PROCESSO X IDEOLOGIA: UM ENSAIO SOBRE OS COMPROMISSOS IDEOLÓGICOS DO DIREITO PROCESSUAL CIVIL; EM MEMÓRIA DE OVÍDIO A. BAPTISTA DA SILVA

June 5, 2017 | Autor: Mateus Pereira | Categoria: Direito Processual Civil, Ideologia, Ordinariedade, Ovídio A. Baptista da Silva
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Processo x Ideologia: um ensaio sobre os compromissos ideológicos do direito processual civil; em memória de Ovídio A. Baptista da Silva

PROCESSO X IDEOLOGIA: UM ENSAIO SOBRE OS COMPROMISSOS IDEOLÓGICOS DO DIREITO PROCESSUAL CIVIL; EM MEMÓRIA DE OVÍDIO A. BAPTISTA DA SILVA Process x Ideology: reflecting some ideological aspects of civil procedure; a tribute to Ovídio A. Baptista da Silva Revista de Processo | vol. 246/2015 | p. 581 - 603 | Ago / 2015 DTR\2015\13232 Ivna Cavalcanti Feliciano Mestranda em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco (Unicap). Diretora da Associação Pernambucana de Pós-graduandos em Direito (Appodi; 2014-2015). Oficiala de Justiça. [email protected] Larissa Pinheiro Pós-graduanda em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (Ibet). Advogada. [email protected] Mateus Costa Pereira Mestre em Teoria do Processo e Direito Processual pela Universidade Católica de Pernambuco (Unicap). Membro da Associação Norte Nordeste de Professores de Processo (Annep). Advogado. [email protected] Área do Direito: Processual Resumo: Este trabalho foi escrito como uma singela homenagem póstuma a Ovídio A. Baptista da Silva; nele, abordamos algumas de suas críticas ao direito processual civil, desde a influência do paradigma racionalista, e que, no âmbito do processo podem ser sintetizadas na expressão ordinariedade. Ordinariedade, que não como um adjetivo de um determinado procedimento comum, senão como o símbolo dos compromissos ideológicos do direito processual civil com a modernidade. Palavras-chave: Ideologia - Processo civil - Ordinariedade. Abstract: Based on the work of Ovídio A. Baptista da Silva, this paper reflects the ideological influence in brazilian civil procedural. It was written as a post-mortem homage, considering he was one of the main brazilian researchers committed to demonstrate in which ways our civil procedural has the same scientific understanding of the seventeenth and eighteenth century, called as the rationalist paradigm. Keywords: Ideology - Civil procedural - "Ordinariedade". Sumário: - 1.Introdução: conhecimento jurídico e ideologia(s) - 2.Racionalismo epistemológico: o paradigma da ciência moderna - 3.Sobre o procedimento comum ordinário ou da ordinariedade do processo de conhecimento - 4.Considerações finais - 5.Referências bibliográficas

Recebido em: 11.02.2015 Aprovado em: 27.07.2015 1. Introdução: conhecimento jurídico e ideologia(s) Em acepção larga e abrangente pode-se dizer que todas – ou quase todas – atividades ou expressões intelectuais recebem influxos ideológicos; em sentido estrito, todavia, somente são consideradas ideológicas as posturas comprometidas com o poder ou à sua luta.1 Este breve registro nos permite inferir que raras – ou mesmo raríssimas – são as posturas intelectuais indenes; e nem poderia ser diferente, uma vez que carregamos ideologias, ainda que inconscientemente. Se numa visão ampla, doravante adotada como premissa, a ideologia repercute no pensar, é no mínimo ingênuo acreditar que o direito, uma clara manifestação cultural, seja construído fora de ambiências ideológicas – e isso, por óbvio, sem negligenciar as relações do direito com oPágina poder 1

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[limitação ou (re) afirmação]; e, no nosso caso, sem descurar que a sociedade brasileira é formada por estamentos patrimoniais.2 Se todo e qualquer direito – mesmo a teoria pura, apogeu do formalismo na ciência jurídica3 – é reflexo de ideologia(s), diferente não poderá ser com qualquer um de seus ramos. Não há de se falar, pois, em neutralidade ou objetividade no conhecimento do direito; tampouco se deve censurar alguém pelo compromisso ideológico da obra,4 pois a ideologia, inevitavelmente, estará presente.5 Em todo caso, porém, são desejáveis posturas francas e conscientes. Migrando a uma linguagem gnosiológica, o sujeito não é mero observador, mas também um partícipe da realidade observável6 – dos litígios que compreende, por exemplo. Se sujeito e objeto são atravessados pela linguagem, a qual, inclusive, é a condição de possibilidade do conhecimento, no pós giro linguístico não há como se excluir o sujeito do processo de conhecimento.7 Na mesma perspectiva, rompe-se com a ideia de que o pensamento seria axiologicamente neutro, pois a linguagem não é pura forma. De tudo isso, resta saber qual é a ideologia predominante no pensamento científico, isto é, que se fez hegemônica e se constituiu num paradigma.8 Poucos são os autores que se preocupa(ra)m em enfrentar o tema, vale dizer, em empreender um recuo ao campo paradigmático para refletir os laços ocultos do direito; em meditar se a crise do direito – e do processo civil – estaria no seio de uma disciplina científica ou, em novo recuo, uma crise, no sentido de Kuhn, do próprio paradigma,9 não se prestando mais ao diálogo ou explicação dos fenômenos; que não sendo uma crise “intraparadigmática”, reclama a sua substituição. Entre nós, contamos com a valiosa contribuição de Ovídio A. Baptista da Silva; um jurista, hermeneuta, e não um dogmático do direito processual. Em perspectiva panóptica, a marca de sua obra é a reflexão sobre os ranços ideológicos – modernos – do direito e dos institutos processuais; a própria desconstrução do paradigma racionalista mediante a “alternativa” hermenêutica.10 Em todos os seus trabalhos é possível vislumbrar esta unidade – panóptica, insista-se –, malgrado a noção de unidade seja um refúgio do próprio paradigma racionalista.11 Assim, e na contracrítica, não é possível restringir sua contribuição a um determinado tema de processo civil, uma vez que, em verdade, isso apenas representaria a unificação daquilo que é diverso. 2. Racionalismo epistemológico: o paradigma da ciência moderna O termo racionalismo ostenta riqueza semântica própria da polissemia. Para garantir alguma dose de precisão e clareza nas ideias recorremos às suas possíveis variações; às suas adjetivações. Assim, é possível dissertar o racionalismo psicológico, um racionalismo epistemológico (também conhecido por gnosiológico) e, por último, um racionalismo metafísico. Delimitando o escopo deste trabalho, e na linha do pensamento ovidiano, a alusão ao racionalismo deve ser situada no viés epistemológico. O racionalismo epistemológico decorreu de uma gradual “evolução” do pensamento científico, embebido por concepções filosóficas que têm sua verve em Descartes, Leibniz e outros teóricos alinhados à “matematização” do conhecimento. Do ponto de vista historiográfico, contudo, aponta-se a sua efervescência na modernidade, isto é, com a dessacralização do pensamento encetada pelo Renascimento e consolidada ao advento do Iluminismo, (re)descobrindo-se a razão.12 Desde então, difundiu-se a crença de que a razão seria a origem de todo o conhecimento verdadeiro tendo, pois, na teoria do conhecimento, seu contraponto no empirismo.13 Dentre outros reflexos, o racionalismo trouxe consigo o ideal sistemático e a universalidade do saber, apanágios que se tornaram indispensáveis ao conhecimento dito científico.14 Na linha da historicidade, Kant pode ser referido como o grande responsável em difundir o ideal sistemático, quando elevou a unidade sistemática a um imperativo científico de todo e qualquer conhecimento.15 Desde então, o conhecimento advindo da experiência seria, duplamente, repudiado: primeiramente, porque elementos empíricos poderiam comprometer a unidade estabelecida em abstrato; em segundo lugar, por se acreditar que a experiência somente fornecia o contingencial, jamais o conhecimento universal (atemporal e sem limites geográficos). Foi a época de eclosão da perspectiva formalista, associada à pretensão de objetividade do conhecimento; à “matematização” do saber (validez lógica); e que foi impostada nas ciências, principalmente, pelo peso da obra kantiana. Como sói acontecer, a perspectiva formalista se espraiou pelas ciências humanas. No direito, o apelo sistemático e a busca da universalidade – a própria neutralidade do saber – foram Página 2

