Probabilidade e Propensões à luz dos Três Mundos de Popper (2012)

June 19, 2017 | Autor: Angelo Hartmann | Categoria: Probability Theory, Philosophy of Physics, Karl Popper, Epistemic Fallibilism
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PROBABILIDADE E PROPENSÕES À LUZ DOS TRÊS MUNDOS DE POPPER – Angelo Eduardo da Silva Hartmann UNIOESTE/PET Filosofia - ICV [email protected] Resumo: O problema de como interpretar a teoria da probabilidade é, em Karl Popper (19021994), incontornável para a adequada compreensão da teoria quântica em suas implicações com o realismo. A interpretação estatística é correta, no entanto, permite uma oscilação entre concepções objetivistas – puramente estatísticas – e subjetivistas – que recorrem às probabilidades para suprir as insuficiências do nosso conhecimento. O objetivo desse texto é apresentar alguns traços da proposta de Popper acerca da teoria da probabilidade à luz da sua teoria dos Três Mundos. Tenciono fazê-lo em uma articulação que se configura com a interpretação da probabilidade (Mundo 3) em termos de propensões físicas (Mundo 1), compatibilizando com a defesa de Popper do realismo de inobserváveis e de uma nova metafísica da física. Palavras-chave: Campos. Cosmologia. Metafísica.

Cálculo de probabilidades e Interpretações Dedico essa primeira seção do texto (i) à explanação geral de Popper acerca da teoria da probabilidade – que compreende as fórmulas relativa e absoluta e as interpretações lógica, em termos de frequência e de propensão – e (ii) à distinção entre as interpretações subjetivista e objetivista, condizentes com a sua concepção de conhecimento científico. A crítica de Popper incide sobre a oscilação entre interpretações subjetivas e objetivas, permitida pela carência de clareza presente na interpretação estatística. A proposta epistemológica de Popper acerca da teoria da probabilidade é que de um sistema formal do cálculo de probabilidades seja possível extrair as mais diversas interpretações da probabilidade, de modo que seja inserida na Física teórica uma interpretação compatível com o cerne filosófico da atividade especulativa acerca do

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mundo físico – o realismo. Proponho a tabela a seguir como um mapa da proposta geral de Popper (1997; 2010) acerca da teoria da probabilidade. 1

Figura 1: Cálculo formal de probabilidade e interpretações

A discussão das interpretações do cálculo de probabilidades 2 lança mão de apenas duas fórmulas 3 bastante simples, uma relativa e outra de caráter absoluto. Popper desenvolve as interpretações lógica, frequencial e propensitiva principalmente com a probabilidade relativa. A fórmula da probabilidade relativa é R)

p(a,b) = r, e lê-se “a probabilidade relativa de a sendo dado b é igual a r”, sendo r uma

fração entre 0 e 1 (incluindo estes limites); também conhecida como “a probabilidade condicional de a sob a condição de b”. 1

Uma bibliografia enorme acompanhada de discussões críticas foi desenvolvida por Popper, como indica W. W. Bartley III na nota 1, cap. 1, Parte II do Realismo e o Objetivo da Ciência. Bartley III editou o Postscript à Lógica da Pesquisa Científica, de Popper. 2 Como indicado na nota 4 de Popper, 2010, o tratamento formal da probabilidade desenvolvido por Popper pode ser encontrado nos Novos Apêndices *iv e *v da Lógica da Pesquisa Científica. 3 Que, no entanto, não reduzem o sistema formal elaborado por Popper conforme a nota anterior. As fórmulas e suas descrições são apresentadas conforme Popper, 1997, Parte II, seção 2. A minha exposição segue de perto a de Popper e é dispensável para a compreensão dos argumentos filosóficos de Popper a favor do realismo e das propensões.

