PROCESSOS DE INSERÇÃO PROFISSIONAL DE PROFESSORES INICIANTES NA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE CURITIBA

August 4, 2017 | Autor: Marilia Marques Mira | Categoria: SUPERVISÃO E FORMAÇÃO DE PROFESSORES, Professor Iniciante
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Desenvolvimento e avaliação de programas de inserção profissional para o professorado principiante INFORME DE INVESTIGAÇÃO

PROCESSOS DE INSERÇÃO PROFISSIONAL DE PROFESSORES INICIANTES NA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE CURITIBA MIRA, Marilia Marques [email protected] Secretaria Municipal de Educação – Curitiba/PR CARTAXO, Simone Regina Manosso [email protected] PUC-PR ROMANOWSKI, Joana Paulin [email protected] PUC-PR, UNINTER MARTINS, Pura Lucia [email protected] PUCPR. Palavras-chave: Professor iniciante - Processo de inserção profissional - Ensino Fundamental

INTRODUÇÃO Esse artigo tem o propósito de apresentar reflexões sobre os processos de inserção profissional de professores iniciantes na Rede Municipal de Ensino de Curitiba (RME). O estudo objetiva contribuir para uma análise desses processos, considerando a relevância de avaliá-los, na perspectiva de se instituir programas de inserção profissional que atendam efetivamente às necessidades formativas desses profissionais. Para sua realização, foram tomados como objeto de análise os processos de inserção atualmente existentes na RME, relacionados aos eventos de integração funcional, de formação em serviço e de avaliação do período de iniciação profissional (estágio probatório). Ainda, nesse processo, considera-se o papel dos pedagogos escolares, que podem ter uma atuação importante no âmbito da orientação e acompanhamento dos professores iniciantes, nos diferentes momentos formativos que ocorrem no interior das escolas. A análise desses processos foi efetivada com base nos estudos de Marcelo (1999; 2008; 2010), Romanowski (2012), Cunha (2012), Gatti (2012), Reali, Tancredi e Mizukami (2008), entre outros.

A REDE MUNICIPAL DE CURITIBA A RME de Curitiba iniciou suas atividades a partir de 1963, com a criação de uma escola situada em um dos bairros, na perspectiva da educação comunitária, entendida com a participação da comunidade próxima e com a oferta de atendimento em educação, serviço social, posto de saúde e biblioteca. A escolarização compreendia uma formação das crianças para o conhecimento, o trabalho e a convivência social. Durante as décadas seguintes, a rede expandiu-se, assumindo gradativamente a responsabilidade pela oferta de ensino dos cinco primeiros anos do ensino fundamental e a educação infantil. Em relação ao processo de ensino, busca constituir-se como proponente de propostas inovadoras, mas subordinada ao plano de governo de cada gestão municipal. Na atualidade compreende 184 escolas de ensino fundamental e 197 Centros Municipais de Educação Infantil, contando com 11.923 profissionais do magistério ativos. Desse total, mais de 50% professores (no registro profissional são denominados servidores) 6.045 foram nomeados a partir de 2004, ou seja, nos últimos dez anos. Nos últimos cinco anos, o percentual de profissionais nomeados chega a 22,79%, conforme explicitado Na figura abaixo.

PROFISSIONAIS DO MAGISTÉRIO

Cargo

Período/ano 1973-1978 1979-1983 1984-1988 1989-1993 1994-1998 1999-2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 TOTAL GERAL

Fonte: SMRH/SME (2013)

Nomeaçoes de profissionais 51 121 347 1764 1335 2260 743 342 1482 486 276 398 375 330 1297 316 11923

Percentual 0,43% 1,02% 2,91 14,80% 11,20% 18,96 6,23% 2,87 12,43% 4,08% 2,31% 3,34% 3,15% 2,77% 10,88% 2,65% 100%

