Processo regulatório sancionador e consensualidade: análise do acordo substitutivo no âmbito da ANATEL

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Revista de Direito de Informática e Telecomunicações ‐ RDIT Belo Horizonte,  ano 5,  n. 8,  jan. / jun.  2010 

Processo regulatório sancionador e consensualidade: análise do acordo substitutivo no âmbito da Anatel Juliana Bonacorsi de Palma  

Palavras­chave: Processo regulatório sancionador. Sanção administrativa. Anatel. Regulação consensual. Sumário: 1 Introdução ­ 2 A sanção administrativa como instrumento regulatório ­ 3 Disciplina jurídica da aplicação de sanções no âmbito da Anatel ­ 3.1 Sanções e infrações administrativas no setor de telecomunicações ­ 3.2 Análise da conformação do modelo regulatório sancionador da Anatel: a demanda por consensualidade ­ 4 O acordo substitutivo como instrumento regulatório ­ 4.1  A   r e g u l a ç ã o   p e l a   v i a   d o   c o n s e n s o   ­  4.2 Finalidades do setor de telecomunicações e instrumentalidade dos mecanismos de hard  e  soft regulation  ­  5 Possíveis obstáculos à regulação consensual ­ 6 Conclusão ­ Referências   1 Introdução Dentre os diversos questionamentos que o atual estágio da regulação estatal no Brasil suscita, certamente aqueles conexos ao Direito Administrativo Sancionador constarão forte na pauta da agenda teórica a ditar futuros estudos sobre o exercício da potestade sancionatória pelo Poder Público. Embora tema recorrente no Direito Administrativo, bas tando apontar o exemplo do processo disciplinar, apenas recentemente constata­se incipiente produção acadêmica sobre seus aspectos mais emblemáticos. Algumas razões podem ser apontadas para tanto. Originalmente atrelada ao clássico tema do poder de polícia, a inserção da prerrogativa sancionatória no âmbito da regulação estatal determinou análises jurídicas acerca da atividade sancionadora à luz dessa nova abordagem. Possibilidade de previsão de sanções e infrações administrativas em regulamentos, estipulação de cláusulas penais em contratos administrativos relacionais ­ especialmente os de concessão de serviço público ­ e natureza discricionária dos atos de sanção são algumas das principais questões que a regulação sancionatória hoje apresenta. Saliente­se, ainda, o expressivo número de normas regulamentares que dispõem sobre o procedimento administrativo sancionador ­ praticamente todas as agências reguladoras possuem sua própria disciplina para aplicação de sanções. O fenômeno da despenalização de tipos de menor potencial ofensivo reforça a demanda por estudos da atividade administrativa sancionadora, dada a passagem destes ilícitos da esfera jurisdicional e penal para a administrativa. Nesse sentido, também a sistematização do Direito Administrativo Sancionador como ramo do Direito Público autônomo ao Direito Penal, com disciplina jurídica e atributos específicos, coloca em evidência aspectos práticos e teóricos da regulação sancionatória. Por fim, cobra­se uma gestão pública eficaz, cujos provimentos sejam efetivamente cumpridos em prol das finalidades públicas ínsitas a cada setor regulado. Faz­se necessário que as sanções administrativas sejam eficazes: as multas devem ser pagas, as obrigações comissivas ou omissivas devem ser cumpridas pelos sancionados e o exercício da potestade sancionatória deve apresentar

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um conteúdo mínimo simbólico à sociedade. O presente artigo volta­se ao estudo de uma faceta da regulação sancionadora, qual seja, a terminação consensual de processos sancionadores. Instiga­me a análise pela recente abertura à consensualidade que vivencia o Direito Administrativo brasileiro ante a crescente previsão de normas autorizativas de acordos administrativos, cujos efeitos espraiam­se por toda a disciplina administrativa, alcançando a atividade sancionatória. De fato, vários são os diplomas normativos que admitem os termos de compromisso ou termos de ajustamento de conduta substitutivos da sanção administrativa. Para tanto, focarei minha pesquisa nos acordos substitutivos de sanções no âmbito da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Esta delimitação pautou­se na preferência por uma análise mais aprof u n d a d a   d e   q u e s t ã o   s e n s í v e l   a o   D i r e i t o   R e g u l a t ó r i o   n a   m e d i d a   e m   q u e   o s desdobramentos da consensualidade ainda são obscuros, principal mente no que tange aos seus instrumentos e à forma de emprego dos mesmos, apesar da potencialidade amplamente reconhecida. Ademais, o momento de conformação do modelo regulatório sancionador da Anatel, marcado por processos normativos conduzidos pela Agência Reguladora, convida a análises sobre a experiência no setor de telecomunicações. O artigo partirá do estudo aproximativo de potestade sancionató ria e regulação para então verificar a disciplina jurídica do processo sancionador na Anatel. Valho­me da Consulta Pública nº 847/07 (CP nº 847/03) para relatar o atual estágio de conformação deste modelo regulatório no setor de telecomunicações, ocasião em que as demandas regulatórias e a reação dos agentes regulados ao modelo de processo sancionador vigente serão reconhecidas e analisadas criticamente, com especial enfoque sobre a nota da consensualidade. Na sequência, o acordo substitutivo será estudado na qualidade de instrumento regulatório para avançar na questão da fungibilidade entre sanção e acordo substitutivo nos pro cessos sancionadores. Ao final, algumas dificuldades à regulação consensual serão explicitadas com o propósito de registrar os pontos de aperfeiçoamento do instituto consensual. Pretendo com essa exposição assinalar a projeção da consensuali dade sobre o processo regulatório sancionador a partir da experiência do setor de telecomunicações, pautando os aspectos técnicos e os questionamentos que o tema suscita. Ademais, pela demonstração do ambiente institucional favorável à consensualidade objetivo fomentar reflexões sobre a inserção dos acordos administrativos na atividade regulatória estatal.   2 A sanção administrativa como instrumento regulatório Variados institutos jurídicos são colocados à disposição do Estado para proceder à intervenção no 1

domínio econômico pela via da regulação,  a exemplo dos atos normativos e das sanções 2

administrativas. Consiste a sanção administrativa em efetivo instrumento regulatório,  fundado no exercício do poder sancionador, com vistas a satisfazer as finalidades ínsitas ao setor regulado por meio da repressão a práticas infracionais. Trata­se de ato administrativo unilateral e imperativo, pois seu conteúdo impõe­se independentemente da aquiescência do sancionado, com quem termina por travar uma relação vertical de autoridade.

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Diferentes finalidades das sanções administrativas são apresentadas no plano teleológico, dentre as quais se destacam: i) repressão do infrator, ii) recomposição da legalidade, iii) prevenção de infrações, iv) revesti mento de eficácia às políticas regulatórias pela afirmação do regulador perante os regulados e v) persuasão nos acordos consensuais. Além de repercutir diretamente sobre o infrator, a sanção admi nistrativa aplicada pela Administração tornar­se­ia exemplar à sociedade em decorrência de seu efeito simbólico, de forma que parcela signifi  c ativa dos administrados reconheceria a força da autoridade no manejo do poder sancionador em uma pontual situação. Consequentemente, a aplicação de sanções administrativas geraria incentivos negativos à tomada de decisões contrárias ao ordenamento jurídico pelos demais agentes, o que enalteceria o efeito preventivo da medida. Segundo essa primeira linha, quanto mais eficaz se mostrar o exercício do poder sancionador pela imposição 3

estatal de sanções,  tanto mais serão prevenidas futuras infrações. Ademais, a aplicação das sanções administrativas, enquanto instrumento regulatório unilateral e imperativo, afirmaria a Agência Regula dora perante os regulados em geral. Esse é o entendimento de Floriano de Azevedo Marques Neto, para quem   o exercício da função punitiva possui grande importância. Isso não só por constituir a punição um requisito de eficácia da atividade reguladora, mas também porque é primacialmente pelo poder de sanção que o órgão regulador se afirma frente aos atores privados regulados (concessionários, permissionários, autorizatários etc.) e perante os administrados (consumidores). Sem a ameaça potencial de sanção, resta fragilizada a autoridade regulatória. Sem perceber a capacidade coercitiva do regulador, sente­se o 4

administrado desamparado.  

Ainda, a ascensão da consensualidade no plano do Direito Regulatório conferiu nova funcionalidade 5

à sanção administrativa, qual seja, a capacidade persuasiva.  No momento da celebração de acordos substitutivos, a constante ameaça da imposição de sanção administrativa a equipararia aos mecanismos de persuasão, constituindo­se relevante elemento de barganha quando da negociação das obrigações do termo consensual. Todas essas projeções da sanção administrativa apontam para uma regulação incisiva, verdadeira tradução da autoridade estatal. Nesse sentido, as sanções administrativas integram o conceito de hard regulation. 3 Disciplina jurídica da aplicação de sanções no âmbito da Anatel 3.1  Sanções e infrações administrativas no setor de telecomunicações A competência sancionatória da Anatel para aplicação de sanções está prevista no caput do art. 173 da LGT, preceito este que também discrimina as sanções administrativas cabíveis no setor de telecomuni cações, quais sejam, a advertência, a multa, a suspensão temporária e a declaração de 6

inidoneidade.  Inclui­se ao rol de sanções administrativas atinentes ao setor de telecomunicações a

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sanção de cassação, por expressa previsão na Lei nº 8.977/95. As infrações administrativas no setor de telecomunicações estão estipuladas na LGT, a exemplo do 7

art. 70,  em atos normativos, instrumentos de outorga e contratos, casos estes em que se verifica relação de sujeição especial entre prestadores de serviços de telecomunicações e Anatel. Instigante questão se coloca acerca da possibilidade de previsão de infra ções e sanções administrativas em sede regulamentar. Poderia a Anatel definir tipos infracionais por meio de regulamentos administrativos? Hodiernamente, e por influência de clássicos escritos sobre Direito Sancionador de Direito Comparado, tende­se a reconhecer no Direito Administrativo brasileiro a existência de um jus puniendi geral do Estado, fundamento único da prerrogativa de aplicação de sanções administra ti vas e do poder de imposição de penas. Tal  jus puniendi serviria de elo de ligação entre o Direito Administrativo Sancionador e o Direito Penal por meio do qual princípios e institutos típicos deste sistema seriam transportados ao Direito Administrativo, como o princípio da legalidade estrita. Projetada no Direito Administrativo, a regra da legalidade estrita corresponderia à impossibilidade de previsão e disciplina de infrações e sanções administrativas em sede regulamentar, as quais apenas poderiam ser dispostas mediante lei formal. Decorreria desta regra o dever de a lei oriunda do Parlamento dispor sobre sanções e infrações de forma objetiva e clara, em respeito ao princípio 8

da tipicidade.