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A fórmula da probabilidade absoluta é expressa por A)

p(a) = r, e pode ser lida como “a probabilidade absoluta de a é igual a r” (aqui, a também

é lida como probabilidade anterior, inicial ou a priori). A estas fórmulas, atribuem-se as interpretações indicadas na tabela. Assim, se aplicarmos a interpretação lógica a R), teremos que a e b são interpretados como nomes de enunciados e a fórmula p(a,b) = r significa “uma asserção acerca do conteúdo de a e de b e do seu grau de proximidade lógica 4” (Popper, 1997, p. 297). Se aplicarmos a interpretação em termos de frequência 5 à R), temos que a mesma fórmula significa que “a frequência relativa de a no interior da classe de referência b (ou da sequência de referência b) é igual a r”. De acordo com a interpretação em termos de propensão, a fórmula relativa R) é uma “asserção de que as condições b produzem uma propensão r em que se realize o resultado a” (Idem, p. 296). A relação que se estabelece entre as interpretações acerca da probabilidade e a resolução de problemas almejada pode gerar um ponto de vista subjetivista acerca do emprego da probabilidade – para suprir a insuficiência do nosso conhecimento, como pode ser conduzida objetivamente 6 – considerando-se apenas as relações físicas objetivas do arranjo experimental. Nas palavras de Popper: 4

Por “grau de proximidade lógica”, Popper entende o grau de informação que a contém em relação a b. Segue a explicação de Popper: “Se b disser tudo quanto é dito por a, de tal maneira que a se siga de b, então p(a,b) = 1. Se b for consistente e contrariado por a, então p(a,b) = 0, ao passo que, é claro, p(a,ab) = 1. Se a nem se seguir de b nem contrariar b, então o valor p(a,b) há de estar algures entre 0 e 1 (estes limites incluídos); e será próximo de 1 se a disser apenas um pouco mais do que b, e próximo de 0 se a disser coisas muito diferentes das que b diz” (Popper, 1997, p.297). 5 Que, de acordo com Popper, atribui a probabilidade a um acontecimento individual interno a uma sequência virtual ou realizável de acontecimentos. 6 Há uma distinção sutil, mas irrelevante, entre interpretação “objetiva” e “objetivista”: A primeira, condizente com a proposta de Popper, sugere que sejam consideradas as condições físicas do arranjo experimental independentemente da falta de conhecimento do experimentador e, no entanto, guiadas pela visão cosmológica – realista, indeterminista, propensitiva – do mesmo; a noção de interpretação “objetivista” remete à consideração

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P á g i n a | 485 As interpretações objetivas pressupõem que a probabilidade de saírem caras (e não coroas) depende unicamente de condições físicas, ou outras semelhantes, e não do estado do nosso conhecimento. Ao passo que chamo “subjetivas” às que interpretam a probabilidade de saírem caras como estando dependente do estado do nosso conhecimento (subjetivo), ou talvez do estado das nossas crenças (Popper, 1997, p.293).

Segundo Popper, a perspectiva objetivista considera que b (isto é, o arranjo experimental) representa as condições repetíveis de uma situação repetível. Os resultados do experimento não fazem parte de b, uma vez que a repetibilidade dos testes implica a independência do arranjo experimental. A perspectiva subjetivista, ao contrário, admite que “b tem de conter todo o nosso conhecimento relevante e a observação de resultados passados do experimento em questão será altamente relevante” (Popper, 1997, p.301). [A] nova física probabilística [a partir de Maxwell e Boltzmann] foi durante muito tempo considerada como estando ligada à nossa falta de conhecimento. Mesmo durante os anos 30, e talvez até depois, pensava-se ainda que as considerações probabilísticas intervinham na física unicamente por ser impossível conhecermos as posições e os momentos precisos de todas as moléculas de um gás, o que nos obriga a atribuir probabilidades às diversas possibilidades, método este que constitui a base da mecânica estatística. Se pudéssemos conhecer, se pudéssemos estar certos quanto às posições e momentos das partículas em questão, não teríamos de recorrer às probabilidades (Popper, 1989, p.26).