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“viabilizados” pela acentuada valorização de seu elemento formal; para alguns, inclusive, mediante a redução do fenômeno jurídico às formas, à dimensão analítica.16 Neste orbe, a pretensão de objetivismo subjacente na doutrina kelseniana17 é reconhecida como um dos mais notáveis esforços em conquistar a dignidade científica ao direito – a despeito de também se constatar a pretensão de objetividade em autores que lhe precederam18 –, donde resultou sua pouca utilidade.19 No ensejo, mesmo no formalismo não podemos deixar de registrar uma ambiência ideológica. No diálogo com Nelson Saldanha, destaca-se o legado do liberalismo político, não mais como vigência política, senão como ambiência político cultural.20 Está fora de nossos propósitos desnudar as raízes do paradigma racionalista, o que já vimos realizando noutras oportunidades.21 Após esta exposição introdutória da gênese das ideias que foram alvo da censura ovidiana – das teorias e doutrinas que repercutiram na construção da dogmática jurídica e dos institutos fundamentais do direito processual –, adotando o procedimento comum ordinário como fio condutor, desenvolveremos a crítica da ordinariedade. A ordinariedade, tão combatida pelo homenageado, sobre ser a marca do rito que a consagra em seu nome, não é uma característica exclusiva dele. Consoante será demonstrado, na obra de Ovídio A. Baptista Silva a ordinariedade é o sintoma do racionalismo epistemológico no processo civil. 3. Sobre o procedimento comum ordinário ou da ordinariedade do processo de conhecimento 3.1 Da (im)possibilidade de interpretação no direito à declaração da vontade unívoca da lei Imerso no racionalismo epistemológico, o pensamento jurídico moderno partiu da razão como meio privilegiado ao conhecimento; a mesma razão que levaria ao conhecimento das verdades absolutas (universais), motivou a aspiração de certeza no conhecimento jurídico – certeza que, no particular, pode ser entendida como previsibilidade e que, mais uma vez, associa-se ao ideal de objetividade no conhecimento em geral. Esta crença – que se pode dizer metafísica – foi impostada no direito processual, dentre outros, por Chiovenda, notadamente, em sua defesa acerca da natureza declaratória da jurisdição, idealizada à aplicação da vontade concreta – e unívoca – da lei.22 Para tanto, pressupunha-se uma atividade meramente avalorativa do magistrado, descritiva da realidade, sucedida por uma aplicação mecânica de um direito já existente (direito = lei). Na doutrina do processualista italiano, o direito preexiste ao processo, daí a natureza declarativa. Para tanto, na censura de Ovídio Baptista da Silva, deve-se assumir que o legislador consiga antever todas as possibilidades de fatos ocorrentes na sociedade; antes mesmo de ser uma pessoa “iluminada”, o legislador precisaria ser um super-homem.23 Como será visto adiante, o procedimento ordinário é o instrumento privilegiado à sua identificação, sendo refratário a qualquer atividade interpretativa (= subjetividade). A (im)possibilidade de interpretação no direito é uma questão antiga e que, em tese, está superada no debate jurídico;24 é um tema associado à pretensão de controle da atividade jurisdicional, e que teve centralidade na ambiência francesa do séc. XIX. Não convindo analisá-la em profundidade, registremos, na linha da historicidade, que esta foi a principal bandeira da Escola da Exegese; seus defensores rechaçavam a interpretação, pois aos magistrados não competia elaborar o direito – lembrando que ele estaria contido nas leis, nos códigos.25 À guisa de ilustração, e no afã de escancarar sua roupagem ideológica, para Robespierre, um dos maiores nomes da Revolução, o termo “jurisprudência” deveria ser “banido” da língua francesa, já que num “Estado que tem Constituição e legislação, a jurisprudência dos tribunais não pode ser outra coisa senão, a própria lei”.26 No ensejo, numa zona em que não é possível determinar o vínculo ideológico, se amplo ou restrito, à época alguns procedimentalistas franceses negaram autonomia ao “julgar”, pois que se limitando à aplicação – silogística27 – da lei, a atividade corresponderia a uma manifestação do próprio Executivo;28 “sem” o mesmo radicalismo, isto é, “sem” negar a existência do Judiciário, esta seria a única forma de não haver ingerência de um segmento do poder no outro.29 Tributários da ideologia mencionada, ainda que inconscientemente – paradigma… – os teóricos do processo criaram um procedimento à prova de juízes; um procedimento que, em discurso sedutor, asseguraria a previsibilidade e a certeza no direito,30 dado que caracterizado por uma longa e profunda investigação dos fatos à posterior descoberta da vontade da lei (cognição exauriente); lei que fora unificada em códigos; códigos que poderiam ser conhecidos por todos.31 Daí porque, insistimos, os togados deveriam se limitar à “missão de estabelecer os fatos pelos quais decorrem as Página 3

