PROFISSÃO, ESTILO E CAUSA: UM OLHAR SOBRE OS PRIMEIROS CONGRESSOS PAN-AMERICANOS DE ARQUITETOS

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PROFISSÃO, ESTILO E CAUSA: UM OLHAR SOBRE OS PRIMEIROS CONGRESSOS PAN-AMERICANOS DE ARQUITETOS Fernando Atique FAU-USP – Doutorando em História e Fundamentos da Arquitetura e do Urbanismo

Em 1920, foi realizado no Uruguai o I Congresso Pan-Americano de Arquitetos, evento que teve por objetivo defender e divulgar os interesses, o pensamento e as realizações profissionais dos arquitetos das Américas. Realizados, desde então, trienalmente, os Congressos Pan-Americanos de Arquitetos podem ser vistos, sob o ponto de vista da história da profissão, como uma das primeiras tentativas de debate institucionalizado sobre a produção arquitetônica, urbanística e intelectual de arquitetos não-europeus. Reunindo, em várias de suas edições, profissionais provenientes desde a Argentina até os Estados Unidos, os Congressos abordavam questões que perpassavam a regulamentação da profissão de arquiteto; a adequação de teorias e modelos urbanos aos países participantes; a definição de uma coerência estilística para as cidades americanas; o debate sobre a habitação social e as primeiras formulações sobre a salvaguarda do patrimônio. Mas esses eventos podem ser vistos também sob o prisma político, especialmente se confrontados com as teorias Pan-Americanistas surgidas no século XIX e re-apropriadas durante os novecentos, como a Doutrina Monroe, encabeçada pelos Estados Unidos; a de Joaquim Nabuco, entusiasta do congraçamento americano, e a “anti-yankee” de Oliveira Lima. Este artigo tenta construir nexos entre a dimensão política da teoria Pan-Americanista e a dimensão doutrinária dos Congressos Pan-Americanos de Arquitetos, visando colaborar com a análise de instituições e de personagens participantes de suas cinco primeiras edições (1920-1940), e que demarcaram a trajetória da arquitetura e do urbanismo no Brasil. Uma vez que o país foi membro ativo e participante de quase todas essas cinco primeiras edições dos Congressos, como também do Comitê Permanente dos Congressos Pan-Americanos e das Exposições de Arquitetura PanAmericana, realizadas paralelamente aos encontros, seu estudo mostra-se de grande relevância para o entendimento da prática profissional, do debate intelectual e das posições políticas tomadas pela arquitetura e urbanismo durante o século XX, no país e nas Américas. Ao mesmo tempo, permite tecer comparações entre as realizações congêneres da Europa, como os CIAM’s, melhor conhecidos pela historiografia da área. Palavras-chave: história da profissão; teorias Pan-Americanistas; arquitetura e urbanismo; congressos Pan-Americanos de arquitetos; exposições de arquitetura Pan-Americana.

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PROFISSÃO, ESTILO E CAUSA: UM OLHAR SOBRE OS PRIMEIROS CONGRESSOS PAN-AMERICANOS DE ARQUITETOS Fernando Atique FAU-USP – Doutorando em História e Fundamentos da Arquitetura e do Urbanismo

PAN-AMERICANISMO: GÊNESES E INTERPRETAÇÕES Os Congressos Pan-americanos de Arquitetos fazem parte de um capítulo ainda a ser escrito na história da arquitetura e do urbanismo. Idealizados por um grupo de arquitetos uruguaios, os Congressos Pan-americanos tinham por interesse, inicialmente, a defesa e a regulamentação da profissão de arquiteto. A gênese de tais eventos remonta a 1914, ano em que é organizada a Sociedade de Arquitetos do Uruguai por iniciativa de alguns profissionais daquele país, atuantes na primeira metade do século XX, como Alfredo R. Campos, Alfredo Baldomir, Horacio Acosta y Lara, dentre outros. A iniciativa de regulamentação e defesa dos profissionais da arquitetura naquele país surtiu efeito e foi colocada por tal comissão fundadora, como cabível e necessária aos outros países do continente americano. Nesse sentido, organiza-se, em 1916, o Comitê Permanente dos Congressos Pan-americanos, que ficou locado em Montevidéu, sob direção de Horacio Acosta y Lara, com a função de estruturar a participação dos países das Américas nos congressos a serem realizados. Essa vontade de lutar pelo reconhecimento da profissão e pela delimitação das atribuições profissionais dos arquitetos em toda a América, como expressaram os uruguaios, deve ser entendida tendo em vista a política pan-americanista, em debate desde o século XIX. O tema do pan-americanismo foi constante durante os oitocentos, envolvendo os países da América do Sul e os Estados Unidos, país considerado, genericamente pela história, como o formulador do “congraçamento das Américas”, já que foi o criador da doutrina Monroe, em 1823. No momento em que o Uruguai lança a idéia dos Congressos Pan-americanos de Arquitetos (1914), tal discussão já estava amalgamada no continente. Autores das mais variadas tendências políticas já haviam escrito sobre o tema, expondo concepções curiosas, como a do brasileiro Heitor Lyra que, em um texto publicado na Revista Americana, em 1917, dizia que “se Monroe, em 1823, estabelecera publica e officialmente as bases do panamericanismo, a América do Sul alguns antes já pensara em adoptar essa política liberal. (...) Era o sonho de Bolívar” – dizia ele. “Somente unida a América poderia se apresentar ‘al mundo com aspecto de majestad y grandeza sin ejemplos em las naciones antiguas’” (REVISTA AMERICANA, 2001, p.201). Entretanto, independentemente de tentar