Esses dados evidenciam que a maioria dos profissionais do magistério atuante nas escolas municipais tem menos de 10 anos de trabalho na RME, sendo significativo o percentual de ingressantes nos últimos três anos, o que implica em considerá-los como profissionais iniciantes na função docente, quadro semelhante ao quadro nacional em estudos realizados por Gatti e Barreto (2009). A quantidade de professores nomeados a cada período está relacionada com a própria expansão da rede, no bojo dos processos de democratização do ensino no país, a partir do final da década de 1980, bem como pelas políticas de municipalização do ensino fundamental. A municipalização integra a política de colaboração entre entes governamentais: federal, estadual e municipal, determinado pela Constituição de 1888, em que cabe à instância federal a educação superior e apoio os demais entes, à estadual o ensino médio e os anos finais do ensino fundamental e à municipal os anos iniciais do ensino fundamental e a educação infantil (Oliveira,1999). Assim, ampliou-se o número de escolas, visando ao atendimento da obrigatoriedade do ensino fundamental, a implantação dos ciclos de aprendizagem (a partir de 1999) e, mais recentemente, do ensino fundamental de 9 anos e da educação infantil, sendo necessária a contratação de mais profissionais. Destaca-se ainda que, desde 1985, com a aprovação do Estatuto do Magistério Público Municipal (Lei 6761/1985), os profissionais do magistério têm garantido 20% (vinte por cento) do total de horas de trabalho para estudos, planejamento e outras atividades inerentes à função docente. Em 2008, a Lei 11738 instituiu que “na composição da jornada de trabalho, observar-se-á o limite máximo de 2/3 (dois terços) da carga horária para o desempenho das atividades de interação com os educandos.” Ou seja, o terço restante destina-se a atividades de estudos, planejamento e avaliação. Dessa forma, para a RME de Curitiba, a implantação dessa legislação implicou na ampliação do percentual de permanência de 20% para 33% do total de horas letivas semanais, sendo necessária também a ampliação significativa do quadro de profissionais do magistério, a partir de 2012. É importante explicitar que, em 2013, mais de mil vagas ainda estão sendo cobertas por profissionais em Regime Integral de Trabalho (RIT), em vez de serem preenchidas por profissionais nomeados.1 Considerando o quadro exposto, observa-se que o número de professores que ingressam anualmente na RME é significativo, exigindo da SME a efetivação de processos de apoio institucional que auxiliem esses profissionais durante o período de inserção profissional. Toma-se aqui o conceito de inserção profissional como o período de tempo que envolve os primeiros anos de docência, quando os professores realizam o processo de transição de estudante para docente, conforme explicitado por Marcelo (1999; 2009). O mesmo autor destaca, ainda, que esse é um período de aprendizagens intensivas, mas também de muitas tensões e desafios, no qual os iniciantes precisam se apropriar dos conhecimentos profissionais necessários para o exercício da docência. A relevância de se pensar nos processos de inserção profissional e, mais especificamente, nos processos de formação continuada direcionados aos professores iniciantes relaciona-se, entre outras questões, às considerações apontadas por diversos 1

O profissional do magistério ingressa na RME via concurso público de provas e títulos, para uma jornada de 20 horas semanais. O desenvolvimento de seu trabalho numa jornada de 40 horas semanais pode ser feito por meio de outro concurso ou pela realização de Regime Integral de Trabalho (RIT).