A distinção que Popper faz das interpretações subjetivista e objetivista é coerente com a sua epistemologia. Sob as lentes da Teoria dos Três Mundos 7, temos como recorte epistemológico que o conhecimento objetivo produzido pela mente humana (Mundo 2) constitui o Mundo 3, sem o qual somos cegos quando tentamos olhar para uma parte do Mundo 1. A crítica de Popper à concepção subjetivista não admite o seu contrário – o de que recorremos à probabilidade uma vez dado o nosso conhecimento completo acerca de certa sequência de acontecimentos. O exame crítico de Popper rejeita o emprego da probabilidade mediante uma crença psicológica – cujo problema inicial configura-se no Mundo 2 e não no Mundo 3.

puramente estatística e formal da probabilidade, descomprometida, portanto, com a visão de mundo que orientam os testes. 7 Em linhas gerais, podemos entender a Teoria dos Três Mundos de Popper a partir da noção de relação: há três mundos reais existentes para Popper – o mundo das relações físicas, químicas e biológicas (Mundo 1); o mundo das relações psicológicas, da mente humana (Mundo 2); e o mundo das relações lógicas, constituídas linguisticamente entre proposições, problemas e teorias, bem como obras de arte (Mundo 3).

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Por outras palavras, a crítica que Popper direciona às interpretações subjetivas da teoria da probabilidade incide sobre a aceitação geral de que a probabilidade é adotada devido

à insuficiência do conhecimento que temos acerca de uma sequência de

acontecimentos, desconsiderando-se as propriedades físicas dos próprios acontecimentos; às interpretações objetivistas correntes, por lidarem de modo puramente estatístico com a probabilidade, desconsiderando que esta, ao depender dos arranjos experimentais, acaba por caracterizar as propriedades físicas disposicionais presentes nos arranjos. A oscilação entre interpretações subjetivas e objetivas é resolvida por Popper com a adoção de uma interpretação teórica objetiva acerca dos arranjos experimentais – a interpretação em termos de propensões. Propensões, realismo de inobserváveis e testabilidade Pontuo nessa seção do texto a passagem realizada por Popper da interpretação da probabilidade em termos de frequência para a interpretação em termos de propensões , já que as distinções teóricas relevantes, contudo dispensáveis, para o presente texto foram indicadas na seção anterior. No capítulo VIII da Lógica da Pesquisa Científica Popper apresenta a sua primeira interpretação objetiva da probabilidade com a teoria das frequências relativas, cuja correção epistemológica é responder diretamente à oscilação entre interpretações subjetivas e objetivas e eliminar a intromissão do observador na física. Em termos de frequência, “as hipóteses probabilísticas fazem asserções acerca da distribuição estatística de certas propriedades dos acontecimentos no interior de classes ou sequências de acontecimentos” (Popper, 1997, p.294). As propriedades dos acontecimentos são, portanto, consideradas puramente estatísticas e não físicas – essa é a consideração que a interpretação em termos de propensões, a sua segunda proposta teórica, abrange. Ao propor uma segunda interpretação objetiva das probabilidades, em termos de propensões, Popper reafirma a interpretação em termos de frequências até o seu limite: o de que o referente de um enunciado probabilístico são os resultados de uma sequência de experimentos. Entretanto, se os enunciados probabilísticos se referem aos resultados de

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uma sequência de ocorrências produzidas por certo arranjo experimental e se os mesmos resultados dependem das condições dadas pelo arranjo, então os enunciados probabilísticos caracterizam o próprio arranjo experimental. Ao admitir que todo experimento contém disposições, propensões ou vetores de possibilidades que permitem a emergência de novas relações físicas, Popper assume uma nova defesa metafísica acerca do mundo físico: a defesa realista de que o Mundo 1 é um mundo de propensões. O ponto principal dessa mudança é que passamos a considerar fundamental a probabilidade do resultado de um único experimento, relacionando-o às suas condições, em vez da frequência de resultados numa sequência de experimentos. (Popper, 2010, p.200)

