da política econômica governamental, mantida a seletividade em função da essencialidade do produto, ou, ainda, para corrigir distorções, poderão as alíquotas ser reduzidas até zero ou majoradas até trinta unidades percentuais. (grifo nosso)

Vittorio CASSONE 76 define a seletividade do IPI como sendo: [...] um comando dirigido ao legislador, elaborador da lei ordinária criadora do IPI, no sentido de que, ao dimensionar a carga tributária, deve obedecer ao critério da seletividade em função da essencialidade do produto, isto é, produtos de primeira necessidade devem ter baixa tributação, e produtos menos essenciais ou supérfluos, devem receber tributação mais elevada.

Ricardo Lobo TORRES considera que a Constituição permitiu implicitamente a seletividade no IPTU (Imposto sobre Propriedade Predial e Territorial Urbana) 77: 76

CASSONE, Vittorio. Direito tributário: fundamentos constitucionais, análise dos impostos, incentivos à exportação, doutrina, prática e jurisprudência. 11. ed. São Paulo: Atlas, 1999. p. 270. 77 TORRES, Ricardo Lobo. op. cit., p. 94.

49

O subprincípio da seletividade, que informa o IPI e o ICMS, inscrito nos arts. 153, § 3º, I e 155, § 2º, III, aponta para a incidência na razão inversa da essencialidade do consumo. Representa um elemento de personalização agregado a um tributo que originalmente se definiria como imposto real. A EC 29/00, ao modificar o art. 156, § 1º, da CF 88, permitiu tenha o IPTU “alíquotas diferentes de acordo com a localização e o uso do imóvel”, o que significa que o imposto municipal passa a ser seletivo em função do bairro ou região da cidade, ou da finalidade comercial, atendendo à pretensa variação da capacidade contributiva.

Faticamente, como poderia a seletividade estar compatível com o princípio da capacidade contributiva? Pela seletividade, os produtos de primeira necessidade (os mais essenciais à vida) seriam os menos tributados ou até mesmo não tributados, como por exemplo: os produtos que compõem a cesta alimentar básica. Por outro lado, produtos menos essenciais teriam uma carga tributária mais alta, como acontece com os produtos de luxo. Nesses termos, pessoas com baixa capacidade contributiva seriam menos tributadas, pois se restringiriam a adquirir produtos mais essenciais, enquanto que pessoas com maior capacidade contributiva seriam tributadas de forma mais severa ao adquirirem produtos menos essenciais. Neste ponto cabe analisar a distinção que José Marcos Domingues de Oliveira 78 faz com relação a: (1) capacidade contributiva relativa e (2) capacidade contributiva absoluta. Tributar pela (1) capacidade contributiva relativa seria observar a real possibilidade de onerar a riqueza do contribuinte, conforme explica OLIVEIRA 79: Por incidência do princípio da capacidade contributiva (entendido como pressuposto da tributação) deverão pagar mais tributos aqueles contribuintes que, por deterem maior riqueza, incidirem num maior número de fatos geradores adequadamente selecionados pela lei.

A (2) capacidade contributiva absoluta representaria a aparente capacidade do contribuinte de se onerar, ou seja, o contribuinte demonstra capacidade contributiva pelo que adquire e não pela riqueza que possui, observe a explicação de OLIVEIRA 80:

78 79 80

OLIVEIRA, José Marcos Domingues de. op. cit., p. 61. Idem. Idem.

50

Quanto se investiga a capacidade contributiva absoluta, a que aludem Cortés Dominguez e Martín Delgado, verifica-se que há situações que são insuscetíveis de indicar percepção, acúmulo ou consumo de riqueza, na fórmula de Adolf Wagner, como a aquisição de produtos de higiene e alimentação básica, de vestuário e de saúde (como remédios) a propriedade de uma habitação popular, e a percepção de pensão alimentícia, e que, portanto, não podem gerar tributo. Quem adquire esses produtos ou recebe alimentos não demonstra capacidade contributiva, mas age no sentido de prover à própria existência, daí não poder sofrer qualquer tributação em relação a tais fatos, o que enseja recurso ao Judiciário.

Contudo, o que ocorreria se uma pessoa de baixa capacidade contributiva adquirisse um produto não essencial? Imagine um trabalhador de baixa renda que economiza durante anos para comprar um anel de ouro para pedir a sua amada em casamento, estaria ele demonstrando capacidade contributiva ao comprar o anel de ouro? A crítica que se faz a seletividade é que ela não leva em conta a real capacidade contributiva da pessoa, mas a sua aparência (capacidade contributiva absoluta).