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consequências jurídicas”.32 Coerente, nosso legislador reafirmou suas preferências ideológicas ao elevar o efeito suspensivo à condição de regra na apelação;33 ao tribunal caberia corrigir eventual distanciamento da vontade da lei. Mesmo imbuído de forte apelo científico, é preciso alguma dose de ingenuidade para defender o contrário.34 A construção de um procedimento em abstrato, por suposto, dissociado de qualquer elemento empírico,35 cai no mesmo inconveniente denunciado pela doutrina, de se estudar os conceitos (jurisdição, ação, defesa etc.) – conceitos que se relacionam a uma “forma” de Estado – fora de um contexto histórico,36 divorciados da historicidade. Ovídio também denunciava isto ao defender que o papel da doutrina é o de doutrinar, e não o de se tornar refém da dogmática ou subserviente ao legislador.37 3.2 O contraditório prévio e a (im)possibilidade de criação do direito A doutrina reconhece três técnicas distintas de contraditório: prévio, eventual e postergado (diferido). O contraditório prévio é a marca do procedimento ordinário, seu sentinela avançado;38 quanto a ele iremos nos deter mais adiante. O contraditório é diferido ou postergado nas situações em que há provimentos liminares, isto é, quando o magistrado é provocado a decidir – provisoriamente – sobre o mérito da causa, antes mesmo do réu tomar ciência da demanda; é a situação de toda antecipação de tutela, independente de sua natureza, cuja urgência impeça a oitiva da parte adversa. Sobre o contraditório eventual, trata-se de técnica utilizada no procedimento da execução e na ação monitória;39 nestas ações o ônus de instaurar a discussão e a investigação quanto à (in)existência do direito afirmado em juízo depende da iniciativa do demandado/executado, cabendo a ele promover uma demanda para tanto, o que realiza por meio da impugnação ou dos embargos (à execução ou monitórios).40 Entendido como a bilateralidade da audiência, não há qualquer dificuldade em visualizar as técnicas do contraditório prévio e do diferido. No primeiro caso, a bilateralidade se impõe antes de qualquer decisão. Ao passo que no segundo, a oitiva do demandado é postergada para um segundo momento, isto é, após o magistrado se pronunciar sobre a pretensão de uma das partes. A construção de procedimentos de acordo com as diferentes técnicas encimadas é fruto de concepções teóricas encampadas pelo legislador; concepções que, inevitavelmente, têm laços ideológicos. É o que sucedeu com o procedimento comum ordinário.41 Um rápido olhar pelo Código Buzaid denota que o rito ordinário foi alçado à regra; é o procedimento mais completo, dotado de uma ampla cadeia de atos processuais; nele a cognição não tem limites; o já referido exercício prévio do contraditório etc.42 Não por outro motivo, tem aplicação subsidiária aos demais procedimentos (art. 272 do CPC);43 um processo-tipo.44 No escólio de Ovídio Baptista da Silva é possível apontar diferentes razões – crenças – pelas quais esse procedimento foi elevado a patamar de destaque pelo legislador, a saber: univocidade de sentido da lei; verdade real; arquétipo procedimental etc.45 Todas elas com raízes no pensamento jurídico moderno, na formalização do pensamento (conhecimento), concorrentes à instituição de um procedimento à prova de juízes, isto é, que impedisse a criação do direito46 e, pois, concretizasse a segurança jurídica (previsibilidade).47 Como visto, a preocupação em controlar a atividade jurisdicional teve motivação em fatores de duas ordens: num sentido estrito de ideologia, suficiente remontar à França na ambiência de eclosão da revolução, as diferentes atrocidades praticadas pela magistratura da época, cujos integrantes eram oriundos da nobreza, o que resultou, no pós revolução, na preocupação burguesa em esvaziar os poderes da toga;48 em sentido lato, uma motivação de cariz positivista consistente na busca pela dignidade científica do direito, “viabilizada” pelas lentes da objetividade – a interpretação era encarada como o momento supremo de subjetividade do julgador.49 A configuração do contraditório prévio como regra, no procedimento que também foi elevado à regra – do processo de conhecimento, regra (!) diante da (in)compreensão das cautelares e das restrições à tutela executiva – é sintomática destas assertivas. Supõe-se que o magistrado somente estaria habilitado a pronunciar as palavras da lei – em tempo, a lição de Montesquieu –, após a superação de todas as etapas da cadeia procedimental; só então seria possível declarar o direito calcado numa aplicação “acertada” da lei, isto é, fiel à sua vontade, de modo a não ocorrer uma ingerência do Judiciário na obra “perfeita e acabada” do Legislativo.50 Com alguma clareza, pretendia-sePágina abafar 4

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qualquer espaço para a hermenêutica, negando-se o elemento criativo que hoje é considerado inerente à jurisdição. Com um claro hiperdimensionamento pelo legislador, dado que rompeu com a tradição brasileira e “universal” seguida por outras codificações em estabelecer prescrições de caráter genérico num livro inicial – razão pela qual há, nele, inúmeros dispositivos que não se vinculam especificamente –,51 o processo de conhecimento tem seu “carro chefe” no rito comum ordinário, haja vista ter sido modelado à tutela da maior parte das situações jurídicas (procedimento universal). Foi considerado o arquétipo dos procedimentos civis52 a partir da eliminação de seu horizonte conceitual das “formas de contraditório diferido e, especialmente, de contraditório eventual, para consagrar o contraditório prévio, como única forma legítima de contraditório”.53 Os compromissos do legislador são inquestionáveis; sua escolha tomou em consideração um rito com ampla cadeia de atos processuais, no qual a sentença constituiria a única oportunidade de incursão sobre o mérito – as demais decisões ao longo do iter são consideradas interlocutórias,54 tendo por objeto as questões incidentais. Em outras palavras, só haveria julgamento propriamente dito ao seu final, o que se erigia em garantia contra os magistrados; os juízes somente declaravam a lei após a descoberta dos fatos, assegurando-se a aplicação mecânica. A noção de objetividade pretendia asfixiar as possibilidades interpretativas.55 O mito da ordinariedade impede a ocorrência de julgamentos, salvo na oportunidade do provimento final; assim, a sentença era o ato que colocava termo ao processo; daí a ideia de que haveria uma única sentença por processo. O paradigma impôs que “julgar”, sob o signo da provisoriedade, não seria julgar; a ideologia não se concilia com os juízos provisórios, já que, supostamente, descambariam em discricionariedade56 ou mesmo liberalidade do juiz; os juízes eram reduzidos à função de oráculo.57 É por esses motivos que a doutrina encara a tutela antecipada como uma técnica processual que adianta os “efeitos da sentença”, ainda que, paradoxalmente, seja concebida por meio de uma decisão interlocutória.58 O sistema inadmite a real possibilidade de convencimento do magistrado fundado em verossimilhança. O desprestígio dos juízos de verossimilhança impede uma adequada redistribuição do ônus do tempo dentre as partes, sobrecarregando o autor.59 Voltaremos ao ponto noutro momento. 3.3 Um procedimento baseado na igualdade formal; um rito na contramão da instrumentalidade O procedimento ordinário tem a igualdade formal por premissa; numa preocupação de pureza, distanciamento da empiria, dele é afastada qualquer possibilidade de intervenção jurisdicional no tecido social (plano da vida); uma preocupação – que também é de índole científica – em evitar que na ação de conhecimento houvesse a realização de atos executivos; que em execução houvesse espaço à prática de atos cognitivos.60 Foi um rito idealizado para produzir resultados apenas no mundo normativo, o que se constata em suas “três ações”.61 Não por outro motivo, passou a ser conhecido como um “processo de sentença”, o que rendeu, na expressão popular, o “ganha, mas não leva”; e não “levava” o bem da vida certificado em sentença porque, com o trânsito em julgado, ainda seria necessária a propositura de um novo processo, desta feita, destinado à realização da “vontade de lei” consubstanciada no título executivo – o conhecido ocaso das sentenças condenatórias.62 A noção formal de igualdade que enfeixa o procedimento comum ordinário pode ser visualizada na posição ocupada – leia-se, pressuposta – dentre os sujeitos processuais parciais: o legislador partiu da premissa de que existiria um equilíbrio material dentre as partes, algo que, em verdade, privilegia o demandado.63 Inclusive, esta problemática – compromisso ideológico – foi camuflada no conceito processual de parte difundido pela doutrina. Assim, aprendemos – e, acriticamente, ensinamos… – que o autor é aquele que pede, ao passo que o réu, em nome de quem se pede.64 No ensejo, a proposta de Ítalo Andolina quanto à configuração de um “dano marginal” deve ser compreendida na necessária superação desse conceito formal de parte; outrossim, na própria reflexão sobre a noção de igualdade subjacente ao rito comum ordinário.65 No diálogo com Ovídio, a análise da igualdade no procedimento comum ordinário também deve ser perspectivada na linha do devido processo legal do autor, e não apenas do réu.66 Por outro lado, após os ventos da instrumentalidade causa espécie que o procedimento ordinário Página 5