Apesar de opiniões discrepantes, impõe reconhecer que infrações podem ser determinadas e sanções especificadas em sede regulamentar. Regra maior do Direito Administrativo, preceitua o princípio da legalidade a vinculação (ora positiva, ora negativa) de todas as vertentes da função regulatória ao Direito, de forma que o bloco de legalidade, formado por Constituição, leis formais e normas infralegais, fundamenta e rege a regulação estatal. Os institutos de Direito Penal apenas serão transponíveis ao Direito Administrativo, mediante expressa previsão constitucional ou legal, não sendo o dito jus puniendi 9

geral hábil a justificar a aplicabilidade de técnicas penalistas na seara administrativa.   N ã o havendo preceito constitucional que imponha à Administração o dever de legalidade estrita, afasta­ se a regra da legalidade estrita quando da definição de infrações administrativas, bem como na especificação das sanções administrativas em sede regulamentar. Semelhante solução pode se estender aos contratos e atos de outorga, por meio dos quais se estabelece relação de sujeição especial com o regulador. Observadas as sanções administrativas previstas em lei formal, o contrato de concessão e o ato de permissão de serviços de telecomuni cação podem dispor sobre as sanções a serem aplicadas ao regulado em relação de sujeição 10

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especial com a Anatel nos termos do art. 93, inciso XIV,  e do art. 120, inciso VIII,  da LGT, além de estipular as infrações administrativas em compasso com as particularidades do serviço prestado. A especificação das sanções administrativas e a definição de infra ções administrativas em sede regulamentar ou contratual inserem­se em um cenário mais abrangente, correspondente ao tema da autovinculação, cada vez mais perceptível na prática do Direito Regulatório, principalmente com a afirmação do poder normativo detido pelas autoridades reguladoras.

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Tendo por pressuposto a inviabilidade de determinação em lei formal de todos os critérios e condicionamentos de aplicação de sanção administrativa aos entes regulados, bem como das infrações a serem apli cadas pela Anatel, infrações estas muitas vezes definidas de forma emi nentemente técnica e conjuntural, tem­se o seguinte panorama normativo: i) previsão em lei formal de standards imbuídos de conceitos jurídicos indeterminados e de discricionariedade 12

administrativa, ii) regulamentação, atentando­se aos standards estabelecidos na lei formal,  e iii) contratualização conforme as duas outras fontes normativas indicadas. 13

Os critérios e parâmetros para aplicação das sanções administrativas  pela Anatel são atualmente definidos pelo "Regulamento de Aplicação de Sanções Administrativas", aprovado pela Resolução nº 344, de 18 de julho de 2003. Segundo seu art. 8º, as infrações são classificadas em leves, quando decorrer de condutas involuntárias ou escusáveis e não houver benefício ao infrator, médias, no caso de a conduta ser inescusável, mas não beneficie o infrator e nem afete número significativo de usuários, ou graves, se presente um dos seguintes fatores: má­fé, benefício direto ou indireto ao infrator, reincidência ou significativo número de usuários atingidos pelos efeitos da infração. Assim, a Anatel deve observar não apenas a LGT para exercer seu poder sancionador, mas também todos os regulamentos internos que disciplinam tal atividade. No que tange à aplicação da sanção de multa, que não poderá ser superior a R$50 milhões conforme o art. 179 da Anatel, a Resolução nº 344/03 estabelece os limites à intensidade do valor da multa em um documento anexo, o qual reuniu em sete grupos os diversos serviços prestados no setor de telecomunicações conforme os seguintes critérios de agrupamento: modalidade de serviço prestado, abrangência dos interesses que tais serviços atendem, número de usuários contemplados pelo serviço e regime jurídico de sua prestação. Para cada qual, o anexo estipulou o valor máximo de acordo com a gradação da infração em leve, média e grave. Os valores das multas aplicáveis aos prestadores de STFC e serviço móvel insertos no grupo 1 do mencionado anexo, por exemplo, não podem ultrapassar o teto de R$10 milhões caso a infração seja considerada leve, R$25 milhões se se tratar de infração média e R$50 milhões se a multa for de natureza grave, conforme as especificações do anexo à Resolução nº 344/03. Ficou a cargo da LGT definir as sanções aplicáveis ao setor de telecomunicações (art. 173) e a previsão mínima das infrações adminis trativas (art. 70, por exemplo), além de determinar 14

condicionantes gerais e específicas da atividade regulatória sancionadora  em seu art. 176, quais sejam, i) a natureza e a gravidade da infração, ii) os danos ocasionados ao serviço e aos usuários, iii) a vantagem auferida pelo infrator, iv) as circunstâncias agravantes, v) os antecedentes do infrator e vi) a reincidência específica. O anexo à Resolução nº 344/03 estabeleceu critérios e parâmetros para aplicação de sanções administrativas pela Anatel. Para tanto, houve a definição de certos termos e conceitos jurídicos indeterminados, a estipulação de critérios para classificação dos serviços de telecomuni cações para 15

fins de aplicação de sanções administrativas (art. 3º),  a definição de circunstâncias a serem obrigatoriamente observadas pelo regulador quando da aplicação das sanções administrativas (art. 7º),

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 a gradação das infrações em leves, médias e graves (art. 8º), a indicação dos valores

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máximos das multas de acordo com o grupo preestabelecido pelo Regulamento (art. 14 e anexo) e a estipulação de atenuantes (art. 16) e agravantes (art. 15).

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A autovinculação procedida pela Anatel quando do exercício de seu poder normativo transparece clara com a edição deste ato normativo. Como consequência, reduz­se a margem de discricionariedade do órgão regulador, o qual passa a sujeitar­se a seus próprios comandos norma tivos para aplicação de sanções administrativas, com sensível redução da margem de apreciação da oportunidade e conveniência da adoção de medidas regulatórias sancionadoras.   3.2 Análise da conformação do modelo regulatório sancionador da Anatel: a demanda por consensualidade Depara­se o setor de telecomunicações em um momento de conformação do modelo de regulação sancionatória, marcado por processos normativos abertos à participação administrativa. Evidencia­ s e   u m a   s i t u ação muito especial ao setor de telecomunicações, assim como ao Direito 18

Administrativo Sancionador, porquanto todo o ciclo regulatório sancionador  ­ regramento das infrações e sanções administrativas, fiscalização dos serviços concedidos, permitidos ou autorizados e aplica ção de sanções administrativas ­ é objeto de debates e estudos técnicos para fins de aprimoramento da regulação sancionatória. A fase de conformação do modelo em comento iniciou­se pela atividade fiscalizatória com o processo normativo para elaboração de "Regulamento de Fiscalização", cuja proposta foi objeto da Consulta Pública nº 489 (dezembro de 2003 a fevereiro de 2004). Ao todo, a con  sulta pública contou com 207 contribuições e resultou na Resolução nº 441, de 12 de julho de 2006, que aprovou o vigente Regulamento de Fiscalização. Posteriormente, a Consulta Pública nº 595 (fevereiro a março de 2005) teve por objeto a "Proposta de Revisão do Regimento Interno da Anatel". Interessa notar que a mencionada proposta previa a criação de novo procedimento administrativo estritamente relacionado com o tema da consensualidade ­ o "Processo de Ajuste de Conduta" ­, além de criar canais de consensualidade no Pado e na Averiguação Preliminar (outro procedimento criado pela Proposta) com a instituição de 19

permis sivos expressos de celebração de "termos de ajustamento de conduta" (TAC).

Na Proposta de Revisão do Regimento Interno da Anatel, o Processo de Ajuste de Conduta vinha regulado no Capítulo XVI, do art. 100 ao art. 108. Em linhas simples, a Proposta conferia poder discricionário à Anatel para "estabelecimento de pacto, tendo por finalidade precípua a defesa do interesse público e proteção dos direitos dos usuários" (art. 100). Tratava­se de um instrumento consensual cuja proposta tanto poderia se dar de ofício quanto mediante requerimento do interessado, contendo as informações técnicas e jurídicas necessárias à negociação do pacto, admitida a contraproposta (art. 101). 20

Com precisa discriminação das formalidades do TAC,  o instrumento consensual em análise não poderia substituir as sanções de cassação, caducidade ou declaração de inidoneidade (art. 104, parágrafo único, inciso II). Seu descumprimento determinaria o imediato prosseguimento do trâmite do Pado ou sua instauração, além de configurar impedimento ao interessado de celebrar

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novo TAC pelo prazo de dois anos (art. 106). Ademais, as infrações contra a ordem econômica poderiam ensejar processo de ajuste de conduta conduzido pela Anatel, mas o instrumento regulatório consensual específico a incidir no caso correspon deria ao Termo de Compromisso de Cessação (TCC) previsto no art. 53 da Lei nº 8.884/94 (art. 108 e art. 169, inciso III). A consulta pública recebeu 825 contribuições, mas a Proposta de Revisão do Regimento Interno da Anatel não foi aprovada. Mais recentemente, está em curso processo normativo para elaboração de "Regulamento de Aplicação de Sanções" em substituição ao vigente, aprovado pela Resolução nº 344, de 18 de julho de 2003. A respectiva Consulta Pública nº 847 (dezembro de 2007 a janeiro de 2008) contou com o quadro de participação exposto na tabela que segue:      

        Fonte: Elaboração própria a partir da CP nº 847/07. Essa consulta pública mostra­se reveladora quanto às demandas regulatórias em relação ao modelo pretendido de regulação sancionatória levadas à Anatel pelos agentes regulados, que correspondem a 90% do total de contribuições, somadas as contribuições ofertadas pelos presta dores de serviço com as das associações de prestadores de serviço. Da lei tura exaustiva da CP nº 847/07 extraem­se três demandas regulatórias patentes: i) demanda por amenização da intensidade da regulação, ii) demanda por redução de discricionariedade conferida pelo projeto de regulamento de aplicação de sanções administrativas ao regulador e iii) demanda por instrumentos consensuais.   a) Primeira demanda regulatória: amenização da intensidade da regulação A primeira demanda ­ amenização da intensidade da regulação ­ corresponde à atenuação da força estatal quando do emprego de atos sancionadores. De fato, em comparação ao Regulamento de Aplicação de Sanções Administrativas vigente, constata­se maior severidade no objeto da CP nº 847/07. O art. 2º, inciso VIII, da CP nº 847/07, por exemplo, elevou o prazo para contagem da reincidência específica de dois anos para cinco anos. Ademais, o acréscimo de 35% no valor da multa constante no art. 15, inciso III, do Regulamento aprovado pela Resolução nº 344/03 foi aumentado para