encontrar a genealogia do pan-americanismo, uma grande parcela dos autores ligados à intelectualidade das Américas do Sul e Central viam com ceticismo os objetivos dos Estados Unidos mediante a doutrina Monroe, como a declaração do diplomata brasileiro Oliveira Lima, em 1906, deixa claro: “A doutrina Monroe sempre foi, desde o seu primitivo estágio, uma doutrina egoísta que visava reservar a América, econômica e diplomaticamente, para um apanágio da sua porção preponderante, em vez de continuar a depender das suas velhas metrópoles, não mais exclusivistas do que a nova. E tanto nunca foi uma doutrina altruísta ou mesmo cujas responsabilidades fossem comuns, e também as vantagens, a todas as repúblicas americanas, representando uma garantia recíproca de defesa, de preservação e de soberania (...) que os Estados Unidos se guardaram ciosamente o direito de escolher a ocasião ou o pretexto da sua aplicação de acordo com seus próprios interesses” (LIMA, 1980, p.37). [email protected]

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Se a doutrina Monroe, em seus primeiros anos, propalava-se como uma resposta negativa da América, sobretudo de seu país liberto mais antigo – os EUA - à Europa, em função de um suposto interesse de reintegração de suas ex-colônias, ela foi, de fato, uma política de pretensão dominadora por parte dos norte-americanos, sobretudo durante o governo de Roosevelt. Essa tentativa de “dominação imperialista” por parte dos EUA produziu discursos acalorados em prol da necessidade de manifestações nacionalistas de repúdio a essa tendência. A realidade brasileira, guardada as devidas proporções que a impede de ser tomada como única maneira de análise da realidade dos demais países da América, permite com que se perceba o grau de importância desse debate nas primeiras épocas do século XX. Especificamente, o caso mais contundente, no Brasil, envolve o livro de Eduardo Prado, A Ilusão Americana, de 1893, documento, ao mesmo tempo, monarquista e antiestadunidense. Eduardo Prado, poucos anos depois da Proclamação da República ainda defendia – como alguns outros brasileiros, como o Conde do Pinhal -, que apenas um governo centralizador, vitalício, calcado em títulos de nobreza, seria capaz de encaminhar o Brasil rumo às resoluções de seus problemas políticos. Mas, de fato, seu suposto “anti-republicanismo” ecoou fortemente durante o governo do Marechal Floriano Peixoto, quando atacou, pautado em análises apaixonadas, incidentes políticos deflagrados ou encabeçados pelos Estados Unidos: o modelo de país livre e republicano da Primeira República (REBELO, 2001, p. XI). Citando situações em que a política externa norte-americana feriu os interesses nacionalistas do México, do Peru, da Colômbia, do Haiti, da Argentina e de outras nações da América, Eduardo Prado queria mostrar que já era “tempo de reagir contra a insanidade da absoluta confraternização que se pretende impor entre o Brasil e a grande república anglo-saxônica, de que nos achamos separados, não só pela grande distância, como pela raça, pela religião, pela índole, pela língua, pela história e pelas tradições de nosso povo. (...) O fato de o Brasil e de os Estados Unidos se acharem no mesmo continente é um acidente geográfico ao qual seria pueril atribuir uma exagerada importância. (...) Pretender identificar o Brasil com os Estados Unidos, pela razão de serem do mesmo continente, é o mesmo que querer dar a Portugal as instituições da Suíça, por que ambos os países estão na Europa” (PRADO, 2001, p.31). Seu livro acabou sendo confiscado pelas tropas do governo federal, no mesmo dia do lançamento, e só veio a público em 1896, na França. Contudo, o livro pode ser considerado um dos ensaios inaugurais da linha de crítica à política externa dos Estados Unidos. Eduardo Prado pode ser citado como um dos primeiros autores a se indispor à noção de “fraternidade americana”, preconizada pela doutrina Monroe. Expondo opiniões pessoais na obra em questão, Prado anunciava que “a fraternidade americana [era] uma mentira”, já que existiam “mais ódios, mais inimizades” entre as “nações ibéricas da América”, do que entre as nações da Europa (idem). Pelo que se nota, Eduardo Prado não via a possibilidade de uma postura pan-americanista, devido a suas concepções políticas (era monarquista, e como tal, era zeloso das expressões nacionais bem demarcadas como fator de existência de uma nação), e sociais, já que era defensor das questões de raça, credo e história como identificadoras dos países. Mas, o teor contestador de Eduardo Prado pode ser encontrado, em certo sentido, também nos escritos do já citado diplomata Oliveira Lima. Como expõe Washington Luís Pereira de Souza Neto, na introdução da obra Pan-americanismo: Monroe, Bolívar, Roosevelt, de 1907, “clara estava a intenção política de Oliveira Lima sobre o pan-americanismo e sobre o sistema de governo norte-americano. Opunha-se ao ‘rooseveltismo’ de Nabuco, procurava demonstrar os perigos que adviriam da extensão da doutrina de Monroe com o corolário de Roosevelt e esboçava uma nova orientação da política externa brasileira, a qual deveria, em sua opinião, basear-se em uma maior aproximação com a Argentina e demais repúblicas latino-americanas, na manutenção das tradicionais relações com o mundo europeu, e não na busca açodada de relações privilegiadas com os Estados Unidos da América” (SOUZA NETO, 1980, p.10).