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continue ocupando um patamar de absoluto destaque, isto é, que a ele ainda seja confiada a missão de tutelar a maior gama de direitos; que seja utilizado como parâmetro à construção dos demais procedimentos. Nitidamente, no ideal de universalidade e perfeição,67 este procedimento teve de se distanciar das situações jurídicas, tornando-se impermeável aos objetivos jurídico-substanciais próprios ao trato dos diferentes objetos – ideia síntese da instrumentalidade.68 Sem embargo, o que fez o nosso legislador reformista? Será que a generalização da “antecipação dos efeitos da tutela” foi suficiente para romper com esse emblema da ordinariedade? 3.4 A generalização da tutela antecipada satisfativa: um atentado à ordinariedade? No início da década de 90 teve início o primeiro grande movimento de reforma do Código de Processo Civil, editando-se um pacote de leis à promoção de mudanças setoriais em nossa codificação. Naquilo de interesse aos nossos propósitos, foi aprovada a Lei 8.952/1994, a qual, alterando a redação do art. 273 do CPC, generalizou a tutela antecipada satisfativa.69 Esta mudança legislativa é fruto de uma crítica de Ovídio A. Baptista da Silva em congresso realizado no Rio Grande do Sul com um decênio de antecedência. Naquela ocasião, o professor gaúcho sugeriu a introdução de um parágrafo único ao art. 285 do CPC, contendo a seguinte redação: “Parágrafo único. Sempre que o juiz, pelo exame preliminar dos fundamentos da demanda e pelas provas constantes da inicial, convencer-se da plausibilidade do direito invocado, poderá conceder medida liminar antecipando os efeitos da sentença de mérito, se a natureza de tais eficácias não for incompatível com tal providência”. Em parte seguindo a proposta original; em parte divergindo naquilo que, em verdade, pareceu-nos uma involução; o legislador rompeu com o confinamento da antecipação de tutela a alguns procedimentos determinados (ex. possessórias; mandado de segurança etc.) e, em vez de introduzir um parágrafo único no art. 285, modificou a redação do art. 273.70 Para Ovídio a decisão que antecipa a tutela seria uma sentença liminar, pois nela o magistrado decide sobre a lide, e não sobre questões processuais. Não foi, todavia, o que entendeu a doutrina brasileira tão logo a modificação entrou em vigor – tudo por força das concepções teóricas, e ideológicas, dominantes. Sendo decisão de natureza processual, a despeito de remexer com seus fundamentos – mormente a técnica do contraditório prévio –, nem mesmo a introdução das liminares no processo de conhecimento teve o condão de afastá-lo da ordinariedade.71 O processualista gaúcho entendia que a tutela antecipada conflitava com os pilares de nosso código. Mas parte da doutrina, fiel à ideologia que inspirou a codificação, teima em “não” compreender o instituto. Talvez isso explique o porquê de, muito embora tenha sido seu idealizador, Ovídio não ter dedicado tantos trabalhos sobre o tema, concentrando seus esforços, por outro lado, no aperfeiçoamento da tutela cautelar. Malgrado seja antagônica à noção de contraditório prévio, cediço que, na prática, ainda paira um preconceito sobre decisões pautadas em verossimilhança, pois que, como visto, o sistema pressupõe a certeza das matemáticas72 – um dos motivos da incipiência das cautelares;73 outrossim, ainda não houve um adequado enfrentamento do fator temporal no processo,74 havendo quem sustente, por exemplo, que a ênfase de estudos e trabalhos no instituto em questão seria um sintoma da crise de (in)efetividade de nosso sistema.75 A mesma doutrina que se esmerou em desenvolver o estudo das tutelas de urgência, não se preocupou em meditar a própria urgência de tutela do homem moderno.76 Andando em círculos, o sistema é continuamente remendado por uma “produção exegética de valor, porém apenas exegética”.77 Na redação do art. 273, a subordinação da tutela antecipada à “prova inequívoca” (art. 273, caput), somada à demonstração do “perigo da demora” (art. 273, I), e à inexistência de “irreversibilidade do procedimento” (art. 273, § 2.º) – muito embora sejam conhecidos todos os esforços doutrinários à compreensão e, não raro ao próprio abrandamento destas expressões78 –, foi a forma encontrada pelo legislador de generalizar a tutela antecipada satisfativa, sem que os alicerces do sistema tivessem de ser revisados. Para que seja antecipada a “vontade da lei”, forçando a jurisdição a romper a “inércia” do procedimento comum ordinário, é necessário que o autor supere os obstáculos (“requisitos”) instituídos em lei. A técnica da antecipação caiu nas amarras ideológicas do código, dificultando a superação da igualdade formal para a assunção de um equilíbrio dentre as partes contrapostas; a perplexidade é ainda maior se confrontada com a interditalidade das ações Página 6