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100% pelo art. 11, §3º, inciso II, da CP nº 847/07. Todas essas alterações foram sistematicamente questionadas pelos contribuidores, vigorando entre esses atores a tese de que tais alterações afrontariam os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. No caso da CP nº 847/07 constata­se essa demanda de forma mais contundente em relação ao art. 2º, inciso VIII, em que todas as contri  buições pediram a diminuição do prazo de cinco anos da reincidência específica para dois anos. De semelhante forma se verifica com o art. 6º, §4º, em que mais uma vez todas as contribuições foram no sentido de suprimir o preceito que considera como infração grave obstar ou dificultar a ação de fiscalização. Ainda, praticamente todas as propostas rela tivas ao art. 11, §3º, inciso II, da CP nº 847/07 pediram a redução da percentagem de 100% para 35% de aumento do valor da multa em caso de reincidência específica.   b) Segunda demanda regulatória: redução da discricionariedade administrativa O capítulo I do Título VI da LGT, intitulado "Das Sanções Administrativas", disciplina de forma geral a previsão de infrações e a aplicação de sanções administrativas. Nele estão contidos standards traçados pela Lei nº 9.472/97, vinculantes de toda a atividade regulamentar da Anatel de disciplina do processo sancionador: em síntese, o art. 173 fixa as sanções administrativas aplicáveis ao setor de telecomunicações, os arts. 176 e 179, §1º, delimitam os parâmetros e critérios basilares para aplicação destas sanções e o art. 179, caput, delimita o valor máximo da sanção de multa, correspondente a R$50 milhões.

21

Nota­se na esfera legal ampla discricionariedade conferida à Anatel para aplicação de sanções administrativas em decorrência da presença de conceitos jurídicos indeterminados nos preceitos disciplinadores do processo regulatório sancionador ­ o termo "má­fé" empregado no art. 177 é o mais representativo nesse sentido. Corrobora para a ampla discricionariedade da Anatel a lacuna legal referente à previsão de critérios e parâmetros de aplicação das sanções administrativas em 22

conformidade com as especificidades do agente regulado ou, ainda, da situação concreta.   N o extremo, o art. 179, caput, da LGT, confere ao regulador ampla margem de discricionariedade na dosimetria da sanção de multa, a qual poderia ser arbitrada em até R$50 milhões, levando em consideração apenas as balizas legais etéreas dispostas no art. 176 da LGT. Apesar da sensível redução desta margem de discricionariedade pela autovinculação da Anatel (conferir item 3.1), também é o Regulamento de Aplicação de Sanções Administrativas revestido de relevante discricionariedade, neste caso, porém, mais em razão da presença de conceitos jurídicos indeterminados que da própria lacuna normativa. O art. 6º, §1º, do citado preceito bem traduz o exposto:   Art. 6º. Nas infrações praticadas por pessoa jurídica, também devem ser punidos com a sanção de multa seus administradores ou controladores, quando tiverem agido de má­ fé. §1º. Considera­se má­fé, dentre outros comportamentos caracterizados por fraude ou dolo:

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I ­ deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de leis, regulamentos, contratos, termos e atos aplicáveis ou fatos incontroversos; II ­ opor resistência injustificada ao andamento de processo, à fiscalização ou à execução de decisão da Anatel; III ­ agir de modo temerário; IV ­ provocar incidentes infundados; e V ­ interpor recurso ou pedido de reconsideração manifestamente protelatório. (grifos nossos)   Além de a discricionariedade na aplicação de sanções administrativas delineada pelo Regulamento de Aplicação de Sanções Administrativas decorrer da lacuna normativa ou de conceitos jurídicos indeterminados, duas outras fontes de discricionariedade se apresentam no ato normativo: prescrição autorizativa expressa e conferência de opções para que o regulador selecione a que melhor satisfaça as finalidades do setor de telecomunicações, mediante análise de oportunidade e conveniência. São exemplos deste último caso os artigos 9º e 10, caput, do Regulamento:   Art. 9º. A critério da Anatel, nas infrações classificadas como leves, pode ser aplicada a pena de advertência ao infrator, observado o disposto no art. 176 da Lei nº 9.472, de 1997, bem como no §2º do art. 39 da Lei nº 8.977, de 1995. Art. 10. Caso considere mais conveniente ao interesse público, a Anatel, observado o disposto neste Regulamento e na regulamentação específica, pode substituir sanção, salvo a advertência, por multa em valor proporcional à infração cometida.   Em compasso com o vigente Regulamento aprovado pela Resolução nº 344/03, a Proposta de Alteração do Regulamento de Aplicação de Sanções Administrativas, objeto da CP nº 847/07, também congrega preceitos discricionários, o que não ilide a presença de vinculação em certos esquemas normativos, nas seguintes fontes de discricionariedade: previsão normativa expressa, lacuna normativa, conferência de margem de opções pela norma e presença de conceitos jurídicos indeterminados. Discricionariedade decorre, por exemplo, da lacuna normativa do art. 5º, §1º, segundo o qual "considera­se má­fé, dentre outros comportamentos caracterizados por fraude ou dolo:". Nessa linha, também o art. 11, §3º, inciso VI: "o valor da multa pode ser acrescido, até os limites abaixo, considerando os seguintes agravantes: (...) VI ­ 5% (cinco por cento), no caso de circunstâncias não contempladas nos incisos anteriores". No que tange aos conceitos jurídicos indeterminados, o art. 5º da CP nº 847/07 possui a mesma redação do transcrito art. 6º do Regulamento em vigor, permanecendo os conceitos jurídicos indeterminados na aplicação das sanções administrativas. Ainda, o art. 11, que confere parâmetros

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à dosimetria das sanções, também é carregado de conceitos jurídicos indeterminados:   Art. 11. No cálculo do valor da multa devem ser considerados os seguintes aspectos: I ­ Os danos resultantes para o serviço e para os usuários efetivos e potenciais; II ­ A participação do infrator no mercado, dentro de sua área geográfica de prestação do serviço; III ­ A situação econômica e financeira do infrator, em especial sua capacidade de geração de receitas e seu patrimônio; IV ­ A gravidade da falta; e V ­ O benefício direto ou indireto auferido pelo infrator. (grifos nossos)   Interessa ressaltar a pontualidade das alterações propostas pela CP nº 847/07 ao Regulamento de Aplicação de Sanções Administrativas em vigor. Poucas foram as modificações substanciais do texto normativo, de forma que se toma novamente como exemplo de discricionariedade administrativa resultante de expressa previsão normativa o art. 13 da CP, correspondente ao art. 10 do Regulamento aprovado pela Resolução nº 344/03, de seguinte teor: Art. 12. O valor da multa pode ser reduzido em até 35% (trinta e cinco por cento), caso incidam uma das seguintes circunstâncias atenuantes: I ­ cessação espontânea e imediata da infração; II ­ adoção de medidas, por livre iniciativa do infrator, para minimizar os efeitos decorrentes da infração cometida; e III ­ denúncia espontânea do infrator junto à autoridade pública responsável e competente para regulamentar o serviço. Art. 13. As sanções constantes deste regulamento podem ser substituídas por uma menos gravosa, nos casos em que a infração não justificar a aplicação destas sanções, observado o disposto neste regulamento e nas demais normas aplicáveis. Pela análise exaustiva da CP nº 847/07, depreende­se a demanda regulatória por redução da discricionariedade para aplicação de sanções administrativas. Em outros termos, pretendem os regulados especificação das regras que norteiam a aplicação de sanções administrativas em prol de maior segurança jurídica. A título exemplificativo, mencione­se a Contribuição nº 109 da 23

operadora TIM relativa ao art. 11, §2º,  da CP nº 847/07. Ela sugere a redação de um novo inciso em que o prejuízo efetivamente sofrido pela Agência no desempenho de suas funções de fis calização fosse contemplado como critério para aplicação de sanção por óbice ou dificultação à fiscalização:  

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as alterações apresentadas têm por escopo definir critérios objetivos para que se possa mensurar a infração definida em regulamentação específica, como óbice à fiscalização, 24

diminuindo parcialmente a discricionariedade e a amplitude do conceito apresentado.  

Diversas outras contribuições solicitaram a especificação dos se guintes conceitos jurídicos indeterminados: "gravidade da falta" (art. 11, inciso IV) e "falta de igual natureza" (art. 2º, inciso VI). Houve, ainda, contribuições que sugeriram redação que diminuísse a margem de dis cricionariedade em relação à versão original objeto de consulta pública. Ao art. 10 da CP nº 847/07, que dispõe que a "multa pode ser imposta isoladamente ou em conjunto com outra sanção, não devendo ultrapassar o valor previsto na lei", significativa maioria das contribuições opinou pela submissão do valor da multa também aos contratos, instrumentos de outorga e regulamentos específicos. A força da demanda por redução da discricionariedade detida pelo regulador por meio da edição de comandos normativos pela própria Anatel autovinculativos possui como pano de fundo um grande questionamento na agenda dos debates regulatórios: como compatibilizar a imprescindível discricionariedade à regulação eficaz com a necessidade de previsibilidade e segurança jurídica? Por certo que o equilíbrio entre discricionariedade no exercício do poder sancionador e segurança jurídica deve ser principalmente composto em atenção ao cenário concreto que oportunamente se apresente (tipo de serviço prestado, agente prestador do serviço, local de prestação do serviço etc.) e às políticas regulatórias determinadas pelo Estado. O con trato ou o ato de outorga deve, portanto, conter cláusulas que procedam a essa compatibilização, o que não tolhe por inteiro, contudo, a discricionariedade administrativa em sede regulamentar. A discricionariedade revela­se instrumental de suma importância para uma regulação mais consentânea com a situação fática ensejadora da intervenção estatal e mais capacitada para atender às finalidades do setor regulado; a discricionariedade é a garantia de mobilidade do regu lador para a tomada de decisões criativas e racionais em prol do equilíbrio sistêmico do setor regulado, motivo suficiente para constar nos atos normativos expedidos pela Anatel.   c) Demanda por consensualidade Identifica­se efetiva demanda regulatória por consensualidade na CP nº 847/07, que se expressa de forma mais contundente no art. 2º e no art. 13 da Proposta de Regulamento de Aplicação de Sanções Administrativas. As contribuições relativas ao art. 2º, que dispõe sobre as definições de termos técnicos empregados no regulamento ("advertência", "infrator" e "antecedente"), pedem também a definição de "termo de ajustamento de conduta", como proposto na Contribuição nº 31 apresentada pela Telesp, a qual assim define o termo de compromisso de ajustamento de conduta:   acordo extrajudicial firmado entre a Anatel e as empresas prestadoras de serviços de telecomunicações, em procedimentos administrativos, por meio do qual o administrado

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compromete­se com a Agência a solucionar, em prazo certo, os motivos causadores de determinada conduta que possa caracterizar desconformidade legal, regulamentar ou 25

contratual.