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Oliveira Lima, ao contrário de Prado, não era propriamente um oponente da noção de panamericanismo, mas repudiava a política do “Big Stick”, de Roosevelt. A postura de Oliveira Lima foi definida por Gilberto Freyre como “pan-americanista crítica” (idem, p.11). Mas esse “panamericanismo crítico” encontrava oposição em outro diplomata brasileiro, Joaquim Nabuco. Joaquim Nabuco foi o intelectual brasileiro da Primeira República que mais se empenhou em divulgar supostas benesses de uma aliança dos países da América Latina com os norteamericanos. Em suas conferências em algumas universidades dos Estados Unidos,1 Nabuco exprimiu opiniões laudatórias não só apenas dessa aliança, como de celebração do que chamava de “civilização norte-americana”: “vós, com toda a vossa alta civilização, não podeis fazer mal a nenhuma outra nação. O contacto intimo comvosco, seja em que condição for, só poderá, portanto, trazer beneficio e progresso á outra parte” (NABUCO, 2001, p.40). Joaquim Nabuco, num sábio jogo de palavras, transmitiu sua noção de pan-americanismo, tentando demonstrar que, para ele, tal atitude de congraçamento traria muitos benefícios aos latinos, mas, também aos norte-americanos: “O único effeito que posso enxergar no trato intimo da America Latina comvosco é que ella viria a ser lentamente americanizada; isto é, ela se impregnaria, em medida diversa, do vosso optimismo, intrepidez e energia. (...) Não quero dizer que algum dia emparelhemos com o vosso passo. Nem o desejamos. Excedestes toda a actividade humana de que ha memoria , sem perturbar o rhythmo da vida. Fizestes novo rhythymo só para vós. Nós nunca o poderíamos conseguir. Para as raças latinas festina lente é a regra da saude e da estabilidade. E seja-me licito dizer que é um bem para a humanidade que todas as raças não marchem a passo igual, que todas não corram” (Idem). Para Nabuco, era importante deixar claro que os demais países da América não tinham por intenção tentar se igualar aos Estados Unidos, talvez temendo uma interrupção na transmissão dos efeitos da ‘americanização’ acima referida. Para ele, era natural que a república estadunidense fosse a líder da fraternidade das Américas por considerá-la ‘predestinada’ a isso por questões de raça, credo e geografia. Em linhas bem gerais, podemos vislumbrar, então, a existência de três grupos políticos no trato com a questão pan-americanista: o de repúdio completo aos modelos e proposições de aliança com os Estados Unidos, no Brasil, encabeçada por Eduardo Prado; o de crítica árdua à política pan-americanista como era comandada pelos Estados Unidos durante o governo de Roosevelt muito embora visse a necessidade de uma aliança entre os países da América Latina -, tendência capitaneada por Oliveira Lima; e a de “Fraternidade Americana”, vinculada à atividade diplomática de Joaquim Nabuco, e seguida, também, pelo Barão do Rio Branco. O que se depreende da análise dos documentos que tratam especificamente dos Congressos Pan-americanos de Arquitetos é que havia uma interpretação de pan-americanismo, entre seus participantes e idealizadores, aparentemente próxima dos conceitos pelos quais Joaquim Nabuco entendia o pan-americanismo, como o editorial da revista Architectura no Brasil, de setembro de 1923, expressa com relação ao II Congresso Pan-americano de Arquitetos, realizado em Santiago do Chile: “Reune-se pela segunda vez em nosso continente o Congresso Pan-americano de Architectos, cujo promissor inicio realizou-se ha tres annos passados na linda cidade de Montevidéo, capital do nosso vizinho amigo o Uruguay. (...) O Brasil, como um dos grandes membros da grande família americana, congratula-se com os demais paizes amigos pela realização desse congraçamento de obreiros do bello, no qual se reúnem debaixo do mesmo palio fraternal da paz e trabalho, os principaes architectos americanos, portadores de idéas e principios, cuja utilidade para o engrandecimento da architectura em nosso continente excuzamo-nos de enaltecer. (...)Para governo de uma profissão, as resoluções dos congressos internacionaes não eram o sufficiente. Além das sabias lições adquiridas no