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possessórias de “força nova”, em que o legislador, fazendo “concessões” à ordinariedade, nem mesmo exigiu a comprovação do perigo.79 Para o homenageado, a antecipação da tutela propiciaria um modo alternativo de utilização do procedimento ordinário, mediante a outorga de poderes aos magistrados à realização de verdadeiros julgamentos liminares.80 Contudo, não foi o que prevaleceu. A par dos itens anteriores, remetemos o leitor à redação por ele sugerida, e não acatada. 4. Considerações finais Em acepção larga ou abrangente, vimos que a ideologia está presente nas manifestações intelectuais e, pois, em objetos culturais. Superado o ideário por direitos que não seriam fruto da criação humana, não há como conceber o direito desvencilhado de cargas ideológicas; em recuo, algo que também alcança o pensamento daqueles que, imbuídos da pretensão de objetividade, teimam em reduzir o fenômeno jurídico à dimensão formal. Com origem remota na modernidade, nomeadamente, no racionalismo epistemológico, segundo Ovídio A. Baptista da Silva a ordinariedade é o rastro ideológico da modernidade no direito processual civil brasileiro; foi na ordinariedade que Ovídio encontrou a fonte inesgotável de suas inquietações, refletindo o compromisso (in)consciente do legislador e da doutrina brasileira a esta ideologia. Mas a ordinariedade não se confunde ao procedimento comum ordinário. Posto que este procedimento seja um emblema, a ordinariedade repercutiu nos pilares de nossa codificação processual, os quais, dentre outros, estão comprometidos com a limitação do poder dos juízes e a desvalia de decisões pautadas em verossimilhança; tudo no afã de sufocar a interpretação. Neste trabalho, tendo adotado o rito comum ordinário como fio condutor, demonstramos que a preferência legislativa por um procedimento longo, pautado em cognição exauriente e informado pelo contraditório prévio – que pressupõe a igualdade formal dentre as partes –, mas que é destinado à tutela da ampla maioria das situações jurídicas, descende da ideia de univocidade de sentido da lei e, em última instância, do apelo científico de objetividade no direito. Mas a ordinariedade – leia-se, a bandeira do paradigma racionalista no direito processual civil – não permite que larga parcela da doutrina perceba esses laços ideológicos, mesmo se tomarmos o procedimento comum ordinário como referência, e mesmo após os ventos da instrumentalidade. Incansável, o Ovídio conclamava a doutrina a despertar do “sonho racionalista”, demonstrando que nele existe intenso componente autoritário; ilustrava com a busca da univocidade de sentido da lei, a qual enfeixa o processo de conhecimento ordinário, constituindo um dos alicerces de nosso sistema recursal. A obra do homenageado expressa a luta perene em conscientizar e libertar o direito dos grilhões racionalistas, ciente, no entanto, que “o processo ainda não descobriu um sistema imune a inconvenientes”.81 Ovídio A. Baptista da Silva sempre buscou oferecer soluções aos problemas que suscitou. Todavia, como não poderia deixar de ser, as soluções que preconizava não eram exegéticas; combatendo o dogmatismo matematizante, suas críticas/sugestões preparavam o terreno às mudanças, o que nem sempre foi compreendido… 5. Referências bibliográficas ANDOLINA, Italo. “Cognición” y “Ejecución Forzada” en el Sistema de la Tutela Jurisdiccional. Trad. Juan José Monroy Palacios. Lima: Communitas, 2008. AROCA, Juan Montero. El derecho procesal en el siglo xx. Valência(Esp): Tirant lo Blanch, 2000. BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Estudos sobre o novo Código de Processo Civil. Rio de Janeiro, 1974. BOBBIO, Norberto. O positivismo jurídico: lições de filosofia do direito. Trad. Márcio Pugliesi, Edson Bini e Carlos E. Rodrigues. São Paulo: Ícone, 1995. CAMBI, Eduardo. Neoconstitucionalismo e neoprocessualismo: direitos fundamentais, políticas públicas e protagonismo Judiciário. São Paulo: Ed. RT, 2010. Página 7

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______. Ordem e hermenêutica. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. ______. Teoria do direito e crítica histórica. Rio de Janeiro: Freitas Bastos Ed., 1987.

1 SALDANHA, Nelson. Da teologia à metodologia: secularização e crise no pensamento jurídico. Belo Horizonte: Del Rey, 1993. p. 81. 2 Sobre o tema, indispensável a consulta da obra de FAORO, Raymundo. Os donos do poder: formação do patronato político brasileiro. 3. ed. Porto Alegre: Globo, 1976. vol. 1 e 2. 3 HESPANHA, António Manuel. Cultura jurídica europeia: síntese de um milênio. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2005. p. 435-437. 4 Veja-se a censura de Ovídio ao pensamento de Fukuyama. SILVA, Ovídio A. Baptista da. Processo e ideologia: o paradigma racionalista. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 9. 5 “(…). É algo patente que em qualquer sociedade organizada o tipo do direito existente se relaciona com um determinado tipo de poder e com um tipo de ética, ou seja: com uma ordem política (instituições e processos) e com um conjunto de princípios ou valores justificados” (SALDANHA, Nelson. Teoria do direito e crítica histórica. Rio de Janeiro: Freitas Bastos Ed., 1987. p. 40). 6 No mesmo sentido, porém analisando a questão sob o enfoque sociológico, permita-se o excerto de Pinto Ferreira: “A posição social do observador, participante da realidade social, é de uma atuação extraordinária. As categorias ideológicas, as formas de pensamento, as ideias ou educação do homem de um estilo social determinado, ou de um stratum social, variam de acordo com a sua posição na classe social. O observador participante perturba o conhecimento neutral da realidade no próprio fato da observação, em vista da atuação das categorias sociais que a priori se estruturam em seu mecanismo mental” (PINTO, Ferreira. Ideologia. In: FRANÇA, R. Limongi (coord.). Enciclopédia Saraiva do Direito. São Paulo: Saraiva, 1977. p. 128). 7 Essa tentativa de exclusão que afastou a filosofia da ciência, instituindo-se uma ciência que não poderia ser hermenêutica, pois que o sujeito, “ideal hermenêutico”, dela foi excluído. Quem explica essa relação da hermenêutica com a filosofia e a centralidade do sujeito é Nelson Saldanha. Filosofia, povos e ruínas: páginas para uma filosofia da história. Rio de Janeiro: Calibán, 2002. p. 55-60. 8 Acerca da noção de paradigma, cf. MORIN, Edgar. Introdução ao pensamento complexo. 4. ed. Porto Alegre: Sulina, 2011. p. 15. 9 Uma crise de degenerescência, e não uma crise de crescimento. No último caso, a crise formenta a revisão de conceitos, dada a sua inaplicabilidade. No primeiro, a crise leva à superação do próprio paradigma. KUHN, Thomas S. A estrutura das revoluções científicas. Trad. Beatriz Viana e Nelson Boeira. São Paulo: Perspectiva, 2007. p. 93 e ss. 10 Neste trabalho são analisados diferentes artigos do Prof. Ovídio, todos citados ao longo do texto; em todos, a marca da crítica ao paradigma, a denúncia aos compromissos ideológicos do legislador e da doutrina. Todavia, decerto que merece destaque a obra “Processo e Ideologia”, a qual, a nosso ver, reúne seus mais importantes trabalhos em censura ao racionalismo. 11 Sobre o tema da unidade, da simplificação, em correlação ao paradigma, cf. MORIN, Edgar. O método 1: a natureza da natureza. 3. ed. Trad. Juremir Machado da Silva. Porto Alegre: Sulina, 2005. p. 126-127. 12 Sem negligenciar a crítica de Habermas quanto à restrição da modernidade ao período histórico mencionado. Daí porque usamos o termo “efervescência”, relacionando ao projeto iluminista. HABERMAS, Jürgen. Modernidad: un proyecto incompleto. Página 10