Embora o art. 13 da Proposta objeto da CP nº 847/07 disponha sobre a substituição de sanção por outra menos gravosa, nos casos em que se verificar desproporcionalidade entre a infração e a sanção mais gravosa, o que a princípio não corresponde a um instrumento consensual, mais da metade das contribuições solicitaram a previsão de TAC. As demais contribuições relativas ao art. 13 sugeriram a previsão do procedimento de averiguação preliminar. O gráfico a seguir indica a procedência das contribuições pró­consensualidade por categoria de contribuidores:            

            Fonte: Elaboração própria a partir da CP nº 847/07.   As propostas pró­TAC enfatizaram que o exercício da função fiscalizatória não objetivaria impor sanções, mas sim aprimorar a qualidade dos serviços prestados, valorizando o caráter educacional da fiscalização. Em relação aos efeitos benéficos da medida, ressaltou­se a celeridade ao dispor que há cessação da conduta lesiva de pronto, sem que transcorra longo período correspondente ao trâmite do Pado. Conta da Contribuição nº 6 ofertada pela Telcomp em relação ao art. 13:   a sugestão de inclusão [do TAC] objetiva incorporar ao regulamento ferramenta que vem se consagrando como excelente alternativa para eliminar efeitos prejudiciais

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decorrentes de conduta ou ainda reverter ou cessar a própria conduta do 26

administrado.  

Da análise do panorama apresentado extrai­se, portanto, que uma das chaves de conformação do poder sancionador na regulação econômica exercida pela Anatel consiste na abertura à consensualidade, demanda regulatória concomitante a regulador e a regulado, conforme demons tram a Proposta de Revisão do Regimento Interno da Anatel e a análise das contribuições fornecidas pelos regulados na CP nº 847/07. O cenário mostra­se, portanto, positivo à afirmação da soft regulation no âmbito da Anatel: instrumentos regulatórios consensuais são demandados e as partes mostram­se receptivas a diálogos, além de a prática regulatória já demonstrar a celebração de acordos substitutivos cele bra dos pela Anatel.   4 O acordo substitutivo como instrumento regulatório 4.1 A regulação pela via do consenso A fórmula clássica de atuação administrativa marcada pela presença de poderes exorbitantes, correntemente traduzíveis nas notas da unilateralidade e da imperatividade, primaciais à definição 27

28

d o  ato administrativo típico,  é posta em xeque.  Principal forma de desenvolvimento das atividades administrativas, a via do ato administrativo típico, do qual resulta uma relação verticalizada e autoritária estabelecida entre Administração e administrados, já não é mais concebida como a forma única de desenvolvimento das funções públicas. Paulatinamente o Direito Administrativo brasileiro se abre à participação administrativa por meio 29

da realização de audiências e consultas públicas,  além de ser crescente a previsão de instrumentos consensuais para satisfação das competências administrativas. Instrumentos consensuais, denominados "módulos convencionais" por Massimo Severo Giannini, devem ser compreendidos nos termos propostos pelo administrativista italiano que os visualiza em expressiva ascensão no âmbito do Estado Pluriclasse:   todos os elementos em que utiliza, como técnica de atuação, para viabilizar que os interessados e as Administrações cheguem a soluções acordadas, evitando­se, assim, soluções unilateralmente impostas pela via autoritária ou soluções adotadas 30

isoladamente.  (tradução livre)   Os instrumentos consensuais compreendem todos os institutos negociados e alternativos ao ato administrativo típico,

31

 a exemplo do acordo substitutivo de sanção (termos de compromisso),

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objeto de estudo no presente artigo. Pelos instrumentos consensuais na modalidade substitutiva, a prerrogativa imperativa é afastada no caso concreto tendo em vista a satisfação das finalidades 32

específicas do setor  para adoção de uma solução negociada, que estabeleça obrigações positivas (fazer) ou negativas (deixar de fazer e não mais fazer) para suspensão do processo sancionador e posterior terminação consensual com o cumprimento do pacto pelo signatário. A celebração de acordos administrativos pelo regulador não signi fica disposição do poder sancionador, em afronta aos princípios da supre macia do interesse público sobre o interesse privado e da indisponibilidade do interesse público. Isso porque a consensualidade pode ser um mecanismo de alcance da finalidade pública no caso concreto, observadas as especificidades da 33

situação fática e do setor regulado envolvido.  No âmbito das telecomunicações, o princípio da mínima intervenção estabelecido no art. 128 da LGT consiste em diretriz de preferência da conse­ nsualidade em detrimento da aplicação de sanções sempre que forem oportunos e convenientes os acordos administrativos (termos de compromissos e ajustes de conduta). A atual literatura administrativista sobre acordos administrativos tem enumerado os efeitos benéficos dos instrumentos consensuais, os quais seriam desejáveis em prol de uma gestão pública 34

eficiente.

Uma vez que a decisão consensual também congrega os interesses dos administrados, os instrumentos consensuais seriam eminentemente legítimos e seu cumprimento mais certo, ante a 35

menor resistência à solu ção paritariamente delineada.  Nesse sentido, o consenso propiciaria eficácia às decisões regulatórias ao adequar as obrigações do termo às características e finalidades do setor, sem desconsiderar as particulari dades do caso concreto. Também seriam menos onerosos a ser tomados e executados, principalmente em razão da economia de tempo. A regulação pela via do consenso integra o modelo de soft regulation, caracterizado pela ordenação das atividades com menor incidência da imperatividade estatal, pois a satisfação das finalidades públicas antecede a afirmação da própria Administração Pública, em uma lógica verdadeiramente consequencialista. Dessa forma, os instrumentos de soft regulation, como qualquer outro instrumento regulatório, ordenam os comportamentos dos agentes econômicos, mas de forma mais branda em comparação à hard regulation. No caso da Anatel, o termo de ajustamento de conduta consiste no instrumento consensual mais emblemático. A Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985, que disciplina a ação civil pública, prevê o TAC em seu artigo 5º, §6º, parágrafo esse acrescentado pela Lei nº 8.078/90 (Código de Defesa do 36

Consumidor).  Trata­se de um verdadeiro permissivo genérico do qual decorre a legitimidade de os órgãos da Administração Direta ou os entes da Administração Indireta celebrarem TAC com os administrados, tanto em processos judiciais quanto em processos administrativos. Por essa via, o ajustamento de conduta possui eficácia de título jurídico extrajudicial, cujo conteúdo discrimina obrigações positivas e negativas condicionais ao administrado, o que implica na finalização do processo administrativo apenas mediante o cumprimento das mesmas. Uma vez cumpridas as obrigações estabelecidas no termo (geralmente condicio nadas a certo lapso temporal), finda o processo sancionador. Eis uma forma de solução consensual de conflitos por excelência.

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A Anatel pode se valer desse mecanismo em seus processos administrativos fiscalizatórios ou

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sancionadores. Além de o TAC previsto na lei da ação civil pública ser caracterizado como um permissivo genérico, o que bastaria para caracterizar a legitimidade da Anatel para empregar este instrumento consensual, saliente­se que a regulação em telecomunicações envolve assuntos relacionados a consumo e ordem econômica, ambos com previsão no art. 1º da Lei nº 7.347/85, artigo este que disci plina a aplicabilidade da lei da ação civil pública. Embora não haja efetiva disciplina do instituto em atos normativos, a Anatel já utiliza o instrumento consensual principalmente no âmbito do processo sancionador. Mesmo sem previsão normativa específica, é legal a adoção de instrumentos consensuais pela Anatel como efetivos 38

instrumentos regulatórios.  A análise da legalidade na adoção de medidas consensuais passa pelo reconhecimento da legalidade enquanto vincu  l a ç ã o   n e g a t i v a   a o   D i r e i t o   n o   t e m a   d a consensualidade. De fato, o referido art. 5º, §6º, da Lei nº 7.347/85 consiste em um permissivo genérico que autoriza o emprego do instituto independentemente de expressa previsão legal ou normativa. Ademais, quando a utilização dos instrumentos consensuais for defesa, haverá necessariamente previsão normativa nesse sentido, como se verifica na Lei nº 8.429/92, a Lei de Improbidade Administrativa, em seu art. 17, §1º, de seguinte redação: "é vedada a transação, 39

acordo ou conciliação nas ações de que trata o caput".

Dessa forma, os TACs celebrados pela Anatel são juridicamente viáveis e constituem efetivo instrumento de soft regulation do setor de telecomunicações quando comparados às sanções administrativas, em compasso com o princípio da regulação leve claramente estabelecida pela LGT 40

em seu art. 128, balizador de toda a política regulatória em telecom.  

4.2 Finalidades do setor de telecomunicações e instrumentalidade dos mecanismos de hard e soft regulation Para além da função garantística, outras funcionalidades são atribuídas ao processo administrativo, como a capacidade de uniformização do desempenho da atividade administrativa e a função legitimadora, especialmente com o incremento de figuras participativas como as audiências públicas e as consultas públicas. Especificamente em relação à consensualidade, as funções de racionalização da tomada de decisões e de controle (jurídico e social) merecem ser salientadas, pois em razão dessas características se afirma que o processo é a arena do consenso.

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Tendo em vista o dinamismo das atividades regulatórias, poucas são as decisões administrativas instantâneas; cada vez mais elas são construídas no âmbito procedimental, considerando os elementos de fato e de direito nele deduzidos, fator que propicia a deliberação racional sobre a conformação do ato. No que tange ao consenso, tem­se que a eleição pelo instrumento consensual para efetivar a regulação deve ser racionalmente determinada no curso do processo em atenção às especificidades do caso concreto e à potencialidade do instrumento consensual em satisfazer as finalidades do setor de forma mais eficiente que a sanção administrativa. Ainda que se entenda pela aplicação da sanção administrativa, a medida da proporcionalidade exigível na eleição da sanção administra tiva e mesmo na determinação do seu grau de intensidade passa a ser aferível com maior racionalidade no processo administrativo, dada a explicitação dos

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elementos que conduziram o administrador a decidir de uma determinada forma.