Não importa se a pessoa tem ou não condições de suportar ônus da

tributação sem que lhe seja tirada o mínimo existencial, se foi capaz de adquirir um produto tido como não essencial então deverá suportar a tributação. Assim, tanto o rico como o pobre ao adquirirem o mesmo produto serão tributados da mesma forma. Exemplo: o tributo que o rico paga ao comprar um saco de arroz é o mesmo que o pobre pagará, da mesma forma o tributo que um rico paga ao comprar uma jóia será o mesmo que o pobre pagará ao comprar a mesma jóia. Desta forma, a seletividade não seria o melhor instrumento para a realização da justiça fiscal no que se refere ao tratamento isonômico segundo a capacidade contributiva do contribuinte. Por outro lado, não se pode dizer que a seletividade não esteja em consonância com este princípio, uma vez que procura a justiça fiscal ao tributar menos os produtos de primeira necessidade, possibilitando um acesso mais facilidade a estes pelas pessoas com menor capacidade contributiva.

51

3.4. CRITÉRIO DA PROGRESSIVIDADE E DA PROPORCIONALIDADE

A progressividade é um critério de fixação variável de alíquotas enquanto que a proporcionalidade é um critério fixação de alíquotas que adota uma porcentagem fixa e constante sobre o valor a ser tributado. Por um critério didático explicar-se-á primeiramente o critério proporcional. A proporcionalidade como conceituada anteriormente é um critério para a fixação da alíquota em que há uma porcentagem fixa incidente sobre a base de cálculo, seja qual for o montante desta. Exemplificando: um tributo ‘X’ determina que sobre o valor da propriedade incidirá a alíquota de 10%, sendo assim, se uma determinada propriedade ‘A’ tiver o valor de $1.000,00 e uma propriedade ‘B’ o valor de $ 1.000.000,00, sobre ambas incidirá a mesma alíquota de 10%. Isso significa que o proprietário de ‘A’ pagará $100,00 de tributo e o proprietário de ‘B’ pagará $ 100.000,00 de tributo. Veja a tabela abaixo:

TRIBUTO ‘X’ Propriedade ‘A’

Propriedade ‘B’

Base de cálculo:

$1.000,00

$1.000.000,00

Alíquota:

10%

10%

Cálculo:

$1.000,00 x 10%

$1.000.000,00 x 10%

Tributo a pagar:

$100,00

$100.000,00

Diferentemente é o critério da progressividade. Este prevê a cobrança de alíquotas diferenciadas segundo o valor da base de cálculo. Exemplificando: um tributo ‘H’ determina que sobre os imóveis com valor de até $10.000,00 incidirá a alíquota de 5%, sobre o valor que excede $10.000,00 até $50.000,00 incidirá a alíquota de 10% e sobre o que excede $50.000,00 até o infinito incidirá a alíquota de 20%. Se o imóvel ‘A’ tiver o valor de $5.000,00, o imóvel ‘B’ o valor de $27.000,00 e o imóvel ‘C’ o valor de $ 75.000,00, então o proprietário de ‘A’ pagará $250,00 de tributo, de ‘B’ pagará $2.700,00 e o de ‘C’ pagará $15.000,00. Veja a tabela abaixo:

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TRIBUTO ‘H’ Imóvel ‘A’

Imóvel ‘B’

Imóvel ‘C’

Base de cálculo:

$5.000,00

$27.000,00

$75.000,00

Alíquota:

5%

10%

20%

Cálculo:

$5.000,00 x 5%

$27.000,00 x 10%

$75.000,00 x 20%

Tributo a pagar:

$250,00

$2.700,00

$15.000,00

Aprofundando um pouco mais é possível estabelecer duas formas de progressividade: simples e gradual 81. A progressividade simples seria aquela em que a alíquota maior seria aplicada ao valor total da base de cálculo, enquanto que na progressividade gradual a alíquota maior seria aplicada apenas sobre a parcela que excedesse o limite da alíquota inferior, sendo ao final somado o valor resultante da alíquota inferior com a da alíquota maior. Observe pela tabela abaixo a diferença de calcula existente entre a progressividade simples e a gradual:

Alíquotas progressivas Até $5.000,00

5%

Acima de $5.000,00 até $10.000,00

10%

Acima de $10.000,00

20%

Cálculo pela progressividade simples Base de cálculo:

$2.000,00

$8.000,00

$20.000,00

Alíquota:

5%

10%

20%

Cálculo:

$2.000,00 x 5%

$8.000,00 x 10%

$20.000,00 x 20%

Tributo a pagar:

$100,00

$800,00

$4.000,00

81

ZILVETI, Fernando Aurélio. op. cit. p. 168.