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convivio com o meio selecto de architectos da velha Europa, nesses magnos torneios de arte, algo de mais especializado e absolutamente restricto ao meio ambiente da America necessitavam os nossos architectos, porque ha sempre uma mesma lei moral de harmonia que nos irmana e engrandece, baseada em um novo ideal altamente de solidariedade humana (...)” (ARCHITECTURA NO BRASIL, 1923,p.141). O que corrobora a afirmação anterior à citação, é o fato de que os Congressos tinham como línguas oficiais o espanhol, o português, mas também, o inglês e o francês, possivelmente pelo fato dos países da América do Norte – Estados Unidos e Canadá – falarem tais idiomas. Essa simples detecção permite perceber um ideal de reunião que pretendia facilitar o intercâmbio do conhecimento entre as Américas. Contudo, ao analisarmos os anais de tais encontros, percebemos um certo predomínio na participação de profissionais da América do Sul, como Argentina, Brasil, Uruguai e Chile, e, num menor número, da Colômbia, da Venezuela, do Peru, como ainda de Cuba e dos Estados Unidos. Os norte-americanos participaram de quase todas as cinco primeiras edições, exceto do II Congresso, realizado em Santiago do Chile, em 1923, por proibição do governo local, mas sempre com um número muito pequeno de delegados, não chegando a se constituírem em um grupo hegemônico em nenhuma dessas ocasiões. O Canadá participou pela primeira vez do IV Congresso, no Rio, mesmo assim, por representação do arquiteto britânico Robert Prentice, atuante no Rio, e membro de uma sociedade de classe daquele país (ARQUITECTURA, 1930). É possível, também, que a noção pan-americanista uruguaia, ao formular essa espécie de evento, em 1914, tenha sido vinculada à noção do “congraçamento das Américas”, ainda mais se notarmos que a sugestão dessas reuniões partiu de Alfredo R. Campos, arquiteto que também era militar, e que chegou a ser Ministro da Guerra de seu país, atividade que lhe garantia certa simpatia pelas atitudes “ordenadoras” vistas na doutrina Monroe. Contudo, pela escassez de bibliografia sobre o tema, ainda não foi possível comprovar se tal hipótese está correta, todavia, pela análise de suas conclusões, publicadas em diversas revistas do Brasil e da Argentina, percebe-se, claramente, que os Congressos Pan-americanos de Arquitetos serviram mais de instrumento e fórum de debate dos problemas dos países latinos, do que de espaço de divulgação de elementos ideológicos ou políticos norte-americanos, muito embora, vez ou outra, os Estados Unidos fossem celebrados como modelo para sanar dúvidas surgidas nas sessões de trabalho, como no caso da relevância dos arranha-céus como modelo cabível aos países da América do Sul (REVISTA DE ARQUITETCTURA, 1930, p.494). Talvez sem muita clareza no momento de suas realizações, esses congressos estavam seguindo concepções pan-americanistas parecidas com as de Oliveira Lima em sua prática, ou seja, minorando a ascendência norte-americana sobre a América, ao mesmo tempo em que não as impediam de existirem; reiterando a necessidade de diálogo com a Europa e conclamando a uma aliança entre os demais países da América. Pan-Americanismo na Histöria da Arquitetura e do Urbanismo São poucos os livros de arquitetura e de urbanismo que tratam dos congressos Pan-americanos de Arquitetos. Um dos autores que se deteve, ainda que brevemente, nas contribuições dos Congressos Pan-americanos de Arquitetos foi Paulo Santos, em Quatro Séculos de Arquitetura. Mas Santos relata apenas alguns acontecimentos e algumas conseqüências do Congresso de 1930, ocorrido no Brasil. Em sua obra não são encontradas análises sistêmicas dos Congressos, o que dificulta a compreensão da importância do próprio evento que o país abrigou. Hugo Segawa, em Arquiteturas no Brasil: 1900-1990, também não se deteve na análise das repercussões dos Congressos Pan-americanos, indicando, apenas, a participação de algumas personagens, como Flávio de Carvalho, participante da edição de 1930. Na obra de Yves Bruand, Arquitetura Contemporânea no Brasil, por sua vez, não são encontradas referências aos Congressos. Candido Malta Campos Neto, em Os Rumos da Cidade: urbanismo e modernização em São Paulo, recentemente publicado, trata da participação de alguns profissionais brasileiros nos congressos, mas não se detém, mais do que o necessário, na análise da contribuição desses eventos para a arquitetura e o urbanismo no Brasil. No âmbito acadêmico, podemos citar a dissertação de mestrado da arquiteta Ana Lúcia Cerávolo, defendida no Departamento de