A aplicação das sanções administrativas determinadas no art. 173 da LGT pela Anatel condiciona­ se a prévio processo administrativo sancionador específico ao setor de telecomunicações, designado pelo Regimento Interno da Anatel de procedimento para apuração de descumprimento de obrigações (Pado). Consiste o Pado em processo regulatório sancionador por meio do qual eventuais infrações a dispositivos da LGT e a demais normas que ordenam os serviços de telecomunicações, sem exclusão das cláusulas dos contratos e dos instrumentos de outorga, são apreciadas pela Anatel. Enfatize­se que não se trata de um procedimento para aplicação de sanção administrativa ao ente regulado ­ que essa nota fique desde já bem frisada, pois fundamental ao raciocínio desenvolvido nesse artigo. O fundamento legal do Pado reside no art. 175 da LGT, segundo o qual "nenhuma sanção será aplicada sem a oportunidade de prévia e ampla defesa", mas sua efetiva disciplina encontra­se no Regimento Interno da Anatel (RI/Anatel), aprovado pela Resolução nº 270/01. Trata­se de documento que discrimina competências, atos e processos administrativos conduzidos no âmbito da Anatel, razão pela qual pode ser considerado como o regulamento geral das atividades administrativas da Agência. O título VI desse documento rege os procedimentos administrativos, sendo formado por uma "parte geral", que versa sobre os direitos e obrigações do administrado perante a Agência Reguladora em comento, aplicável a todos os procedimentos, e por uma "parte especial", destinada a pormenorizar o regramento dos diversos tipos procedimentais como o procedimento normativo, o procedimento para obtenção de autorização e o Pado. Cumpre ressaltar que a Lei federal de processo administrativo (Lei nº 9.784/99) rege subsidiariamente o Pado, aplicando­se especial mente os dispositivos relativos à formalidade dos atos processuais, a exemplo dos artigos 23 e 25, e à determinação dos impedimentos e da suspeição (art. 18 a art. 21). Nessa linha, o art. 26 impõe o dever de intimação do interessado para ciência de decisão ou de diligência, observada a antecedência mínima de três dias. 43

Inicia­se o Pado por ato de instauração  mediante denúncia formulada na forma de requerimento inicial por força do art. 6º da Lei nº 9.784/99 ou de ofício, conforme o art. 77, inciso I, c/c art. 71, caput, do RI/Anatel. Na sequência, o interessado é notificado para que apresente sua defesa e provas dentro do prazo de quinze dias fixado pelo art. 77, inciso II do RI/Anatel, para, então, dar início à fase de instrução probatória no decorrer da qual a Procuradoria será ouvida. Finda a instrução, o interessado manifesta­se no prazo de dez dias estabelecido no art. 44 da Lei nº 9.784/99 e dentro de trinta dias (art. 77, inciso V, RI/Anatel) o Conselho Diretor profere decisão motivada por ato ou despacho (art. 77, inciso VII, RI/Anatel), cabendo recurso ou pedido de reconsideração da decisão. O tempo de trâmite do Pado não poderá exceder 90 dias, conforme determinação do art. 77, inciso IV do RI/Anatel, e seu término ordinário corresponde à aplicação de sanção administrativa ante a constatação de infração administrativa. Os Pados conduzidos no âmbito da Anatel podem ser terminados consensualmente. Com a ascensão da consensualidade no Direito Regulatório e o reconhecimento dos acordos

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substitutivos como efetivos instrumentos regulatórios, os mecanismos consensuais podem ser empregados para terminação consensual do processo sancionador em detrimento i) do prosseguimento do processo para apuração de eventual infração administrativa e aplicação da correspondente sanção ou ii) da aplicação da sanção administrativa se restar configurada infração administrativa. Como visto, cada tipo de ato propicia efeitos específicos. As sanções administrativas, unilaterais e autoritárias, pois que respaldadas no poder sancionador, carregam o caráter simbólico da autoridade; o efeito exemplar da sanção previne a ocorrência de novas infrações e afirma o regulador no setor, cujas decisões revestem­se de efetividade em com passo com o art. 2º, inciso 44

IV, da LGT.  Por sua vez, os acordos substitutivos conformam uma decisão consensual mais consentânea às peculiaridades do caso concreto e às especificidades do setor regulado, além de otimizar tempo e recursos e ser reconhecida como legítima perante o regulado. Pela análise dos modelos de hard regulation  e  soft regulation no campo da competência sancionatória exercida pela Anatel, depreende­se que os respectivos instrumentos de regulação ­ sanção administrativa e acordo substitutivo (TAC) ­ são juridicamente viáveis à terminação dos processos sancionatórios. Em outros termos, duas destinações igual mente plausíveis se colocam aos Pados: sancionar, se caracterizada a infração, ou transacionar. Concebe­se recorrentemente o dever de aplicação de sanções administrativas se caracterizada infração após regular trâmite de procedi mento administrativo sancionador. Reportando­se novamente ao sistema constitucional que subsidia o regime jurídico­administrativo e mesmo às normas específicas atinentes ao setor de telecomunicações, cumpre enfatizar a inexistência de 45

preceito que vincule a aplicabilidade de sanção à ocorrência de infração administrativa.

De fato, o poder sancionador consiste em prerrogativa conferida pelo ordenamento jurídico à 46

Administração para melhor consecução das finalidades legais,   d e   o n d e   s e   e x t r a i   a instrumentalidade das sanções administrativas, decorrência direta do exercício da potestade sancionatória. No setor de telecomunicações a instrumentalidade das prerroga tivas é ainda mais evidente com o art. 9º da LGT, segundo o qual "a Agência atuará como autoridade administrativa independente, assegurando­se­lhe, nos termos desta Lei, as prerrogativas necessárias ao exercício adequado de sua competência". Depreende­se do mencionado preceito o atrelamento das prerrogativas detidas pela Anatel à satisfação ótima de suas competências com atenção à finalidade setorial. Regulação e finalidades regulatórias são elementos indissociáveis, uma vez que estas delineiam a regulação, a qual pode ser do tipo sancionatória ou consensual conforme se adote, respectivamente, a sanção 47

administrativa  ou o acordo substitutivo de sanção

48

 como mecanismo regulatório.

No setor de telecomunicações, as finalidades públicas podem ser agrupadas em quatro escopos, quais sejam: competição, universalização, investimentos e qualidade dos serviços prestados são as 49

finalidades às quais se orienta a regulação procedida pela Anatel.  Para a consecução dessas finalidades, as sanções administrativas podem ser discricionariamente substituídas por TACs no curso do processo sancionador. Cum pridas as obrigações do termo, tem­se a terminação consensual do Pado.

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A mencionada discricionariedade para eleição do instrumento regulatório não implica, porém, em incondicionada liberdade de escolha do regulador; a opção pela via consensual deve atender a determinados requisitos para que seja considerada válida. Primeiramente, esta escolha deve ser tomada no percurso do processo administrativo sancionador. Na qualidade de decisão administrativa, os acordos substitutivos são eminentemente processuais. A escolha do administrador pela sanção ou pelo termo consensual resulta de um trabalho de construção processual marcado pela instrução probatória, pela análise das peculiaridades do caso e pelos debates jurídicos. Qualquer que seja a escolha do regulador, esta deve ser motivada, com exposição da razão prática e dos fundamentos jurídicos para adoção da específica medida regulatória. Com o fenômeno da processualização, incrementa­se o controle da regulação na medida em que cada ato processual deve ser motivado e os fatores decisórios são exteriorizados no processo. No caso específico do Pado, porém, a LGT determina em seu art. 174 que "toda acusação será circunstanciada, permanecendo em sigilo até sua completa apu ração". Nesse sentido, o art. 79 do RI/Anatel dispõe que "o PADO será sigiloso até seu encerramento, salvo para as partes e seus procuradores". O controle nos processos sancionadores, portanto, é enfraquecido por conta da previsão de sigilo, dado que apenas as partes diretamente interessadas podem tomar conhecimento de todas as etapas processuais. No entanto, inexiste impedimento legal à publicidade dos termos de ajustamento de conduta celebrados pela Anatel. Embora tenha expres sivos efeitos sobre o Pado, o acordo substitutivo TAC constitui instru mento autônomo ao processo sancionador, devendo seu teor ser necessariamente divulgado. Ainda há que se observar a regra da proporcionalidade para eleição do instrumento regulatório, passando necessariamente pela análise da adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. Pela verificação da proporcionalidade na adoção dos acordos substitutivos, busca­se selecionar o instrumento regulatório de menor impacto ao regulado. Por fim, o acordo de vontades entre regulador e regulado, ora partes em processo regulatório sancionador, reputa­se imprescindível à adoção do acordo substitutivo de sanções administrativas. Não haveria como ser diferente em razão da inserção da espécie acordos substitutivos no gênero instrumentos consensuais. Tem­se, portanto, que a depender i) das especificidades que qualificam a situação concreta e ii) das finalidades a serem contempladas, poder­se­á adotar indistintamente os instrumentos regulatórios sanção ou acordo substitutivo. A discricionariedade presente nessa eleição de instrumentos regulatórios condiciona­se, porém, a prévio processo sancionador, ao dever de motivação, à regra da proporcionalidade e ao acordo de vontades entre regulado e regulador para adoção da solução consensual. Apesar da indiferença em se adotar instrumentos sancionatórios ou consensuais, a adoção de acordos substitutivos deve ser seriamente considerada pelo regulador em razão da prevalência do princípio de regulação leve no setor de telecomunicações, especialmente nos casos em massa, os quais demandam soluções uníssonas. 5 Possíveis obstáculos à regulação consensual

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Em atendimento ao art. 32 do Plano Geral de Metas e Qualidade (PGMQ) aprovado pela Resolução nº 30/98 da Anatel, segundo o qual "toda localidade com STFC com acessos individuais deverá ser dotada, pela prestadora do serviço, de atendimento público que permita ao usuá  rio efetuar qualquer interação relativa à prestação do serviço", as concessionárias de STFC mantinham call center à disposição da integralidade dos usuários e postos de atendimento pessoal (PAPs) em 50

localidades de maior densidade demográfica.

Entendeu a Anatel, pressionada pelo Ministério Público e por entidades de defesa do consumidor, que o atendimento público deveria se dar por meio de PAPs para, assim, contemplar usuários sem acesso midiático. Dessa forma, diversos Pados foram instaurados por descumprimento do dever de atendimento público especificado no contrato de concessão em decorrência i) do fechamento de postos de atendimento pessoal aos usuários de telefonia fixa ou ii) da ausência de PAPs em Municípios atendidos com telefonia individual. Em alguns casos, pesadas multas foram cominadas às concessionárias de STFC consideradas infratoras do PGMQ após regular tramitação de processo sancionador: Telemar e Brasil Telecom, por exemplo, foram multadas em R$1,76 milhão pelo fechamento de PAPs, sem prejuízo de outros 51

Pados com o mesmo objeto em localidades diferentes.  Nesse sentido, a somatória das multas 52

aplicadas à Brasil Telecom, à Telefônica e à Telemar supera a monta de R$20 milhões.