53

Cálculo pela progressividade gradual Base de cálculo:

$2.000,00

$8.000,00

$20.000,00

Alíquota:

5%

10%

20%

Cálculo:

$2.000,00 x 5%

$5.000,00 x 5% +

$5.000,00 x 5% +

$3.000,00 x 10%

$5.000,00 x 10% + $10.000,00 x 20%

Tributo a pagar:

$100,00

$550,00

$2.750,00

Claramente é possível observar a diferença entre os valores a serem pagos segundo o critério da progressividade simples com relação à gradual.

3.5.

PROGRESSIVIDADE

COMO

O

MELHOR

INSTRUMENTO

DA

CAPACIDADE CONTRIBUTIVA

A constituição não impõe a aplicação do critério da progressividade para que seja observado o princípio da capacidade contributiva. Na verdade o texto constitucional deixa em aberto o critério que o legislador deva aplicar. A única ressalva que faz, no art. 145, § 1º da CF/1988, é que os impostos deverão ser “graduados”. Essa graduação, no entender de José Mauricio CONTI, é melhor atendida pelo critério da progressividade 82: “A tributação progressiva é a forma de tributação que melhor obedece ao princípio da capacidade contributiva, pois visa igualar o sacrifício dos contribuintes e obter, assim, a eqüidade vertical” Contudo, a progressividade não agrada a todos, como assevera José Mauricio CONTI há argumentos que rejeitam este critério por considerá-lo injusto 83: a) A progressividade tributária penaliza os mais eficientes. A idéia é que, à medida que um contribuinte seja mais eficiente, mais criativo, ou trabalhe mais, acabará auferindo maior renda e, conseqüentemente, sofrerá uma alíquota fiscal mais elevada que um outro que não possua as mesmas qualidades. 82 83

CONTI, José Mauricio. op. cit., p. 98. Ibidem. p. 77.

54

b) A progressividade tributária prejudica toda a sociedade, passando a ser socialmente injusta, ao desmotivar o esforço e a criatividade. Isto porque faz com que as pessoas passem a ser penalizadas ao terem recompensados seus respectivos esforços e criatividade com alíquotas tributárias mais elevadas. Leva, conseqüentemente, a um desestímulo ao esforço e à criatividade, o que, em última análise, prejudica toda sociedade. c) A utilização dos serviços públicos é inversamente proporcional à progressividade tributária. Os serviços públicos, tais como assistência médica, transporte coletivo, educação etc., são geralmente utilizado pelas pessoas com menor capacidade econômica, que não são atingidos pelas maiores alíquotas, pois estes geralmente já pagam estes serviços particulares, de modo que acabam pagando duas vezes pelo mesmo serviço

Afinal de contas, o critério da progressividade seria bom ou ruim? Não se pode pensar o critério da progressividade de forma maniqueísta, deve-se analisá-lo sob o ponto de vista da necessidade de uma política de governo. Nestes termos, tendo em consideração a concentração de renda existente no Brasil esse critério se demonstra justo? Para esta pergunta pode-se dizer que sim. Sobre a distribuição de rendo no Brasil veja a publicação no Almanaque Abril de 2008 84: Apesar do desenvolvimento de sua economia, o Brasil persiste com vários indicadores sociais ruins, pois o país possui uma das maiores concentrações de renda do mundo: a renda controlada pelas pessoas que são o 1% mais rico da população é praticamente igual à dos 50% mais pobres. E, se formos além da renda, 75,6% da riqueza do Brasil (renda, patrimônio e ganhos financeiros) está nas mãos de apenas 10% da população.

Pelo visto, no Brasil, a adoção da progressividade como instrumento de aplicação do princípio da capacidade contributiva como forma de justiça fiscal demonstra ser mais adequado, chegando a ser até mesmo uma necessidade.

3.6. PROGRESSIVIDADE NA CONSTITUIÇÃO

A Constituição da República de 1988 apresenta em seu texto diversos dispositivos em que se pode perceber a aplicação do critério da progressividade. Implicitamente pode-se observar este critério no art. 145, § 1º: Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente

84

Almanaque abril 2008. São Paulo: Abril, 2008. p.123

55

para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte. (grifo nosso)

Quando se diz que a Constituição ao mencionar a expressão “serão graduados” está implicitamente se referindo ao critério da proporcionalidade, não se quer dizer que este seja o único critério (como argumentado em páginas anteriores), mas que este critério também se encontra no contexto desse termo. Expressamente a CF/1988 menciona a progressividade nos seguintes dispositivos: Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre: [...] III - renda e proventos de qualquer natureza; VI - propriedade territorial rural; [...] § 2º - O imposto previsto no inciso III: I - será informado pelos critérios da generalidade, da universalidade e da progressividade, na forma da lei; [...] § 4º O imposto previsto no inciso VI do caput: I - será progressivo e terá suas alíquotas fixadas de forma a desestimular a manutenção de propriedades improdutivas; [...] Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: I - propriedade predial e territorial urbana; [...] § 1º Sem prejuízo da progressividade no tempo a que se refere o art. 182, § 4º, inciso II, o imposto previsto no inciso I poderá: I – ser progressivo em razão do valor do imóvel; [...]