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13 FERRATER MORA, José. Dicionario de filosofia. 4. ed. Buenos Aires: Sudamericana, 1958. t. IV, p. 2442. Rigorosamente, a disputa quanto às origens do conhecimento data da filosofia antiga – figure-se como exemplo Epicuro (sensualista) e Platão (idealista). Na linha de historicidade é comum verificar uma acentuação oram dum ora doutro. 14 Não apenas do conhecimento apriorístico, dissociado da experiência, senão e, igualmente, a partir de um conhecimento empírico que, por suposto, mediante o esforço posterior do intelecto, poderia ser formalizado, tornando-se “universal” e atemporal. 15 KANT, Immanuel. Crítica da razão pura. 5. ed. Trad. Manuela Pinto dos Santos e Alexandre Alfradique Morujão. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2001. p. 657. 16 SALDANHA, Nelson. Ordem e hermenêutica. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 197-203. 17 SALDANHA, Nelson. Teoria do direito e crítica histórica. Rio de Janeiro: Freitas Bastos Ed., 1987. p. 77. Não confundamos métodos puramente formais com o reconhecimento de um sentido formal ou mesmo de elementos formais no direito. A mesma observação se vê em: SALDANHA, Nelson. Da teologia à metodologia: secularização e crise no pensamento jurídico. Belo Horizonte: Del Rey, 1993. p. 21. 18 Assim, Gerber, Max Seydel e Van Krieken. SALDANHA, Nelson. Teoria do direito e crítica histórica. Rio de Janeiro: Freitas Bastos Ed., 1987. p. 57. 19 Na crítica de Kaufmann, para quem, muito embora tenha fomentado a teoria do direito, a teoria pura quase não mereceu atenção do ponto de vista prático; em seu enfoque positivista lógico-normativo, desprendeu-se do real. KAUFMANN, Arthur. Introdução à Filosofia do Direito e à Teoria do Direito Contemporâneas. 2. ed. Trad. Marcos (trad.). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2009. p. 182. Na crítica de Nelson Saldanha: “(…). O balizamento oferecido pela teoria pura, do espaço epistemológico correspondente à ciência do direito, significou um esforço altamente meritório, mas ao mesmo tempo uma atitude artificial e sempre discutível” (SALDANHA, Nelson. Teoria do direito e crítica histórica. Rio de Janeiro: Freitas Bastos Ed., 1987. p. 73-74). 20 SALDANHA, Nelson. Teoria do direito e crítica histórica. Rio de Janeiro: Freitas Bastos Ed., 1987. p. 58. 21 PEREIRA, Mateus Costa. O paradigma racionalista e sua repercussão no direito processual brasileiro (Dissertação de Mestrado). Recife: Universidade Católica de Pernambuco, 2009. 22 CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. Trad. J. Guimarães Menegale. São Paulo: Saraiva, 1943. vol. II, p. 11 e ss. Para uma concepção crítica: SILVA, Ovídio A. Baptista da. Sentença e coisa julgada. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 249-251. SILVA, Ovídio A. Baptista da; GOMES, Fábio Luiz. Teoria geral do processo civil. 5. ed. São Paulo: Ed. RT, 2010. p. 60. MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de processo civil: teoria geral do processo. 2. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Ed. RT, 2008. vol. 1, p. 35. 23 SILVA, Ovídio A. Baptista da. Processo e ideologia. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 24. 24 Por todos, ver SALDANHA, Nelson Nogueira. Ordem e hermenêutica. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. GOUVEIA, Lúcio Grassi de. Interpretação criativa e realização do direito. Recife: Bagaço, 2000. LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do direito. 3. ed. Trad. José Lamego. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1997. 25 SILVA, Ovídio A. Baptista. Jurisdição e execução na tradição romano-canônica. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 1997. p. 104. 26 CUNHA, Sérgio Sérvulo da. Introdução à edição brasileira. In: KELSEN, Hans. Jurisdição constitucional. 2. ed. Trad. Alexandre Krug. São Paulo: Martins Fontes Ed., 2007. 27 Cf. GOUVEIA, Lúcio Grassi de. Interpretação criativa e realização do direito. Recife: Bagaço, 2000.