Em outros, Agência Reguladora e concessionárias de STFC celebraram termos de ajustamento de conduta. Certamente o TAC firmado entre Anatel, Brasil Telecom, Telefônica e Telemar consiste no mais emblemático. Pelo acordo, datado em 21 de dezembro de 2004, as concessionárias se comprometeram a instalar 5.489 postos de atendimento até o dia 31 de dezembro de 2005 nas localidades cujos PAPs foram fechados, além de se submeterem a multa de R$20 mil por dia de atraso na abertura de cada PAP. Em troca, os Pados foram suspensos e a Anatel se comprometeu a não aplicar sanções ante o cumprimento dos deveres estabelecidos consensualmente. Importa notar que, apesar da adoção de instrumento consensual para terminação dos referidos 53

Pados, o efeito prático da dita soft regulation equipara­se à hard regulation  na medida em que houve na prática a mera suspensão condicional da sanção, e não sua substituição. Verifica­se, no caso concreto, verdadeira desnaturação da soft regulation. Como espécie do gênero acordos consensuais, os acordos substi tutivos de sanção administrativa devem ser estabelecidos da forma mais horizontal possível, pois intrínsecas ao consenso são as trocas recíprocas. Sem que se garanta um mínimo de paridade, haverá desnaturação do acordo substitutivo e seu efeito prático poderá ser o mesmo daquele verificado na hard regulation. O problema da desnaturação dos acordos substitutivos pode ser mitigado com a elaboração de normas hábeis a assegurar uma relação mais paritária entre regulador e regulado, com a estipulação de condições de negociação e garantias ao regulado. Não se trata, por óbvio, de pro tecionismo ao regulado, mas de garantia de eficácia dos instrumentos consensuais e de efetiva alternatividade entre soft e  hard regulation. A elaboração de ato normativo específico para disciplinar a dinâmica dos acordos administrativos pela Anatel seria uma iniciativa indispensável ao estímulo à adoção de métodos concertados no âmbito do processo administrativo sancionador.  

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6 Conclusão O reconhecimento da consensualidade como meio eficaz de desenvolvimento da atividade administrativa determina uma nova dinâmica acerca dos instrumentos de regulação: ao lado da atuação lastreada pela imperatividade, colocam­se os acordos administrativos como mecanis mos de cumprimento das finalidades públicas, ambos à disposição da Administração para exercício de suas competências regulatórias. Especialmente na função sancionatória, objeto de estudo do presente artigo, a afirmação do consenso é de fato transformadora. Pela análise da CP nº 847/07 verificou­se que a celebração de acordos administrativos na seara sancionatória é desejada pelos atores do setor de telecomunicações, fator indicativo de uma nova percepção da autoridade estatal, mais instrumental e proporcional. Diante das peculiaridades da situação e conforme as finalidades de universalização, investimento, competição e qualidade, a regulação em telecom poderá se fazer por meio da hard regulation ou da soft regulation, i.e., pela aplicação de sanção administrativa ou pela celebração de acordos substitutivos, supletivamente. De todas as dificuldades que os acordos substitutivos possam eventualmente se deparar, certamente a barreira cultural é a que mais tolhe o aproveitamento da potencialidade dos instrumentos consensuais. Ainda remanesce muito forte no subconsciente coletivo o dever de sancionar (punir) ­ nessa linha, o emprego de instrumentos consensuais sofre grande resistência e até mesmo preconceito, pois visualizados como instrumentos de "impunidade". Avaliações do modelo regulatório consensual podem contribuir à superação desta visão negativa da regulação concertada: estudos avalia tivos da eficácia dos acordos administrativos, definição de garantias de paridade entre regulador e regulado e publicidade dos termos celebrados pela Administração Pública são cruciais para a adoção de medidas regulatórias mais consentâneas à realidade e úteis à satisfação das finalidades setoriais. Dentro de suas limitações, o presente artigo pretendeu conferir subsídios a essa agenda de pesquisa na atividade sancionadora estatal.   Referências   ALFONSO, Luciano Parejo. Los Actos Administrativos Consensuales en el Derecho Español.  A&C ­ Revista de Direito Constitucional & Administrativo, Belo Horizonte, n. 13, jul./set. 2003. ARAGÃO, Alexandre Santos de. A consensualidade no direito administrativo: acordos regulatórios e contratos administrativos. Revista de Direito do Estado, Rio de Janeiro, n. 1, p. 168, jan./mar. 2006. ARAGÃO, Alexandre Santos de. O princípio da eficiência. R evista Brasileira de Direito Público ­ RBDP, Belo Horizonte, n. 4, jan./fev. 2004. CASSESE, Sabino. La Crisis del Estado. Trad. Pascual Caiella e Juan González Moras. Buenos Aires: Lexis­Nexis, 2003. FERREIRA, Daniel. Sanções administrativas. São Paulo: Malheiros, 2001.

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FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Administração consensual: a audiência pública e sua finalidade.  Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 230. FONT Y LLOVET, Tomàs. Desarrollo reciente de los instrumentos de la administración consensual en España.  In: MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo (Coord.).  Uma avaliação das tendências contemporâneas do direito administrativo. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. GIANNINI, Massimo Severo.  El Poder Publico. Estados y Administraciones Publicas. Trad. Luis Ortega. Madrid: Civitas, 1991. GUERRA, Sérgio. Controle judicial dos atos regulatórios. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. GUIMARÃES, Fernando Vernalha. Procedimento e função regulatória de serviços públicos no Estado pós­social. A&C ­ Revista de Direito Administrativo e Constitucional, Belo Horizonte, v. 14, out./dez. 2003. JAMBRENGHI, M. T. Paola Caputi.  Studi Sull'Autoritarietà nella Funzione Amministrativa. Milano: Giuffrè, 2005. MARQUES NETO, Floriano de Azevedo .  A nova regulação estatal e as agências reguladoras.  I n: SUNDFELD, Carlos Ari (Coord.). Direito administrativo econômico. São Paulo: Malheiros, 2002. MARQUES NETO, Floriano de Azevedo .  Aspectos jurídicos do exercício do poder de sanção por órgão regulador do setor de energia elétrica. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 221, 2000. MARQUES NETO, Floriano de Azevedo .  Direito das telecomunicações e ANATEL. In: SUNDFELD, Carlos Ari (Coord.). Direito administrativo econômico. São Paulo: Malheiros, 2002. MARQUES NETO, Floriano de Azevedo . Discricionariedade e regulação setorial: o caso do controle de atos de concentração por regulador setorial.  I n: ARAGÃO, Alexandre Santos de (Coord.). O poder normativo das agências reguladoras. Rio de Janeiro: Forense, 2006. MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. Limites à abrangência e à intensidade da regulação estatal. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico, Salvador, v. 4, nov./jan. 2005/2006. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 22. ed. São Paulo: Malheiros, 2006. MOREIRA, Egon Bockmann. Agências reguladoras independentes, poder econômico e sanções administrativas. In: GUERRA, Sérgio (Coord.). Temas de direito regulatório. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2004. MOREIRA, Vital. Auto­regulação profissional e Administração Pública. Coimbra: Almedina, 1997. NIETO, Alejandro. Derecho administrativo sancionador. Madrid: Tecnos, 1993. OSÓRIO, Fábio Medina. Direito administrativo sancionador. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. OSÓRIO, Fábio Medina. O conceito de sanção administrativa no direito brasileiro. In: MOREIRA

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  Adoto a formulação ampla de regulação de Vital Moreira, correspondente a "todas as medidas de

condicionamento da actividade económica, revistam ou não forma normativa" (Auto­regulação profissional e Administração Pública. Coimbra: Almedina, 1997. p. 36).   2

  Cf. SUNDFELD, Carlos Ari. Introdução às agências reguladoras. In: SUNDFELD, Carlos Ari (Coord.). Direito administrativo econômico. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 18.   3

  Sobre o efeito preventivo da sanção administrativa, cf. Manuel Rebollo Puig, que assim coloca:

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"claro que castigar sí tiene una finalidad. Las sanciones administrativas tienen una finalidad, como la tienen las penas. Aquí también se puede decir que las sanciones administrativas son útiles como sistema de respaldo o tutela del ordenamiento pues sirven para prevenir infracciones futuras y así, aunque sea de manera indirecta, proteger los intereses públicos confiados a la Administración" (El Derecho Administrativo Sancionador. In: MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo (Coord.).  Uma avaliação das tendências contemporâneas do direito administrativo. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 268. Cf. ainda, FERREIRA, Daniel. Sanções administrativas. São Paulo: Malheiros, 2001).   4     

Aspectos jurídicos do exercício do poder de sanção por órgão regulador do setor de energia

elétrica. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 221, p. 354, 2000.   5

  Essa funcionalidade foi reconhecida no Direito Administrativo Sancionador brasileiro por Fábio

Medina Osório (O conceito de sanção administrativa no direito brasileiro. In: MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo (Coord.). Uma avaliação das tendências contemporâneas do direito administrativo. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 319).   6

  Note­se que a LGT disciplinou de forma especial o descumprimento de obrigações relativas à universalização e à continuidade da prestação dos serviços de telecomunicações em seu artigo 82, ao afastar as sanções de advertência e de suspensão temporária. É o artigo in verbis: "Art. 82. O descumprimento das obrigações relacionadas à universalização e à continuidade ensejará a aplicação de sanções de multa, caducidade ou decretação de intervenção, conforme o caso".   7

   In verbis: "Art. 70. Serão coibidos os comportamentos prejudiciais à competição livre, ampla e

justa entre as prestadoras do serviço, no regime público ou privado, em especial: I ­ a prática de subsídios para redução artificial de preços; II ­ o uso, objetivando vantagens na competição, de informações obtidas dos concorrentes, em virtude de acordos de prestação de serviços; III ­ a omissão de informações técnicas e comerciais relevantes à prestação de serviços por outrem".   8

  "A configuração das infrações administrativas, para ser válida, há de ser feita de maneira suficientemente clara, para não deixar dúvida alguma sobre a identidade do comportamento reprovável, a fim de que, de um lado, o administrador possa estar perfeitamente ciente da conduta que terá de evitar ou que terá de praticar para livrar­se da incursão em penalizações e, de outro, para que dita incursão, quando ocorrente, seja objetivamente reconhecível" (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 22. ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 839).   9

  Alejandro Nieto aponta dois motivos para a subordinação do Direito Administrativo Sancionador

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ao Direito Penal, quais sejam, i) a mera reminiscência histórica e ii) a utilidade pragmática dos lapidados institutos penais: "(...) ni existe uma subordinación por naturaleza al Derecho Penal sino ésta es meramente conyuntural y técnica: el Derecho Administrativo Sancionador toma em préstamo los instrumentos que le proporciona el Derecho Penal sencillamente porque le son útiles por causa de su maduración más avanzada y de su superioridad teórica" (p. 75). Para além desse ponto, o administrativista espanhol atrela a potestade sancionatória ao conceito de intervenção, o que implica reconhecer contornos específicos ao poder sancionador administrativo em relação ao Direito Penal (Derecho administrativo sancionador. Madrid: Tecnos, 1993. p. 90).   10

 In verbis: "O contrato de concessão indicará: (...) XIV ­ as sanções".