autores (Gatti, 2012; Romanowski, 2012), quando afirmam que apenas a formação inicial nas licenciaturas – quer pelo aligeiramento do processo formativo, quer pelas formas de organização e práticas desarticuladas da escola básica – não tem preparado adequadamente os professores para as exigências e implicações do trabalho no contexto escolar. Da mesma forma, os estágios, constituindo-se de forma precária e/ou burocrática, também não vêm proporcionando o tempo necessário e as oportunidades adequadas de preparo para a inserção docente. Nessa perspectiva, muitos professores iniciantes enfrentam, no primeiro ano de docência, o “choque de realidade”, expressão cunhada por Veenman (apud MARCELO, 1999, p. 114), caracterizado pela necessidade de sobrevivência na profissão. As dificuldades enfrentadas nesse período têm sido apontadas por diferentes autores como o principal motivo do abandono da docência. É nessa direção, também, que Marcelo (2010, p. 28) destaca que o período de inserção profissional “tem um caráter distintivo e determinante para conseguir um desenvolvimento profissional coerente e evolutivo”. E aponta os programas de iniciação como o “elo imprescindível que deve unir a formação inicial ao desenvolvimento profissional ao longo da carreira docente” (idem, 1999, p. 119). CARACTERIZANDO OS PROCESSOS DE INSERÇÃO PROFISSIONAL NA RME A experiência das autoras como profissionais do magistério nesta RME permitiu fazer algumas inferências a respeito do processo de inserção profissional. Este processo inclui ações da Secretaria de Recursos Humanos e da Secretaria de Educação. Atualmente, ao ingressar na RME, todo profissional do magistério é chamado pela Secretaria de Recursos Humanos para participar do Programa de Admissão e Integração de Novos Agentes Públicos (Curitiba, 2010). Numa reunião denominada Integração Funcional, os professores ingressantes recebem informações sobre os principais programas e projetos da Prefeitura, o período de Estágio Probatório, benefícios e vantagens legais a que o servidor tem direito, previdência municipal, entre outras questões relacionadas à carreira no magistério público municipal. A partir da data de nomeação, o profissional inicia o período de estágio probatório. Esse período tem a duração de três anos e tem por objetivo “confirmar o servidor no cargo e aferir sua aptidão para o desempenho das atividades que lhe são pertinentes.”(Curitiba, 2010, p. 21). Em cada unidade em que há um ou mais professores iniciantes, é instituída uma Comissão de Avaliação de Estágio Probatório, que tem o papel de acompanhar e monitorar o desempenho desses professores no trabalho efetivo, avaliando-os quanto ao atendimento de requisitos como: conhecimento para o trabalho; pontualidade; assiduidade; iniciativa; flexibilidade; produtividade e qualidade no trabalho; disciplina; ética pública; cuidados com materiais equipamentos e ambientes; relacionamento interpessoal; capacidade física e mental para exercício do cargo. Essa avaliação acontece a cada seis meses, sendo registrada em ficha própria, assinada pelo professor e pelos demais membros da comissão. Ao final do processo, deve-se definir o resultado, que implica em considerar o professor apto (quando atende aos requisitos avaliados); atende parcialmente aos requisitos ou não apto (quando deve ser encaminhado para exoneração).

A avaliação do professor iniciante, efetivada durante o período de Estágio Probatório, constitui-se, na maioria das vezes, em mera formalidade burocrática, que não repercute efetivamente no sentido de se prever apoios institucionais aos profissionais que apresentam alguma dificuldade, apontada nessa avaliação. Em muitos dos casos vivenciados, as dificuldades – mesmo quando diagnosticadas – não são registradas pela comissão na ficha de avaliação do profissional, salvo situações mais graves de absenteísmo no trabalho ou problemas relacionados à capacidade física e mental. Ainda, se considerarmos os requisitos avaliados, pode-se verificar que se referem mais à assiduidade, cumprimento de normas institucionais e avaliação de desempenho. Esse processo é tomado de forma ampla e genérica, ou seja, não apresentam um detalhamento na perspectiva do estabelecimento de critérios de caráter qualitativo que possam contribuir para identificar necessidades de apoio institucional e para a formação para o professor iniciante. Após a Integração Funcional, os profissionais do magistério que irão trabalhar nas escolas de ensino fundamental participam de um curso para professores iniciantes na RME. Esse curso não tem uma carga horária fixa, pois depende do prazo estabelecido pela SME para o servidor assumir suas funções. Em média, tais cursos têm a duração de 12 a 20 horas, sendo desenvolvidos por equipes de diferentes departamentos da SME. Os conteúdos desse curso referem-se a questões relacionadas ao conhecimento da organização da RME (estrutura da SME e equipamentos), à organização do ensino em Ciclos de Aprendizagem e à Educação em Tempo Integral, Diretrizes Curriculares para a Educação Municipal, legislação educacional básica e informações sobre processos de inclusão escolar. Também são trabalhadas questões relacionadas às tecnologias educacionais, bem como informações sobre o acesso ao portal educacional da SME (www.cidadedoconhecimento.com.br) e os serviços ali disponíveis. Nos últimos anos foi possível observar que os cursos de formação para os professores iniciantes foram realizados de forma diversificada e, em alguns casos, a urgência da contratação dispensou a formação inicial ofertada pela RME. Este contexto indica que, embora algumas ações sejam realizadas para a inserção profissional destes professores, não há uma definição prévia do formato e dos conteúdos do curso ofertado aos iniciantes. Aliado à forma como ocorrem os demais processos de inserção profissional dos iniciantes (reunião de Integração Funcional e Avaliação do Estágio Probatório), pode-se inferir que essa formação vem possibilitando um primeiro contato com questões básicas relacionadas à organização dos processos de ensino na RME. Dessa forma, cabe refletir sobre em que medida tais cursos vêm conseguindo atender às complexas demandas exigidas no exercício da docência pelo professor iniciante. Pode-se acrescentar ainda que, em muitas redes de ensino, são destinadas aos professores iniciantes as turmas de estudantes com maiores dificuldades, ou seja, as turmas “sobrantes”, que não foram escolhidas por nenhum profissional mais experiente. Em relação ao exposto, Gatti (2012, n/p) destaca que esse profissional: [...] se defronta com uma situação complexa que integra objetivos a atingir, formas de comunicação didática com crianças e jovens, emoções e reações, alunos heterogêneos, com suas características individuais e socioculturais, os conteúdos disciplinares que tem que manejar e ajustar a um nível escolar determinado, à idade dos estudantes, o clima psico-