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28 “El apoderamiento de la Justicia realizado por Napoléon, cuya expresión más clara fue la conversión de los jueces en funcionarios nombrados por el Poder Ejecutivo, resultó tan completa que hasta la doctrina se apresuró a justificarlo. Los procedimentalistas franceses partieron ya de negar la existencia del Poder Judicial, y así Garsonnet hablaba de dos poderes, el Legislativo y el Ejecutivo, mientras que el judicial entraba necesariamente en el segundo puesto que su función es sólo aplicar la ley” (AROCA, Juan Montero. El derecho procesal en el siglo xx. Valência(Esp): Tirant lo Blanch, 2000. p. 46-47). 29 É o que acentua Bobbio, comentando o pensamento de Montesquieu. BOBBIO, Norberto. O positivismo jurídico: lições de filosofia do direito. Trad. Márcio Pugliesi, Edson Bini e Carlos E. Rodrigues. São Paulo: Ícone, 1995. p. 40. Mas as aspas são necessárias, já que, no alerta de Ovídio, na teoria de Montequieu o Judiciário é concebido como um “poder nulo”. SILVA, Ovídio A. Baptista da; GOMES, Fábio Luiz. Teoria geral do processo civil. 5. ed. São Paulo: Ed. RT, 2010. p. 60. 30 PERELMAN, Chain. Lógica jurídica: nova retórica. Trad. Verginia K. Pupi. São Paulo: Martins Fontes Ed., 1998. p. 185. 31 HASSEMER, Winfried. Sistema jurídico e codificação: a vinculação do juiz à lei. Introdução à filosofia do direito e à teoria do direito contemporâneas. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2002. p. 282. 32 KRETSCHMANN, Ângela. História crítica do sistema jurídico: da prudência antiga à ciência moderna. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 178. 33 PEREIRA, Mateus Costa; RIBEIRO, Isabela Lessa de A. Pinto; AZEVEDO NETO, João Luiz Lessa de. Do efeito suspensivo no projeto do novo Código de Processo Civil: a (não) superação de um paradigma. In: DIDIER JR., Fredie; MOUTA, José Henrique; KLIPPEL, Rodrigo (orgs.). O projeto do novo Código de Processo Civil: estudos em homenagem ao Prof. José de Albuquerque Rocha. Salvador: JusPodivm, 2011. p. 153-182. 34 No escólio de Ovídio Baptista: “A ideia de que as instituições processuais – queremos referir-nos ao Processo de Conhecimento e ao cortejo conceitual que o sustenta – sejam neutras e livres de qualquer compromisso com a História e com o contexto cultural que as produziu é inteiramente falsa, mesmo tendo-se em vista a extrema formalização a que elas foram levadas pelo movimento responsável pela formação do ‘mundo jurídico’” (Jurisdição e execução na tradição romano-canônica. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 1997. p. 201). 35 No ensejo, o paradigma não permite que se reconheça a indissociabilidade dentre “questões” de fato e de direito, algo que, sobre ser insustentável, ainda hoje é defendido por alguns autores. 36 MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de processo civil: teoria geral do processo. 2. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Ed. RT, 2008. vol. 1, p. 9. 37 A atualidade do excerto impele a transcrição: “É uma circunstância que compõe nossa formação dogmática, que é também o resultado óbvio do normativismo, a conceber o processo civil sem passado e sem futuro, vivendo num eterno presente. É a concepção do direito processual como ciência constituída por normas, consequentemente desligada da história” (SILVA, Ovídio. A. Baptista da. Nota explicativa. Curso de processo civil. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008. vol. 1, t. I). 38 SILVA, Ovídio A. Baptista da. Processo e ideologia. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 151. 39 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de processo civil: procedimentos especiais. São Paulo: Ed. RT, 2009. vol. 5, p. 157. DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. Salvador: JusPodivm, 2010. vol. 5, p. 55. 40 FLACH, Daisson. A verossimilhança no processo civil e sua aplicação prática. São Paulo: Ed. RT, 2009. p. 80-84.

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41 MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica processual e tutela dos direitos. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 2008. p. 41 e ss. 42 FLACH, Daisson. Op. cit., p. 82. 43 Vale a crítica de José da Silva Pacheco acerca do anteprojeto: “A vala comum é o procedimento ordinário, que por ser o geral, passará, como ocorreu no passado, a predominar, a absorver e a impor-se, com toda a sua moleza. E tudo continuará na mesma: um belo Código e uma Justiça tarda, cara e enervante” (PACHECO, José da Silva. Evolução do processo civil brasileiro: desde as origens até o advento do novo milênio. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p. 270). 44 Neste sentido: MIRANDA, F. C. Pontes de. Comentários ao Código de Processo Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1979. t. III, p. 685. FIGUEIRA JR., Joel Dias. Comentários ao Código de Processo Civil: do processo de conhecimento, arts. 270-281. São Paulo: Ed. RT, 2007. vol. 4, t. I, p. 113-114. 45 SILVA, Ovídio A. Baptista da. Processo e ideologia. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 131 e ss. 46 CAMBI, Eduardo. Neoconstitucionalismo e neoprocessualismo: direitos fundamentais, políticas públicas e protagonismo Judiciário. São Paulo: Ed. RT, 2010. p. 80. 47 SILVA, Ovídio A. Baptista da. Sentença e coisa julgada. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 278-279. GÁLVEZ, Juan Monroy; PALACIOS, Juan Monroy. Del mito del proceso ordinario a la tutela diferenciada: apuntes iniciales. RePro, n. 109, ano 28, São Paulo, jan.-mar. 2003. p. 190. 48 DALLARI, Dalmo de Abreu. O poder dos juízes. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 15-16. 49 BOBBIO, Norberto. O positivismo jurídico: lições de filosofia do direito. Trad. Márcio Pugliesi, Edson Bini e Carlos E. Rodrigues. São Paulo: Ícone, 1995. p. 135. Cf. PERELMAN, Chaïn. Lógica jurídica: nova retórica. Trad. Vergínia K. Pupi. São Paulo: Martins Fontes Ed., 2004. p. 91. 50 Cf. SILVA, Ovídio A. Baptista da. Processo e ideologia: o paradigma racionalista. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. 51 Na precisa observação de Barbosa Moreira: “O legislador de 1973 adotou outra solução; preferiu, digamos assim, se me permitem uma expressão talvez não muito erudita, inflacionar o Livro dedicado ao processo de conhecimento, no qual se pode notar certa tendência imperialística a anexar matérias que não lhe pertencem com exclusividade. Daí o enorme vulto, as dimensões do Livro I, que abrange praticamente a metade dos dispositivos do no Código. Esse fenômeno se explica exatamente porque nele existem numerosas disposições que a rigor não estariam situadas com toda a propriedade no seu contexto, já que não lhe dizem respeito exclusivamente” (BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Estudos sobre o novo Código de Processo Civil. Rio de Janeiro, 1974. p. 50). 52 FAZZALARI, Elio. Instituições de direito processual civil. Trad. Elaine Nassif. Campinas: Bookseller, 2006. p. 159. 53 “Dissemos que o sistema “ordinarizou-se”, eliminando a possibilidade de que haja eventuais decisões de mérito em provimentos liminares. Com efeito, é essencial ao procedimento ordinário o contraditório prévio, segundo o qual o juiz somente poderá julgar depois de ter ouvido ambas as partes, porque somente assim estará habilitado a “descobrir a vontade da lei”, apreciando o meritum causae, o que pressuporia “cognição exauriente” dos fatos da lide” (SILVA, Ovídio A. Baptista da. Processo e ideologia: o paradigma racionalista. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 113). 54 MIRANDA, F. C. Pontes de. Comentários ao Código de Processo Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1979. t. III, p. 107-108; 55 SILVA, Ovídio A. Baptista da. Processo e ideologia. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 143.

