Processos Fonológicos da Oralidade que Interferem na Escrita

May 22, 2017 | Autor: M. Baia | Categoria: Literatura Portuguesa, Fonologia, Escrita
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Fonte: http://www.sbs.com.br/e-talks/processos-fonologicos-da-oralidade-queinterferem-na-escrita/

Processos Fonológicos da Oralidade que Interferem na Escrita Maria de Fátima de Almeida Baia e Sulemi Fabiano Campos | Biodata |

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Neste texto, são expostos alguns dos processos fonológicos segmentais e supra-segmentais que podem ser considerados os ‘causadores’ de certos erros de escrita. Nosso intuito é, portanto, mostrar aos professores que muitos dos erros que encontramos na escrita são motivados por fenômenos da oralidade, além de apresentar alguns conceitos lingüísticos que são de grande validade para a avaliação diagnóstica. Na área de Educação, um dos autores que obteve destaque nas últimas décadas nos debates sobre avaliação foi Luckesi (1988) ao afirmar que, em primeiro lugar, há que se partir para a perspectiva de uma avaliação diagnóstica. Com isso, aponta que o professor deve modificar sua utilização de classificatória para diagnóstica. Ou seja, a avaliação deve ser assumida como instrumento de compreensão do estágio de aprendizagem em que se encontra o aluno, tendo em vista tomar decisões suficientes e satisfatórias para que aluno possa avançar no processo de aprendizagem. Para que um professor possa conduzir tal diagnóstico relacionado a problemas de escrita e interferência da oralidade, ele precisa ter conhecimento do funcionamento básico de alguns processos fonológicos da língua em uso, além de iniciar tal discussão com temas como variação e mudança lingüística, os quais fogem do escopo deste texto, pois este prende-se a alguns fenômenos da oralidade que deixam marcas na escrita de alunos desde a fase da alfabetização até o Ensino Médio, fenômenos tais como os que ocasionam a hipossegmentação (junção de duas ou mais palavras na escrita) e a hipersegmentação (separação de segmentos dentro de uma mesma palavra). A seguir, alguns exemplos de escrita de alunos de 5ª a 8ª série são dados juntamente com o processo fonológico que subjaz a cada um deles. Processos fonológicos e hipossegmentação: Focalizamos o sândi, palavra de origem sânscrita que significa ‘ligação’ ou ‘colocar junto’. Este termo é utilizado para uma variedade de processos fonológicos que podem pode ocorrer no interior de uma palavra (sândi interno) ou em fronteiras de palavras (sândi externo). Tratamos aqui do segundo tipo de sândi e, particularmente, do sândi vocálico externo, a saber, processo que desfaz encontros vocálicos (elisão, degeminação e ditongação). i. Elisão: Processo de sândi vocálico externo que apaga vogais em posição não-acentuada final de item lexical, quando este é seguido por outro item que começa por vogal de qualidade diferente:

‘meninorgulhosa’ (menina orgulhosa). Exemplos de interferência na escrita de alunos: # 1: “galinha botovo” (bota ovo)- (6ª) #2: “empinoutro pipa” (empina outro) – (7ª) ii. Ditongação: Combinação formada por dois segmentos vocálicos na mesma sílaba: uma vogal e uma semivogal/glide: ‘le[kja]zul’ (leque azul). Exemplos de interferência na escrita de alunos: # 3: “cara mal[au]m chato” (mala um)- (8ª) #4: “é crent[iu]m certinho ” (crente um) – (8ª) iii. Degeminação: O ponto inicial da degeminação é a simplificação de duas consoantes que se convertem em uma só, mas para isso precisa haver duas vogais idênticas adjacentes: ‘meninalegre’ (menina alegre). Exemplos de interferência na escrita de alunos: #5: “eh molekierrado!” (moleque errado) – (8ª) Além dos processos de sândi acima exemplificados, encontramos também hipossegmentação por simples juntura como em: ‘derepente’ (de repente), ‘durminarede’ (dormir na rede), ‘porisso’ (por isso), ‘mediverti’ (me diverti), etc. No entanto, muitos desses casos, além de ocorrem por desconhecimento da escrita ou falta de atenção, ocorrem por influência da prosódia da língua também, pois em muitos deles encontramos o que chamam de grupo clítico na Fonologia Prosódica (Nespor & Vogel, 1986). Processos fonológicos e hipersegmentação: Podemos exemplificar com os metaplasmos por subtração: i. Síncope: Subtração do fonema no interior do vocábulo. Exemplos de interferência na escrita de alunos: # 1: “robando” (roubando)- (5ª) #2: “cherando” (cheirando) – (8ª) ii. Apócope: Queda do fonema no final do vocábulo. Exemplos de interferência na escrita de alunos: # 3: “ele falo” (falou)- (8ª) #4: “pra brinca” (brincar) – (8ª) Além desses, há casos de hipersegmentação que espelham, na verdade, o desconhecimento da escrita por parte do aluno ou descuido, como em ‘segui ndo’, ‘com migo’, ‘do ente’, ‘assi m’, etc. Esperamos, após esta breve exposição, poder alertar os professores que muitos erros de escrita não surgem

aleatoriamente, mas apresentam, na maioria das vezes, traços da própria oralidade. Assim, algo que aparece representado na escrita e que poderia ser entendido apenas como um reflexo do desconhecimento, vem, na verdade, de uma sistematização lingüística inconsciente por parte do aluno. Recomendamos, dessa maneira, que a simples classificação (escrita errada) seja mudada para um diagnóstico por parte do educador (erro por descuido, desconhecimento, interferência da oralidade, os três juntos?). Ademais, este tipo de conhecimento por parte do professor é fundamental para que este ajude os alunos a implantarem uma espécie de barreira entre a oralidade e escrita, quando necessária. Referências Bibliográficas: BISOL, L. Neutralização das átonas. DELTA: Documentação de Estudos em Lingüística Teórica e Aplicada. vol.19, n 2. São Paulo, 2003. CAGLIARI, L. C. Alfabetrização e Lingüística. São Paulo: Editora Scipione, 1989. COUTINHO, I.L. Gramática histórica. Rio de Janeiro: Livraria Acadêmica, 1969. CHACON, L. . Prosódia e letramento em hipersegmentações: reflexões sobre a aquisição da noção de palavra. In: Anais do I Seminário Internacional sobre práticas escritas na escola: letramento e representação. São Paulo : USP, 2005. p. 20-20. LUCKESI, Cipriano. O papel da diática na formação do educador. In: CANDAU, Vera. A didática em questão. Petrópolis, Vozes, 1988. MASSINI-CAGLIARI, G. “Erros” de ortografia na alfabetização: escrita fonética ou reflexões sobre o próprio sistema de escrita? Diante das Letras: a escrita na alfabetização - de Gladis MassiniCagliari & Luiz C. Cagliari. Campinas: Mercado de Letras, 1999, p. 121-130. NESPOR, M.; VOGEL, I. Prosodic Phonology Foris: Dordrecht,1986. NOGUEIRA, M.V. Aspectos segmentais dos processos de sândi vocálico externo no falar de São Paulo. Dissertação de mestrado, USP, 2007. REIS, M. C. ; CHACON, L. . Relações entre constituintes prosódicos e hipossegmentação na escrita infantil. In: XVII CIC Congresso de Iniciação Científica. São Paulo : Editora da UNESP, 2006. v. Único. SEMEGHINI-SIQUEIRA, I. Avaliação diagnóstica da capacidade de uso da língua materna pelo aluno de 1º grau e a formação do professor. In: Anais do I Congresso de Ciências da Educação. Araraquara. São Paulo: Unesp/USP, 1997.

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