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Arquitetura e Urbanismo da EESC-USP, como uma breve contribuição à relevância de tais eventos, ao abordar a trajetória do arquiteto Paulo de Camargo e Almeida. Na historiografia latinoamericana de arquitetura e urbanismo também não foram encontradas muitas obras que tratem desse assunto, sendo, talvez, exceções, o artigo de Alberto Gurovich W., Conflictos e Negociaciones: la planificacion urbana em el desarollo Del Gran Santiago, publicado na Revista Urbanismo, versão eletrônica mantida pelo Departamento de Urbanismo da Universidad de Chile, contudo, muito vago na análise desses eventos; e um breve texto, embora não localizado, de Ramon Gutierrez sobre o tema, conforme declarou Hugo Segawa em conversa informal. Entretanto, as revistas de arquitetura, publicadas no período de realização desses congressos, como a revista Architectura e Construções e Revista de Engenharia Mackenzie, de São Paulo; as revistas cariocas Architectura no Brasil, Arquitetura e Urbanismo, e a argentina Revista de Arquitectura, publicada pela Sociedad Central de Arquitectos de Buenos Aires, permitem a obtenção de fontes documentais valiosas ao estudo dessas iniciativas. Devido à grande quantidade de informações que necessitam de análise, visando um melhor entendimento dos Congressos Pan-americanos de Arquitetos, optamos, nesse artigo, por apresentar as discussões processadas nesses eventos dentro de três possíveis chaves analíticas: o debate, as concepções e as polêmicas presentes nos congressos sobre a atividade do arquiteto; as resoluções oficializadas pelos eventos na formulação do campo profissional do arquiteto urbanista, e os embates sobre os grupos denominados “acadêmicos” e os antiacadêmicos, chamados de “renovadores”, no Uruguai, “racionalistas”, na Argentina, e comumente de “modernos”, no Brasil (MARGENAT, 2000; SEGAWA, 1999). ASPECTOS TEMÁTICOS DOS CONGRESSOS PAN-AMERICANOS DE ARQUITETOS A primeira edição dos Congressos Pan-americanos ocorreu em Montevidéu, em 1920, sob a presidência do arquiteto Horácio Acosta y Lara. Da leitura das conclusões desse evento, transparece a idéia central dessa reunião que era a de lutar e estimular a promulgação e sanção de leis que regulamentassem a profissão de arquiteto em cada país participante. Nesse sentido, fica claro que o primeiro congresso procurava dialogar com os poderes centrais de cada país, entendidos como os responsáveis diretos por oficializar as conclusões obtidas no evento. O Segundo Congresso foi realizado em Santiago do Chile, em 1923, tendo sido presidido pelo arquiteto Ricardo Gonzáles Cortés. O que se depreende, de imediato, de suas conclusões, é a necessidade de estudo e entendimento sobre o urbanismo em todas as escolas da América. Aparece, também, o debate acerca da conservação dos monumentos históricos dos países latinoamericanos, atitude que antecipou a discussão e a criação de vários serviços com essa finalidade nos países participantes. O terceiro encontro, o primeiro que, de fato, contou com a presença de um grande número de participantes, ocorreu em Buenos Aires, tendo sido presidido pelo arquiteto Raul E. Fitte. Nessa edição dos Congressos Pan-americanos a questão do ensino nas Escolas de Arquitetura foi uma das pautas centrais, deslocando o debate persistente sobre a questão da proteção aos profissionais para a que incidia sobre “qual profissional se queria ver formado” na América. Contudo, é nesse Congresso que aparecem, pela primeira vez, teses específicas sobre qual seria o destino da arquitetura com a proliferação da vertente moderna. O Congresso seguinte foi organizado pelo Brasil, e ocorreu na cidade do Rio de Janeiro, em 1930, sob a presidência de Nestor Egydeo de Figueiredo. Das reportagens sobre esse encontro depreendem-se as noções de nacionalismo que vigoravam em cada país participante, sobretudo no país anfitrião, mas, podem ser sentidas, também, as repercussões positivas e negativas acerca da arquitetura e do urbanismo modernos, bem como da metropolização das cidades da América do Sul. Nessa edição dos Congressos Pan-americanos decide-se que Havana, em Cuba, seria a organizadora do próximo encontro, agendado para 1933. Contudo, problemas políticos e econômicos levaram a uma interrupção de dez anos nos encontros, que, por fim, acabaram sendo realizados novamente em Montevidéu.