sociológico da escola, entre outros aspectos que estão presentes nas relações na educação escolar.

Os conteúdos trabalhados nesse curso inicial dificilmente permitiriam refletir sobre todas essas questões, muitas das quais os profissionais vão se apropriando – na dependência dos apoios que recebe – durante seu próprio processo de desenvolvimento profissional docente. Nessa direção, Reali et al (2008, p. 79) afirmam que uma das características da docência é que os processos de aprender a ensinar e a ser professor são contínuos e ocorrem ao longo da vida. As autoras argumentam “que é imprescindível o oferecimento de apoio para que esses profissionais possam continuar a aprender durante a carreira, desenvolvendo-se progressivamente.” Porém, destacam que as demandas de formação para profissionais iniciantes e mais experientes são diferenciadas. Nesse sentido, é importante analisar de que forma os processos de formação continuada em serviço vem se constituindo, especificamente em relação aos professores iniciantes na função. A SME oferta, anualmente, uma quantidade significativa de cursos aos seus profissionais. Assim, durante o período de estágio probatório e ao longo da carreira docente, os profissionais podem realizar diversos cursos, conforme a etapa de ensino em que atuam (educação infantil, ensino fundamental, educação de jovens e adultos), nos diferentes componentes curriculares. Após a última reorganização curricular (2006), foram elaborados Cadernos Pedagógicos pelas equipes técnicas da SME, com o objetivo de explicitar os fundamentos teórico-metodológicos de cada componente curricular, subsidiando os profissionais para o desenvolvimento do trabalho didático em sala de aula. Nesse período, foram desenvolvidos cursos específicos a partir desse material, para todos os professores da RME, conforme o ciclo em que atuavam. Esses cursos, nos últimos anos, foram direcionados aos professores iniciantes na RME (ou iniciantes na função). Paralelamente, outros cursos são ofertados, envolvendo temas e conteúdos diversos, nos diferentes componentes curriculares. Em algumas situações, explicita-se se o curso é voltado para o professor iniciante ou refere-se ao aprofundamento de determinados conteúdos, embora isso não seja a regra. Todos os cursos (e outros eventos formativos) ofertados aos profissionais da RME são divulgados no portal educacional da SME, com número de vagas indicado por turma/turno. Cada profissional pode acessar o portal e, de acordo com seu interesse e necessidade, proceder à inscrição no curso escolhido, desde que haja disponibilidade de vagas. Porém, a oferta desses cursos não vem acompanhada de um programa sistemático de acompanhamento e apoio, no sentido de se avaliar quais as dificuldades que os professores vêm enfrentando na implementação dos encaminhamentos didáticos discutidos durante a formação, muito menos sobre outras dificuldades vivenciadas no próprio exercício da docência. Ou seja, os encontros de formação desenvolvidos têm sua importância no sentido de propiciar as primeiras reflexões sobre os fundamentos teóricometodológicos de cada componente curricular, porém, há necessidade de se avaliar em que medida as formações atendem, efetivamente, às reais necessidades observadas na prática pedagógica. Além disso, a maioria dos cursos volta-se ao trabalho com os conteúdos curriculares. Entretanto, Marcelo (2010, p. 29) aponta que:

[...]as principais tarefas com que se deparam os professores iniciantes são: adquirir conhecimentos sobre os alunos, o currículo e o contexto escolar; delinear adequadamente o currículo e o ensino; começar a desenvolver um repertório docente que lhes permita sobreviver como professor; criar uma comunidade de aprendizagem na sala de aula; e continuar desenvolvendo uma identidade profissional.

Outras pesquisas apresentadas pelo autor indicam como preocupação dos professores iniciantes a gestão da classe, o ensino, a gestão do tempo, as relações com os alunos, pais, colegas e diretores (idem, p. 33). Nesse sentido, pode-se verificar que os cursos vêm atendendo à necessidade de adquirir conhecimento sobre o currículo, mais especificamente, sobre o ensino de conteúdos e encaminhamentos metodológicos dos diferentes componentes curriculares. Porém, cabe refletir em que medida tais formações tem contribuído para auxiliar os iniciantes no desenvolvimento das demais tarefas de que precisam dar conta. Outra questão a considerar, conforme apontado por Romanowski (2012, n/p) é que a grande maioria dos cursos ofertados organiza-se na perspectiva da teoria como guia da ação, constituindo-se a partir do princípio da racionalidade técnica. Assim, não conseguem superar a visão aplicacionista da teoria e um discurso prescritivo na formação de professores (Diniz-Pereira, 2010, p.84). Nessa perspectiva, considera-se importante relacionar a formação continuada com as necessidades dos professores, tomando como pressuposto os conhecimentos e habilidades que os professores precisam lançar mão nas diversas situações que enfrentam no cotidiano da sala de aula. Reali et al (2008, p. 81), com base em Schulman (1986; 1987) apontam que: “Para agirem nas situações instáveis e complexas da sala de aula, os professores precisam de uma base de conhecimento, composta por conhecimentos de diferentes tipos e natureza, os quais sustentam seus processos de tomada de decisões. Essa base de conhecimento é constituída por um conjunto de compreensões, conhecimentos, habilidades e disposições necessárias para atuação em situações específicas de ensino e aprendizagem.”

Considerando o exposto, as autoras propõem que a formação continuada seja centrada na escola e nas necessidades dos professores, tendo como estratégia formativa a reflexão sobre a ação pedagógica. Isso não significa que a formação deva ser realizada apenas no espaço escolar, na perspectiva de se conceber a escola como uma organização aprendente, mas implica – principalmente – que tal formação tenha como ponto central as necessidades dos professores contextualizadas a partir do local de trabalho, considerando as situações ali vivenciadas (idem, p. 81-2). Nessa mesma direção, Marcelo (2008) aponta a necessidade de revisão dos programas de formação de professores organizados sob um paradigma tradicional, em que a formação se efetiva em torno de ‘unidades discretas de conhecimentos e habilidades’, de forma descontextualizada das escolas, com duração limitada e pouco acompanhamento

e aplicação prática. O autor afirma que, sob esse formato, os programas de formação não têm nenhuma possibilidade de mudar as crenças e práticas dos professores. Para André (2012, p.218), uma das alternativas é de que os programas de inserção à docência apoiem e acompanhem os iniciantes, auxiliando-os na realização das complexas tarefas que devem realizar, ao mesmo tempo em que os convençam da importância do desenvolvimento profissional. No entanto, a adesão do professor a processos que possibilitem seu crescimento pessoal e profissional só se efetivará se esses processos vierem ao encontro de suas necessidades e motivos. Cabe, assim, ao poder público a responsabilidade de promover dispositivos de formação que realmente mobilizem os docentes a se envolver nessas atividades.