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56 SILVA, Ovídio A. Baptista da. Sentença e coisa julgada. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 257. 57 Idem, p. 278-279. 58 SILVA, Ovídio A. Baptista da. Processo e ideologia. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 152-153. 59 Ovídio Baptista da Silva não economizaria na crítica: “(…). Considero que a introdução, no sistema legal brasileiro, do denominado Processo de Conhecimento, com todos os demais requintes técnicos que o enaltecem e que serão objeto de minha análise, é um dos fatores responsáveis pela lentidão exasperante da Justiça” (Da sentença liminar à nulidade da sentença. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 95). 60 Em sua redação original, o Código de Processo Civil foi idealizado de modo a coexistirem três compartimentos estanques: conhecimento, execução e cautelar; que, a rigor, não se intercambiavam à efetiva prestação da tutela (OLIVEIRA, Carlos A. Alvaro de; MITIDIERO, Daniel Francisco. Teoria geral do processo civil e parte geral do direito processual civil. São Paulo: Atlas, 2010. p. 107-109). 61 SILVA, Ovídio A. Baptista da. Jurisdição, direito material e processo. Rio de Janeiro: Forense, 2008. p. 167. 62 SILVA, Ovídio A. Baptista da. Da sentença liminar à nulidade da sentença. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 233-251. 63 Idem, p. 96-97. 64 Por todos, cf. CARNEIRO, Athos Gusmão. Intervenção de terceiros. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 4-5. 65 ANDOLINA, Italo. “Cognición” y “Ejecución Forzada” en el Sistema de la Tutela Jurisdiccional. Trad. Juan José Monroy Palacios. Lima: Communitas, 2008. p. 26 e ss. 66 “A questão para a qual desejo chamar a atenção do leitor define-se muito singelamente deste modo: – o ‘devido processo legal’ é um privilégio processual reconhecido apenas aos demandados? Ou, ao contrário, também os autores terão direito a um processo igualmente ‘devido’, capaz de assegurar-lhes a real e efetiva realização prática – não apenas teórica – de suas pretensões? Um processo capenga, interminável na sua exasperante morosidade, deve ser reconhecido como um ‘devido processo legal’, ao autor que somente depois de vários anos logre uma sentença favorável, enquanto se assegura ao réu, sem direito nem mesmo verossímil, que demanda em procedimento ordinário, o ‘devido processo legal’, com ‘plenitude de defesa’?” (SILVA, Ovídio A. Baptista da. Da sentença liminar à nulidade da sentença. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 113). 67 Idem, p. 125. 68 DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 76. 69 DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma do Código de Processo Civil. São Paulo: Malheiros, 1996. p. 140-141. 70 A própria aproximação dentre a tutela antecipada cautelar e a tutela antecipada satisfativa quanto ao “perigo da demora”, supostamente, uma exigência comum dentre elas, já denota a barafunda em que a doutrina incorre. Ovídio denuncia este problema em diferentes momentos de sua obra; oportuno a consulta de: Sentença e coisa julgada. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 275-276. 71 “Não sendo antecipação do mérito – porque, para a doutrina, se antecipa apenas juízo de probabilidade a respeito do mérito –, seriam, no entanto, os provimentos antecipatórios simples decisões interlocutórias? Sim, é a resposta que a doutrina nos dá, sob o pressuposto, por nós já

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indicado, de que o julgamento provisório não é verdadeiro julgamento. É frequente dizerem os juízes, quando concedem uma medida liminar, que ainda não está a decidir coisa alguma, já que, para nossa concepção de jurisdição, o juiz verdadeiramente nada decide, senão quando julga. Decidir, que é um ato ‘volitivo’, para nosso vocabulário, transformou-se em ato intelectivo. O juiz, em nosso sistema, não decide entre duas ou mais alternativas possíveis: decide quando encontra e proclama a ‘vontade (única) da lei’” (SILVA, Ovídio A. Baptista da. Sentença e coisa julgada. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 250). 72 SILVA, Ovídio A. Baptista. Jurisdição e execução na tradição romano-canônica. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 1997. p. 199. 73 Sobre ser o primeiro Código no mundo a disciplinar o processo cautelar em livro próprio (o Livro III que, segundo Barbosa Moreira, seria uma das partes mais felizes da legislação, cf. Estudos sobre o novo Código de Processo Civil. Rio de Janeiro, 1974. p. 26.), no que logrou nivelar a ação cautelar às ações de conhecimento e de execução (SILVA, Ovídio A. Baptista da. A ação cautelar inominada no direito brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 1979. p. 3), agrupando e sistematizando as disposições acerca das cautelares constantes do Código de Processo Civil de 1939, outrora “perdidas no oceano tormentoso dos processos acessórios” (BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Op. cit., p. 52), o legislador não reconheceu a autonomia das ações cautelares, antes consagrando sua acessoriedade no artigo que inaugura o Livro III (art. 796). Já nos debruçamos sobre o tema em outra oportunidade, para onde remetemos o leitor: PEREIRA, Mateus Costa. Da ainda incipiente autonomia das cautelares. RT 897/81-99, São Paulo, 2010. 74 “Este novo modelo foi introduzido no bolo de um modelo anacrônico de processo. Conservamos a estrutura de um processo baseado em juízos de certeza, em razão de desconfiarmos dos juízos de verossimilhança. Demos um passo à frente, introduzindo a tutela antecipada no processo de conhecimento. Todavia, dez passos foram dados para trás ao dificultarmos a concessão da medida; tudo isso face ao modelo ultrapassado de processo em que estamos inseridos” (SILVA, Jaqueline Mielke. Tutela de urgência: de Piero Calamandrei a Ovídio A. Baptista da Silva. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2009. p. 330). 75 “(…) a excessiva preocupação e interesse pelas chamadas tutelas de urgência denota exatamente o descompasso atual do sistema, porquanto tal tema, numa jurisdição eficiente e moderna, seria relegado a plano secundário, com raro interesse em casos esparsos, e não como ocorre atualmente, ungido a principal enfoque da doutrina, textos acadêmicos e cursos de extensão, pois o ideal seria a concessão da tutela jurisdicional ao final do processo, e não no início, em cognição sumária e muitas vezes com o contraditório postergado” (HOFFMAN, Paulo. Razoável duração do processo. São Paulo: Quartier Latin, 2006. p. 146). 76 SILVA, Ovídio A. Baptista da. Da sentença liminar à nulidade da sentença. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 224 e ss. 77 SILVA, Ovídio A. Baptista da. Processo e ideologia. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 216. 78 Por todos: MARINONI, Luiz Guilherme. A antecipação da tutela. 8. ed. rev. ampl. São Paulo: Malheiros, 2002. 79 SILVA, Ovídio A. Baptista da. Procedimentos especiais: exegese do Código de Processo Civil (arts. 890 a 981). Rio de Janeiro: Aide Ed., 1989. p. 224-225. 80 SILVA, Ovídio A. Baptista da. Processo e ideologia. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 215. 81 SILVA, Ovídio A. Baptista da. Processo e ideologia. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 34.

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