A Constituição ainda prevê a progressividade no tempo em que sobre a mesma base de cálculo a alíquota será progressiva com o decorrer do tempo: Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes. [...] § 4º - É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de: [...] II - imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo; [...]

Convém neste momento a realização de alguns questionamentos: é possível a aplicação da progressividade a todos os impostos? E, a progressividade pode ser estendida a outras figuras tributárias?

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Sobre o primeiro questionamento é possível argumentar que seria possível a aplicação do critério da progressividade a todos os impostos, uma vez que o artigo 145, §1º da CF/1988 menciona a possibilidade de graduação dos impostos e, como visto, isto seria um indicativo da aplicação desse critério. Contudo este parece não ter sido o entendimento do Supremo Tribunal Federal ao editar a súmula 656: “É inconstitucional a lei que estabelece alíquotas progressivas para o imposto de transmissão “inter vivos” de bens imóveis – ITBI com base no valor venal do imóvel”. Além disso, cabe ressaltar que como visto anteriormente, Fernando Aurelio ZILVETI entende que o art. 145, §1º da CF/1988 seria aplicável apenas aos impostos pessoais. Já com relação a outras figuras tributárias (taxas, contribuições de melhorias, empréstimo compulsório e contribuições) não se poderia afirmar sobre a aplicação da progressividade. Interpretando literalmente a Constituição pode-se concluir que o constituinte originário decidiu por aplicar a progressividade apenas aos impostos. Contudo tem entendido o STF que sobre a taxa de fiscalização do mercado de títulos e valores mobiliários é possível a aplicação do princípio da progressividade (Informativo nº 146 do STF) 85: Concluído o julgamento de recursos extraordinários em que se discute a constitucionalidade da taxa de fiscalização do mercado de títulos e valores mobiliários, instituída pela Lei 7.940/89 (v. Informativos 82, 112 e 119). O Tribunal, por maioria, mantendo as decisões recorridas, entendeu constitucional a referida taxa. Considerou-se : 1) que o fato de a taxa variar em função do patrimônio líquido da empresa não significa que esse patrimônio líquido constitua sua base de cálculo - serve, apenas, de elemento informativo do montante a ser pago, quando da aplicação da tabela prevista na lei; 2) que o critério adotado para a cobrança de taxa observa o princípio da capacidade contributiva, que também pode ser aplicado a essa espécie de tributo, principalmente quando se tem como fato gerador o poder de polícia. (CF, art. 145, § 1º - "Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte."). (grifo nosso).

Como visto o Supremo Tribunal Federal parece ter entendido pela interpretação extensiva do disposto no art. 145, § 1º da Constituição da República de 85

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Informativo jurisprudencial nº 146. Disponível em: < http://www.stf.jus.br//arquivo/informativo/documento/informativo146.htm >. Acessado em: 27 ago. 2009.

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1988, ao determinar que não haveria problema em estendê-la a outras espécies tributárias além dos impostos. Logo, é possível entender que a aplicação do critério da progressividade como instrumento para garantir a aplicabilidade do princípio da capacidade contributiva, também, poderia se estender a todas as espécies tributárias.