Assim, a interpretação da probabilidade em termos de propensão é apresentada por Popper em compatibilidade tanto com a sua defesa do realismo metafísico, quanto com a sua contribuição epistemológica para a metodologia das ciências naturais. O realismo é expresso por Popper como a concepção metafísica de que há o mundo físico independente de um sujeito de conhecimento. Da proposição (metafísica) de que há o mundo físico objetivo deriva-se a proposição (de caráter epistemológico) de que é possível, de algum modo, conhecê-lo. A crença na realidade física objetiva só pode ser para Popper metafísica, porque não é possível verificar positivamente nenhum objeto do mundo. O mundo, segundo Popper, é a totalidade de acontecimentos e não de coisas. 8 Todo acontecimento contém disposições, propensões ou possibilidades de emergir como relação entre coisas. O argumento principal a favor da interpretação em termos de propensão encontra-se no seu poder de eliminar da teoria dos quanta alguns elementos perturbadores de caráter irracional e subjetivista – elementos que são mais “metafísicos” do que as propensões e, além disso, metafísicos no mau uso da palavra. É pelo sucesso ou fracasso neste campo de aplicação que a interpretação em termos de propensão terá de ser julgada. (Popper, 1997, seção 20)

A visão cosmológica assumida por Popper, entretanto, não se configura na crença realista de apenas um mundo e sim de três. Ao combater o materialismo 9 – crença 8

Cf. POPPER, 2000, Part I. Ver os capítulos P1, P2 e P3 de Popper&Eccles, 1995. A menção ao materialismo, bem como ao dualismo de substâncias serve, aqui, apenas para indicar uma das esferas do debate que Popper trava com a defesa da Teoria dos Três Mundos. 9

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de que há apenas o mundo físico, bem como o dualismo substancial – dos mundos físico e psicológico, Popper propõe a existência objetiva e coemergente de três mundos: O mundo das relações físicas, químicas e biológicas (Mundo 1), o mundo das relações psicológicas (Mundo 2) e o mundo das relações lógicas (Mundo 3), que é produto da mente humana. A partir da visão cosmológica dos Três Mundos, podemos redimen sionar a proposta de Popper acerca da teoria da probabilidade: A probabilidade é um artifício teórico do Mundo 3 que caracteriza singularmente o arranjo experimental (do Mundo 1) sob teste. A probabilidade é lida à luz de uma metafísica realista acerca de propriedades físicas do mundo – é lida à luz de propensões. Qual é o “referente” de um enunciado probabilístico? O próprio arranjo experimental – que se caracteriza probabilisticamente através de cada experimento realizado, cujas relações exprimem as propensões ou disposições que o arranjo contém. A realidade dos três mundos se dá pelas relações de interação entre eles: assim como uma cadeira é real por ser “pontapezeável”, uma proposição (Mundo 3) é real porque pode levar um “pontapé” tanto de uma proposição testável 10 – indiretamente, de um acontecimento (Mundo 1) – quanto de uma proposição não-testável – caso ambas incorram em contradição lógica (Mundo 3). As interações entre os três mundos podem ocorrer diretamente entre os Mundos 1 e 2 e entre os Mundos 2 e 3; e indiretamente entre os Mundos 3 e 1, mediante o Mundo 2.

10

Por proposição “testável”, Popper entende aquelas proposições singulares – as proposições de base – extraídas da lei universal em conjunção com as condições iniciais de teste. O critério lógico adotado por Popper para caracterizar uma teoria científica é o seguinte: uma teoria é científica se implicar um conjunto de proposições que se divide em dois subconjuntos não vazios – o subconjunto de proposições afirmadas pela teoria e o subconjunto de proposições proibidas pela mesma. Neste último reside a possibilidade lógica de a teoria ser falseada: as proposições proibidas são os falseadores potenciais, segundo Popper. Assim, o critério de falseabilidade é um critério de possibilidade – a teoria tem que poder levar um “pontapé” de acontecimentos do mundo físico. Os arranjos experimentais, no entanto, não falsificam as teorias diretamente – apenas dispõem de condições objetivas para a aceitação ou rejeição da teoria sob teste. Ver o capítulo IV da Lógica da Pesquisa Científica de Popper.