Algumas pesquisas vêm indicando como possibilidade o acompanhamento (de forma presencial ou virtual) de profissionais de apoio, conselheiros ou mentores, como elemento importante nos programas de inserção profissional de iniciantes. Tais profissionais assumem um papel relevante, auxiliando e orientando o professor iniciante no desempenho de suas funções. Marcelo (2010, p. 39) apresenta algumas características desse profissional: “professor permanente, com experiência docente, com habilidade na gestão da classe, disciplina, comunicação com os companheiros, com conhecimento do conteúdo, com iniciativa para planejar e organizar, com qualidades pessoais (flexibilidade, paciência, sensibilidade, etc.)”. Na RME, uma possibilidade de efetivação desse acompanhamento pode se dar pelo trabalho do pedagogo escolar, cuja atuação está prevista em todas as escolas da rede municipal. O Caderno Pedagógico intitulado: “Subsídios à organização do trabalho pedagógico nas escolas da Rede Municipal de Ensino de Curitiba” assim se refere aos pedagogos escolares: A atuação dos pedagogos escolares, neste contexto, direciona-se para a organização pedagógica da escola, numa ação conjunta com a direção, corpo docente e discente. Seu trabalho se efetiva concretamente por meio das relações que estabelece na escola, com os demais profissionais que ali atuam. Portanto, é nesse espaço que se constrói a possibilidade de ação-reflexão-ação sobre os acontecimentos escolares e sobre a prática educacional vivenciada pelos sujeitos que fazem parte da escola e a fazem escola de fato. (Curitiba, 2012, p.11)

Nessa perspectiva, os pedagogos escolares – considerando o papel de contribuir para a organização do trabalho pedagógico das escolas – poderiam auxiliar os professores iniciantes, durante os momentos de estudo e planejamento coletivo realizados nas escolas, acompanhando-os e orientando-os em relação aos procedimentos didáticopedagógicos necessários à efetivação do trabalho docente. Porém, nos últimos dez anos, esses profissionais têm assumido uma quantidade significativa de tarefas e atividades, relacionadas à ampliação e à complexificação das ações desenvolvidas pelas escolas (implantação dos ciclos de aprendizagem, avaliações em larga escala, inclusão escolar,

estudantes com diferentes níveis de aprendizagem, os desafios das novas tecnologias, etc.), bem como em relação aos níveis e modalidades de atendimento ofertados em cada unidade (educação infantil, educação em tempo integral, educação especial). Essa situação amplia as demandas de todos os profissionais no interior das escolas e, em muitos casos, dificultam um trabalho mais efetivo dos pedagogos escolares junto aos professores, em especial junto aos iniciantes. Nessa direção, verifica-se a necessidade de pesquisas que possam investigar como esse processo de acompanhamento vem sendo efetivado e quais os determinantes que interferem no seu desenvolvimento, no contexto da RME. Além disso, diante da alta demanda de professores iniciantes, a inclusão de mentores, com a atribuição específica para desenvolver programas de apoio e acompanhamento da inserção profissional, especialmente, nos dois primeiros anos, que atuasse junto com a equipe da escola em que os iniciantes se encontram. Marcelo (2008), analisando o papel dos mentores no processo de inserção de iniciantes, aponta a necessidade de incluir outras experiências formativas. Para o autor, o êxito dos programas de inserção apoia-se no compromisso de toda a equipe diretiva das escolas no apoio e integração desses profissionais. Para tanto, há que se pensar nesse processo como um projeto da escola. Ainda, consideramos necessário acrescentar: como uma política permanente do sistema de ensino, implicando na transformação efetiva das políticas e práticas até aqui desenvolvidas. Considerando o exposto, pode-se inferir que os professores iniciantes, no contexto estudado, acabam tendo que se responsabilizar individualmente pelo seu processo de inserção à docência e de desenvolvimento profissional. As ações explicitadas e analisadas nesse texto mostram-se insuficientes, considerando-se a necessidade de assegurar aos docentes trabalhar num ambiente que favoreça seu sucesso e sua permanência na profissão. As fragilidades evidenciadas nesses processos de inserção de professores no início da carreira docente na RME indicam a relevância e a necessidade de revisão de tais processos. Nessa direção, Romanowski (2012, n/p.) aponta os principais desafios para o desenvolvimento profissional dos professores iniciantes: i)Desenvolvimento de uma política de reconhecimento de que os professores principiantes carecem de apoio quando iniciam sua atividade profissional; ii) criação de programa de acompanhamento e supervisão, tipo mentoria, destinados a promover o desenvolvimento profissional de professores em início de carreira; iii) estabelecimento de projetos de formação específicos que atendam as demandas do início do trabalho docente; iv) melhoria das condições de vínculo dos profissionais em início de carreira, proporcionando remuneração e valorização do desenvolvimento profissional; v) revisão dos critérios de lotação e designação de trabalho para professores principiantes que favoreçam sua adaptação aos sistemas escolares; vi) fomento para realização de pesquisas sobre esse período de desenvolvimento profissional e para pesquisas colaborativas que visem propiciar contribuição com a formação e prática desses profissionais em início de carreira.