  11

 In verbis: "A permissão será formalizada mediante assinatura de termo, que indicará: (...) VIII ­

as sanções".   12

  O art. 214 da LGT enaltece a figura do ato normativo, equiparado a uma efetiva lei formal: "Na aplicação desta Lei, serão observadas as seguintes disposições: I ­ os regulamentos, normas e demais regras em vigor serão gradativamente substituídos por regulamentação a ser editada pela Agência, em cumprimento desta Lei".   13

  Pelo parágrafo único do art. 1º, o direito de exploração de satélite e o uso de radiofrequência sujeitam­se às disposições da Resolução nº 344/03. É o texto in verbis: "Sujeitam­se às disposições deste Regulamento os serviços de radiodifusão, no que tange aos aspectos técnicos, o direito de exploração de satélite e o uso de radiofreqüência, no que couber".   14

  Tais condicionantes encontram­se principalmente no art. 5º da LGT: "na disciplina das relações econômicas no setor de telecomunicações observar­se­ão, em especial, os princípios constitucionais da soberania nacional, função social da propriedade, liberdade de iniciativa, livre concorrência, defesa do consumidor, redução das desigualdades regionais e sociais, repressão ao abuso do poder econômico e continuidade do serviço prestado no regime público".   15

 In verbis: "Para efeitos deste Regulamento, os serviços e meios de telecomunicações prestados

no País estão classificados em grupos conforme disposto no Anexo consoante os seguintes critérios: I ­ a modalidade de serviço; II ­ a abrangência do interesse a que atendem; III ­ o número de usuários do serviço; e IV ­ o regime jurídico da prestação".  

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16

   In verbis: "Na aplicação das sanções e na fixação das multas, devem ser consideradas as seguintes circunstâncias: I ­ a natureza e a gravidade da infração; II ­ os danos resultantes da infração para o serviço e para os usuários; III ­ a vantagem auferida em virtude da infração; IV ­ as circunstâncias gerais agravantes e atenuantes; V ­ os antecedentes do infrator; VI ­ a reincidência específica; VII ­ a proporcionalidade entre a gravidade da falta e a intensidade da sanção, inclusive quanto ao número de usuários atingidos; VIII ­ a participação do infrator no mercado dentro de sua área geográfica de prestação do serviço; e IX ­ a situação econômica e financeira do infrator, em especial sua capacidade de geração de receitas e seu patrimônio".   17

  In verbis: "O valor da multa pode ser acrescido até: I ­ 5% (cinco por cento), quando o dano

resultante ou a vantagem auferida da infração atingir até 10% (dez por cento) dos usuários do serviço; II ­ 10% (dez por cento), quando o dano resultante ou a vantagem auferida da infração atingir acima de 10% (dez por cento) dos usuários do serviço; III ­ 35% (trinta e cinco por cento), no caso de reincidência específica; IV ­ 5% (cinco por cento), quando houver antecedentes; e V ­ 5% (cinco por cento) no caso de circunstâncias não contempladas nos incisos anteriores".   18

  Cf. MOREIRA, Egon Bockmann. Agências reguladoras independentes, poder econômico e sanções administrativas.  I n: GUERRA, Sérgio (Coord.). T emas de direito regulatório.   R i o   d e Janeiro: Freitas Bastos, 2004.   19

  Eis o teor do art. 88 da Proposta de Revisão do Regimento Interno da Anatel: "É facultado à Agência, durante o desenvolvimento da Averiguação Preliminar buscar a solução da possível violação da ordem jurídica por meio de um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) ou, no caso de conflito entre Administrados, o consenso entre os envolvidos, podendo ser instaurado Processo de Composição de Conflitos". O art. 93, §1º, da referida Proposta possui o seguinte teor: "Durante a instrução de PADO, interessado poderá propor a celebração de Termo de Ajuste de Conduta, nos termos deste Regimento Interno". Ainda, havia o art. 104: "O TAC poderá ser celebrado durante processo de Averiguação Preliminar ou durante o curso de PADO, tendo por objeto a adequação de conduta do interessado por ele abrangida".   20

  "Art. 103. O TAC deverá conter, no mínimo: I ­ o nome e a qualificação do interessado, bem

como do seu representante legal; II ­ a descrição detalhada de seu objeto e dos compromissos pactuados, que podem consistir em obrigação de fazer ou não fazer; III ­ cláusula estabelecendo as conseqüências pelo descumprimento dos compromissos pactuados; IV ­ a periodicidade da apresentação de relatórios detalhados das obrigações, bem como a possibilidade de a Agência solicitar a qualquer momento o fornecimento de informações que julgar relevantes ao acompanhamento do cumprimento dos compromissos pactuados, sem prejuízo da realização de

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fiscalização de ofício; e V ­ assinatura da autoridade competente e do interessado. Parágrafo único: poderão ser pactuados compromissos específicos, inclusive de natureza onerosa, em benefício dos usuários prejudicados".   21

  Outros standards são estabelecidos no diploma legal, dentre eles a possibilidade de punição dos administradores de pessoa jurídica sancionada quando imbuídos de má­fé (art. 177), a fixação do prazo máximo de suspensão temporária equivalente a trinta dias (art. 180, parágrafo único) e a estipulação do prazo de vigência da declaração de inidoneidade não superior a cinco anos (art. 182).   22

  Segundo Floriano de Azevedo Marques Neto, "a discricionariedade poderá advir 1) da

deslegificação (conferência de margens de liberdade para a administração concretizar normativamente aquilo que o legislador se abstiver ­ tácita ou expressamente ­ de fazê­lo por não ser possível prever todas as hipóteses de incidência da competência administrativa); 2) da utilização pelo legislador de conceitos jurídicos indeterminados (utilização pelo legislador de fórmulas amplas cuja concretização depende de uma avaliação subjetiva do agente competente para aplicar a lei); 3) da prescrição de poderes implícitos (quando a lei prescreve uma competência, prevê a finalidade justificadora de seu manejo, mas ou se omite em determinar a conduta a ser adotada para sua consecução ou arrola uma série de medidas possíveis à escolha do administrador); por fim, 4) da prescrição autorizativa expressa (conferência direta e expressa de uma autorização para a administração, diante do caso concreto, a decidir pela utilização, total ou parcial, de suas competências" (Discricionariedade e regulação setorial: o caso do controle de atos de concentração por regulador setorial.  I n: ARAGÃO, Alexandre Santos de (Coord.). O  poder normativo das agências reguladoras. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 571).   23

  "Art. 11, §2º. A sanção por óbice ou dificultação à fiscalização da Agência levará em

consideração adicionalmente os seguintes aspectos: I ­ duração do óbice; e II ­ quantidade de informações não fornecidas ou fornecidas erroneamente".   24

  CP nº 847/07, p. 260.

  25

 CP nº 847/07, p. 141.

  26

 CP nº 847/07, p. 107.

 

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  Segundo Massimo Severo Giannini, "en los países en los que se crea un derecho administrativo, es decir, los de la Europa continental y su órbita cultural, la actividad que se manifesta mediante actos de autoridad va a constituir el derecho administrativo y los actos de autoridad de las administraciones asumen la nueva calificación jurídica de actos administrativos". El Poder Publico. Estados y Administraciones Publicas. Madrid: Civitas, 1991 (trad. Luis Ortega).   28

  Sabino Cassese afirma que a relação administrativa pautada na potestade remete ao

tradicional conflito autoridade­liberdade travada entre Administração e administrado. E é exatamente essa relação de bipolaridade­antagonismo que é questionada em razão de quatro evidências: i) reconhecimento da função distributiva detida pela Administração Pública, pois que o desempenho das atividades administrativas implica em efeitos favoráveis para certos administrados e efeitos desfavoráveis para outros, determinando, assim, uma função tríplice; ii) constatação pelos estudiosos do tema da consensualidade de que a Administração atua cada vez mais por meio de instrumentos privados; iii) estabelecimento de relação tríplice do Direito Regulatório envolvendo regulador, prestadores de serviços e usuários e iv) verificação de que o processo administrativo pode agrupar mais interessados que permite a clássica relação bipolar. Embora Sabino Cassese não afaste por completo o bipolarismo, demonstra o autor o desenvolvimento da arena pública por meio da qual "se desenvolvem a atividade pública e o intercâmbio Estado­sociedade (...) se desenvolvem diálogos e conflitos e que serve para a transferência das demandas sociais ao corpo político". Trata­se, assim, de espaço público que incita a consensualidade (La Crisis del Estado. Trad. Pascual Caiella e Juan González Moras. Buenos Aires: Lexis­Nexis, 2003. p. 156).   29

  Cf. FIGUEIREDO, Lúcia Valle.  Administração consensual: a audiência pública e sua finalidade.

Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 230, out./dez. 2002.   30

  Op. cit., p. 149.

  31

  Segundo Floriano de Azevedo Marques Neto, "o fato é que esta 'nova regulação',

desempenhada pelos órgãos reguladores independentes, discrepa dos lineamentos da autoridade administrativa tradicional. A unilateralidade e a exorbitância tradicionais no exercício da autoridade pública (poder extroverso) têm que dar lugar à interlocução, à mediação e à ponderação entre interesses divergentes, sem descurar, por óbvio, da proteção da coletividade contra abusos dos agentes econômicos" (Aspectos jurídicos do exercício do poder de sanção por órgão regulador do setor de energia elétrica. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 221, p. 360, 2000).  