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O Quinto Congresso Pan-Americano de Arquitetos ocorrido no Uruguai, em 1940, fecha um ciclo de vinte anos, e mostra uma discussão muito interessante sobre temas sociais, quer seja sobre a resolução dos crescimentos desordenados das cidades, quer seja sobre o problema habitacional da população de baixa renda, e, ainda, sobre a necessidade de se lutar por fundos de aposentadoria para os arquitetos. A discussão que começou no Uruguai, em 1920, tendo como base a regulamentação da profissão dos arquitetos, retorna à mesma cidade, com temas que parecem indicar não uma mudança nas atividades profissionais dos arquitetos, mas, sim, uma ampliação do entendimento da própria profissão, mediante a possibilidade de discussão e amadurecimento proporcionados pelos congressos. Essa edição dos Congressos PanAmericanos foi presidida pelo arquiteto Daniel Rocco. O ENTENDIMENTO DA PROFISSÃO E DE SUA REGULAMENTAÇÃO PROFISSIONAL Algo extremamente valioso para a compreensão da história da profissão, e que pode ser notado nos Congressos Pan-americanos de Arquitetos, é a capacidade de análise, por parte de seus Comitês Organizadores, das conjunturas da época em que cada evento ocorria, e que ficaram refletidas na escolha das temáticas de cada evento. Temas de discussão afinados com os problemas da classe, mas também políticos e, mesmo que timidamente, sociais, foram freqüentes nessas reuniões. Logo no primeiro congresso puderam ser discutidos temas como: “Transformação, desenvolvimento e embelezamento da cidade de tipo predominante na América”; “Materiais de Construção peculiares a cada paíz da América – meios adequados para difundir o conhecimento de sua natureza e emprego em todo o continente”; “Casas baratas urbanas e rurais na América”, além dos que tratavam especificamente da questão do entendimento profissional, como: “Convém regulamentar o exercício da profissão de Arquiteto?”; “Meios de se obter maior cultura artística do público para uma melhor compreensão da obra arquitetônica” e “Responsabilidade Profissional do Arquiteto”, dentre alguns outros. Do ponto de vista que nos interessa nesse artigo, as conclusões do I Congresso Pan-americano de Arquitetos estabeleciam noções que, de certa forma, passaram a ser defendidas pelos arquitetos brasileiros, mesmo antes da regulamentação federal da profissão pelo governo Vargas, na década de 1930.2 Nesse sentido, é interessante cotejar as definições de “arquiteto”, extraídas das cinco primeiras edições desses congressos, e notar que muito embora a noção de arquiteto, como “homem das artes”, típica da tradição Beaux-Arts não tenha desaparecido por completo, novos entendimentos foram surgindo. Assim, as conclusões oficiais do I Congresso diziam que o arquiteto era “o profissional que possue todos os conhecimentos jurídicos e econômicos, necessarios para projetar as obras de arquitetura e faze-las executar sob sua direção” (ARQUITETURA E URBANISMO, 1940, p.14); o arquiteto era, também, o profissional habilitado “para melhorar a estética das cidades, desenvolver a cultura geral, para obter um critério definido nas condições de nossas vivendas que tanta influência têm na saúde física e moral do povo, para assegurar a beleza, segurança e higiene de toda a especie de edificios” (Idem). O segundo Congresso, entre suas determinações, fazia “votos para a regulamentação da profissão de Arquiteto, como unico meio de alcançar o nível que lhe corresponde como fator fundamental do melhoramento da vida moderna” (Idem, p.18), e explicitava, também, que era “função que [competia] primordialmente aos Arquitetos do continente estudar em todos os seus aspectos e caracteristicas locais o problema da habitação e da edificação em geral e das casas proletarias e economicas em particular, de modo a estabelecer as condições que [convinha] fixar para chegar ao estimulo efetivo das construções de toda a especie nas cidades e povoações americanas” (idem, p.18). Essas determinações deixam clara a noção de compromisso social do profissional, sobretudo, se atentarmos para a discussão sobre a questão da habitação de interesse social, que foi discutida no evento. Um paralelo inevitável deve ser traçado com os debates do CIAM, que em função da realidade européia de reconstrução e melhoramento das construções, de fato, só introduziria esse debate sobre a habitação social, em um evento de objetivo e porte semelhante, no final da década de 1920. Entretanto, numa espécie de paradoxo aos olhos contemporâneos, o mesmo congresso recomendava que o ensino nas escolas de

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arquitetura fosse “essencialmente artístico, sem prejuízo de serem desenvolvidos, convenientemente os conhecimentos de ordem técnica e científica necessarios para a formação do Arquiteto” (ARQUITETURA E URBANISMO, 1940, p.19). Mas, de fato, tal paradoxo parece ser esclarecido pelos congressistas do evento de 1927, transcorrido em Buenos Aires. A primeira conclusão do congresso era intitulada “como deve ser definido o arquiteto da América e quais devem ser suas atividades no exercício profissional”, a saber: “O Arquiteto é um artista e um técnico, que projéta e dirige suas obras com exclusão de toda a atividade comercial das mesmas, sendo um anseio do III Congresso Pan-Americano de Arquitetos que os poderes publicos de todos os países da América, ao ditar as respectivas regulamentações profissionais, dêm força a essa definição” (ARQUITETURA E URBANISMO, 1940, p. 23). Contudo, as principais resoluções desse terceiro congresso refletem uma retomada de noções já debatidas nos eventos anteriores, como, por exemplo, a que