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P á g i n a | 489 O teste de uma proposição sobre CAMPO ELÉTRICO

e

PROPENSÕES

são semelhantes: Condições de teste: corpo e campo; Procedimento metodológico: “usamos um corpo de teste e medimos o efeito do campo nesse corpo”; Assim como o CAMPO ELÉTRICO,

as PROPENSÕES são

propriedades relacionais [do arranjo experimental], INOBSERVÁVEIS e, no entanto, FISICAMENTE REAIS. Figura 2: Campo elétrico e propensões.

Através das lentes dos Três Mundos, podemos entender porque as propensões, ainda que inobserváveis, são reais: as propensões não são detectadas pelos instrumentos de medição em um corpo físico sob teste, mas são caracterizadas pelos impactos – “pontapés” – que as disposições do arranjo experimental produzem no corpo inserido no teste (como indicado na tabela 11). Se desejarmos testar um enunciado probabilístico, temos de testar uma sequência experimental. Agora, porém, o enunciado de probabilidade não é uma afirmação sobre essa sequência: é um enunciado sobre propriedades das condições experimentais ou do arranjo experimental. (Em termos matemáticos, essa mudança corresponde à transição da teoria da frequência para a abordagem teórica da medida.) (Popper, 2010, p.200).

Assim, o enunciado probabilístico refere-se às possibilidades físicas objetivas que emergem na relação entre o “campo de propensões” e o corpo sob teste. A probabilidade não remete singularmente à possibilidade de um corpo isolado, mas às disposições relacionais que precedem o acontecimento.

11

Ver o exemplo na segunda seção do texto “Propensões, probabilidades e teoria quântica”, p.200.

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Considerações abertas Como a teoria da probabilidade se ajusta ao sistema filosófico de Popper? Parece que não há como responder a essa questão de modo definitivo, assim como parece não ser conveniente dizer se a teoria das propensões é correta ou não. Podemos, entretanto, extrair da argumentação até aqui desenvolvida alguns traços que configuram a recepção da probabilidade na visão de mundo arquitetada por Popper. A teoria das propensões não é um aspecto da probabilidade – antes, torna a probabilidade uma construção teórica de características singulares da própria constituição do mundo físico, especialmente de relações físicas que escapam à medição direta ou à observação. Podemos pensar nas comparações entre as massas de estrelas e planetas, que se tornam desprezíveis; ou ainda entre as massas de planetas em relação às massas das suas luas. Tal construção da imaginação é altamente abstrata e não nos referimos a nenhum ponto do espaço, mas às propriedades relacionais do sistema solar. Tais relações disposicionais podem ser as condições de organização do sistema solar e é nesse sentido que podem ser admitidas como fisicamente reais. Ao admitir o mundo como uma totalidade de acontecimentos e cada acontecimento como dotado de predisposições físicas, de propensões para ocorrer, a leitura da probabilidade, enquanto constitutiva de uma teoria científica, já não pode considerar o caráter puramente estatístico de uma reprodução finita de experimentos. Ao caracterizar o próprio arranjo experimental, a probabilidade diz algo acerca de uma fração do mundo, caracteriza teoricamente as condições arranjadas para a reprodução de certos acontecimentos. Lançamos mão da teoria da probabilidade para compreender o que ocorre quando certas condições são reunidas. Tais “condições”, entretanto, jamais condicionam definitivamente a ocorrência de certos acontecimentos. As “condições” são abertas, permitem que novidades possam emergir de um campo de possibilidades – de um campo de propensões. É nesse sentido que Popper afirma que a interação entre os Três Mundos depende de uma abertura causal do mundo 1 para o mundo 2 e do mundo 2 para o mundo 3; caso contrário, o abismo entre a mudança e o atemporal seria sequer suscetível de ser mencionado. XVII Simpósio de Filosofia Moderna e Contemporânea da UNIOESTE De 29 de outubro a 01 de novembro de 2012 – UNIOESTE Campus de Toledo http://www.unioeste.br/filosofia ISSN: 2176-2066

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