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  Cf. ARAGÃO, Alexandre Santos de. O princípio da eficiência. R evista Brasileira de Direito

Público ­ RBDP, Belo Horizonte, n. 4, p. 79, jan./fev. 2004.   33

  A respeito da relação entre consensualidade e os princípios da supremacia e da

indisponibilidade do interesse público, cf. PALMA, Juliana Bonacorsi de. Atuação administrativa consensual: estudo dos acordos substitutivos no processo administrativo sancionador. Dissertação (Mestrado) ­ Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, 26 fev. 2010.   34

  "Ao DAC [Direito Administrativo do Clips] se opõe o direito administrativo dos negócios (DAN), o dos que se focam em resultados e, para obtê­los, fixam prioridades, e com base nelas gerenciam a escassez de tempo e de recursos. Para esse âmbito, valem as práticas opostas às do DAC: aumenta a informalidade nos procedimentos; a inação é o pior comportamento possível do agente; soluções devem ser encontradas o mais rápido; acordos são desejáveis; evitar e eliminar custos é fundamental; só se envolvem na decisão agentes e órgãos indispensáveis; riscos devem ser assumidos sempre que boa a relação custo­benefício, etc." (SUNDFELD, Carlos Ari.  O  direito administrativo entre os clips e os negócios. Revista de Direito Público da Economia ­ RDPE, Belo Horizonte, v. 18, p. 37, 2007).   35

  Fernando Vernalha Guimarães ainda ressalta a funcionalidade do consenso em conseguir

informações do agente regulado (disclosure) (Procedimento e função regulatória de serviços públicos no Estado pós­social. A&C ­ Revista de Direito Administrativo e Constitucional,  Belo Horizonte, v. 14, p. 73, out./dez. 2003).   36

  Dispõe referido dispositivo (in verbis): "Art. 5º. §6º. Os órgãos públicos legitimados poderão

tomar dos interessados compromisso de ajustamento de conduta às exigências legais, mediante cominações, que terá eficácia de título jurídico extrajudicial".   37

  "Trata­se de dotar o órgão público de instrumento consensual que viabilize a pronta adoção,

pelo particular, de comportamentos desejados. Privilegiou­se o resultado à busca incerta e demorada de sanções na via judicial. A celebração do termo de ajustamento de conduta também é um modo mais rápido para assegurar a aplicação efetiva da norma em discussão. Não se trata de instrumento de punição, mas de indução de comportamentos concretos" (SUNDFELD, Carlos Ari; CÂMARA, Jacintho Arruda. O  devido processo administrativo na execução do termo de ajustamento de conduta. A&C ­ Revista de Direito Administrativo & Constitucional, Belo Horizonte, n. 31, p. 91, abr./jun. 2008).  

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  Ao diferenciar os instrumentos de regulação normativa dos demais instrumentos regulatórios,

Vital Moreira aloca a "concertação convencional" no segundo bloco de regulação (Op. cit., p. 36).   39

  Alexandre Santos de Aragão também entende pela viabilidade jurídica de celebração de acordos consensuais ainda que ausente permissivo específico dado que "o princípio da legalidade, mesmo em sua acepção mais rígida, foi elaborado para assegurar a esfera jurídica dos particulares diante de atos imperativos que gerem gravames, não para aqueles que beneficiem o particular ou que se 'expressassem em convenções, nas quais o assentimento da outra parte também é idôneo para superar a eficácia do princípio', até porque, lembremos, tanto a lei, como o contrato, podem ser fontes de direito" (A consensualidade no direito administrativo: acordos regulatórios e contratos administrativos. Revista de Direito do Estado, n. 1, Rio de Janeiro, p. 168, jan./mar, 2006).   40

  O princípio de regulação leve na Anatel é assim exemplificado pelo prof. Carlos Ari Sundfeld:

"(...) a lei contém uma opção geral pela regulação mais leve possível. Isto é muito evidente para os serviços autorizados, onde 'a liberdade será a regra, constituindo exceção as proibições, restrições e interferências do poder público', devendo a regulação observar o princípio da 'mínima intervenção na vida privada' (art. 128). (...) Ao tratar da concessão de telecom, a LGT foi ainda mais fundo nessa linha, prevendo o direito de os concessionários participarem da livre, ampla e justa competição (art. 6º), a opção de liberdade quanto às tarifas para os usuários finais (arts. 104 e 105), a livre negociação entre prestadores para os serviços de interconexão (art. 153), o direito em princípio à prorrogação do prazo contratual (art. 99), etc. Em suma, em telecom há um princípio de regulação leve não só para as autorizações, mas também para as concessões" (Meu depoimento e avaliação sobre a lei geral de telecomunicações. Revista de Direito do Estado, Rio de Janeiro, v. 3, p. 77­78, jan./mar. 2008).   41

  Notada a transição da unilateralidade à transação e do poder extroverso ao poder condensado

no desenvolvimento das atividades regulatórias, Floriano de Azevedo Marques Neto reforça a necessidade de as mesmas "tenham um caráter marcadamente procedimental, processualizado, com sua subordinação a regras, ritos e procedimentos claros e preestabelecidos" (A nova regulação estatal e as agências reguladoras.  I n: SUNDFELD, Carlos Ari (Coord.).  Direito administrativo econômico. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 79). Segundo Tomàs Font y Llovet, "el procedimento participado há sido, precisamente, el camino a través del cual se há ido abriendo paso la figura del acuerdo entre la Administración y los particulares en el ejercicio de potestades administrativas. De la simple participación en el procedimiento se ha evolucionado hacía la Administración convencional, a la substitución de la decisión administrativa unilateral, expresión de la sola voluntad de la Administración, por el acuerdo entre las partes" (Desarrollo Reciente de los Instrumentos de la Administración Consensual en España.  I n: MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo (Coord.). Uma avaliação das tendências contemporâneas do direito administrativo. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 364).   Biblioteca Digital Fórum de Direito Público ­ Cópia da versão digital

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  MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. Limites à abrangência e à intensidade da regulação estatal. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico, Salvador, v. 4, nov./jan. 2005/2006.   43

  Conforme o art. 77, inciso I, do Regimento Interno, no ato de instauração deverão constar os fatos que motivaram o início do processo administrativo sancionador, as normas correspondentes à infração apontada e a sanção aplicável.   44

  In verbis: "Art. 2º. O Poder Público tem o dever de: (...) IV ­ fortalecer o papel regulador do Estado".   45

  O caso de declaração de inidoneidade, regulado no art. 12 do Regulamento aprovado pela Resolução nº 344/03, porém, determina a obrigatoriedade de aplicação de sanção administrativa, nos seguintes termos: "a declaração de inidoneidade deve ser aplicada a pessoa natural ou a pessoa jurídica, bem como a seu administrador ou controlador, que tenha praticado atos ilícitos visando frustrar os objetivos de licitação".   46

  Segundo José Bermejo Vera, "la potestade de sancionar o potestade sancionadora, como el resto de potestades administrativas, constituye una auténtica prerrogativa y una manifestación más de la capacidad de las Administraciones públicas para el cumplimiento de sus fines" (VERA, José Bermejo. La Potestad Sancionadora de la Administración.  I n: MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo (Coord.). Uma avaliação das tendências contemporâneas do direito administrativo. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 245). Nesse sentido, também posiciona­se Marcelo Madureira PRATES: "a possibilidade de a Administração impor, por ela mesma e com império, sanções aos particulares com os quais não mantivesse nenhuma relação jurídica especial adquiriu densidade e se consolidou como verdadeiro poder administrativo, como mais uma das prerrogativas de autoridade detidas pela Administração para serem utilizadas em favor da coletividade, à qual temos denominado poder administrativo sancionador geral" (Sanção administrativa geral: anatomia e autonomia. Coimbra: Almedina, 2005. p. 37).   47

  Sobre a instrumentabilidade das sanções administrativas, Floriano de Azevedo Marques Neto

assim dispõe: "A sanção é mero instrumento para atingimento das finalidades primárias do órgão (...) a finalidade da atividade regulatória estatal não é a aplicação das sanções e sim a obtenção das metas, pautas e finalidades que o legislador elegeu como relevantes alcançar. Para atingimento destas finalidades primaciais pode lançar mão, dentre outros instrumentos, do poder de sancionar" (Aspectos jurídicos do exercício do poder de sanção por órgão regulador do setor de Biblioteca Digital Fórum de Direito Público ­ Cópia da versão digital

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energia elétrica, op. cit., p. 361).   48

  "Nel quadro giuridico nell'ambito del quale oggi può muoversi agevolmente l'amministrazione pubblica nell'esercizio dei poteri che la legge le atribuisce, scegliendo ­ quase indifferentemente ­ tra i molteplici strumenti e modelli del diritto pubblico e privato, purché idonei a soddisfare le esigenze dell'interesse affidato alla sua cura, l'affermazione non appare affatto fuori luogo. Ma una visione complessiva del fenomeno impone di tenere sempre a mente la natura puramente strumentale dei modelli consensuali" (JAMBRENGHI, M. T. Paola Caputi.  Studi Sull'Autoritarietà nella Funzione Amministrativa. Milano: Giuffrè, 2005. p. 46).   49

  SUNDFELD, Carlos Ari. Meu depoimento e avaliação sobre a lei geral de telecomunicações. Revista de Direito do Estado, Rio de Janeiro, v. 3, jan./mar. 2008.   50

  SUNDFELD, Carlos Ari. Caso processo administrativo na Anatel. Material didático da Direito GV.

  51

  Por fechar postos de atendimento no Paraná, por exemplo, a Brasil Telecom foi multada em mais de R$700 mil.   52

  Informação disponível do site da Anatel: .

  53

  Conforme relato de Carlos Ari Sundfeld: "mas, com certeza, a mais grave negação da diretriz

legal de regulação leve está ligada à imposição de obrigações sem análise adequada do custo­ benefício. Dois casos são exemplares: a exigência de instalação, pelas concessionárias de postos de atendimento pessoal (PAP) em todas as localidades e, mais recentemente, dos chamados postos de serviços de telecom (PST). Foram decisões regulatórias geradoras de despesas altíssimas, cujos benefícios aos usuários são duvidosos (no caso dos PST) ou praticamente nulos (no dos PAP)" (Op. cit., p. 13).  

Como citar este conteúdo na versão digital: Conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto científico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma:

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PALMA, Juliana Bonacorsi de. Processo regulatório sancionador e consensualidade: análise do acordo substitutivo no âmbito da Anatel. Revista de Direito de Informática e Telecomunicações ­ RDIT,   B e l o   H o r i z o n t e ,   a n o   5 ,   n .   8 ,   j a n . / j u n .   2 0 1 0 .   D i s p o n í v e l   e m : . Acesso em: 24 set. 2015.

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