procura uniformizar o ensino da arquitetura em todas as escolas do continente, possibilitando um intercâmbio de profissionais pelos diversos países, mas, sobretudo, aquela que procura o entendimento sobre o urbanismo e sobre suas relações com a arquitetura. Nesse quesito, é interessante observar que o evento recomendava aos “arquitetos manter em seu estudo e em seu desenvolvimento”, um contato direto com o urbanismo, “ciência intimamente ligada com a Arquitetura”, e entendida, no evento, como a responsável por limitar a densidade exagerada das edificações sobre as vias tradicionais das cidades americanas, como responsável, também, pela confecção de planos reguladores ou de extensão a cada povoação da América (idem). O quarto Congresso Pan-americano de Arquitetos, realizado no Rio de Janeiro, introduz com grande força a discussão sobre as “expressões nacionais da arte”, bem como, sobre as formas de alcançar sua difusão em cada país do continente. Dessa forma, fica clara a noção de que o arquiteto é o profissional dotado de capacidade de composição arquitetônica, completada por “conhecimentos históricos, técnicos e científicos” (ARQUITETURA E URBANISMO, 1940, p.27). Mas, tal noção é ampliada, na medida em que fica explicitada, entre as determinações do congresso, que ocorra a “creação de cadeiras ou cursos de urbanismo nas escolas superiores de arquitetura assim como o ensino especialisado da Arquitetura Paisagista”, sendo explicitado, ainda, que “o Urbanismo, por sua importancia, constitúa tema obrigatorio dos futuros congressos” (Idem, p.29), recomendação seguida na montagem do V Congresso, em 1940. A quinta edição dos Congressos Pan-americanos de Arquitetos dedicou grande parte de suas discussões à questão do crescimento das cidades e da resolução dos déficits habitacionais. Para tanto, o congresso recomendou a criação de uma “Conferência Pan-americana de Urbanismo”, sob os auspícios do Comitê Permanente dos Congressos Pan-americano de Arquitetos, que traria soluções já debatidas em cada país, nos “Institutos Oficiais Autônomos de Urbanismo e Urbanística”, a serem também criados, e que teriam “a finalidade de levar a cabo uma ação coordenada de investigações, ensino e divulgação dos problemas urbanos e rurais” (ARQUITETURA E URBANISMO, 1940, p.31). Vê-se, então, que houve um crescente amadurecimento no pensamento sobre as atribuições profissionais do arquiteto, somando à tradicional concepção de homem das artes, noções de ciência, técnica e planejamentos habitacional e regional, muito em função do englobar do urbanismo ao métier já consagrado. Mas outro fator que possibilitou mudanças no entendimento da própria profissão do arquiteto, foi a luta pela regulamentação profissional durante as cinco edições em análise. De conclusões genéricas ocorridas no primeiro encontro, em 1920, como a que cobrava dos governos nacionais “a necessidade de definir a responsabilidade legal do Arquiteto, a exemplo do que ocorre com as demais profissões cujo exercício é fiscalizado por lei” (ARQUITETURA E

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URBANISMO, 1940, p.15), chega-se em 1940, com recomendações mais precisas sobre os comportamentos esperados de júris em concursos públicos e privados, bem como da questão dos honorários cabíveis a cada categoria de uma obra, claramente, um desdobramento das edições anteriores, como a de 1930, que postulava “com relação á propriedade artística”, que os poderes públicos sancionassem leis, ou reformassem as existentes “no desejo de garantir os direitos de autores nas obras de arquitetura”, estabelecendo especificações mais claras, já que “os codigos convencionais e opiniões juridicas só tratam do assunto de um modo geral, incluindo-a entre as demais artes e a literatura” (Idem, p.29). DEBATES: AS NOÇÕES DE ‘ESTILO’ D ‘CAUSA’ NOS CONGRESSOS PAN-AMERICANOS Costumeiramente, na historiografia da arquitetura e do urbanismo, se atribui a certos “arquitetos pioneiros”, uma suposta renovação do campo de atuação profissional, mediante um redesenhar de relacionamentos entre cliente e arquiteto, e entre sociedade e arquiteto. Esses arquitetos, chamados de “pioneiros” por historiadores da área, como Benévolo, Pevsner, Kopp e outros adeptos das concepções de “progresso na obra de arte”, são vistos como detentores de um pensamento elaborado, próprios “de seu tempo”, uma vez que podem ser identificados como partidários da crença na existência de um zeitgeist, enfim, de uma “causa transformadora”. Essa “causa” é entendida como a que possibilitaria uma transformação da sociedade e a instalação de um modo de vida que, em linhas gerais, traria um bem-estar a todos, mesmo que nem todos o aceitassem imediatamente. Por exclusão, os opositores dessa noção são vistos como “retrógrados”, “atravancadores”, ”historicistas”, “equivocados”, “anacrônicos”, enfim, partidários de um “estilismo arquitetônico estéril e sem compromissos”. Essa chave analítica dicotômica poderia ser usada para estudar os Congressos Pan-americanos de Arquitetos, já que em suas edições, algumas polêmicas envolvendo personagens tradicionais das duas formas de pensamento e ação da arquitetura das Américas estiveram presentes. Mas, optou-se por mostrar que embora algumas concepções fossem de implicações simplesmente formais, havia uma certa noção de causalidade presente em ambos os grupos. Tanto personagens como Christiano Stockler das Neves, professor do curso de Arquitetura do Mackenzie College, como José Marianno Carneiro da Cunha Filho, que apesar de médico foi celebrado pelos arquitetos no IV Congresso Pan-americano de Arquitetos como defensor da profissão (REVISTA DE ARQUITECTURA, 