58

CONCLUSÃO Pelo observado os princípios são vigas mestras que orientam uma ciência. O direito tributário, como um ramo autônomo da ciência jurídica possui princípios próprios: legalidade, anterioridade, competência, igualdade, capacidade contributiva, vedação do confisco e liberdade de tráfego. No direito tributário os princípios além de representarem a base do sistema, também demonstram ser limites ao poder de tributar. Isso significa que esses princípios são como escudos nas mãos dos contribuintes, defendendo-os contra as investidas do Estado. Contudo é preciso deixar claro que os princípios não impedem o Estado de tributar. A tributação é essencial para a manutenção e continuidade do Estado. A função dos princípios é impedir que o Poder Público se utilize imoderadamente dos tributos. Tributar é essencial a sobrevivência do Estado e pelo mesmo motivo também é necessário para a sobrevivência do próprio contribuinte. Sem uma fonte de renda não há Estado, e sem este não há como uma pessoa de nossa Era existir. O ônus de ser tributado caminha ao lado do bônus de conviver em uma sociedade. Mas, como dito anteriormente, esse poder não deve ser exercido de forma imoderada. O princípio da capacidade contributiva é um dos limites constitucionais ao poder de tributar do Estado. Esse princípio representa um dos aspectos da justiça fiscal. A justiça é uma idéia que as pessoas ainda não conseguiram traduzir em palavras e por isso não existe um conceito sobre ela. Apesar disso não se pode dizer que as pessoas não compreendam o que seja a justiça. Esta palavra é como o amor, ninguém o define, mas todos podem senti-lo. Com a justiça é a mesma coisa, não existem palavras capazes de traduzirem todos os seus significados, mas é algo que todo ser humano pode sentir. A justiça pode ser difícil de ser descrita em palavras, mas é possível compreende-la através de outros conceitos. Um dos conceitos que estão próximos da idéia de justiça é a idéia de igualdade.

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O princípio da igualdade orienta os seres humanos no sentido de tratarem seus pares sem distinções ou discriminações. Melhor traduzido: tratar os iguais igualmente e os desiguais desigualmente na medida de suas desigualdades para trazê-los em um patamar de igualdade. Este entendimento sobre o princípio da igualdade foi ensinado durante as aulas de graduação do curso de Direito pelo professor Roberto Catalano Botelho FERRAZ na Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Segundo FERRAZ apenas dizer que a igualdade é tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida de suas desigualdades não quer dizer nada, pois a mesma idéia foi aplicada na Alemanha Nazista, ou seja, os nazistas trataram os alemães igualmente e desigualmente os judeus na medida das suas desigualdades, e então o holocausto se instaurou. A igualdade se reflete no sentido de trazer a situações de paridade aqueles que se encontram em situações desiguais. A igualdade se manifesta no Direito Tributário através do princípio da capacidade contributiva. Este princípio traz dentro de si a idéia de que aquele que possuir mais riqueza deve ser mais tributado que aquele que possuir menos riqueza. Ou seja, o Estado deve tratar os contribuintes desigualmente na medida de suas capacidades contributivas. Tributar segundo a capacidade contributiva não significa uma permissão de tributar, pelo contrário, tem o sentido de ser um limite ao poder de tributar. Por este princípio o Estado não pode exigir do contribuinte o que bem entender, deve agir de forma a preservar-lhe o mínimo existencial e a não retirar-lhe de maneira confiscatória os bens. O mínimo existencial seria quantia mínima e necessária de riqueza para que um ser humano pudesse ter uma vida digna. Sobre essa quantia destinada a subsistência da pessoa não pode o Estado exercer a imposição da tributação. Outro limite a tributação, segundo o princípio da capacidade contributiva, é a vedação do confisco. Ao tributar o contribuinte o Estado não pode fazê-lo de forma a retirar-lhe toda a riqueza que este acumulou. Ou seja, não deve o Poder Público onerar de tal forma o contribuinte que lhe seja dilapidado todo o patrimônio e o impeça de gozar dos frutos de sua riqueza. O poder de tributar deve ser utilizado de forma

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equilibrada e responsável para que não falte dinheiro aos cofres públicos e nem destrua o contribuinte. O princípio da capacidade contributiva para ter efetividade não pode ficar apenas no plano das idéias, deve ser concretizado e para isso é preciso que existam instrumentos para sua aplicação. Três desses instrumentos foram tratados neste trabalho: a seletividade, a proporcionalidade e a progressividade. A seletividade procura determinar a carga tributária de acordo com a essencialidade do produto ou serviço em questão. A proporcionalidade visa a tributação sempre por uma alíquota comum, ou seja, não importa a quantidade de riqueza do contribuinte a alíquota do tributo será sempre a mesma. A progressividade procura tributar diferentes graus de riqueza com diferentes alíquotas. Isto significa que um contribuinte com maior capacidade contributiva será tributado de forma mais intensa que um contribuinte que apresenta baixa capacidade contributiva. Pelo observado todos os critérios demonstram adequação ao princípio da capacidade contributiva, mas aquele que mais parece entrar em sintonia com a idéia centrar desejada pelo princípio é o critério da progressividade. A utilização de um critério caracterizado pela progressividade demonstra uma busca pela justiça no campo da tributação. Esse entendimento é adequado em um contexto social qualificado por uma desproporcional distribuição de renda como ocorre no Brasil. Talvez em países cujos cidadãos se encontrem em uma situação de equivalência de riquezas a progressividade poderia ser considerada injusta, porém no Brasil este critério demonstra ser o mais adequado.

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