Ainda, Marcelo (2008) aponta a necessidade de que os países (e no nosso caso, o sistema municipal de ensino) comecem a se preocupar efetivamente com essa questão,

prestando atenção à forma como os professores iniciantes têm se inserido na cultura escolar, objetivando assegurar a garantia do direito à aprendizagem de todos os estudantes e o cumprimento da função da escola como espaço de formação para as novas gerações. Mais do que integrar os novos professores à cultura escolar, o autor afirma a necessidade de que o processo de inserção profissional constitua-se como um período de indagação, de inovação e reflexão, para o que é fundamental a participação de pessoas e instituições que podem auxiliar nesse complexo processo. CONSIDERAÇÕES FINAIS A necessidade de se refletir sobre como vem ocorrendo os processos de inserção profissional de professores iniciantes, no Brasil, tem sido apontada por diversos autores já citados nesse texto. Todos são unânimes em afirmar a urgência de se instituir programas de apoio voltados especificamente aos professores iniciantes, considerando suas necessidades, ou mais explicitamente, as especificidades desse período do desenvolvimento profissional. Uma primeira análise dos processos de inserção profissional existentes atualmente na RME de Curitiba evidencia que se constituem como iniciativas com caráter fragmentado e descontínuo, pois não se efetivam como uma política efetiva voltada para as necessidades dos professores iniciantes e para o interesse do próprio sistema de ensino em buscar a qualificação e a permanência desses profissionais na rede pública municipal. Em síntese, na atualidade, os programas e cursos de formação para professores iniciantes dependem da definição de planos de governo, mas não se instituíram como política da carreira docente e não se constituem um programa de desenvolvimento profissional para todos os professores iniciantes, com características próprias e tempo determinado. É urgente que os sistemas de ensino e as políticas públicas fomentem o desenvolvimento profissional docente diante dos novos desafios da escola, pois no atual contexto social a atratividade para a profissão docente se expressa em crise, e mesmo a carreira e as condições de trabalho no magistério continuam precárias. Enfim, que o “choque de realidade” contamine os planos e propostas para a melhoria da formação e desenvolvimento profissional dos professores. É nessa direção que esse estudo foi desenvolvido, apontando como se encontra a condição dos professores iniciantes e explicitando pistas para a necessária reformulação do processo de inserção profissional existente. REFERÊNCIAS ANDRE, Marli.( 2012) Políticas e programas de apoio aos professores iniciantes no Brasil. Caderno de Pesquisa. [online]. v..42, n.145, pp. 112-129. CUNHA, M. I. (2012) O professor iniciante: o claro/escuro nas políticas e nas práticas de formação profissional. Anais do III Congreso Internacional sobre Profesorado Principiante e Inserción Profesional a la Docencia. Santiago do Chile. n.p. cd-rom CURITIBA. (2012) Prefeitura Municipal de Curitiba. Secretaria Municipal da Educação.

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