1930, p.469), eram partidários, cada qual, de um ideal arquitetônico. É obvio que suas concepções eram diversas de profissionais como Flávio de Carvalho, também um não-arquiteto de formação,3 mas contundente em suas declarações e iniciativas profissionais, mas todos buscavam defender, dentro dos mais altos níveis de erudição, suas posições e crenças profissionais. O que torna a análise dos Congressos Pan-americanos de Arquitetos, peculiar do ponto de vista da compreensão das vertentes de pensamento na arquitetura e no urbanismo, existentes entre os anos 20 e 40, é que eles aglutinavam essas diversas visões de arquitetura, provocando um diálogo aberto, e muito apaixonado pelos ideais de cada grupo. Muito interessante se torna a transcrição a seguir, relatando o teor de discussão a que os participantes se submeteram, durante o IV Congresso, no Rio de Janeiro: “A la hora regulamentaria, el Sr. Arq. Néstor de Figueirêdo asumió la Presidência y declaró abierta la II sesión plenaria del IV Congresso Panamericano de Arquitectos. (...) Antes de iniciarse la lectura de la tesis VII y IX, comunicó el Sr. Presidente que, estando inscriptos para hablar los Sres. [Flavio] Carvalho y Constantinowski explicó que pensaba ocuparse de los asuntos que estaban debatiéndose, pero considerando el espíritu conservador evidente que animaba al actual Congresso y no queriendo perturbar la armonía unilateral reinante, se abstendría de hacer uso de la palabra. El Sr. Flavio Carvalho informó a la presidencia que era su intención hablar sobre los ‘rascacielos’. El Presidente declaró que esa materia no estaba ese día em discusión y em seguida dió lectura a las tesis inscriptas. El señor Secretario leyó el informe sobre el tema VII: ‘La defensa Del patrimonio artístico,

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principalmente arquitectónico, em las naciones americanas’. (...)El Presidente puso luego el informe para ser discutido y concedió la palabra, según reglamento, al Sr. Favio de Carvalho, (...) que declaró estar conforme con las primeras conclusiones del informe. Hizo serias objeciones, sin embargo, respecto al espíritu de tradición y del pasado de que está llena parte de conclusiones. Dijo al respecto, entre otras cosas, que el Sr. Agache había difundido en el Brasil el amor a las cosas de la Colonia y la estimación para los objetos viejos y tradicionales. Siguiendo este orden de ideas expuso varias opiniones que fueron recibidas con apartes y otras veces protestas por parte de la Asamblea” (REVISTA DE ARQUITECTURA, 1930, p.495). A réplica a essa exposição de Flávio de Carvalho foi dada por José Marianno, que fez a defesa “del espíritu de tradición, del sentimineto de continuidad en la labor del Arquitecto”, já que, segundo expôs, “Todo pueblo, toda nación posee una historia y un pasado que deben conservar. Desde el momento que las naciones alcanzan verdaderamente un florecimiento social y político, edifican en realidad una civilización y se despierta entonces en el hombre el instito del amor a la casa, del cariño al logar, de la veneración por el ambiente donde se forma y se desenvuelve una familia. De así se deduce que todas las naciones (...) poseyeron su proprio estilo arquitectónico. Así ese estilo recuerda, señala el ambiente y la vida íntima de cada pueblo” (Idem). Em outra ocasião, outro diálogo acalorado entre Flávio de Carvalho e José Marianno demonstrou quais eram os argumentos existentes entre membros defensores, respectivamente, da Arquitetura Moderna e da Arquitetura Tradicional, representadas no evento: “El Sr. Flavio de Carvalho (...) dijo que la Arquitectura en el siglo XX es lógica, a la vez que filoófica, procede de las ciencias y se combina con la máquina, depende directamente del nuevo sistema social que la humanidad está en vías de elaborar. El sistema antiuo pone vallas a la inteligencia, embrolla y todo lo confunde; la Arquitectura debe ser lógica y filosófica; debe repetir la imagem de un sistema (...) Sólo de un ambiente nuevo pueden surgir ideas nuevas. El discurso del Sr. Carvalho fué aplaudido por varios de sus partidarios” REVISTA DE ARQUITECTURA, 1930, p.496). José Marianno respondeu, segundo a revista argentina, com “un discurso incisivo y cortante”, fazendo uma crítica “justa” ao moderno conceito de arquitetura, dizendo que os arranha-céus, e suas preocupações econômicas, feria os sentimentos da sociedade. Como relata o periódico, José Marianno citou críticos como Ruskin e Berson para revidar às críticas feitas contra a existência de uma arte tradicional, e teceu um paralelo para comprovar tal hipótese, dizendo que “se não existisse a arte tradicional, não existiria a família” (Idem). Essa divergência de opiniões, sentida nas sessões do IV Congresso Pan-americano de Arquitetos, soa como extremamente ilustrativa do alto grau de importância que os eventos panamericanos tiveram para a discussão e formulação dos discursos e das posturas profissionais dos arquitetos das Américas, e, especialmente, do Brasil, como o caso acima revelou. Convém, todavia, que sejam ampliados os estudos sobre essas reuniões, principalmente para que se detecte, de fato, o peso de sua contribuição ao amadurecimento e expansão do território da arquitetura, verificado no século XX. 1

Como Wisconsin, Chicago, Columbia, entre algumas outras. Merece destaque o fato de que o Brasil talvez tenha colaborado neste quesito, uma vez que desde 1911 existiam agremiações de Engenheiros e Arquitetos, como a de São Paulo, fundada em 1911 (FICHER, 1989, p.160). 3 Flávio de Carvalho era diplomado em Engenharia, na Inglaterra. (OSÓRIO, 2000, p.11). 2

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